A possibilidade de ocorrência do incidente de sanidade mental de acusados no curso de processos criminais encontra-se prevista no art. 149, CPP:

“Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal.

§ 1o O exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante representação da autoridade policial ao juiz competente.

§ 2o O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando suspenso o processo, se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que possam ser prejudicadas pelo adiamento”.

Há sérios questionamentos sobre a inadequação do termo “insanidade mental” de acusados no curso dos processos criminais e administrativos disciplinares. (Capítulo VIII, que trata da “insanidade mental”, do Título VI - CPP).  Nesse sentido o que estará em jogo no incidente não será somente a questão da possível insanidade (ou não) que será objeto de exame, considerando que serão objetos da perícia também a ocorrência de outros distúrbios mentais: “verificação de potencial para interferir na capacidade, do autor do fato, de compreendê-lo e desejá-lo (dolo) ou, ainda, de prever a sua ocorrência e de poder tentar evitá-la (culpa). Ainda que a possível doença não pareça afetar a capacidade de intelecção do sujeito (como é de se supor que ocorreria com a pessoa ‘insana’), o mais prudente é que o exame seja feito para que a dúvida seja resolvida por especialistas e qualquer traço de eventual nulidade seja afastado” (in Gustavo Scandelari, disponível em: https://dotti.adv.br/incidente-de-insanidade-mental-anotacoes-aos-arts-149-154-do-cpp-com-referencias-jurisprudencia/. Acesso em 28.02.2018).

“Imputabilidade é concebida como o conjunto de condições psíquicas que a lei exige para atribuir ao agente a sua ação. É um complexo de determinadas condições psíquicas que tornam possível ligar um fato a uma pessoa.” MANZINI e MAGGIORE.

São as atividades da medicina legal, segundo o sistema biopsicológico que se baseia na higiene psíquica e capacidade de entendimento ético Juiz elementos para que seja determinado o grau de imputabilidade do infrator. Três estágios diferentes são apresentados.

1º grau: imputabilidade plena, o infrator é considerado portador de plenas faculdades mentais, capacidade de entendimento ético-jurídico e autodeterminação no momento do crime.

2º grau: imputabilidade atenuada ou semi-imputabilidade, o infrator não é portador de doença mental, porém, por imaturidade, não tem consciência da licitude ou ilicitude das ações cometidas.

3º grau: inimputabilidade, é nula a capacidade de imputação do infrator por não possuir ele plenas faculdades mentais, capacidade de entendimento ético-jurídico e autodeterminação no momento do crime. 

(...)

 A semi-imputabilidade, caracterizada como uma imputabilidade de segundo grau (como foi visto acima). Consiste em um estágio intermediário entre a imputabilidade e a inimputabilidade, ou seja, um estado fronteiriço. São mais frequentemente enquadradas nesse segmento aquelas pessoas que, apesar de possuírem doenças mentais ou desenvolvimento mental incompleto, esses fatores não lhe tiram completamente os elementos inteligência e vontade. A essa categoria, quando comprovada sua presença emprega-se geralmente uma redução de um terço a dois terços da pena (...)”. (Apud, Elenice Pires Damaceno,  Moisés Fontes e Raíssa de Almeida, Disponível em http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-eficacia-do-direito-frente-a-alegacao-de-insanidade-mental,29305.html. Acesso em 28.02.2018).

No Estado de Santa Catarina a matéria encontra-se disciplinada por meio do foi art. 51 da Lei Complementar 491/2010 que deu origem ao “Estatuto Jurídico Disciplinar no âmbito da Administração Direta e Indireta do Estado de Santa Catarina”, conforme segue:

“Art. 51. Quando houver dúvida sobre a sanidade mental do acusado, a comissão proporá à autoridade competente que ele seja submetido a exame por junta médica oficial.

§ 1º O incidente de sanidade mental será processado em auto apartado e apenso ao processo principal, após a expedição do laudo pericial.

§ 2º O internamento do acusado, bem como a licença para tratamento de saúde após o interrogatório não suspende a tramitação do processo”.

JURISPRUDÊNCIA:

INCIDENTE DE SANIDADE MENTAL

“STJ, Terceira Seção, MS n. 8.276, DF, Min. Carlos Fischer, data da dec.: 13.11.02: “(...) III – Não há se falar em nulidade do exame de insanidade mental do acusado, em face da composição da junta médica oficial designada para a realização do referido exame, se foram devidamente observados os ditames do art. 160 da Lei n. 8.112/90, que determina a participação de pelo menos um médico psiquiatra (...). V – Não há nulidade na realização do exame pericial do acusado por ausência do assistente técnico indicado pela defesa se o defensor do acusado, devidamente comunicado acerca da impossibilidade de comparecimento do assistente na data previamente designada, compromete-se a indicar outro assistente técnico para participar do exame e deixa de fazê-lo”.

 

STF, 2ª Turma, Habes Corpus n. 74.459, RJ, data da dec.: 19.11.96: “(...) I – Tendo o paciente alegado, durante o interrogatório que era portador de doença mental, o Juiz determinou a realização do exame pericial e o desmembramento do processo, com base no art. 80 do CPP, em face da existência de co-réus com prisão decretada (...). V – H.C. indeferido”.

STJ, 3ª Seção, MS n. 7.291, DF, data da dec.: 28.03.01: “(...) Surgindo no curso do processo disciplinar dúvida razoável acerca da sanidade mental do servidor, a comissão processante deve propor à autoridade competente que ele seja submetido a uma avaliação médica, na forma do art. 160 da Lei 8.112/90. Segurança concedida”.

STJ, 3ª Seção, MS n. 6.974, DF, data da dec. 25.04.01: “(...) 2. A comissão de inquérito deve propor à autoridade competente a submissão da servidora à avaliação méica, quando no curso do processo disciplinar, surja dúvida razoável acerca da sua sanidade mental, ut art. 160 da Lei n 8.112/90”.

STJ, Embargos de Declaração em MS n. 7.464, DF, rel. Min. Gilson Dipp:  “(...) 2. O hodierno conceito de saúde contempla observância não só  do conjunto das qualidades exteriores e materiais do homem, mas também de seu estado interior, qual seja, a higidez de seu estado anímico. Desta feita, o indeferimento do requerimento apresentado pelo empregado detentor de pretenso problema psíquico, ao argumento de que a junta médica da Instituição concluiu pelo seu retorno imediato ao trabalho, oportunidade em que analisou-se, precipuamente, seu aspecto fisiológico, sem atentar-se para o problema psíquico emocional contraído, justamente pelo Órgão ser desprovido de psiquiatras em seu quadro de empregados, caracteriza latente desrespeito aos direitos humanitários mínimos, no que diz respeito ao conceito contemporâneo de saúde (...)”.

Incidente de insanidade mental do indiciado:

"(...) É que ao ser alegado a insanidade mental do acusado, pois que este, por quase trinta anos, serviu ao Estado com uma relevante folha de serviço, competia-lhe encaminhar o paciente a uma junta médica especializada, a fim de comprovar ou não o alegado. Sendo matéria que necessitava laudo pericial especializado, escapava, à referida comissão, decidir o mérito do que foi peticionado. Além do mais, não era o procurador do réu quem deveria indicar os peritos, bem como, proceder tal prova, sob pena de suspeita. A execução das diligências é imanente à comissão (...) (JC 25, p. 321, Rel. Des. Nauro Colaço).

“(...) O juiz somente deverá determinar a realização  de exame de insanidade mental quando existirem reais dúvidas pela integridade  mental do acusado, podendo negar perícias requeridas quando estas não forem  necessárias ao esclarecimento da verdade (artigos 149 e 184 do CPP), ainda mais se o acusado, nas oportunidades em que foi ouvido, não demonstrou qualquer distúrbio capaz de justificar a providência. Até mesmo ‘a simples alegação de sofrer distúrbios psíquicos e o uso de remédio controlado não são suficientes  para levantar dúvida sobre a higidez psíquica do acusado’ (RT 683/339) (...)” (Apel. Criminal n. 98.006430-9, Blumenau, Rel. Des. Álvaro Wandelli, DJ n. 10.061, de 24.09.98, pág. 14).

Exame de insanidade mental – processo – suspensão:

“(...) O exame de insanidade mental, por ser obrigatório a suspensão do processo, e por ser ato que beneficia o réu, não caracteriza excesso de prazo” (HC n. 11.361, de Blumenau, Rel. Des. Solon d'Eça Neves)” (HC n. 98.003211-3, Itajaí, DJ 9.978, de 27.05.98, p. 13).

PROVA - PERÍCIA – EXAME DE INSANIDADE MENTAL:

“(...) 3. Não obstante a singeleza da perícia médica levada a efeito pela própria administração, que afastou a insanidade mental do autor, a defesa não alegou nos autos do processo administrativo que o acusado padeceria de doença mental, nem pediu que se procedesse a seu exame. A prova da impunidade cabia ao autor. Cerceamento de defesa que se afasta” (TRF da 1ª Região, Primeira Turma, classe da decisão: remessa ex officio n. 01.250.174, DF, data da dec.: 21.11.01).

“Penal. Processual penal. Hábeas corpus. Exame de insanidade mental. Desmembramento do processo. Inocorrência de nulidade. Cerceamento de defesa. Ausência de defesa. Questões levantadas pela defesa: análise pelo tribunal. I – Tendo o paciente alegado, durante o interrogatório, que era portador de doença mental, o Juiz determinou a realização do exame pericial e o desmembramento do processo, com base no art. 80 do CPP, em face da existência de co-réus com prisão decretada. H.C. indeferido” (STF, Segunda Turma, HC n. 74.459, RJ, data da dec.: 19.11.96).