O modelo ideal de Polícia (I):

Herman Goldstein,  professor da Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin (EUA),  um dos maiores especialistas em polícia dos Estados Unidos e autor de vários livros e que já assessorou as polícias de Chicago (Illinois) e Portland (Maine),  consultado sobre como deve ser a polícia no Brasil,  prestou as seguintes informações:

“(...) O professor defende uma polícia controlada pela sociedade, com ênfase na prevenção e no respeito aos direitos humanos. Para Goldstein, o policial é como um médico: ‘Ele não deve administrar remédios sem saber qual é a doença’ (...). O importante é que haja um reconhecimento nacional de que, ao olhar para a polícia, o que se vê é um reflexo da qualidade da sociedade. E o oposto: a qualidade da sociedade, em especial no que diz respeito aos valores democráticos, depende em grande medida da polícia. Se a qualidade da sociedade depende da polícia, é preciso garantir ao policial um padrão de vida razoável (...).  Além disso, nos EUA, as oportunidades de crescimento na carreira são claramente colocadas. Um policial competente pode aspirar aos cargos mais altos da polícia. Por fim, há uma tendência de redução dos níveis hierárquicos porque há a percepção de que se gasta  muito dinheiro com supervisores em vez de se investir nos policiais que estão nas ruas (...). Internacionalmente, se falamos de democracias, há forte reação contra entregar qualquer tipo de responsabilidade policial a militares, Em termos de eficiência, é melhor ter uma polícia, com todas as funções integradas (...). Para desenhar um modelo de polícia, é preciso estudar cuidadosamente a cultura do país, sua estrutura política e social. Na Inglaterra, há um número relativamente reduzido de departamentos de polícia regionais, controlados em certa medida por um órgão central. Mas é um sistema de difícil  aplicação num país de grandes dimensões e bastante diverso. Acho que cada Estado brasileiro deveria estabelecer seu padrão claramenteUm padrão nacional único tenderia a nivelar  por baixoOs Estados mais bem-sucedidos serviriam de exemplo. Nos EUA, temos milhares de departamentos, que são responsáveis pela segurança das comunidades locais. Valorizamos muito o controle da polícia pela sociedade (...). A polícia não pode fazer seu trabalho sozinha. Precisa construir uma relação com os cidadãos de maneira que eles a ajudem a identificar problemas. Para tanto, o policial precisa ser respeitado, o que só acontece se ele for bem treinado, comprometido com seu trabalho íntegro e avesso à corrupção. A polícia deve fazer o menor uso da força possível. Seu sucesso está no relacionamento com a comunidade (...). O crime precisa ser combatido de maneira inteligente. Se está havendo muitos assaltos numa região, não basta reagir quando há uma ocorrência. É preciso analisar o que acontece e buscar soluções criativas. É útil comparar o trabalho do policial com o do médico. Nós não administramos remédios sem sabermos antes que doenças vamos encontrar. A polícia deve lidar com os crimes de forma clínica (...). Voltamos à necessidade de um policial qualificado. Além disso, as pessoas no topo da organização têm de abraçar esses valores e defendê-los diariamente. Os policiais que cometerem abusos devem ser expulsos”  (Folha de São Paulo, domingo, 3 de agosto de 1997, p. I.13).

Modelo Ideal de Polícia (II):

Benedito Domingos Mariano, sociólogo e ex-Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo (Governo Mário Covas), também atuou junto a Prefeitura da Capital daquele Estado e no Ministério da Justiça (Governo Fernando Henrique Cardoso), também se manifestou sobre o assunto. No que diz respeito à mudanças estruturais nas estruturas policiais, Benedito Domingos Mariano – Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, teceu as seguintes considerações: 

“(...) Outro caminho, mais difícil, é iniciar amplas mudanças pressupondo que a maioria dos policiais é vocacionada e idealista; a estrutura é que é arcaica. Corrupção, ineficiência e violência são efeitos dela; resistir a isso é uma tentativa demagógica de tapar o sol com a peneira. Vejamos alguns dados. 1) Em menos de oito anos, a PM paulista foi responsável pela morte de 5.400 civis, e o número de policiais que se suicidaram é maior que o dos que morreram em confronto com marginais. 2) Morreram nos chamados ‘bicos’ três vezes mais policiais do que os mortos em serviço. 3) A diferença entre o menor e o maior salário na polícia é de dez vezes, na maioria dos Estados. 4)  Em São Paulo, cerca de 30 mil presos sobrevivem em condições subumanas, sob a responsabilidade  da Polícia Civil, numa situação que já vem de décadas. 5) A direção da Polícia Civil,  devido a uma famigerada aposentadoria compulsória aos 70 anos, não se altera com a rapidez necessária. 6) As policiais misturam atribuições. A PM tem um grande setor de investigação (P-2), e a Polícia Civil, um grande setor de Polícia preventiva e ostensiva (GOE e GARRA). 7) A Lei Orgânica da Polícia Civil traz mecanismos frágeis de punição, e o regulamento disciplinar da PM pune mais transgressões nos quartéis que atos irregulares nas ruas (...)” (Folha de São Paulo, Quarta-feira, 5 de agosto de 1998 – Opinião – I-3).

O modelo ideal de Polícia (III):

 “Dicotomia estrutural e violência policial"

O debate sobre modificações das polícias no Brasil foi motivado muito mais pelos episódios que chocaram a opinião pública do que pela real vontade política de mudar regras e estruturas. Governadores – até aqueles de partidos de esquerda, como Cristovam Buarque – foram a público dizer que os casos graves envolvendo policiais militares eram isolados (...). A polícia  da democracia será construída na formação para a cidadania, na fiscalização e na apuração rigorosa de delitos cometidos por agentes do Estado, mas sobretudo nas mudanças estruturais. A sonhada polícia única de caráter civil está longe  da agenda política do governo federal e do Congresso. A proposta enviada pelo governador Mário Covas ao presidente Fernando Henrique Cardoso, que unifica as funções de polícia (Judiciária, investigativa, preventiva e ostensiva), não foi sequer discutida profundamente na comissão criada no Ministério da Justiça para prioritariamente avaliá-la. O que propôs o governo federal foi enviar ao Congresso a desconstitucionalização do artigo 144, passando para os Estados a responsabilidade de reestruturar as polícias estaduais. Nos estados do Norte e Nordeste do país, as Polícias Militares têm efetivos quatro ou cinco vezes maiores que os da Polícia Civil; no Sudeste, no mínimo, o dobro. Sabedores do lobby das Polícias Militares, qual polícia as Assembléias Legislativas iriam priorizar? É bem possível que as Polícias Civis dos Estados percam funções e as Polícias Militares, além do policiamento ostensivo e preventivo, façam  também polícia judiciária e investigativa, como já acontece em determinadas localidades de vários Estados. Se a desconstitucionalização das polícias passar no Congresso, as mudanças podem se dar na contramão das exigências da sociedade civil e da perspectiva da comunidade internacional. O que o governo federal, os estaduais e o Congresso têm que definir é se querem ou não quebrar uma dicotomia estrutural  existente nas Polícias Militares: uma função de natureza civil e uma estrutura de natureza militar (...)” (Folha de São Paulo, 24.09.97, opinião 1-3).   Noutro artigo, assim se manifestou: “Propostas para mudar a polícia – Um órgão de fiscalização autônomo e independente da atividade policial tem o dever de mostrar ao governo e, em particular, à sociedade que, além de encaminhar denúncias e acompanhá-las com rigor, também prioriza propor alternativas que visem, a curto e médio prazos, diminuir os atos irregulares e as deficiências estruturais que a Ouvidoria torna públicos. As principais propostas da Ouvidoria são: 1) Fortalecer, dar competência estadual e estudar a possibilidade  de criação de carreira própria para os órgãos corregedores das policiais, garantindo inamovibilidade e mandato para os corregedores. 2) Mudar o Regulamento Disciplinar da PM (...). Indenizar as vítimas de violência policial (...). 3) Disciplina permanente de direitos humanos nas Academias de Polícia. 4) “...descaracterizar 80% dos carros da Polícia Civil e fortalecer a investigação científica. 6) Estudar a possibilidade de diminuir o número de patentes da Polícia Militar, que hoje são 12, para, no máximo, seis, visando diminuir a distância entre oficiais e praças. 7) Não utilizar armas de fogo em reintegrações de posse, greves e outros eventos  com multidões. 8) Implementar o programa de saúde mental na PM (...). 9) “... criação de um único órgão de informação e inteligência, sob controle do Executivo (...), voltado exclusivamente  para o combate ao crime organizado e para prevenir e inibir a prática de delitos cometidos por agentes do Estado e subsidiar o planejamento estratégico da ação policial. 10) “... pagamento de horas extras, para evitar os bicos dos policiais...”. 11) Unificar progressivamente as academias e escolas e estabelecer convênios com universidades  para formação em determinados temas. 12) Criar mecanismos ágeis que garantam rapidez no julgamento de processos administrativos  e disciplinares sumários...”. 13) Estudar a possibilidade de diminuir a distância entre o maior e o menor salários dos policiais (hoje em torno de dez vezes), estabelecendo piso mínimo e máximo com diferença entre eles não maior do que quatro vezes (...). Uma atividade policial pautada pela legalidade, transparência, eficiência e prática dos valores democráticos deve ser símbolo da polícia cidadã” (Folha de São Paulo, 27.07.99, opinião 1-3).

Modelo Ideal de Polícia (III):

E coube a Benedito Mariano – Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo - um verdadeiro presente de Natal para quem procura viabilizar um projeto que pretende começar uma ruptura no sistema policial..., na essência parece que somos favoráveis a uma mesma coisa: É preciso mudar a nossa polícia e aproximá-la da sociedade civil..., evidente que respeitando a nossa história, os nossos valores, costumes... sem a simples importação de modelos...:

"O exemplo da polícia canadense

(...)

O Brasil, que tem uma tradição de polícia autoritária (oriunda, em grande parte, dos 400 anos de escravidão e dos períodos ditatoriais), precisa priorizar na agenda política o rompimento dessa herança perversa e a criação de um novo modelo. Sem isso, qualquer  programa de policiamento comunitário tende a ficar na superfície do problema da violência e de criminalidade.

Se temos 70% de pobres e são eles  que sofrem cotidianamente a violência policial (ao mesmo tempo em que são as principais vítimas dos efeitos da criminalidade), é com eles, os pobres, como sujeitos do processo que preferencialmente tem de ser forjado um modelo de polícia cidadã. Polícia comunitária é incompatível com militarização, elevada corrupção policial e impunidade. A reforma estrutural das polícias e uma nova formação, que estimule o policial a pensar comunitariamente, devem ser simultâneas aos programas de policiamento comunitário ou vir antes deles.

O Canadá é, pela quinta vez consecutiva, o melhor país do mundo em desenvolvimento humano. Isso também  é medido pelo perfil de sua polícia’.

(Folha de São Paulo, Sexta-feira, 25.12.98, opinião – 1-3)

“Inquisitorialidade e violência"

A recente eleição para a Prefeitura de São Paulo teve como um dos principais pontos de polarização entre os candidatos  a questão da segurança pública. Se um analista político estrangeiro chegasse à cidade poucos dias antes do pleito, certamente se assustaria: como a questão da segurança pode dominar os debates entre candidatos a prefeito, que, sobre o tema, pouco poderão fazer, visto que a competência administrativa para o policiamento preventivo e repressivo, salvo a competência  da Polícia Federal, foi constitucionalmente atribuída aos Estados-Membros?  Oportunismo político à parte, a realidade não pode ser deixada de lado. Segurança pública inclui-se dentre as maiores preocupações do cidadão. Não sem porquê. Dados colhidos pela Ouvidoria da Polícia de São Paulo como o Dipo (Departamento  de Inquérito e Polícia Judiciária), Secretaria de Segurança Pública e Ministério Público revelam que, no ano passado, foram registrados 523.396 boletins  de ocorrência sobre crimes cometidos na capital do Estado, 73% dos quais delitos de natureza patrimonial. Com base nesses boletins foram instaurados 84.519 inquéritos  policiais (cerca de 16% do total), sendo que o Ministério Público formalizou 25.301 denúncias com fundamento nesses inquéritos, dos quais 12.102 foram iniciados por autos de prisão em flagrante em que a atividade investigatória é praticamente inexistente. Diante dessa atroz realidade, qualquer reducionismo seria insensato. Porém, uma conclusão é inafastável: o aprimoramento do sistema judiciário penal, compreendendo polícia, Ministério Público e Judiciário, passa também pela extinção do inquérito policial. Instituto criado em 1871 pela reforma judiciária do Império, revelou-se, com os anos, um mecanismo em que os trâmites burocráticos sobrepujaram sua finalidade, a investigação, com indisfarçável prejuízo à eficiência punitiva e ao respeito aos direitos do cidadão. Com efeito, a existência de um procedimento burocrático, a ser desencadeado pela notícia de um crime, retira da polícia a carga de pressão da opinião pública pela simples divulgação da sua instauração.  A investigação espontânea e informal, a cargo da própria polícia e do Ministério Público, conjunta ou isoladamente, daria mais transparência aos índices de eficiência, mais agilidade às investigações  e maior responsabilidade na resposta à sociedade diante da criminalidade. Na fase do inquérito são constituídas, sem o crivo do contraditório, provas que vêm a ganhar caráter definitivo, como aquelas destinadas a certificar a existência material do crime. De igual modo, essa prova pré-constituída, na medida em que orienta toda prova judicial, atribui à polícia poder sem controle, pois sua elaboração não conta com a presença do Ministério Público e do advogado de defesa. Isso sem falar no indiciamento, que, mesmo sem implicar juízo de culpa definitiva, traz danos irreparáveis aos cidadãos, que terão contra si o preconceito estampado em folhas corridas, mesmo diante de eventual pronunciamento posterior de sua inocência. Essa desmedida capacidade de vulnerar o cidadão, à míngua de critérios  e sem controle imediato de legalidade e de eficiência, transforma o inquérito, por vezes, em uma fonte geradora de corrupção e violência, transformando suspeitos, vítimas e testemunhas em autênticos reféns dos maus policiais. Como a maioria dos policiais da chamada Polícia Investigativa e Judiciária é de idealistas e vocacionados para a função de agente do Estado do Setor de Segurança Pública, a extinção do instituto do inquérito policial irá fortalecer o trabalho primordial da Polícia Civil, que é a investigação. As instituições públicas compostas e dirigidas por seres humanos, sempre serão falhas e carentes de controle e evolução. Por isso mesmo, um instrumento ineficaz (como demonstram as estatísticas), que, ao tempo em que serve de apanágio para a impunidade, constitui o palco de grandes violações dos direitos humanos, não pode substituir em uma sociedade  que se pretende democrática e em evolução, pois, nas palavras de Montesquieu, ‘a pior tirania é a exercida à sombra da lei com aparência de justiça’” (Folha de São Paulo, Benedito Domingos Mariano, 41, sociólogo...; Vidal Serrano Jr. 34, é promotor de Justiça, professor de Direito Constitucional da PUC/SP..., 4.12.2000, p. A3).

O modelo ideal de Polícia (IV):

O encontro com o Senador Esperidião Amin – candidato ao governo do Estado - 1998:

No início do mês de fevereiro  de 1998, foi  marcado o encontro com o Senador Esperidião Amin, o que veio a ocorrer no dia dez, por volta de treze horas,  na Sede do PPB (atual PP), localizado na rua Arcipreste Paiva, no centro da Capital. No referido local, ao chegar encontramos o Deputado Gilmar Knaesel e o Delegado Jorge Xavier, ambos já me aguardando para o encontro que estava programado para logo em seguida.

Durante os minutos de espera na antessala do segundo andar da sede do partido (PPB), permanecemos aguardando bastante ansiosos pelo encontro com o virtual governador (ainda pretenso candidato). As dúvidas eram muitas, entretanto, havia  certeza de que estávamos fazendo o que era certo para aquele momento, mesmo porque de nada adiantaria desenvolver esforços em propostas e estudos que não dessem em nada,  manifestos que sequer sairiam do papel.

Em determinado momento, fomos informados por uma secretária que  estávamos autorizados a entrar no recinto onde se encontrava o Senador Amin. No local, bastante espaçoso e com uma mesa de reunião com vários lugares, inicialmente não deu para ficarmos muito a vontade porque o prefeito de Urussanga – Roberval Pilotto – que nos antecedeu havia permanecido sentado na ponta da mesa (e parece que foi proposital), ouvindo e participando da nossa conversa (a impressão que tive foi que ambos já estavam tratando de algum assunto, cuja conversa  não havia sido terminada. No entanto a nossa presença fez com que fôssemos recebidos no curso derradeiro dessa "trova a dois" que poderia terminar mais cedo ou mais tarde, dependendo do encaminhamento.

Knaesel fez as nossas apresentações (dispensável até porque todos nós já conhecíamos pessoalmente o Senador Amin. Nessa introdução  Knaesel de cara já se cometeu uma gafe, pois ao apresentar-me ao Senador Amin disse-lhe que eu era um velho filiado ao PPB (na verdade este autor nunca foi filiado ao PPB). O único partido que fui filiado (por descuido) era o PFL, em razão de minha inexperiente/ingênua candidatura à Câmara Federal no ano de 1986.

Feitas essas abstrações e voltando ao encontro, Jorge Xavier começou fazendo um relato de seu rompimento com Pacheco. Sua narrativa parece que obrigava a uma atenção forçada do Senador que – apesar da experiência política nessas circunstâncias, não escondia a sua ânsia por avançar para o próximo passo, ou seja, era como se dissesse:  ‘vamos ao que interessa”.  Enquanto transcorria a narrativa de Xavier, Amin que mais parecia um “glutão” domesticado saboreava algo que parecia ser iogurte natural com mel, acompanhado de fibras. Era o seu almoço, e ele parecia que se deliciava com aquilo,  liberava seus neurotransmissores. De um lado a ingestão da boa comida e do outro o jogo política que parece alimentar os espíritos, pude então concluir o porquê do seu excesso de peso (tá certo que era horário de almoço).

De vez enquanto dava uma olhada geral no ambiente, pois já conhecia a história de Xavier. Amin, mostrando-se atento a esses movimentos, me questionava, demonstrando uma percepção aguçada e também que a narrativa de Xavier parecia  ‘lânguida’ para o momento.

Em determinado ponto da conversa, Jorge lembrou nossa participação na proposta entregue à Ângela Amin durante o processo eleitoral de 1994, do qual Heitor Sché também havia participado diretamente, assessorando a candidata. Quanto a isso, Amin – procurando ficar na superfície - apenas se reportou dizendo que Sché havia sido um bom Secretário de Estado da Segurança Pública durante o seu governo (1982-1986). Retruquei que isso era verdade, porém, deixei claro que durante a sua gestão fiz oposição, considerando principalmente a minha participação sindical. Ainda, quando Xavier  se reportou às dificuldades que a Segurança Pública tinha enfrentado durante o Governo Paulo Afonso, Amin, de imediato, de maneira muito categórica fez questão de deixar registrado que a Titular da Pasta da SSP tratava-se de uma verdadeira... Bom,  talvez Sua Excelência  quisesse dizer que ela era uma ‘espertalhona’. Evidente que, principalmente,  por razões éticas preferimos não nos manifestar, em especial sobre essas ponderações, mesmo porque não era nosso objetivo atacar quem quer que fosse, ainda mais, em se tratando de uma policial civil (essa postura de Amin deixou claro que o mesmo estava sendo bem informado sobre a Segurança Pública e com informações acerca da vida dos policiais civis, com os tais dossiês..., bom pelo menos é o que aparentava).  E ficou um imenso vazio, ‘impreenchível’, parece que a falta de eco frustrou as expectativas de nosso interlocutor-mor. E fiquei a me perguntar: “Quem seria a figura útil dentro nossos pares? Haveria um Delegado-Informante-Mor?”

Retomado o prato principal, passou-se a discutir propostas para mudanças na área de Segurança Pública. Knaesel, atento e perspicaz,  interferiu pedindo para que eu me manifestasse sobre o assunto que norteou a nossa vinda até aquele local. Contudo, Jorge previamente designado como porta-voz do grupo, mediante a minha discrição e prudência, passou a discorrer sobre a nossa disposição em trabalhar em um plano de governo.  Amin deixou registrado que concordava com a unificação das polícias e que deveria ser constituído um colégio de Delegados e Oficiais Superiores com incumbência para dirigir todo o aparelho policial do Estado. A seguir, Amin perguntou como é que era no Rio Grande do Sul. Procurei responder que naquele Estado vizinho a Pasta é denominada Justiça e Segurança, estando todos os órgãos policiais, incluindo o Sistema Penitenciário e DETRAN. Falei  em síntese do caos no sistema penitenciário e da necessidade de agregar os estabelecimentos penais à Segurança Pública, aproveitando as estruturas e recursos humanos que possuem as duas polícias estaduais.

Mais a seguir, de maneira direta o Senador Amin dirigiu-se a minha pessoa pedindo que me reportesse sobre possíveis propostas com vistas a um projeto na área de segurança pública. Respondi-lhe prontamente que o próprio candidato já havia dado a solução e que tudo podia ser sintetizado em duas palavras: ‘sinergia’ e evitar a ‘diáspora’ no sistema de segurança pública. 

Amin, parece que compreendendo a resposta lacônica, de pronto declarou que não havia solicitado a qualquer outro grupo que fizesse um projeto para área de segurança pública, mas que estaria disposto a receber do grupo um projeto específico para o aparelho policial do Estado, com vistas ao seu futuro governo.

Nesse interregno já havia se juntado ao grupo o Deputado Lício Mauro da Silveira que (politicamente correto) permaneceu atento e em silêncio ouvindo quase toda a nossa conversa.

Acertada a entrega de uma proposta – sem se especificar nada acerca de seu conteúdo, fizemos questão de registrar que o Deputado Júlio Teixeira integrava o grupo e que por razões de força maior estava ausente.

Amim ainda queixou-se que nenhum Delegado  havia se lançado candidato pelo seu Partido: o PPB.

Saímos da sala, deixando para trás Lício e Tiscoski com Amin. E já na saída do Diretório, do lado de fora, Roberval Pilotto veio até nós (Knaesel, Jorge e eu) que fazíamos um animado balanço do encontro e aproveita para produzir um quase sussurra:

(...)

-  ... Foi bom, foi bom, o homem gostou, ficou impressionado, vocês só têm que ter um pouco de calma, pelo que vi ele ficou bastante satisfeito com a proposta.

(...)

Pensei comigo: "O que quê é isso 'Roberval Taylor'?"

E fomos embora, eu mais dando a impressão que estava com uma pulga atrás da orelha, enquanto que Jorge mais animado. E, também, restou aquela a imagem da saída com  Knaesel, mais à vontade, radiante, efusivo, participante, solícito, companheiro, amigão, enfim, deixando transparecer que a coisa estava indo muito bem(?!?!).

No carro, de carona até à Trompowiski, centro de Florianópolis, Jorge se mantendo enterrado no seu enfeitado terno, com aquele seu tique piscando os olhos continuamente e com sua voz meio grave entoando frases cadenciadas, mantinha uma postura bem característica daqueles momentos pós "ensaios senatorias" que mais parecia "pavonear", magnânimo, formal, com gestos pausados, enquanto eu procurava refletir todo o seu "alter ego", porém, para guardar bem as imagens, insistia sempre em ficar com um pé atrás e a duvidar, e questionar o filme que havia se desenhado, contudo, deixando uma porta aberta para o otimismo que apaixona e também nos cega, até para não delatar algum resquício de chiste.

No meu íntimo, já refrigerado, me perguntava: "Esperidião Amim estaria à altura de protagonizar/implementar no seu futuro governo algum "modelo ideal de polícia“ dentro da Segurança Pública, começando uma revolução pelo nosso Estado?  Também tínhamos que lidar com contingências representadas pelos Deputado-Delegado Júlio Teixeira e Gilmar Knaesel?

E só o tempo seria capaz de mostrar a verdade e quais caminhos serão trilhados...

 

O modelo ideal de Polícia (V):

Deputado-Delegado Júlio Teixeira tem conhecimento do nosso encontro com o Senador Amin:

Eu já tínhamos acertado com Júlio ainda no final de 1997 que seria marcado um encontro com o Senador Amin para discutirmos uma prévia do nosso "Projeto". Ocorre que com o recesso da AL,  Júlio Teixeira simplesmente havia desaparecido. O seu celular não atendia e o pessoal de seu Gabinete na Assembleia Legislativa não sabia (pelo menos era o que diziam) como localizá-lo. Pensei comigo: "Onde estaria Julio naqueles momentos tão decisivos?"

Foi por isso que o encontro com Amin não contou com a presença de nosso Delegado- parlamentar. Entretanto, tão logo a AL voltou a funcionar, ainda, no início do mês de março procurei Júlio na Alesc e participei a ele a ideia do nosso "Projeto", conforme já vínhamos conversando desde desde o ano passado e sobre o que foi tratado no encontro com o Senador Amin. Fiz ver a ele que o principal porta-voz do "Plano" seria ele em razão, principalmente, da sua condição de Delegado e representante dos interesses policiais civis no Poder Legislativo. Esse encontro veio a ocorrer na sede da liderança do PFL (Gabinete do Deputado Pedro Bittencourt), tendo Júlio imediatamente se colocado a disposição para participar do ‘projeto’, inclusive, registrando que já havia conversado com Esperidião Amin acerca da sua participação no nosso projeto "Segurança Pública" no futuro governo. (na verdade a postura de Júlio no episódio das letras, pedindo a exclusão de dois colegas do partido – Ciro Rosa e Agostini - que votaram a favor de Paulo Afonso, além do que a sua intransigência em condenar a postura do Chefe do Poder Executivo, resultou em destaque ao seu trabalho de parlamentar na Alesc e em aumento da credibilidade junto às lideranças partidárias (leia-se, o binômio: Amin e Kleinubing). Em razão disso, era certo que Júlio Teixeira gozava de grande prestígio junto a esses dois parlamentares/Senadores Catarinenses.

Júlio chegou a comentar que Heitor Sché e o Cel. Sidney Pacheco   estavam anunciando publicamente que caso o Senador Amin viesse a ser eleito um deles viria ser escolhido para ocupar o cargo de Secretário de Segurança Pública. Fez questão de frisar que isso era uma inverdade e que Amin já estava muito preocupado confidenciando aos mais próxi9mos que não tinha assumido compromisso com ninguém, mesmo porque se assim fosse iria faltar cargo para tanta gente.

Outro fato que procurei dar relevo a Júlio Teixeira foi relativo ao posicionamento da Federação Catarinense dos Policiais Civis (depois transformada em Sintrasp/1998), pois conforme relatei na época seria fundamental que tivesse o apoio sincero das lideranças dessa entidade e que a mesma se engajasse na sua campanha a reeleição à Alesc. Júlio fez questão de registrar que as conversações já estavam bastante adiantadas nesse sentido.

O ‘Plano’: Redação final:

Antes de passarmos à redação final do nosso "projeto", ainda no mês de março/98 entregamos uma minuta da proposta para Júlio Teixeira. Ao ler a minuta na nossa presença (em seu gabinete/Alesc), como já tinha conhecimento geral do que estávamos defendendo, o nosso parlamentar - numa leitura dinâmica - foi concordando com tudo. Um dos pontos que lhe chamou a atenção foi a questão da reestruturação das carreiras. Segundo seu entendimento e conforme havia postulação da direção da Federação Catarinense dos Policiais Civis, o ingresso nas carreiras policiais civis deveria exigir habilitação em curso  de terceiro grau. A proposta que apresentamos foi intermediária, ou seja, o ingresso deveria exigir, no mínimo, que o candidato estivesse cursando o segundo ano de curso de terceiro grau, cujo período de duração não poderia ser inferior a quatro anos.

Ao assimilar a ideia Júlio me cumprimentou e disse que a opção por uma proposta intermediária se constituía uma grande saída e que tinha o seu total apoio. Fizemos ver a ele que países de primeiro mundo como Estados Unidos era assim e que exigir nível de terceiro grau no nosso caso ainda era prematuro, pois muitos policiais civis sequer ainda não possuíam o segundo grau.

OFICIALIZAÇÃO DO PROJETO: Pacto do quatrilho:

No mês de abril de 1998,  após alguns contatos prévios, Xavier concordou com a proposta apresentada e, a partir daí, passamos para o passo seguinte que foi marcar a data para assinatura da proposta, cuja aprovação da redação final passaria pela assinatura dos dois parlamentares,  de Xavier e deste autor.  (Quando apresentei a proposta de criação da Procuradoria Geral de Polícia para Xavier, este mostrou-se bastante surpreso com a magnitude das propostas. Diante da sua primeira redação, aconselhei que lesse e relesse várias vezes o ‘Plano’ e que a partir daí passaria a assimilar melhor as mudanças propostas. Dito e feito, Xavier na medida que foi se aprofundando nas propostas fez sugestões para o enriquecimento de alguns pontos, pediu esclarecimentos sobre outros que não havia assimilado).

As firmas:

O jantar veio a se realizar no restaurante Candeias de  Barreiros (o mais próximo do Trevo da BR-101). Dele participaram os quatro subscritores da proposta, sendo que após reiterar-se a apresentação e esclarecimentos das propostas, Júlio e Knaesel não tiveram dúvidas em assinar o “Plano” e a considerar que esse certamente teria o integral apoio de Amin, pois significava algo de novo e que possibilitaria uma revolução em termos de integração do aparelho policial estadual, a partir de um comando único, respeitando-se a história das instituições e sem comprometer princípios e valores institucionais.

Knaesel chegou a perguntar como ficaria – por exemplo – a situação em Pomerode, onde a Delegacia de Polícia não possui militares e quando se precisa do auxílio destes, os mesmos criam dificuldades para prestar colaboração à autoridade policial. Respondi-lhe que isso ocorre porque não há unicidade de comandos. O Tenente quando requisitado diz que tem que consultar seu superior e assim por diante. Bom, até o atendimento da ocorrência já se passaram horas, dias, semanas... sem que se tenha uma posição. Sabe-se que o atendimento de ocorrências e a realização de diligências requer resposta imediata. Com a criação das Procuradorias Regionais de Polícia e com a subordinação de todos os órgãos e unidades policiais da região a este novo órgão, passa haver uma unidade não só administrativa, como também operacional. Nesse caso, uma simples portaria do Procurador Regional de Polícia, determinando que os comandantes de Batalhões, Companhias e Pelotões, quando requisitados pela autoridade policial deverão prestar todo auxílio necessário já resolveria o problema. O parlamentar após ouvir essa explicação não teve dúvidas em elogiar a iniciativa e afirmar que doravante passaria ainda mais a defender o nosso “Plano”.


O modelode Polícia (VI):

A Síntese de um Projeto: Unificação dos comandos das Polícias Estaduais”:

PROPOSTA PARA PLANO DE GOVERNO

SENADOR ESPERIDIÃO AMIN

POLÍCIA ESTADUAL  - NOVO MILÊNIO

SÍNTESE  DA PROPOSTA: [1]          Fpolis,  03 de fevereiro de 1998

I - Embasamento teórico:

Polícia Estadual  - como  resultado das funções de polícia administrativa e judiciária -   passa a constituir-se  a partir de um comando único de autoridades que se constituem a magistratura policial do Estado. Dentro de uma escala  macro,  juntamente com o Sistema Prisional,  Trânsito e Defesa Civil,  deve articular-se de maneira orgânica com vistas a garantir a ordem pública e ser essencial à Justiça e à Cidadania.  O sucesso deste plano,   minimizando-se o comprometimento de valores históricos e institucionais -,  está no fato de que a direção dessa nova ‘Polícia’  passa a estar centrada num novo órgão administrado por titulares de cargos efetivos e isolados,  providos a partir de dois segmentos policiais já existentes: Civil e  Militar.  A “Polícia Estadual”,  passa a constituir-se, por meio da Procuradoria Geral de Polícia,  órgão mais técnico e científico,   infenso a ingerências políticas externas, caráter este último emblemático de uma Secretaria de Estado como tem sido por exemplo a da  Pasta da Segurança Pública. A  Polícia Estadual  passa a ser parte indelegávelindissociável e essencial ao Estado, sob a direção de Procuradores de Polícia com formação jurídica superior e atendidos outros requisitos a serem previstos em lei. Para se atingir esses fins, além da visão e do arrojo do futuro governante,  dever-se-á constituir condições dentro da superestrutura do ‘bloco histórico’ (Antonio Gramsci[2]),  com o fito de mitigar distâncias e dissipar antagonismos nas relações de poder na estrutura do  mesmo ‘bloco’ num sentido social amplificado:   Bom atendimento ao público;  melhoria da qualidade dos serviços policiais; eficácia na solução das ocorrências policiais;  qualificação do policial;  criação de serviços policiais especializados; proteção e defesa dos direitos de consumidor;  repressão aos crimes contra o meio ambiente;  “white color crime”;  políticas prisional e de  trânsito;  e etc.

II - Procuradoria Geral de Polícia:

a)                 Assim como “Justiça”   serve para designar  também  todos os órgãos que se relacionam  com a atividade jurisdicional,  o termo “Polícia”  deve ser considerado mais concretamente substância do Estado  no que diz  respeito à  ordem pública e  firmamento dessa mesma Justiça.

b)                 A exemplo das Procuradorias Gerais de Justiça e do Estado, a constituição da Procuradoria Geral de Polícia tem  como objetivo imediato a sua transformação num órgão central, a partir do Colégio de Procuradores,  cujos integrantes serão originários das atuais Polícias Civil e Militar. Os Procuradores de Polícia passam a constituir-se graduação especial e  isolada encimando as graduações de Delegado de Polícia de Quarta Entrância, e,  também, o Posto de Coronel da Polícia Militar. Esses cargos serão providos por meio de promoção por merecimento. Propõe-se, assim, a redução dos atuais 30 (trinta) cargos de Delegados Especiais para 15 (quinze),  com a nova denominação de Procurador de Polícia. Também, na Polícia Militar, cria-se acima do posto de Coronel 15 (quinze) cargos isolados e efetivos de Procurador de Polícia.  A nomeação dos novos titulares verificar-se-á com a vacância desses cargos,  por  meio de lista tríplice votada pelo colégio integrado por todos os Procuradores (de formação civil e militar). Fica assegurado a todos os Delegados Especiais inativos e Coronéis da Polícia Militar  reformados a ascensão a nova situação funcional.  

c)                  Propõe-se a extinção das atuais Pastas e respectivos órgãos e cargos das Secretarias de Segurança Pública/Justiça e Cidadania. As Academias de Polícia Militar e Civil , progressivamente,  deverão ser  transformadas em  Academia de Polícia do Estado, cujo ensino policial deverá ser centralizado e dirigido conforme a formação que se quer dar ao policial, considerando a natureza dos serviços que irá prestar e o cargo público em que será investido.

d)                 Criam-se as Procuradorias Regionais de Polícia (Florianópolis, Joinville, Blumenau, Criciúma, Lages, Joaçaba e Chapecó) e que serão responsáveis pela coordenação e supervisão de todos os órgãos policiais da região (Batalhões/unidades Militares, Delegacias Regionais de Polícia e outras unidades policiais,  órgãos de trânsito,  estabelecimentos prisionais e quaisquer outros órgãos policiais).  

e)                  O cargo de Procurador Geral de Polícia  terá mandato certo e será de escolha do Governo do Estado,  seguindo a ordem alternada, conforme a formação da autoridade. Os cargos de Procuradores Regionais de Polícia deverão ser  preenchidos pelo critério de antiguidade.   

 

III - O governo estadual - pioneiro na adoção  dessas  medidas - poderá aperfeiçoar esse sistema e contribuir para a maior integração policial,  precipuamente  no que diz  respeito ao trabalho policial conjunto.  A Procuradoria Geral de Polícia e a  forma de provimento dos cargos de procuradores trará benefícios imediatos no sentido de unificar seus comandos.

IV  - Para viabilização dessas propostas, urge um compromisso preliminar do futuro governante de respeito às conquistas dos policiais, tais como os Fundos Policiais e Prisional.,  sem embargo da Lei Orgânica da Procuradoria Geral de Polícia. Na esfera policial civil, especialmente, no que diz respeito a isonomia dos Delegados de Polícia (asseguradas em Lei e  por decisões do Poder Judiciário); reestruturação das carreiras policiais civis; escala vertical de vencimentos condizente com a dignidade  da  função policial.

Júlio Teixeira

Deputado Estadual

Gilmar Knaesel

Deputado Estadual             

Jorge César Xavier

Delegado de Polícia                 

Felipe Genovez

Delegado de Polícia

 

[1]           Na verdade esta síntese foi uma forma do próprio atender uma solicitação de Amin que pediu que a proposta fosse bastante sintética. Dessa maneira, essa introdução pretendeu tão somente propiciar um clima de admissibilidade por parte do candidato que uma vez mostrasse interesse nas mudanças poderia ler todo o ‘Plano’.  No encontro com Amin, este encerrou a reunião pedindo especialmente que a proposta fosse sintética.

[2]           No dia 8 de novembro de 1926, Antonio Gramsci (1891-1937), então secretário-geral do PCI (Partido Comunista Italiano), foi preso pelas forças de Mussolini (1926) e condenado a uma pena pouco maior que vinte anos.  No cárcere, entre 29 e 35, produziu uma das mais importantes obras de reflexão política do século. Além de ter reformulado as bases do pensamento político de esquerda, Gramsci foi um criativo  analista da imprensa, da literatura, do teatro, das instituições de ensino, dos intelectuais – aos quais atribuiu um papel fundamental na transformação da sociedade.  Foi o maior teórico político marxista do século 20. Gramsci propunha algo diverso em relação a movimentos revolucionários. Para ele, em países mais complexos socialmente a estratégia era outra. “Em vez da luta armada, da “guerra de movimento”, devíamos adotar a “guerra de posição”, a luta progressiva pela hegemonia etc” (Gramsci, Carlos Nelson Coutinho, Caderno MAIS, Folha de São Paulo, 21.11.99). Estabeleceu o conceito de hegemonia e sociedade civil (esta última como resultado da nova esfera do ser social capitalista percebida a partir da segunda metade do século 19 e que era constituída por partidos de massa, sindicatos, diferentes associações e tudo o mais que resultasse de uma crescente socialização da política: a sociedade civil que se constitui numa importante arena da luta de classes, pois, é nela  que as classes lutam  para conquistar hegemonia – direção política e cultural - , isto é, direção política, capacitando-se  para a conquista e o exercício do governo) (Carlos Nelson Coutinho, ibidem). Gramsci compreendeu o Estado próprio de regimes liberal-democráticos, como um ente bem mais complexo do que aquele de que tratavam Marx e Engels no “Manifesto Comunista de 1848” ou Lênin e os bolcheviques no conjunto de sua obra, isso porque ao se buscar hegemonia, buscar consenso, tentar legitimar-se, significa que o Estado deve deixar de ser um simples comitê da burguesia para levar em conta outros interesses que não restritos interesses da classe dominante (Carlos Nelson Coutinho, ibidem). Gramsci definiu o conceito de “revolução passiva” e que pode ser sintetizada na seguinte frase: Façamos a revolução antes que o povo a faça (Antonio Carlos – governador de Minas Gerais – Revolução de 1930). É a revolução das elites em contraposição aos de baixo. No seu “Cadernos do Cárcere”, “mostra que o determinismo econômico era uma doutrina  grosseira, comparável  à atitude do adolescente ‘satânico’, no período romântico, que via, numa bela mulher, apenas o invólucro de um esqueleto. Sem a instância ideológica, dizia Gramsci, a base econômica era inerte, desprovida de qualquer dinamismo histórico” (Folha de São Paulo, Caderno MAIS, 21.11.99).

O modelo de Polícia (VII):

A entrega oficial do projeto para o Senador Esperidião Amim (futuro governador do Estado):

A entrega do projeto estava prevista para final de abril de 1998, após a convenção do PFL que estava marcada para o dia 17 daquele mês, quando o partido iria decidir pela coligação com o PPB e apoio à candidatura do Senador Esperidião Amin para o governo do Estado (Júlio Teixeira apoiava o nome de Pedro Bittencourt para compor a chapa como vice-governador, entretanto, o nome de Paulo  Bauer corria com desenvoltura e acabou sendo o escolhido, com Jorge Bornhausen para o Senado).

No dia da entrega houve um desencontro total. Amin decidiu ir até a Assembleia Legislativa, com o objetivo específico de se encontrar com Júlio Teixeira em seu Gabinete. Desse encontro participou também o Deputado Gilmar Knaesel. Foram efetivadas tentativas no sentido de encontrar este autor e Jorge Xavier para participarem do encontro, o que não foi possível. A decisão de Amin de se encontrar com os dois parlamentares foi inesperada e pegou ambos de surpresa, sem que pudessem ter nos chamado. No dia seguinte, após tomar conhecimento do encontro que foi noticiado na imprensa, procurei Júlio Teixeira no seu Gabinete e Tereza – a mística musa e secretária do nosso Delegado-Parlamentar, já informado dos acontecimentos, tentou várias vezes contato comigo, porém, não teve sucesso porque o celular não atendia (o que era verdade porque justamente meu celular estava com defeito e ficava quase sempre  desligado).  Após conversar com Júlio sobre o resultado do encontro o mesmo me colocou a par das conversações com o Senador Amin. Pelo relato, logo que o candidato ao governo entrou no seu gabinete teria dito que "sabia das consequência de sua estada ali, que sabia muito bem dos reflexos futuros dessa sua visita e o que ela representaria...". Júlio também comentou que o Senador Amin reiterou que não havia confirmado ainda nome algum na Secretaria de Segurança Pública. Ao ler a síntese do “Plano” teria feito uma observação ao chegar na citação do Gramsci: "É profundo" e Júlio teria dito:  "isso é coisa do Felipe". Segundo Júlio o Senador Esperidião Amin - que se fazia acompanhar  por um secretário - solicitou que o material fosse encaminhado para seu grupo de trabalho e incluído no seu Plano de Governo. No mês de junho recebi uma correspondência do próprio Amin onde o parlamentar agradecia a colaboração e confirmava parte dos relatos do Deputado-Delegado Júlio Teixeira:

SENADO FEDERAL

Gabinete do Senador ESPERIDIÃO AMIN

Florianópolis, 25 de junho de 1998

Ofício SEA Nº 351/98

Ao Senhor*

FELIPE GENOVEZ

Delegado de Polícia Especial

Nesta Capital

Prezado Delegado Felipe,  Prezado Felipe** 

Quero registrar o recebimento da proposta para inclusão no Plano de Governo, contendo um conjunto de sugestões para a área da segurança, especialmente na sua abrangência estrutural.

Ao agradecer a valiosa contribuição informo  que determinei à minha Assessoria a melhor atenção na análise do projeto e a efetiva consideração na elaboração do Plano de Governo.

Aproveito a oportunidade para renovar expressões de consideração e estima.

Cordialmente,

Esperidião Amin

Senador ***

*Também receberam um ofício com idêntico teor o Deputado Júlio Teixeira e o Jorge Xavier, conforme pude verificar pessoalmente.

** Meu nome foi escrita a mão pelo próprio Senador (já nos conhecíamos da época do Senado, isso pós Constituinte de 1988, quando costumava viajar à Brasília para tratar de assuntos de interesse sindical da Polícia Civil/SC/BR).

 *** Consta a assinatura de próprio punho.

Também, procuramos Gilmar Knaesel para ouvir a sua versão, tendo o parlamentar dito que participou somente do primeiro momento do encontro com o Senador Amin no gabinete do Deputado Júlio Teixeira, e como se tratava de assunto afeto à Segurança Pública, deixou aquele local para que ambos pudessem conversar mais à vontade.

A circular noticiando a entrega:

Júlio Teixeira fez circular em toda o âmbito da Polícia Civil um Informativo de seu gabinete, reproduzindo os artigos publicados em jornais e que tratavam sobre a entrega do ‘Plano’, exibindo fotos da visita especial de Amin com Júlio recebendo o material e que passou a reproduzir:

Jornal "O Estado":

‘Amin visita Júlio Teixeira e recebe o Projeto da Segurança Pública

Projeto busca reestruturar polícias de SC

O Deputado Júlio Teixeira (PFL) entregou no início desta semana um projeto inédito que remodela toda a estrutura  da Segurança Pública ao senador Esperidião Amin (PPB), pré-candidato ao Governo de Santa Catarina, com a finalidade que seja incluso no programa de governo da aliança entre os dois partidos. Amin fez questão de ir ao gabinete do parlamentar para conhecer a proposta que considerou muito boa. Segundo Júlio Teixeira, esta é a primeira vez eu um projeto no setor está inteiramente direcionado para a sociedade. Ele elimina privilégios e abre a segurança pública para a população,  alterando sua estrutura. Júlio propõe a unificação dos comandos no documento. Além disso, coloca a necessidade de criação de seis procuradorias regionais de polícia – elas funcionariam como míni Secretarias de Segurança Pública, dotadas de DEIC, Polícia Técnica, entre outros. Na capital ficaria um colégio de procuradores. Amin recebeu a proposta positivamente e teve em suas mãos todo um retrospecto do que foi a Segurança  Pública desde o império até os dias atuais. A proposta elimina as castas e cria aos servidores a possibilidade de ascensão de carreira. ‘Quero uma polícia técnico-científica. Todos terão nível superior com especialização. Nós temos condições de dotar os servidores de cursos, através da Acadepol (Polícia Civil) e da Academia de Polícia Militar. A Polícia Civil seria mais voltada para a investigação criminal enquanto a militar teria treinamento específico para executar o trabalho preventivo e ostensivo e prestaria  serviços à comunidade. As polícias civil e militar seriam estadualizadas, com algum segmento uniformizado e trabalhariam sob comando único que seria o colégio de procuradores. Na base os trabalhos seriam realizados em conjunto. Batalhões e delegacias seriam comandados pelas procuradorias regionais. Parecido com o que acontece  com o Ministério Público. ‘Não é nenhum sonho. Temos o Fundo de Reaparelhamento da Polícia Civil e PM para criar a estrutura necessárias. Hoje este fundo tem uma única destinação, às construções e compra de viaturas’, explica o deputado pefelista, autor do projeto. Agora, o senador Esperidião Amin está fazendo um cruzamento de dados com um projeto que dispõe sobre a Segurança Pública que tramita no Congresso Nacional. Ele está buscando integrar os dois projetos. As ideias colocadas devem fazer parte do plano de governo do candidato da aliança para as próximas eleições”.  ( ‘O Estado’, 11 de junho de 1998 – Quinta-feira).

Diário Catarinense: (Coluna do Paulo Alceu)

Programa:

“Foi entregue ao senador Espiridião Amin (PPB) pelo deputado Júlio Teixeira (PFL) um projeto destinado à segurança pública. Se aplicado, garante o deputado, vai revolucionar o sistema.

O primeiro passo será unificar os Poderes. Além disso a intenção é criar secretarias regionais. Seis ao todo. Seriam polos de segurança ao cidadão. Poderá fazer parte do programa de governo do PPB/PFL”  (Diário Catarinense, Sábado, 13 de junho de 1998).

Constituição de grupos de trabalho para elaborar Plano Geral do Governo E. Amin:

No mês de julho/1998 foi marcado o primeiro encontro dos partidos que formam a união "MAIS  SANTA CATARINA" no Hotel Floph, localizado no centro da Capital. Naquela terça-feira de manhã havia estado no Gabinete do Deputado-Delegado Júlio Teixeira na Assembleia Legislativa conversando mais uma vez acerca do nosso "Plano" e para saber se já havia algum retorno. Nada de importante até ali foi acrescentado, apenas o intento por uma resposta de Amin. Júlio Teixeira fez questão de registrar que a partir de outubro, após o resultado do pleito,  os partidos de oposição aprovariam as reformas de Amin, evitando desgastes para o futuro governo e aproveitando a maioria que tinha naquela Casa. Achei nebulosa essa ponderação do nosso Parlamentar-Delegado, pois a iniciativa das leis que tratam sobre estrutura de governo, criação de cargos, órgãos e etc., dependiam de iniciativa do Executivo e Amin ainda não era governador, mas, enfim, preferi o silêncio e aguardar o andar da carruagem.

Por volta de 11:45 horas, quando estava caminhando em direção a um restaurante para almoçar no Bairro Pantanal fui surpreendido com uma ligação de Júlio Teixeira no Celular dizendo que meu nome havia sido indicado para representar o PFL no Grupo de Governo. Disse-me que o representante era para ser Rachadel em razão de seu irmão  ser  Vereador em Nova Trento e cabo eleitoral de Pedro Bittencourt (candidato a Deputado Federal), e porque que nas últimas eleições havia conseguido mais de quatrocentos votos para o mesmo. Júlio Teixeira pediu que Rachadel não ficasse fora também do processo. Argumentei para Júlio Teixeira que não haveria problema algum de trabalhar com Rachadel, apesar de representarmos grupos diferentes (segundo corria nos bastidores Redondo, Rachadel e Lipinski apoiavam o Cel Pacheco, até então candidato a Deputado Estadual, entretanto, este passou a apoiar Julio Teixeira quando o Tribunal de Contas inviabilizou sua candidatura. Segundo Julio na época Pacheco havia feito contato e proposto apoio ao seu nome pois "tinha cerca de dois mil votos para ele...). Apesar de contrariado com essa guinada, tive que aprender a conviver com isso e com a nova postura de Julio Teixeira, confirmando a minha ida ao encontro em razão da amizade, com a recomendação que fosse sozinho e depois desse um retorno.

Por volta de 20:00 horas subi as escadas do Hotel Floph  (Jorge Xavier havia viajado para Curitiba e São Paulo).  No segundo andar, logo no corredor avistei Newton Knabben – meu primo que também havia sido convidado para a reunião. Menos pior, pelo menos já tinha uma pessoa com quem poderia trocar umas ideias naquele mundo de políticos quase desconhecidos. “Niltinho” – como eu o chamava desde a nossa infância (Tubarão), representava a área de Transportes (funcionário do DETER) e também por ser casado com Nina Sá (secretária de E. Amin), irmã de Renato Sá, casado com Fernanda Bornhausen.

Ao entrar no recinto onde estava programado para ocorrer o evento já destaquei imediatamente a presença de Esperidião Amin e a sua volta vários convidados.  Percebi na frente o Coronel Backes. e próximo Wanderley Redondo que veio na minha direção para um encontro cordial de colegas. Procurei não demonstrar surpresa alguma, mesmo porque sabia da sua participação tanto no Partido – PPB (membro do diretório municipal), como também de seu apoio à candidatura de Júlio (se bem que Redondo pertencia ao grupo que estavam os Delegados Rachadel e Lipinsnki, ligados ao ex-Deputado Cel Sidney Pacheco). Nosso diálogo foi interrompido com a presença de Amin que logo que entrou no auditório deu a impressão que visualizou a minha presença e veio diretamente ao meu encontro, dando a nítida impressão que para  me cumprimentar com primazia (lembrei da história de Júlio Teixeira sobre a citação de "Granschi" no nosso projeto...). Amin pareceu que fazia questão de dar destaque a minha presença no meio de mais de uma centena de pessoas convidadas (entendi aquele gesto como votos de boa receptividade política entre os presentes, nada mais). Enquanto Amim me cumprimentava e me olhava daquele seu jeito sério, olhar penetrante, demorado, e externando convicção, deixando transparecer que queria contar um valioso aliado, o que mais me chamou a atenção foi o olhar de Redondo a um palmo de nós, acompanhando todos os movimentos com um olhar profundo, frio e com um misto de centurião e espartano, a seguir, virou as costas e emudecido foi se juntar do Cel. Baques que estava na primeira fila das cadeiras, enquanto Amim passou a vagar aleatoriamente cumprimentando os demais. Depois de serenados os acontecimentos, me pus a lembrar do telefonema que dias atrás Redondo havia me dado questionando o fato do Delegado Wilmar Domingues estar integrando nosso grupo e avisando que se tratava de um "arqui inimigo" dele... Depois lembrei de Sidney Pacheco que quando Secretário de Segurança Pública me confidenciou que queria trazer Redondo para sua administração porque visualizou nele um profissional altamente útil e preparado. O Cel Pacheco citou o episódio da rebelião no Presídio da Capital - década de oitenta -, em cuja ocasião Redondo que estava atuando naquele estabelecimento teria "parado" literalmente a imprensa, vaticinando que só iriam entrar no Presídio "se passassem por cima do seu cadáver". Aquele gesto teria marcado muito o Cel. Pacheco que certamente não só trouxe Redondo para a sua administração na Secretaria de Segurança/1991 (foi nomeado Gerente do Instituto de Identificação), como mais tarde "o colocou no circuito da campanha de Angela Amin ao governo do Estado/1994 e, certamente,  estava o trazendo de volta para trabalhar para os Amin(s) (opinião deste autor). Lembrei que na época não discordei de Pacheco, se bem que ele não estava pedindo a minha opinião, apenas quis comentar comigo esse fato e ver se eu tinha alguma coisa para dizer contra ou a favor..  

Iniciada a reunião, proferida as primeiras palavras pelo pessoal encarregado da direção dos trabalhos, Amin fez questão de registrar a importância da união dos partidos com vistas a sua candidatura  e pediu que cada um fizesse a sua apresentação para que todos se conhecessem melhor.

No correr da reunião, após a explicação da necessidade de formação de grupos de trabalhos,  também me juntei a Backes e Redondo, tendo acertado com eles para nos encontramos na semana seguinte, no Comando-Geral da Polícia Militar, a fim de dar início aos trabalhos.

Redondo, antes de se despedir, já parecendo mais descontraído, me confidenciou que estava esperando Rachadel que não apareceu na reunião e teria sido convidado como representante também do PPB. Comentei que estava ali por indicação de Júlio e representando o PFL.