"Modelo Ideal de Polícia (II):

Benedito Domingos Mariano, sociólogo e ex-Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo (Governo Mário Covas), também atuou junto a Prefeitura da Capital daquele Estado e no Ministério da Justiça (Governo Fernando Henrique Cardoso), também se manifestou sobre o assunto. No que diz respeito à mudanças estruturais nas estruturas policiais, Benedito Domingos Mariano – Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, teceu as seguintes considerações:

'(...) Outro caminho, mais difícil, é iniciar amplas mudanças pressupondo que a maioria dos policiais é vocacionada e idealista; a estrutura é que é arcaica. Corrupção, ineficiência e violência são efeitos dela; resistir a isso é uma tentativa demagógica de tapar o sol com a peneira. Vejamos alguns dados. 1) Em menos de oito anos, a PM paulista foi responsável pela morte de 5.400 civis, e o número de policiais que se suicidaram é maior que o dos que morreram em confronto com marginais. 2) Morreram nos chamados ‘bicos’ três vezes mais policiais do que os mortos em serviço. 3) A diferença entre o menor e o maior salário na polícia é de dez vezes, na maioria dos Estados. 4)  Em São Paulo, cerca de 30 mil presos sobrevivem em condições subumanas, sob a responsabilidade  da Polícia Civil, numa situação que já vem de décadas. 5) A direção da Polícia Civil,  devido a uma famigerada aposentadoria compulsória aos 70 anos, não se altera com a rapidez necessária. 6) As policiais misturam atribuições. A PM tem um grande setor de investigação (P-2), e a Polícia Civil, um grande setor de Polícia preventiva e ostensiva (GOE e GARRA). 7) A Lei Orgânica da Polícia Civil traz mecanismos frágeis de punição, e o regulamento disciplinar da PM pune mais transgressões nos quartéis que atos irregulares nas ruas (...)” (Folha de São Paulo, Quarta-feira, 5 de agosto de 1998 – Opinião – I-3).

'Modelo ideal de Polícia (III):

Dicotomia estrutural e violência policial

O debate sobre modificações das polícias no Brasil foi motivado muito mais pelos episódios que chocaram a opinião pública do que pela real vontade política de mudar regras e estruturas. Governadores – até aqueles de partidos de esquerda, como Cristovam Buarque – foram a público dizer que os casos graves envolvendo policiais militares eram isolados (...). A polícia  da democracia será construída na formação para a cidadania, na fiscalização e na apuração rigorosa de delitos cometidos por agentes do Estado, mas sobretudo nas mudanças estruturais. A sonhada polícia única de caráter civil está longe  da agenda política do governo federal e do Congresso. A proposta enviada pelo governador Mário Covas ao presidente Fernando Henrique Cardoso, que unifica as funções de polícia (Judiciária, investigativa, preventiva e ostensiva), não foi sequer discutida profundamente na comissão criada no Ministério da Justiça para prioritariamente avaliá-la. O que propôs o governo federal foi enviar ao Congresso a desconstitucionalização do artigo 144, passando para os Estados a responsabilidade de reestruturar as polícias estaduais. Nos estados do Norte e Nordeste do país, as Polícias Militares têm efetivos quatro ou cinco vezes maiores que os da Polícia Civil; no Sudeste, no mínimo, o dobro. Sabedores do lobby das Polícias Militares, qual polícia as Assembléias Legislativas iriam priorizar? É bem possível que as Polícias Civis dos Estados percam funções e as Polícias Militares, além do policiamento ostensivo e preventivo, façam  também polícia judiciária e investigativa, como já acontece em determinadas localidades de vários Estados. Se a desconstitucionalização das polícias passar no Congresso, as mudanças podem se dar na contramão das exigências da sociedade civil e da perspectiva da comunidade internacional. O que o governo federal, os estaduais e o Congresso têm que definir é se querem ou não quebrar uma dicotomia estrutural  existente nas Polícias Militares: uma função de natureza civil e uma estrutura de natureza militar (...)” (Folha de São Paulo, 24.09.97, opinião 1-3).   Noutro artigo, assim se manifestou: “Propostas para mudar a polícia – Um órgão de fiscalização autônomo e independente da atividade policial tem o dever de mostrar ao governo e, em particular, à sociedade que, além de encaminhar denúncias e acompanhá-las com rigor, também prioriza propor alternativas que visem, a curto e médio prazos, diminuir os atos irregulares e as deficiências estruturais que a Ouvidoria torna públicos. As principais propostas da Ouvidoria são: 1) Fortalecer, dar competência estadual e estudar a possibilidade  de criação de carreira própria para os órgãos corregedores das policiais, garantindo inamovibilidade e mandato para os corregedores. 2) Mudar o Regulamento Disciplinar da PM (...). Indenizar as vítimas de violência policial (...). 3) Disciplina permanente de direitos humanos nas Academias de Polícia. 4) “...descaracterizar 80% dos carros da Polícia Civil e fortalecer a investigação científica. 6) Estudar a possibilidade de diminuir o número de patentes da Polícia Militar, que hoje são 12, para, no máximo, seis, visando diminuir a distância entre oficiais e praças. 7) Não utilizar armas de fogo em reintegrações de posse, greves e outros eventos  com multidões. 8) Implementar o programa de saúde mental na PM (...). 9) “... criação de um único órgão de informação e inteligência, sob controle do Executivo (...), voltado exclusivamente  para o combate ao crime organizado e para prevenir e inibir a prática de delitos cometidos por agentes do Estado e subsidiar o planejamento estratégico da ação policial. 10) “... pagamento de horas extras, para evitar os bicos dos policiais...”. 11) Unificar progressivamente as academias e escolas e estabelecer convênios com universidades  para formação em determinados temas. 12) Criar mecanismos ágeis que garantam rapidez no julgamento de processos administrativos  e disciplinares sumários...”. 13) Estudar a possibilidade de diminuir a distância entre o maior e o menor salários dos policiais (hoje em torno de dez vezes), estabelecendo piso mínimo e máximo com diferença entre eles não maior do que quatro vezes (...). Uma atividade policial pautada pela legalidade, transparência, eficiência e prática dos valores democráticos deve ser símbolo da polícia cidadã” (Folha de São Paulo, 27.07.99, opinião 1-3)".