HISTÓRIA DA NUTRIÇÃO ANIMAL 

Emanuel Isaque Cordeiro da Silva
Departamento de Zootecnia da UFRPE
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A história da NA têm relação direta com o desenvolvimento da sociedade. Durante o período Paleolítico o homem era nômade, isto é, ele não possuía um local fixo de habitação para viver, vivia de lugar em lugar para caçar animais que serviam tanto para alimento quanto para vestimenta. À medida em que se inicia o período Neolítico, o homem provoca uma revolução social mediante o domínio de técnicas de cultivo e de domesticação dos animais, além do domínio do fogo. Sendo assim, passou a se fixar em um único lugar, em que nesse lugar cultivava seus alimentos (grãos) e criava seus animais para seu consumo, garantindo, com isso, a sua sobrevivência. Por essa modificação dos hábitos de vida, o homem causou uma expressiva evolução da sociedade que pode ser percebida através dos registros históricos. A domesticação dos caninos ocorre primeiramente no Egito por volta de 10.000 a.C. Em 5.000 a.C. no Iraque, animais esculpidos em pedra e a árvore genealógica de alguns equinos foram descobertas. Por volta de 3.100 a.C. iniciou-se a prática da ordenha de vacas e, consequentemente, a inclusão do leite na alimentação humana. No Código de Hamurabi, datado de 1.900 a.C., há escritos sobre técnicas e práticas de pasto e pastejo, de comércio e de características das diferenças entre as inúmeras espécies de animais. Desse mesma época, o Código dos Hititas apresenta textos sobre a criação de bovinos, equinos, ovinos e sobre as medicinas humana e animal. Também há na Bíblia inúmeras referências aos animais que fazem da vida do homem. Nesse livro são descritos os cavalos de Salomão , a vedação do consumo de inúmeras espécies de animais como o camarão, coelho e porcos. Tais escritos eram relacionados com a sanidade pública do que com cunho religioso, já que diversas doenças eram transmitidas dos animais para os homens mediante o consumo da carne dos mesmos. Até a os dias de hoje, há uma imensa rejeição do consumo de carne suína em países de religião mulçumana ou judaica, por designarem a carne como “imunda” e “remosa”. Todavia, com a evolução das técnicas de criação e manejo, além do conhecimento do ciclo de vida dos agentes patológicos, o consumo desses animais não representa um risco para a saúde pública.

Entre 1.900 a.C., os egípcios observaram que os hábitos alimentares poderiam ser os responsáveis pelo surgimento de patogenias. A cegueira noturna, como exemplo, era prevenida mediante o consumo de carne crua de fígado, e indivíduos que consumiam esse fígado cru não manifestavam essa enfermidade carencial (carência de nutrientes). Com o desenvolvimento da ciência, descobriu-se que a cegueira noturna provém da deficiência de vitamina A. Por volta de 525 a.C. Heródoto observou que o crânio dos gregos era mais resistente que o crânio dos persas. Em seus escritos, ele concluiu que o motivo pelo qual o crânio dos gregos era mais forte seria pelo hábito dos gregos de passarem mais tempo trabalhando sob a luz do sol. Hoje, sabemos que a luz solar é um fator essencial na ativação da vitamina D, tanto para os animais domésticos como nos homens, sendo ela responsável por auxiliar na absorção de cálcio intestinal e melhorar a qualidade óssea dos seres vivos, por isso os escritos de Heródoto são válidos.

O médico italiano Sanctorius (1561-1636), media o seu peso e de todos os alimentos que ingeria e, posteriormente, pesava as suas fezes e a urina. Com isso, observou que o peso do material exonerado era menor do que o peso do material ingerido. Embora seus estudos não tivessem relevância na época, mais tarde fora considerado o “pai” dos estudos metabólicos. Hoje em dia, essa técnica de Sanctorius é utilizada para o estudo do metabolismo de nutrientes, bastante peremptório na área da nutrição animal. Hipócrates, o “pai” da medicina, postulou a existência de um nutriente universal na dieta dos homens e dos animais. Em meados de 1580, o médico italiano Aldrovani observou que pintos alimentados com casca de ovos apresentavam melhor desenvolvimento, uma vez que a casca do ovo é altamente rica em cálcio, um nutriente essencial para o desenvolvimento ósseo dos animais. Já o médico inglês William Harvey, em meados do século XVIII, demonstrou que o sangue circulava em nosso organismo por veias e artérias a partir do condicionamento natural do coração (bombeamento). Essa descoberta revolucionou a medicina da época.

No mesmo século o dióxido de carbono, o oxigênio, o hidrogênio e o nitrogênio foram descobertos. O padre e fisiologista italiano Spallazini (1729-1799), demonstrou que o suco gástrico era um fator relevante e decisivo na digestão dos alimentos. Num de seus experimentos, engoliu um sacos de pano que continham carne e pão e, ao retirá-los após dois dias, observou que a carne havia sido completamente digerida, por sua vez o pão estava quase intacto. Esses trabalhos serviram de alicerce para conceitos e para o desenvolvimento de experimentos de digestibilidade e degradabilidade aplicados em ruminantes.

Muitos dos avanços da nutrição animal foram obtidos no século XIX. Esse século é conhecido pela revolução dos médicos e pesquisadores que passaram a observar a necessidade de variar os tipos de alimentos em uma dieta. Esse conceito preliminar e essencial evoluiu, e nos dias atuais é possível compreender melhor a necessidade de uma alimentação balanceada e com distintos ingredientes que permita ao animal expressar todo seu potencial genético para o qual ele é apto. Em  1810, o aminoácido cistina foi descoberto. Em 1814, Michel Eugene demonstrou que os lipídios eram formados por ácido graxo e glicerol. Em 1816, François Magendie observou que cães alimentados com óleo, manteiga ou açúcar eram acometidos por enfermidades que provocava a morte desses animais. Todavia, quando eram alimentados somente com proteínas, sobreviviam. Logo, entende-se que uma alimentação baseada em carboidratos e lipídios não é saudável para os animais e nem para os homens, uma vez que os mesmos são fonte de energia e incapazes de fornecer nitrogênio. Porém, quando se recebe uma alimentação baseada em proteínas, o animal terá suas necessidades proteicas demandadas e o excesso dessa proteína será utilizada como fonte de energia, o que irá garantir a sua sobrevivência. No ano de 1834, o médico britânico, Prout publicou um livro ao qual descreve os alimentos como sendo compostos por sacarina, óleos e material albuminoso. Essa descoberta demonstrou que os alimentos são formados por carboidratos, lipídios e proteínas. Boussingault desenvolveu os primeiros trabalhos de balanço de nitrogênio com ruminantes e com equinos. Em 1838, Mulder introduziu a alcunha proteína, ao afirmar que a proteína era o principal elemento da nutrição dos animais e que era fornecida pelas plantas aos herbívoros. Em 1883, Kjedahl desenvolveu uma técnica para determinar o teor de proteína dos alimentos, técnica essa usada até hoje no mundo todo.

No século XX ocorreu uma universalização e a padronização de inúmeros conceitos utilizados por toda a população. Em 1909, Karl Thomas introduziu o conceito biológico de proteína. Em 1912, Casimir Funk isolou um elemento do farelo do arroz que era capaz de combater o beribéri, uma enfermidade comum na época das navegações e que era causada pela deficiência da vitamina B1 (tiamina). Um dos principais sintomas do beribéri nos animais é fraqueza causada pela deficiência da assimilação de carboidratos. Nós anos 1930, William Rose submeteu ratos a uma alimentação contendo 19 aminoácidos. Também nós anos 1930, Babcock, Humphrey e Hart avaliaram que uma dieta com um ou mais tipos de alimentos influenciava diretamente na produção e na produtividade de vacas leiteiras em fase de lactação. Nos anos 1940, surgiram os estudos primários acerca de aminoácidos, vitaminas e minerais aplicados à nutrição animal. Entre os anos 1962-1963, Baumgardt e Tiley e Terry desenvolveram uma técnica da digestibilidade in vitro. Em 1992, Baker e Han, consolidaram o conceito de proteína ideal ao usar dietas formuladas com aminoácidos digestíveis, além de elaborar uma relação das exigências de cada aminoácido em função do nível de lisina na dieta, mediante essas descobertas houve uma grande revolução sobre os conceitos de nutrição proteica na alimentação de monogástricos, principalmente.  


Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – DZ da UFRPE
Recife, 2019.

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