HETEROSSEXISMO E JACOBINISMO: EM DEFESA DA HONRA DE RAUL POMPEIA

 

DAIANE PEREIRA DA SILVA SOUZA

 

 

            Neste artigo pretende-se analisar a obra O Ateneu, de Raul Pompéia, sob as perspectivas contemporâneas de Alfredo Bosi, juntamente com  as críticas políticas de Olavo Bilac e Luís Murat sobre o heterossexismo manifestado por Raul Pompéia em O Ateneu, que fora publicado em folhetins no ano de 1888 no jornal Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro. Como precursor do Realismo/Naturalismo, abordando elementos de uma narrativa impressionista, Raul Pompéia privilegia a percepção da realidade na busca das emoções e sensações. Assim como outros intelectuais da época, Pompéia participou de movimentos sociais no decorrer do século XIX, aderindo ao jacobinismo no governo do Marechal Floriano Peixoto (1891-1894). Em suma, analisaremos nas narrativas e sua relação com processos subjetivos, observando a linguagem utilizada por outros escritores brasileiros. O presente estudo visa discutir os referenciais teóricos predominantes nas pesquisas voltadas à heterossexismo nas escolas. Em termos específicos; identificar características do heterossexismo referenciado no internato e nas discussões das escolas nos dias atuais no que diz respeito à sexualidade dos seus alunos; analisar as narrativas e sua relação com processos subjetivos, observando procedimentos de linguagem utilizados por outros escritores brasileiros. A investigação é de natureza bibliográfica, tendo por embasamento a teoria literária, a história da literatura, a literatura comparada e a literatura brasileira. Estudar o contexto histórico do final do século XIX, sobretudo o ideário filosófico e estético que esta em O Ateneu.

No romance O Ateneu, o narrador que se configura com o protagonista Sérgio, conta a realidade As experiências do protagonista giram em torno da figura do senhor Aristarco Argolo de Ramos, responsável pelo internato para meninos. Os fatos são narrados em primeira pessoa, numa que tem por temas predominantes o tédio e a solidão. O romance realista analisa a sociedade com olhar crítico retratando as características de seus personagens capitalistas, pertencentes à classe dominante.          

O personagem Sérgio vive em um internato escolar onde vivencia experiências que lhe marcará para toda a vida. A principal característica do Realismo é a configuração profunda dos personagens, o romance realista é documental, retratando o contexto de uma época. O Ateneu se configura em uma época em que a sociedade passava por transformações econômicas, políticas, sociais e culturais da segunda metade do século XIX, como simulacro dessa sociedade que serviria para dar uma nova interpretação da realidade, gerando críticas de variadas posturas ideologicas como a de Alfredo Bosi.

            BOSI (1994), na História Concisa da Literatura Brasileira, retrata, em poucas palavras, as características do romance.

Para ele, trata-se de uma obra afetada pela plasticidade nervosa com alguns traços expressionistas, destacando o lado grotesco da vida do adolescente. O diretor do Ateneu é a personificação do mal, o traumático que representava a vida no internato. As características negativas referentes ao internato, a discriminação, as injustiças, a corrupção, as amizade perigosas e as referencias psicológicas na descrição das personagens.

            O Ateneu mostra uma cena dolorosa logo no inicio, em que o pai deixa o filho na porta do Ateneu, é um símbolo concreto das agruras da realidade, o ingresso da criança ao mundo adulto, crítica amarga na caracterização do ambiente e das personagens.

            A imagem de Raul Pompéia no Naturalismo é marcada pela forte análise social a partir de grupos humanos marginalizados, a ciência é focalizada e valorização o coletivo é destacada. Observa-se a ousadia apresentando descrições minuciosas de atos sexuais, e características do homossexualismo. Observam-se vários pontos de coincidência entre o romance realista e o naturalista, no qual ambos partem e chegam a um mesmo consenso, só que percorrendo caminhos diferentes.  Os temas são parecidos, pois, na maioria das vezes, atacam a monarquia, o clero e a sociedade burguesa.

            Um momento marcante do traço naturalista, na obra, é o momento em que Sérgio recebe, em seu primeiro dia de aula, o conselho de seu colega de sala, Rebelo, de que não deveria aceitar a proteção de ninguém. Segundo o colega, a escola se dividia entre os meninos que, dotados de masculinidade; e os meninos protegidos, frágeis, que necessitavam de proteção visto como feminilidade.

            Uma das teses, de Mário de Andrade, é de que “o romancista se vinga”, contra o seu internamento no colégio Abílio.Tratando-se apenas de um romance autobiográfico, Mário de Andrade negligencia a importância do romance chegar a atacar Pompéia, chamando-o de ingênuo, questionado a sexualidade do autor. No entanto, Andrade relata que “O Ateneu representa um dos aspectos particulares mais altos do Naturalismo brasileiro” (ANDRADE apud IVO, 1963: 21).

            O estilo naturalista da obra se manifesta ao descrever as características de dona Ângela e na descrição da amizade que Sérgio tinha com Sanches, Bento e Egbert, abordando o homossexualismo:

 

A amizade de Bento Alves por mim, e a que nutri por ele, me faz pensar que, mesmo sem o caráter de abatimento que tanto indignava ao Rebelo, certa efeminação pode existir como um período de constituição moral. Estimei-o femininamente, porque era grande, forte, bravo; porque me podia valer; porque me respeitava. (POMPÉIA, Raul, 1995, pág. 85).

 

            A narrativa apresenta o momento forte sobre a sexualidade e, com relação ao estilo verbal, afirma que a obra representa exatamente os princípios estético-ideológicos do Naturalismo, numa concepção pessimista, interiorizada pelo mal. Nessa perspectiva, a obra vai de encontro a questões atuais. Em suma, considera-se indispensável à politização em torno do tema sobre o heterossexismo que ocorre nas instituições escolares, a partir de uma perspectiva social crítica e interdisciplinar.

            O caráter normatizador das instituições escolares da sexualidade situa-se o conceito de normalidade como uma decorrência do poder disciplinar, que surge no Ocidente a partir do final do século XVII, na necessidade de transformar o corpo em algo útil, não necessariamente voltado para as questões das instituições escolares, o tema abordado em sua obra sob normalização do comportamento sexual nas escolas, como, por exemplo, no caso da proibição da masturbação. (FOUCAULT 1988)

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) os códigos normativos relacionados ao gênero e a sexualidade deve ser tema nas escolas de nosso país. Discute-se sobre essa inclusão, pois alguns argumentam que essa prática não garante o respeito e a aceitação da diversidade de práticas e identidades sexuais. Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, língua portuguesa, os alunos precisam ser capazes de compreender a cidadania como participação social e políticas, por meio de atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças inseridas no meio da sociedade, respeitando o outro como se fosse ele mesmo. Ter uma postura crítica e responsável para enfrentar as situações sociais por meio do diálogo para resolver os conflitos e tomar decisões coletivas. Os mesmos devem conhecer a realidade social e cultural do Brasil, na qual construam uma noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao país. Valorizando a pluralidade do patrimônio sociocultural do Brasil e de outros povos, mantendo-se contra a discriminação sociais, culturais, religiosas e outras características individuais ou sociais. Necessita identificar seus elementos e as interações entre eles, contribuir ativamente para a melhoria do meio ambiente. Conhecer o próprio corpo e cuidar dele, possuir hábitos saudáveis, agindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à saúde coletiva, utilizando a linguagem como meio para produzir, expressar e comunicar suas ideias, interpretar e usufruir as produções culturais, em contextos públicos e privados, atendendo às diferentes intenções e situações de comunicação. Utilizar as informações e os recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos e resolver os problemas por meio de pensamentos lógicos selecionando procedimentos e os adequando.

            Existem muitas discussões sobre a necessidade de como ensinar sobre sexualidade na escola, deixando de expor a ideia de que o sexo é uma ameaça, a sexualidade deve deixar de ser apresentada como risco nas escolas, no qual o discurso gira em torno das doenças sexualmente transmissíveis ( DST/AIDS ) e de uma gravidez indesejada. Assim, compete à escola a função a responsabilidade de contribuir para garantir a todos os alunos o acesso ao exercício da cidadania, nas escolas é comum as ações heterossexistas, uma vez que nelas predominam a percepção da heterossexualidade, por encontramos casos em que alunos por apresentarem tendências não-heterossexuais quase sempre marginalizados na sala de aula.

            O interesse recente pelo tema heterossexismo nas escolas brasileiras traz a tona à escolha dos referenciais teóricos a serem utilizados para as análises e intervenções com vistas a reduzir sua intensidade e minimizar seus efeitos nas escolas e seus efeitos sobre suas vítimas, que incluem perda de autoestima e autoconfiança, dificuldade de concentração, fobia da escola, sentimentos de culpa e vergonha, depressão, ansiedade, medo de se relacionar, levando em alguns casos ao suicídio.

            As relações entre os garotos no internato corroboravam as valorações morais do período de Pompeia, no qual sexualidade e política associam-se neste período em que a sociedade brasileira discutia a viabilidade a heterossexualidade por meio do estabelecimento da homossexualidade como o princípio da diferença sexual e social. Ateneu auxilia a compreender o drama público que marcou os últimos anos da vida de Pompeia dentro na esfera política, polêmicas marcadas por ofensas e pela violência. A polêmica teve início em 1892 durante o governo de Floriano Peixoto, o jacobinismo é doença moral que teria Raul sentindo-se rejeitado pelas gazetas surgiu de questões secundárias em defesas da honra, de Pompéia, desvio da norma sexual, desonra pública, a vergonha como marca da abjeção sexual e defende-se das ameaças e xingamentos, a desonra o levou a um desgaste, a uma humilhação publica e ao suicídio.

 

 

 

 

 

 

ANDRADE, Mário de. Aspectos da literatura brasileira. São Paulo, Ed. Martins, 1967.

BOSI, A. O Ateneu, opacidade e destruição. In: _________. Céu, inferno: ensaios críticos literários e ideológicos. 2.ed. Rio de Janeiro: Editora 34, 2003.

BOSI, A. Histórica concisa da literatura brasileira. 39.ed. São Paulo: Cultrix, 1994.

BRASIL. Ministério da Educação; Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998 .

FOUCAULT, Michel (1988). História da Sexualidade I: A vontade de saber. RJ: Graal, 1988.

POMPÉIA, Raul. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 1995.

VAN DE VEN, P. (1996) Combating Heterosexism in Schools: Beyond Short Courses‟, in L. Laskey and C. Beavis (eds) Schooling and Sexualities, pp. 187–201. Deakin: Deakin Centre for Education and Change, Deakin University.