Jackson Pedro Leal

Bem pra lá da colina, no leito exuberantemente verdeservido por igapós, várzeas, savanas e campos alagados, que sob a cáustica do sol escaldante de verão e circundado por refúgios montanhosos,  atraia-se ver reluzente e ofuscante o nascer do sol, que vislumbrava-nos os olhos a reverenciar tamanha imponência sem igual do azul celeste lá no horizonte. Das matas selvagens densas e quase impenetráveis a humanos, dava-se conta da existência de uma velha aldeia nativa remanescentes dos “UIRAÇABAS”,formadas por malocas inalcançáveis nunca contatadas por seres civilizados,e por láfalava-se de uma tal “ÍNDIA GUAÇIRANA” morena canela, de lábios carnudos, cabelos longos escorridos bem pretinhos na cintura e olhos verdes lodo cintilantes. De sorriso afável e doce como favo de mel. Seu cheiro recendia longe como a essência rara de um perfume caro. Ela era tão ágil e vigorosa, como um guepardo a correr lancinante pelas planícies tropicais de várzeas e igapós.  A donzela Guaçirana se deleitava livre na relva como as borboletas sobrevoando, insones, nas copas de flor em flor e assim poder repousar o seu esplendoroso néctar. Andava incólume pelas matas inóspitas everdejantes onde se impunha intrépida a sua brava tribo guerreira... E de pernas grossas bem torneadas, às vezes, seminuas, à mostra ao ar livre no meio da mata uivante e hostil, mal podia sentir o simples contato da pele de seus lindos pezinhos com a trina pelugem que revestia a terra, depois de receber as primeiras gotas d'água deixadas pelas chuvas.Quando corria pelos campos silvestres, sob a cáustica dos raios solares refletindo sobre a sua pele dourada de pelinhos ouriçados, expunha o seu escultural corpinho de virgem à sombra de uma figueira tão fria quanto o orvalho cadente da madrugada. E quando dormia, pétalas insondáveis caíam como flocos de algodão das copas das árvores sobre os cabelos negros molhados da linda Guaçirana. Delirava sob o encanto e a meiguice da sinfonia magistral dos pássaros nativos... Muitas vezes, em brincadeiras ingênuas e infantis com a sua melhor amiguinha por entre os lírios do campo em clareiras abertas, não mediam esforços para o despretensioso desafio de subir pelos ramos das árvores e de lá das copas bem altas, se doarem a verdadeira cantarola enquanto ensaiavam se divertindo chamar pelo nome da virgem donzela;  já, por outro lado, os pássaros reverberavam os belos dotes afinados de canção silvestre, exalando o cheiro selvagem de seus perfumes naturais e tecendo a renda para matizar um puro algodão.

Ela, a doce Guaçirana, de olhos rutilantes e ouvidos aguçados, que nem rumores suspeitos poderiam quebrar o sincronismo com a mãe natureza a que o sol caprichava sem perturbar-se. Ela se investia como sempre numa verdadeira guerreira, como tal e corajosa intimidando até os maus espíritos das matas. Tal qual tece na memória os fios alvos de cabelos que um dia hão de se transformar assim como o branco das areias que beiram o mar; as vezes, nos olhos deixavam transluzir o azul das águas revoltas e perenes das mais recônditas profundezas do oceano.  Arcos, flechas e tacapes – armas beligerantes – cocais e penugens extraídos da fauna silvestre daquelas matas cobriam-lhe todo o corpo matizado como flocos de algodão. A bela Guaçirana tinha um olhar tão rápido, volátil, como num piscar de olhos e o mais sutil dos gestos já por vezes tolhido de um coraçãozinho tão virgem como era o da encantadora indiazinhaGuaçirana. De atitudes marcadas pela constante impetuosidade de seu herdado gênio de guerreira institivamente sempre pronta para seus inimigos e vencer. Assim quando impunha a desferir suas flechas certeiras, gotas de sangue cintilavam borbulhantes na face moribunda de seus oponentes.E, subitamente, no ímpeto de suas andanças embrenhada nas matas, se viu em certo momento cortejada por um formoso jovem guerreiro nunca visto por ali antes. De repente, teve a formosa indiazinha o inevitável e instintivo gesto de defesa típico de quem é  incivilizadamente adotado pela selva, repousando imediatamente a mão firme sobre a cruz do seu inseparável punhal; mas logo sem demora mudou de atitude subitamente por um discreto sorriso como de quem estava já completamente interessada no jovem rapaz a sua frente, estático e também irradiado pela tamanha beleza daquela índiazinha linda por natureza – uma verdadeira ninfeta selvagem e irresistivelmente sedutora, o que sem delonga aquele jovem e bravo nativo de matas virgens daqueles arredores, assim do nada esbouçou o que aprendera com sua velha mãe ainda criança, que a mulher é para ser tratada com carinho, ternura e muito amor...  Totalmente tomado por um sentimento que deixara visivelmente estampado a bel prazer em seu olhar de homem, ele ficara ali estático e medindo aquela indiazinha linda da cabeça aos pés.  Por sua vez, a morena virgem guerreira largou de si o arco e a uiraçaba, não hesitando mais a correr para os braços daquele intrépido homenzinho selvagem e guerreiro, arrependida do susto que causara ao seu belo cortejador.  As mãos ágeis que podiam ferir, logo também complacentemente podiam estancar o sangue que supostamente gotejaria do corpo dele. Depois ainda a imaginar, Guaçirana não demora e se livra da flecha imaginariamente assassina,oferecen-do o pedaço que sobrara com a ponta virada ao jovem valente e corajoso, que tinha num piscar de olhos a conquistado e que tanto a entusiasmou.

–– Venha comigo, menina arisca, e traga a flecha da paz!    ––disse o jovenzinho guerreiro.

––  Donde vieste a estas bandas, que testemunharam quão cortês e cativante és tu! ––  Admoestou  a sedutora índia Guaçirana.

––  Venho de muito longe, minha brava indiazinha, rainha das florestas.

––  Sou pra lá das terras de teus ancestrais dos UIRAÇABAS!!!!!

––  Sejabem vindo ó estrangeiro!   –– ao seio dos Uiraçabas, senhores das aldeias, eprincipalmente à maloca de MuahbbiNehquém, meu honrado pai.