Função Social da Posse: A posse como mecanismo de efetivação de Direitos Fundamentais[1]

Ana Alice Torres, Claudia Lobo, Thaynara Silva[2]

Viviane Brito [3]

Sumário: 1 Introdução; 2 Fundamentação Teórica; 2.1 Da Posse; 2.1.1 Da Função Social da Posse; 2.2 Dos direitos Fundamentais; 3 Discussão do Tema; 3.1 Função Social da Posse e Direitos Fundamentais; 3.1.1 Análise do Caso Concreto Julgado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais; 4 Considerações Finais; 5 Referências

RESUMO

A posse definida pelo Código Civil e sua função social não está explícita no ordenamento jurídico brasileiro, como ocorre com a propriedade, mas pode ser identificada a partir de princípios constitucionais, jurisprudência e a partir também das necessidades que surgem na sociedade e economia. O objetivo deste trabalho é discutir acerca do fato de que mesmo sem estar explícita na Constituição Federal, a posse exercendo de maneira plena sua função social, pode ser considerada um direito fundamental. A discussão será possível através da explanação do significado e significância etimológica da função social da posse e seus direitos fundamentais, fazendo análise das teorias de Savigny (é a teoria subjetiva, em que a posse possui corpus e animus domini) e Ihering (teoria objetivista, na qual a posse possui corpus e dentro dele está a intenção) acerca da importância e necessidade da posse, compreendendo esses conceitos e aplicações e caracterizando a correlação existente entre função social e direitos fundamentais.

Palavras-chave: Posse. Função social. Direitos fundamentais.

1 INTRODUÇÃO

O conceito de posse costuma ser muito polêmico, pois a doutrina ainda se encontra em desarmonia de definição para tal. Essa desarmonia reflete, inclusive, nos tribunais, que frequentemente criam confusão sobre o conceito de posse, bem como com seus efeitos, principalmente no Brasil que sempre foi marcado por lutas e conflitos possessórios e que ainda crescem diariamente advindos dos problemas sociais existentes como a miséria, a marginalização, a má distribuição das terras nas mãos de poucos, dentre outros. Este trabalho busca referenciar e nortear a posse no liame da função social, e entender se existe, de fato, função social na posse, uma vez que a Constituição Federal de 1988 elenca a função social apenas para a propriedade.

Neste passo, entende-se que a posse é a possibilidade fática do exercício de um dos poderes inerentes ao domínio (usar, gozar, dispor e reaver) e que sua presença traz consigo, além dos poderes inerentes ao domínio, mas o exercício de direitos basilares e fundamentais, constituindo assim sua importante função social. A posse é um instituto jurídico que vem satisfazer uma necessidade, que pode ser individual ou coletiva. O fundamento da função social da posse, por sua vez, revela uma expressão natural da necessidade da pessoa humana.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Da Posse

A doutrina brasileira é desarmonizada quando o assunto é posse. Essa falta de harmonia se encontra tanto na definição sobre a origem fática da posse, quanto em relação ao seu conceito. Quanto à origem, Maria Helena Diniz, (2014, p.45), nos mostra que “diversas versões são conhecidas; no entanto, podem ser sintetizadas em dois grupos representados pela teoria de Niebuhr, adotada por Savigny e pela teoria propugnada pelo jurista Ihering.” A primeira teoria defende que a posse se originou com a distribuição de terras conquistadas pelos romanos, já a segunda teoria sustenta que a posse surgiu como consequência do processo reivindicatório.

Entrementes, a posse, independentemente se sua origem fática, possui um significado também controverso na doutrinas, mas enquanto a corrente minoritária defende que a posse se trata de um fato, outra corrente aponta a posse como um direito, sendo esta última a que prevalece na doutrina. Para Miguel Reale, “o Direito é fundado em três subsistemas: dos fatos, dos valores e das normas. Sendo a posse um fato, e sendo o Direito também constituído por elementos fáticos, pode-se afirmar que a posse é um direito” (REALE apud TARTUCE; SIMÃO, 2011, p. 48).

Destarte, diversas são as teorias para justificar a importância e a necessidade da posse, entretanto, o entendimento vigente é muito marcado pelas teorias de Savigny e Ihering. Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2011) explicam que as duas realidades trazidas por essas teorias são muito reais, por isso cada autor segue e justifica a que plano permanece. Na teoria Subjetiva e Clássica de Savigny, a posse é constituída por: corpus e animus. O corpus seria o controle material da pessoa sobre a coisa, enquanto o animus seria a intenção do possuidor de exercer o direito como se proprietário fosse (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 36). Contudo, a maior contribuição da teoria de Savigny foi a projeção da autonomia à posse, que passa a ser tida como “uma situação fática merecedora de tutela, que decorre da necessidade de proteção à pessoa, manutenção da paz social e estabilização das relações jurídicas”, segundo Farias e Rosenvald (2011, p. 36). [...]