Data: 18.08.2016, por volta de treze horas, estava almoçando no restaurante "De Itália", localizado no centro de Chapecó (próximo da Igreja matriz), na companhia do Delegado Regional W. M., quando tratamos de vários assuntos relacionados à Polícia Civil. Durante nossa conversa “W.” reiterou algumas considerações que já havia feito na parte da manhã no seu gabinete sobre três pares que eram tidos como seus "inimigos" naquela cidade, nomeando os Delegados Alex Boff, Danilo e Gustavo. Enquanto “W.” apresentava seus argumentos lembrei apenas do Delegado Alex, casado com uma mulher de família abastada daquela cidade, sendo que naqueles tempos se encontrava licenciado, muito provavelmente porque estaria muito bem de vida. Segundo “W.” o Delegado Alex, com forte influência política na região, tentava de diversas formas intervir na sua administração, dando a impressão que queria derrubá-lo para assumir o seu lugar (já havia exercido a função de DRP entre 1998 e 2002) ou, talvez, quisesse indicar alguém das suas relações, no caso um dos dois desafetos também mencionados. Como não conseguia lembrar desses dois Delegados (Danilo e Gustavo) optei pelo silêncio, sem tecer qualquer comentário sobre os mesmos. “W.” que veio do Estado do Mato Grosso, onde foi Sargento da Polícia Militar (seu pai também era militar reformado naquele Estado) fez um desabafo:

- "Uma das diferenças que eu pude notar aqui em Chapecó é que a maioria dos Delegados veio de fora, não possuem raízes familiares nesta cidade. Então, isso gera uma diferença muito grande de tratamento, pois os Delegados não conhecem quase ninguém, enquanto que os militares são daqui, possuem diversas familiares que residem nesta região e por isso possuem muitos acessos a políticos, enquanto que nós chegamos sem conhecer quase ninguém".

Concordei com o raciocínio de “W.”, lembrando que primeiramente ele foi Delegado de Maravilha, depois, a convite do Delegado Antônio Carlos Pereira (Delegado Toninho, nosso amigo), foi convidado a assumir a Delegacia Regional de Canoinhas, uma cidade bem diferente de Chapecó. Também, logo imaginei que chegar em Chapecó e ter que enfrentar o Delegado Alex (apesar de também ser manezinho da Ilha, lá do Bairro Saco dos Limões, já estaria bem radicado naquela cidade). “W.” parecia simbolizar um quê de pura inocência, entretanto, com forte característica de ser verdadeiro, sincero e, especialmente, demonstrava ser uma pessoa humildade e confiável. Apesar disso, tinha algo nele que de certa maneira poderia incomodar um pouco e que naquele momento fazia acender uma luz amarela em termos de segurança no cargo. Diante desses presságios interiores (e querendo ajudar o ilustre e competente amigo), logo me acalmei lembrando que à tarde iria ouvir justamente os Delegados Danilo e Gustavo, sendo assim poderia aquilatar melhor os motivos dos conflitos desses dois com o Delegado Regional de Chapecó. “W.” já havia me dito que o Delegado Danilo era casado com a Juíza de Direito de Maravilha e dava a impressão que não queria trabalhar, era acomodado e atuava nos bastidores como seu opositor, inclusive, mantendo relações com um jornalista famoso da cidade, repassando informações para desgastá-lo perante a opinião pública (citou como exemplo o caso da normatização da CPP/Chapecó), mantendo contatos também com o Delegado Alex Boff. Já o Delegado Gustavo, além de lhe fazer oposição, também, mantinha relações de amizade com o Delegado Alex e fazia críticas abertamente a sua gestão frente a DRP. “W.” já havia me dito que o Delegado Aden, Diretor de Polícia da Fronteira era apadrinhado do Deputado Gelson Merísio/PSD (Presidente da Assembleia Legislativa, do mesmo partido do Governador Raimundo Colombo) e amigo dos Delegados desafetos, não lhe dando apoio na sua pretensão de bem administrar a DRP, inclusive, na sua pretensão de mandar os mesmos embora de Chapecó. Curioso com o assunto, perguntei sobre a opinião do Delegado Toninho (Diretor de Polícia do Interior) e “W.” respondeu que o mesmo havia lhe orientado a não fazer nada, deixar tudo como estava para evitar entrar em rota de confronto com o Delegado Aden que possuía blindagem política muito forte. Reforcei que com relação ao Delegado Alex Boff era para tomar muito cuidado porque se tratava de uma pessoa muito forte politicamente, além de ser um grande articulador. Aproveitei para relatar um fato pitoresco envolvendo o Delegado Alex Boff que há uns anos atrás - após um jantar na minha campanha às eleições à Adepol-SC (2010) – me formulou um convite (digamos, se ofereceu) para irmos juntos até o Paraguai comprar pneus para minha caminhonete (foi um convite-surpresa porque eu não tinha tratado ou perguntando qualquer coisa sobre o assunto..., talvez ele tivesse percebido o veículo estacionado ao lado com os pneus um pouco desgastados...). Comentei que agradeci o convite e que argumentei que nunca tive interesse em fazer tal viagem e que na minha avaliação Alex parecia ser tudo em termos de fazer negócios e contatar políticos, entretanto, era bem menos Delegado e interessado em assuntos institucionais (dava para perceber no ar o que respirava, dava importância, aguçava seu interesse, animava os seus contatos...).

Por volta das quatorze horas, já na DRP/Chapecó, comecei primeiramente a ouvir o Delegado Gustavo e logo que passamos a conversar lembrei que ele havia assumido interinamente a Delegacia Regional de Chapecó, substituindo o Delegado Regional Ronaldo Moretto durante um breve afastamento. Na medida em que conversávamos pude perceber que a testemunha se revelava um Delegado bem preparado, com um senso muito alto de profissionalismo, com sentimento amor próprio e autoestima, enfim, revelava dignidade e comprometimento com a função pública e que acreditava no que fazia. Em razão disso me pus a perguntar por quê “W.” teria implicado com esse Delegado? Sim, pelo fato de ser um profissional com luz própria, por já ter exercido interinamente a Delegacia Regional (substituiu o DRP Ronaldo Moretto), por exercer talvez uma espécie de liderança, por não aceitar a função dignitária de um DRP mais novo que chegou recentemente na região? “W.” aparentava encontrar dificuldades no relacionamento com alguns colegas justamente porque pretendia conquistar seus espaços, se auto afirmar, pretendia se consolidar, ser aceito, se autoafirmar... Diante desse quadro pensei comigo: "Bah, vou ter que conversar urgente com o ‘W.’, porque sua estratégia está completamente errada com relação a esse Delegado”.

Por volta das quinze horas chegou a vez de ouvir o Delegado Danilo que entrou na sala de audiência (antessala do gabinete do DRP) de modo informal e sem qualquer cerimônia. Danilo se acomodou numa “poltroninha” que servia para as testemunhas, repassando a impressão de que estava bem tranquilo, além de um misto de humildade e fidalguia discretamente observáveis. Meu interlocutor comentou que a exemplo do Delegado Gustavo, já tinha sido ouvido por mim noutra oportunidade, só que noutro procedimento disciplinar. De imediato caiu minha ficha e acabei lembrando da minha testemunha, entretanto, não do conteúdo de nossas conversas, diferentemente do Delegado Gustavo, em razão da sua condição de Delegado Regional interino. Todavia, na medida em que o Delegado Danilo passou a estabelecer uma conversação logo lembrei um pouco do seu interesse institucional, especialmente, porque foi um dos poucos nessas minhas caminhadas que tomou a iniciativa de me perguntar:

- "Doutor, o senhor ainda está defendendo aquele seu projeto do segundo grau para a carreira dos Delegados de Polícia?"

Digamos que isso foi o "passaporte" para blindar a sua pessoa contra qualquer prevenção em termos de crítica e dúvida quanto a sua conduta profissional, funcionando como empatia e receptividade aos nossos contatos. Na sequência, perguntei de que Estado da federação ele era originário, ao que prontamente respondeu Rio de Janeiro, mas que sua esposa era catarinense, da região de São Carlos (sem citar que a mesma era Juíza de Direito de Maravilha). Logo imaginei: "Bingo, esse cara marcou mais um ponto comigo, pela humildade, e pensei: "mais um motivo para que tenha que voltar a conversar com “W.” urgentemente, hummm!". Depois que terminamos a audiência pude observar que Danilo quis permanecer mais um pouco conversando sobre assuntos institucionais, sem manifestar qualquer interesse em deixar o local, inclusive, relatando que gostou muito de um dos últimos artigos que publiquei sobre "hierarquia nas carreiras jurídicas" e que realmente concordava comigo, vaticinando:

- "Lá realmente existe muita hierarquia, puxa, e como tem!".

Foi quando aproveitei para comentar que tinha conhecimento que sua esposa pertencia ao Poder Judiciário e que ela mesma poderia confirmar que o que eu escrevi era a pura verdade. Danilo concordou com minhas opiniões e aproveitou para reiterar que sempre lia meus artigos e que eu era um profissional imprescindível na instituição (pensei comigo: "Pode ser bajulação, mas acredito que ele não precisa disso e demonstra inequivocamente ser uma pessoa autêntica". Obviamente que essas considerações reforçaram ainda mais a imagem positiva sobre sua pessoa e que na minha opinião realmente “W.” estava tendo problemas sérios de relacionamento especialmente com esses dois Delegados que na minha opinião eram excelentes (a exemplo do próprio “W.”). No caso do Delegado Alex, fora umas questões pontuais, o Delegado “W.” tinha que considerar que se tratava também de um profissional muito influente e com peso político, entretanto, necessitaria adotar algumas providências para mantê-lo afastado do seu raio de atuação e evitar proximidades para não se prejudicar. No curso da conversa relatei um pouco sobre o anteprojeto de lei orgânica da Polícia Civil e notei que Danilo insistia em conhecer detalhes sobre o assunto. Tive que dar algumas voltas, repassando alguns informações. Danilo me surpreendeu perguntando:

- "Doutor, o senhor já fez a exposição de motivos?"

Achei mais uma grande “sacada” essa sua indagação e ao mesmo tempo me senti lisonjeado com tamanha sagacidade, demonstrando estar na frente dos seus pares em nível de consciência de classe e visão institucional. Respondi negativamente a indagação e argumentei que a exposição de motivos seria rápida e que o mais cruel era trabalhar no projeto final, tendo que enfrentar desafios outros que estávamos dispostos a solucionar. Ao final, comentei que felizmente o nosso projeto já estava quase que consumado.

Por volta das dezessete horas e quarenta minutos, quando tinha terminado as audiências, me dirigi até o gabinete de “W.” e o encontrei sentado em sua cadeira parecendo aguardar um "feedback" sobre minhas impressões. Pude perceber que “W.” estava na sala ao lado, com a porta entreaberta, dando a impressão que ouviu todas as nossas conversas (reparei que a porta da antessala de seu gabinete estava apenas encostada, com uma pequena fresta...). Fiquei satisfeito por ter agido normalmente diante daquela possibilidade, sem me importar que as paredes tivessem ouvidos, digamos, ou que pudesse haver algum monitoramento (só fui perceber que a porta estava daquele jeito já no final das oitivas, intuindo que poderia ter sido obra da secretária do DRP...).  Logo que me aproximei de “W.” observei que ele poderia ter ficado meio que desconfortado pela forma com que me relacionei com os dois "desafetos" durante as audiências, mas fui direto priorizando acima de tudo nossa amizade:

- "‘W.’, eu conversei com o Danilo e com o Gustavo, sinceramente, eles me pareceram excelentes profissionais. Eu acho que tem alguma coisa errada no teu relacionamento com eles, na forma como você trata os dois...".

“W.” imediatamente me contradisse:

- "Doutor, o senhor não conhece esses dois, eles só fizeram cena, eles não são nada disso. O senhor precisa saber o que eu passo com eles aqui".

Interrompi:

"‘W.’, se tu falares do Alex eu até concordo que ele é difícil de lidar e que tu tens que tomar certos cuidados, deves manter ele longe, não tratar mal, mas sinceramente esses dois Delegados aí, me desculpe, eles me pareceram muito bons".

“W.” começou a mexer no celular atrás de uma nota do jornalista conhecido na região e que tinha uma coluna no principal jornal em circulação daquela cidade. Enquanto ele procurava a notícia arquivada no seu celular eu fui falando que o Delegado Danilo ainda tinha elogiado a sua conduta profissional. “W.” mexendo no celular arrematou:

- "Não, doutor, é tudo um faz de conta. Não é nada disso. Foi ele mesmo que repassou a informação para que o jornalista publicasse a nota me criticando, eu vou lhe mostrar, deixa eu achar aqui. Ele é assim com esse jornalista".

Depois de uns segundos ou talvez uns dois minutos, não mais que isso, “W.” veio com o celular me mostrar a nota contendo críticas a normatização da Central de Polícia de Chapecó e afirmou:

- "Tá vendo aqui, eu sei que foi ele que entregou a informação porque nas conversas que tivemos aqui são essas frases que ele usa, bem igual. Então não vem ele aqui querer se passar de bonzinho. Eu conversei com o Aden e pedi uma providência contra esses dois Delegados, mas eu vi que ele não vai fazer nada. Ai eu conversei com o Doutor Toninho lá da ‘Depoi’ e ele foi que nem um pai para mim, me aconselhou a não mexer com eles, deixar tudo quieto que era melhor. Então, doutor, ouvindo as pessoas que eu confio e considero as mais experientes foi que eu resolvi deixar a coisa assim, mas confesso que estou com muito ódio, não sei como vou administrar isso, eles me fizeram muito mal!"

Diante desse quadro e percebendo o "sinal amarelo", sentindo nos gestos, no olhar e nas frases todo o ressentimento de “W.” contra os dois colegas citados (parece que com relação ao Delegado Alex, por estar afastado das funções, não havia tanto ressentimento a ser destilado contra sua pessoa) resolvi lhe dar um conselho:

- "Bom, tu sabes que eu gosto muito de ti e estou torcendo pela tua administração, sabes também que eu poderia chegar aqui e dizer para ti: 'esses dois f.d.p. vieram prestar depoimento para mim e mentiram adoidado, são uns falsos, tu sabes que eu poderia dizer isso só para te agradar. Mas prefiro a verdade, prefiro dizer o que realmente penso, ainda mais em se tratando de você que é uma pessoa que gosto".

“W.” me interrompeu:

- "Não, doutor, o senhor fez bem em me dizer essas coisas, eu vou pensar um pouco melhor sobre tudo isso. Não queria que o senhor viesse aqui me dizer coisas só para me agradar. Eu antes estava lá em Canoinhas e era bem diferente daqui. Eu nunca passei por isso. Não tinha a mínima ideia que assumir uma Delegacia Regional como Chapecó teria que me defrontar com esse tipo de situação, com pessoas trabalhando contra mim, querendo o meu mal. Sinceramente, eu não tinha ideia que seria assim".

Interrompi:

- "Vou te dar um conselho, procura dialogar com esses dois Delegados, traz eles para o teu lado. Imagina, o Danilo é casado com a juíza de Maravilha e o Gustavo foi escolhido pelo Moretto para substituí-lo aqui na DRP quando ele era Delegado Regional, certo? Então, faz o seguinte, tu vais sair de férias no mês que vêm, então chama o Gustavo e diz: 'Olha Gustavo eu queria que você fosse o meu substituto durante as minhas férias. O Delegado Moretto na época que estava aqui na DRP fez isso, então eu vou fazer a mesma coisa em reconhecimento a tua competência funcional e a decisão do Delegado Moretto'. Faz isso que tu vais ver que o Gustavo já vai começar a mudar de atitude contigo".

“W.” me interrompeu:

- "Não, doutor, eu já convidei o Delegado Abel para me substituir nas minhas férias".

Argumentei:

- "Tudo bem, é também um excelente Delegado, mas conversa com ele e relata a situação e chama o Gustavo, faz isso".

“W.”  voltou a externar uma espécie de quase ódio interior contra os dois Delegados e eu voltei a carga:

- "Meu amigo, você criou isso dentro de você, deixou crescer esse sentimento e está alimentando. Não faz isso. Se você pensar pequeno você terá um futuro muito menor. Pensa grande que tu farás o teu futuro ser grandioso. Eu torço por isso, mas tu tens que superar isso dentro de ti".

“W.” pareceu meio impressionado com minhas palavras, mas deu para perceber naquele momento a sua teimosia e a sua "cegueira", tudo criação da sua imaginação. Procurei ainda fazer ver a ele que no âmbito da instituição nós temos que agir como se fôssemos uma família apesar das divergências... “W.” chegou a dizer que sabia que eu estava aconselhando ele como um pai, que entendia o que eu estava querendo lhe dizer, que iria pensar melhor sobre o assunto e o que poderia fazer. Aproveitei para falar um pouco do anteprojeto da lei orgânica e pedi que ele assinasse junto comigo a exposição de motivos. Acertamos que na minha próxima vinda a Chapecó (provavelmente prevista para o mês de setembro próximo iríamos comer a tão prometida pizza juntos).

Depois de deixar a DRP de Chapecó meus pensamentos se fixaram em “W.” e seu ódio interior, será que ele teria olhos para o nosso anteprojeto de lei orgânica, a exemplo do que havia demonstrado o Delegado Danilo? Estaria o Delegado “W.” eclipsado pelo poder e mergulhado em questões regionais? Só o tempo...