FRANCESCO, A. A. de. Et al. A expulsão de ribeirinhos em Belo Monte. In: MAGALHÃES, S. B; São Paulo: SBPC, 2017.p. 99-128.

A professora Ana Alves de Francesco possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo, mestrado em Antropologia Social pela Universidade de Campinas, os demais autores do trabalho; Alexandra Freitas, Clara Baitello e Denise da Silva Graça, são membros do Instituto Socioambiental (ISA), atuando em projetos de pesquisa acadêmica principalmente nos temas de Grandes Projetos na Amazônia, Povos Tradicionais, agroecologia.

A obra intitulada de A Expulsão de Ribeirinhos Em Belo   Monte, principalmente no capítulo 3: O deslocamento forçado de ribeirinhos em Belo Monte, é indicada principalmente para pesquisadores que desenvolvem pesquisas em Grandes Projetos na Amazônia, com ênfase no processo de desterritorialização advindos da implantação desses projetos estruturantes.

As autoras abrem o debate com uma resolução dos direitos Humanos, que caracteriza, o deslocamento forçado de povos, como transgressão aos direitos fundamentais do ser humano, inclusive resultante de desastres naturais, nucleares ou químicos, segundo o Centro de Estudos Da Universidade de Oxford, geralmente as populações afetadas por projetos de desenvolvimento, são realocadas no seu próprio país. Durante a década de 1990, cerca de 90 a 100 milhões de pessoas ao redor do mundo foram deslocados por esses empreendimentos, mediante a está problemática, foram criadas no mundo, inúmeras legislações para garantir os direitos de compensação a estes povos, como; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais do Ato Comissariado da ONU, no caso do Brasil, um Decreto Federal em tese garante os direitos.

A ênfase da pesquisa são populações tradicionais ribeirinhas e extrativistas a se deslocarem de seu local de origem, para dar lugar a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira no Pará. A metodologia que as autoras utilizaram foi em grande medida entrevistas semiestruturadas e com respostas abertas com os ribeirinhos afetados pela construção da barragem, que contemplava, como eles viviam antes da construção da barragem.

No caminho metodológico ficou comprovado no trabalho de campo que a maioria das famílias tinha o Termo de Autorização de Uso Sustentável e a carteira da colônia de pescadores de Altamira, mas ainda sim muitas famílias não possuíam documento algum, após as entrevistas e analise da coleta de dados, foram identificados dois tipos de deslocamentos forçados no Xingu, a remoção rural, que corresponde a das ilhas e beiradões e urbana que corresponde dos baixões e orla de Altamira.

Nas entrevistas realizadas, algumas violações dos direitos humanos foram relatadas pelos ribeirinhos, a exemplo de filhos e agregados que não foram incluídos no cadastro de reparação, a indenização não foi considerada justa pelas famílias, o deslocamento urbano levou as famílias para longe do rio, aumentando o custo de mobilidade de pescadores que moram próximos de seus locais de trabalho, 32% das famílias entrevistadas conseguiram comprar suas casas como o dinheiro das indenizações, no entanto, essas construções em sua grande maioria não foi concluída, em virtude da insuficiência de recursos. Atualmente 23% das famílias não tem moradia própria e vivem de forma precária com parentes e amigos de favor.

No processo de remanejamento muitas famílias foram dispersas para a zona rural da região, o que torna difícil o acesso para as cidades ao entorno, exatamente por não ter transporte público, além das condições inapropriadas para o cultivo da agricultura familiar nos lotes onde foram reassentados.

No que tange a atividade econômica dos entrevistados, eles abandonaram as práticas extrativistas, por dificuldade de acessar o antigo território, apenas a prática da pesca que permaneceu, mas ainda muitas restrições ambientais, fato este que obrigou alguns a trabalharem em subempregos e até mesmo no mercado ilegal, haja vista, com a construção da barragem, a intensidade da produção pesqueira diminuiu consideravelmente.

Mediante a este contexto social, algumas iniciativas são relatadas na obra pelas autoras, por parte do Poder Público, bem como da sociedade civil organizada, que por via Ministério notificou a revisão no planejamento inicial de remoção das famílias, dando vez ao realocamento pela Norte Energia.

No mês de setembro do ano de 2016, deu-se início a uma nova etapa de reassentamentos em área de terra firme, mais precisamente nas áreas de preservação permanente (APP), o que fica evidente nessa fase de realocação, a não adaptação das famílias que foram expropriadas de lugar original, tanto ambiental, bem como culturalmente.

No tópico: Apontamentos finais, é ressaltado a preocupação para com as famílias para o acesso a água de qualidade, uma vez que nem todos terão a possibilidade de construir poço artesiano em suas residências, soma-se a isto o realocamento foi também em alguns caos em áreas degradadas e sem possibilidade de atividade extrativista de subsistência, a desarticulação das redes sociais ribeirinhas, pela construção da barragem também é um fator importante na pesquisa, uma vez que as relações interpessoais no antigo território, torna-se um elemento importante, na construção sociológica ribeirinha, realocação de famílias em localidades que pertenciam a outras famílias ribeirinhas, gerando conflitos entre os próprios ribeirinhos.

  Outro ponto importante na pesquisa é em relação as dimensões das áreas ofertadas, isto é (100x200 metros) e áreas de APP (500x250 metros), na primeira opção não condições salubres de condições de vida e as atividades produtivas também não são viáveis, na segunda dimensão que é maior, o problema maior é a falta de assistência técnica do Estado para que os assentados consigam ter sua atividade agrícola, ademais, a interferência constante de fazendeiros que estão próximos dos assentados gera grandes conflitos pela terra.

A Amazônia nos de 1960 se insere na lógica dos mercados globais enquanto fornecedora de matéria-prima na Divisão Internacional do Trabalho, a ampliação da fronteira capitalista não é por acaso, a região dispõe de abundância de recursos naturais, com o esgotamento de commodity ao redor do globo, a atenção de apropriação dos recursos naturais para fins de capitalistas nesta região foi a tônica no regime civil e militar nos de 1964-1985 (GONÇALVES, 2001). No bojo deste processo de expansão da fronteira capitalista, sobretudo com a exploração de projetos minerários no território amazônico, surge a necessidade de dar suporte estruturante para os grandes projetos de exploração florestal, agroindustrial entre outros, assim se insere também por meio de consórcio entre empresas privadas e públicas com o objetivo de promover e dar suporte de energia aos Grandes Projetos na Amazônia, caso de hidrelétricas que foram construídas a partir do Regime civil-militar nos de 1960, desde então, para dar conta da produção dos inúmeros projetos de forma capitalista, era preciso uma grande capacidade de energia para que esses mega-projetos pudessem ser tocados.

Na esteira deste processo de implantação de barragens, como é ocaso da Usina de Belo Monte em Altamira, percebe-se a tônica do debate sobre Grandes Projetos na Amazônia: implantação e desterritorialização de comunidades tradicionais, que por décadas as pesquisas nesta temática versam por este binômio.

Até hoje as políticas de Desenvolvimento Regional para Amazônia perpassam por privilegiar os agentes hegemônicos do capitalismo financeiro industrial e não os agentes locais, como os moradores primitivos e populações tradicionais, onde o diálogo e os dividendos econômicos e sociais não são proporcionais e simétricos, verifica-se é exatamente uma acumulação de capital desigual por intermédio da exploração do trabalho (CASTRO, 1994).

O discurso da “modernidade” para a Amazônia capitaneado pelo Governo Federal, tornou-se justificativa central para justificar o modelo de Desenvolvimento Regional exógeno que vigora atualmente nesta região, este desenvolvimento é para as grandes empresas que exploram e degradam a natureza e expropriam comunidades tradicionais, essa desterritorialização não é apenas física, mas sobretudo, existencial, (DIEGUES, 2004) uma vez que as populações que foram remanejadas da região que foi construída a Usina de Belo Monte até hoje, padecem de problemas psicológicos e sociológicos, como apontam alguns pesquisadores de universidades, exatamente por a ruptura do território ser muito além de uma base material, pois a relação que essa populações tem o território é também uma relação de simbiose (DIEGUES, 2004).

Referências Bibliográficas:

CASTRO, E.M.R de; MOURA, E; MAIA.M.L.S. Industrialização e grandes projetos: desorganização e reorganização do espaço. Belém: UFPA, 1994.

DIEGUES, Antonio Carlos Sant’Ana. O Mito moderno da natureza intocada. São Paulo: NUPAUB/USP, 1994.

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. São Paulo: Contexto, 2001.