Governo segue rumo à Esquina Paranoia Delirante

Como chegamos a esta situação surreal de conjuntura política e econômica? Esta é uma pergunta sem resposta para milhões de brasileiros que jamais imaginaram que poderiam viver sob um governo que flerta o tempo todo com pronunciamentos de perfil neofascista, envolvido com integrantes da milícia e sem nenhuma capacidade de governar um país de mais de 212 milhões de habitantes em plena pandemia.

Vivemos tempos difíceis, potencializado por uma conjuntura sanitária de pandemia que assusta até mesmo os mais otimistas; com exceção dos 25% da população, que diminui a cada pesquisa de opinião pública, ainda, seguidores do mito negacionista e representante das trevas.

As instituições democráticas, já muito desgastadas e corroídas, política e moralmente, do Estado brasileiro, em especial as dos poderes legislativo e judiciário, estão de joelhos e batendo cabeças sem saber o que fazer, para interromper o governo de um genocida sem nenhum projeto de país.

Esta situação política, de total desprezo pela democracia e o “Estado democrático de direito”, bases de um país democrático de fato, pela qual passamos hoje, não é fortuita, não aconteceu por acaso. Passamos, hoje, por esta situação caótica, exatamente porque, os poderes legislativo e judiciário que deveriam, por questão de ofício, defenderem o ordenamento jurídico do país, não o fizeram. Muito pelo contrário, os desrespeitaram de forma sistemática e absurda em relação a seus princípios jurídicos. Se acovardaram e se omitiram. Não respeitaram e muito menos, observaram o previsto na lei maior do país: nossa Constituição Federal de 1988 (CF88), que apesar de já desfigurada pelas mais de cem Emendas Constitucionais (EC) sofridas, ainda preserva a maioria de seus princípios e ideais humanitários.

O detonador principal desse estado pelo qual passamos hoje, foi acionado com o Golpe de Estado travestido de “impeachment” contra o governo da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, conspirado pela classe, econômica e política, dominante, representada por um movimento todo ele gestado com a cumplicidade dos partidos de direita, com apoio do fisiológico “Centrão”, do MDB com diversos quadros integrantes da base do governo petista, a começar pelo traidor Michel Temer, que ocupava o cargo de vice-presidente e que viria assumir o governo após o afastamento da presidenta. Contou ainda com a participação destacada do PSDB, que inconformado com mais uma derrota para o PT, afirmou publicamente que questionaria o resultado da eleição, mesmo após ter sido confirmada a legitimidade do pleito, pelo TSE - Tribunal Superior Eleitoral, a partir das conhecidas “pautas bombas” e pedidos de “impeachment” para desestabilizar o segundo governo Dilma.

Nenhum país passa incólume por um golpe de Estado, muito menos quando este Golpe é sorrateiro, banal e ilegítimo; porém “legitimado” de modo tão pobre de “materialidade jurídica” justa e correta, digna de um “Estado Democrático de Direito”. Estado este, que tem como fundamentos “a soberania”, “a cidadania”, “a dignidade da pessoa humana”, “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” e “o pluralismo político”, com destaque ainda, em seu parágrafo único, que “Todo o poder emana do povo”. O “Estado Democrático de Direito” é tão importante que é definido logo no artigo 1º de nossa CF88.

A eleição de 2018 deve ser vista como um laboratório de experimentos, por toda esquerda e centro-esquerda do país e, principalmente, pelo Partido dos Trabalhadores, que com sua política estratégica equivocada de conciliação de classes imaginou estar vacinado contra ataques de partidos mais letais que o vírus Covid-19. A população que se deixou contaminar pelos ataques de ódio exalados pela grande mídia capitalista, contra os governos de esquerda, por interesses comerciais e políticos para eleger seu candidato do PSDB, deveria aproveitar e fazer sua autocrítica a partir do caos, instalado no país, após a eleição de Bolsonaro, que com seu governo catastrófico para a maioria da população brasileira, levou o país para o precipício político, econômico e principalmente social, para milhões de trabalhadorxs brasileirxs.

A eleição de um político tão medíocre como Bolsonaro deverá servir para alertar uma parcela, não desprezível de nossa população, a ter mais cuidado, preocupação e melhores critérios, quando da escolha do presidente e dos deputados federais e estaduais, pois tanto o presidente quanto os governadores, não governam sozinhos, grande parte de seus programas e orçamentos financeiros exigem aprovação de seus respectivos parlamentos, o Congresso Federal (Câmara e Senado) para o Presidente da República e as Assembleias Legislativas Estaduais nos casos dos governadores.

Para agravar e aprofundar, toda uma conjuntura política e jurídica já muito deteriorada, a esquerda e centro-esquerda sofreram ainda um segundo Golpe com a prisão do ex-presidente Lula, a partir de um Movimento com a clara intenção de afastá-lo da corrida presidencial onde aparecia com mais de 40% das intenções de votos. Movimento, este, todo orquestrado pelo juiz de 1ª instância, Sérgio Moro, com contribuição especial do procurador do MPF, Deltan Dallagnol, viabilizado pela tosca e lunática Operação lava Jato, que se apegava em “indícios” para condenar o presidente Lula e outros políticos. Operação Força-tarefa que, hoje, está sendo totalmente desarticulada e desmoralizada por diversas instituições respeitáveis no meio jurídico e ferida de morte pelas decisões do dia 8 de março, onde o ministro Edson Fachin,  do STF - Supremo Tribunal Federal, anulou todas as condenações contra o presidente Lula, assim como a decisão do dia 23 de março, quando a segunda Turma do STF decidiu que o ex-juiz Sergio Moro atuou com parcialidade ao julgar o ex-presidente Lula na, hoje, moribunda Operação Lava Jato condenada a desaparecer dos jornais, assim como seus protagonistas oportunistas e canalhas estão condenados a desaparecer do cenário jurídico do país.

Sérgio Moro e Dallagnol, caso confirmado toda a orquestração jurídica para tirar Lula da disputa eleitoral, devem ser condenados a pagar por todos os prejuízos causados ao ex-presidente e ao país como um todo, pois esta operação causou grandes estragos à economia, à política, à saúde de milhares de brasileiros, à diversas empresas privadas, à Petrobras e centenas de diversas empresas que lhes prestavam serviços e, ainda colocou na situação de desemprego milhões de trabalhadorxs brasileirxs.

Não poderíamos esperar nada de ético de um servidor público que abandona uma carreira de juiz para ser Ministro da Justiça, de um governo medíocre e de cunho fascista que ajudou a eleger a partir de sua intervenção desastrosa em todo o processo eleitoral de 2018, que culminou com a eleição deste ser patético e despreparado para representar o povo brasileiro. Abandou a carreira de juiz para não ficar nem um ano e meio como ministro e levar um belo chute no traseiro de um ser tão desprezível como o presidente que ajudou a eleger.

Se não voltarmos ao ambiente de estabilidade política e econômica institucional, materializada na independência e harmonia entre os três poderes da União; o executivo, o legislativo e o judiciário; o país se transformará numa “esquina paranoia delirante”. Se, os que têm poder e competência legal para fazer, nada fizerem para chegar a um consenso nos próximos dois a três meses, no máximo, para restabelecer o ambiente político necessário para superar os desmandos e medidas totalmente fora de harmonia com o resto do mundo, em relação à crise sanitária pandêmica do Covid-19, a situação certamente fugirá totalmente do controle do já (des)governo atual.

“....

Nem sabatina
Nem farda
Blusa larga!
Os careta viram gelatina
 Hoje eu tô feliz regina

Mas
Hoje é sem stress
Coragem sansão
O tempo passa e a juba cresce
Mermão
Então faço minha prece
Mas tem que ter um som
 Sem tambor o santo não desce

Olha o groove

Esquinaparanóiadelirante
Meu templo é a música
Esquinaparanóiadelirante
Vivência das ruas
Esquinaparanóiadelirante
Meu templo é música
 Vivência das ruas”
(1)

 

É imprescindível, ao mesmo tempo de um combate eficaz da pandemia,  implementar políticas econômicas para garantir um nível mínimo adequado para a demanda agregada (consumo das famílias e dos Governo Federal e Estaduais), assim como dos gastos do governo com investimentos para impulsionar um crescimento maior do produto interno bruto (PIB), e da renda disponível das famílias para o consumo, ao proporcionar a retomada da recuperação de uma parcela dos empregos perdidos com a crise e a pandemia, que garanta a sobrevivência de mais de quarenta milhões de brasileirxs diretamente atingidxs em seus orçamentos por mais uma crise econômica cíclica potencializada por uma crise sanitária de dimensão pandêmica.

Sabemos que as crises capitalistas são cíclicas e que a duração dos intervalos entre esses ciclos veem se reduzido cada vez mais; sendo que desde os anos setenta sinaliza que o sistema capitalista já vem sofrendo, na verdade, uma crise estrutural do capital, cuja capacidade de extrair mais-valor a partir da exploração da força de trabalho assalariada perde cada vez mais potência para viabilizar os excedentes de produção necessários para gerar os lucros, a cada ano com margens menores, das empresas capitalistas; vitais à reprodução e acumulação de capitais, que é o grande fetiche e objetivo principal do sistema capitalista que a cada ano demonstra sua total e crescente incapacidade em resolver os principais problemas das populações excluídas do circuito, aqui simplificado, para reprodução e acumulação de capitais:

Capital-dinheiro => produção e circulação de mercadorias e capitais => criação de mais-valor a partir da exploração da força de trabalho assalariada => extração de excedentes de produção (mais-valor) => transformação do dinheiro em capital => acumulação e reprodução ampliada de capitais.

(*) Economista. Funcionário do Banco do Brasil aposentado e professor de cursos nas áreas de economia política; e finanças corporativas no Corecon RJ – Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.

(1) Trechos da música “Esquinaparanóiadelirante”. Compositor: Murica