Inauguração Kabbalista

Preparar o lugar certo para iniciar um grupo kabbalístico é muito mais que apenas organizar um situação e horário convenientes. Além dos valores práticos, existe a visão a longo prazo que leva em consideração coisas que normalmente não são pensadas, porque se lida com muito mais do que o nível mundano. Todos os elementos devem ser considerados, desde os detalhes comuns, como ter xícaras suficientes para o café, até a implicação em grande escala desta operação em relação a um exercício global, como o que é as vezes chamado de “Fraternidade do Meio-Dia”, no qual grupos se aproximam em contato espiritual ao redor do mundo todo, enquanto o meio do dia passa pelo seu país. Neste estágio, nosso grupo não tem, até então, capacidade neste nível, porque encontra-se ainda em preparação, no sentido de que as pessoas ao redor de “X” ainda são indivíduos e não se relacionam uns com os outros. Não formam ainda uma unidade coesa. Isto apenas pode acontecer quando o grupo nasce através de uma cerimônia de inauguração.

O momento do nascimento de um grupo deve ser escolhido com cuidado. Embora todas as pessoas envolvidas se reúnam durante um período específico, não significa que necessáriamente se tornarão um grupo. Como no nascimento de uma criança, as coisas podem dar errado e o grupo pode “abortar” ou se tornar natimorto. O fator essencial é o tutor, que age como o coordenador das pessoas circulando ao redor da idéia, até então amorfa, de um grupo. Se um tutor não quer assumir a tarefa, nada será realizado. Depois de um certo tempo, a energia focalizada sobre o tutor perderá sua força e coesão. Então se dispersa e o momento terá sido perdido, enquanto as pessoas perdem a oportunidade. Em certas ocasiões isso acontece quando um tutor em perspectiva perde a coragem ou faz algo incorreto, o que invalida o direito e o privilégio de instruir um grupo. Talvez ceda a uma última tentação, como uma súbita presunção do ego que acredita ser ele sozinho a única razão para atrair todas essas pessoas, e não a Providência. Acontece.

De modo inverso, se o tutor em perspectiva assssssume a responsabilidade por um grupo, então todo o processo que conduz à sua inauguração deve ser atravessado. Primeiro, um lugar de reunião deve ser encontrado. Este local pode ser permanente ou temporário. Pode ser em uma casa particular, ou em um edifício público. Pode ser na casa de alguém, ou uma sala especialmente separada para o trabalho de grupo. A história da Kabbalah indica que diferentes tipos de lugar foram utilizados, desde as câmaras laterais do Templo em Jerusalém até a Casa da Dinda em Brasília, das salas secretas das academias talmúdicas até o Palácio do Planalto em Brasília. Bibliotecas acadêmicas (USP, PUC, UFRJ) e templos em miniatura foram utilizadaos pela linha não-judaica da Kabbalah, bem como apartamentos pessoais (Asa norte de Brasília) e quartos de fundo. Não existe uma forma clássica para o lugar da reunião, exceto ser possível transformá-lo em Espaço Sagrado durante o tempo em que é utilizado.

A freqüência das reuniões depende das condições e das inclinações do grupo. Algumas pessoas gostam de se encontrar todos os dias, mas isto requer um modo de vida próprio e localmente orientado, tal como teria sido encontrado nos velhos vilarejos e cidades da Polônia. Outras preferem reunir-se uma vez por mês, e isso equivale ao tempo total disponível a um grupo amplamente disperso, como os que encontram no campo ou em um grande território, como a região Norte do país. A freqüência habitual das reuniões é uma vez por semana, e aqui o dia é determinado por diversos fatores, como o de quantas pessoas podem se reunir em uma determinada noite, porque há sempre os que gostariam de vir, mas não podem neste dia por causa de outros compromissos. Às vezes, isto é um grande teste de seriedade. Muitas pessoas, por exemplo, logo acham que determinada noite é inconveniente por algum motivo,e, na verdade, na maioria das vezes são estas as pessoas que querem essa noite específica. Tais pessoas exigentes são, em geral, as primeiras a saírem. O verdadeiro explorador simplesmente ajusta sua vida ao redor do grupo, e viajará qualquer distância para estar ali porque isto é importante, enquanto os menos dedicados encontrarão qualquer desculpa para não aparecer, embora morem na esquina. Após avaliar um consenso de opiniões, o tutor então descide em qual dia da semana será a reunião. Este será o padrão semanal para os três períodos mensais da primavera, verão e outono. A razão desse sistema é proporcionar às pessoas tempo para descanso e reflexão, para gozarem suas férias e aprenderem a valorizar o grupo quando não estão se reunindo fisicamente. Depois de estabelecer o aspecto organizacional do grupo, a escolha de uma data para a reunião inicial se torna da maior importância.

Até a Renascença, nada de importante era iniciado ao acaso. Cada ocasião, o lançamento da pedra fundamental de um edifício, o içar velas de um navio, ou o momento de um casamento, era cuidadosamente considerada. A razão disso era porque se reconhecia a existência da ocasião propícias nas quais fazer, ou abster-se de qualquer coisa. Esta compreensão vem de fontes esotéricas que percebiam, na interação entre diferentes mundos, haver períodos de harmonia e de desarmonia, e momentos em que se poderia ir para qualquer lado. Estas marés sutis, além disso, não apenas tinham suas vazantes e cheias, mas um conjunto distinto de características em certas épocas do dia, mês e ano, as quais eram favoráveis a certos objetivos e desfavoráveis a outros. Assim, foi observado que o período logo antes do Sol alcançar seu merediano do meio-dia era um momento bom para começar algo que teria um efeito prático de longa duração no mundo, embora fosse observado que os acontecimentos relacionados a quando o Sol estava no signo de Libra tinha um peso distinto sobre a questão da parceria. A posição da lua era levada em consideração em algumas culturas, de modo que nada se fazia durante a sua última fase desfavorável, enquanto algo poderia ser prosperamente iniciado na Lua Nova.

Kabbalisticamente, o começo de qualquer atividade a transporta, através dos planos da Forma e da Criação, até o mundano, de modo que sua cristalização material no mundo da Ação traz a carga e o caráter presentes naquele momento de manifestação. Este princípio é levado em conta no começo formal de um grupo. De modo geral, se o tutor não souber exatamente qual o horário selecionar, então será aconselhado por um de seus superiores, se não for pela Providência, a qual sempre dá sinais bem claros de quando o grupo deveria começar. Muitas vezes, toda a operação aos poucos se focaliza em uma determinada data, porque uma série e uma combinação de acontecimentos a sintoniza naquele dia específico. Uma vez que isto tenha sido identificado e estabelecido, então a cerimônia de inauguração pode ser planejada. Um ritual como este pode ser simples ou complexo, de acordo com o gosto ou com a necessidade do grupo em perspectiva. O elemento essencial é estar bastante seguro de qual é o objetivo da cerimônia de inauguração. Isto não só determinará a natureza da cerimônia, como também a qualidade do grupo enquanto este exista, o que pode ser durante uns poucos meses ou uma centena de anos, pois ninguém, a não ser o visionário, saberá o que está planejado para tal veículo. Se olharmos para a história, existem muitos exemplos de pequenos grupos de pessoas pouco conhecidas em lugares remotos, como a Galiléia, que cresceram até se tornarem escolas, e então Linhas, que transformaram civilizações inteiras. Tais acontecimentos são raros, mas sempre possíveis se a época for propícia e se o Céu assim planeja utilizar o veículo criado.

Tendo estabelecido o dia, a hora e o lugar da reunião, todos os que estão envolvidos deverão ser informados de que devem se preparar para a cerimônia. Isso pode ser feito de acordo com o julgamento do tutor. Alguns pedem que todos se banhem e compareçam com roupas limpas. Outros podem ser mais ou menos exigentes. O que é importante de ser lembrado é que algum esforço especial deve ser feito, como os israelitas no Êxodo antes de chegar diante da Montanha Sagrada do Sinai para receber a Torah. De maneira simbólica e prática, esta é exatamente a mesma situação, pois quando as pessoas se reúnem pela primeira vez como um grupo, receberão algo que não podem receber como indivíduos, porque sendo um grupo um veículo maior, acomodará mais que, nesse ponto, qualquer pessoa como indivíduo. Assim sendo, a reunião inaugural deveria ser marcada como o momento em que o grupo vem a existir, enquanto a reunião se funde com uma totalidade maior.

Falando praticamente sobre a cerimônia, todos devem chegar pelo menos quinze minutos antes da hora marcada, e sentar em completo silêncio. O tutor pode já estar sentado na cadeira ou receber, em silêncio, as pessoas na porta. A forma não importa. O que importa é que seja criada uma atmosfera de que algo de especial está para acontecer. Isto é aprofundado quando o tutor assume a posição de foco diante do grupo, depois das portas serem fechadas e todos estarem em seus lugares. Após um solene silêncio, no qual as pessoas se tornam cientes da elevação da consciência, o tutor evoca a Árvore da Vida pronunciando cada nome sefirótico, tal como:

Malkhut – Reino

Yesod – Fundação

Hod – Reverberação Nezah – Eternidade

Tiferet – Beleza

Gevurah – Julgamento Hesed – Misericórdia

Daat – Conhecimento

Binah – Compreensão Hokhmah – Sabedoria

Keter – A Coroa

Após uma pausa, o tutor, então, prossegue chamando os Nomes Divinos da coluna central da Árvore da Emanação, ou Azilut, tal como:

ADONAI: Senhor

Que sois

EL HAI SHADDAI: O Todo-Poderoso

Que sois

HAKODESH: O Santo

Que sois

EHEYEH ASHER EHEYEH: EU SOU O QUE EU SOU

O tutor então diz:

“Se for de Vossa Vontade, deixe que o Espírito Santo desça sobre nós neste dia para que possamos conhecer a Vossa Presença”. O tutor acende duas velas preparadas, dispostas diante de um diagrama da Árvore da Vida, e conclui a cerimônia dizendo:

“Do Senhor vem toda a Luz”.

A inauguração está terminada. Após longa pausa, o tutor se dirige para a assembléia, cumprimenta o grupo inclinando a cabeça, e começa a falar sobre os objetivos do grupo. O Trabalho foi iniciado. Um novo grupo kabbalístico, em uma longa linha da Tradição, agora existe.