O progresso, no seu conceito mais otimista, correspondendo ao desenvolvimento positivo, sustentado, tendente para um melhor nível e qualidade de vida dos cidadãos, não tem correspondido às justas expetativas da esmagadora maioria da população mundial, pois é sabido que a vala que separa ricos e pobres é cada vez mais larga e funda, na medida em que, muitos dos ricos aumentam desmesurada, e inexplicavelmente, as suas fortunas, enquanto a maioria dos pobres se aproxima, rápida e perigosamente, do limiar da miséria, das diversas formas de exclusão, de situações gritantemente desumanas, sem que se vislumbrem soluções que invertam esta tendência catastrófica.

A vida é cada vez mais agitada e incerta para a maioria das pessoas, para poderem sobreviver com alguma dignidade e conforto material, tentando garantir, àqueles que dela dependem, um mínimo de condições biosociais, relativamente à melhor preservação da vida física, e disporem de uma situação de relativa tranquilidade, no acesso aos bens de primeira necessidade, como: a saúde, a alimentação, a educação, o trabalho, a habitação a cultura.

Os: aparente complexo de superioridade, mesclado com alguma arrogância tecnocrática, que ainda se detetam em alguns profissionais, revela, afinal, que lhes faltam a preparação e formação de base, indispensáveis à pessoa verdadeiramente humana e que, muito embora com mérito, profissionalismo e atualização, resolvam muitos problemas, ao nível do indivíduo e da sociedade, continuam a mostrar-se incompetentes para as questões do foro íntimo das consciências, dos males que perturbam os espíritos, e que conduzem a problemas psico-sociais, para os quais as terapias disponíveis, ao nível das ciências exatas, não têm sido suficientes.

Importa, por isso, que se avance para a interdisciplinaridade entre as ciências exatas, e outros ramos do conhecimento empírico, e da reflexão estruturada, sistematizada e permanente.

Interessa valorizar o conhecimento, que pela conjugação reflexiva e do raciocínio, se vai construindo no espírito de cada pessoa e, posteriormente, desfrutado, discutido e validado, nos aspetos que se compatibilizam com as ciências, as técnicas e tecnologias descobertas, postas à disposição e ao serviço da humanidade, no sentido do bem-comum.

Recolocar a Filosofia no lugar que, desde há mais de 2500 anos, lhe é devido, é uma medida que deve ser tomada, de imediato, por todos quantos têm responsabilidade na educação, formação e bem-estar das pessoas, desde já o bem-estar emocional, psicológico, intelectual e social.

O estudo e reflexão sobre as questões levantadas, pertinentemente, pela Filosofia, por vezes, incomodam, principalmente aqueles que nos últimos séculos a têm desvalorizado, menosprezado e tentado eliminá-la, contudo, dois milénios e meio de vida, de intervenção, de intromissão responsável noutros domínios, garantem a sua credibilidade, pelo menos no que respeita à discussão dos problemas que afetam o homem: individualmente considerado; e toda a sociedade em geral, independentemente das culturas, das civilizações, das religiões. A Filosofia é transversal à humanidade e, talvez, também por isso mesmo, suscite polémicas, ódios, eventualmente, a sua própria negação.

Seguramente que a Filosofia não é nada disto, e os filósofos não querem, nunca o manifestaram e pensa-se que jamais o evidenciarão, que se enclausure, numa redoma dogmática, que conduziria à morte intelectual do homem, porque: Filosofia é vida, é contestação, é democracia; é liberdade, é igualdade e é fraternidade. Filosofia enquanto pensamento livre, alternativa, crítica, contestação ordeira, dúvida metódica.

Filosofia na origem do pensamento visionário, utópico, mas também realidade, pragmatismo e construção ideológica de sistemas, valores e princípios. Filosofia do comportamento ético-moral, da fixação de regras deontológicas. Enfim, Filosofia como companheira da ciência, da técnica, da tecnologia, da religião, da política, da cultura e da arte. Filosofia como marca indelével da pessoa humana.

Uma vida equilibrada não dispensa a reflexão, como pressupõe o exercício e a participação na atividade política democrática, no seio do povo, com o povo e para o povo. Praticamente, todos os problemas que afetam a existência humana, coletivamente considerada, e/ou individualmente analisada, encontram a solução nas decisões políticas, maduramente ponderadas, refletidas e avaliadas.

Os recursos, os meios, as metodologias encontram-se numa profunda, justa e adequada reflexão sobre cada situação. Filosofia, Ciência, Técnica e Democracia devem, portanto, continuar a trabalhar em conjunto, visando objetivos racionais, exequíveis de serem atingidos, e potencializadores para uma vida-boa.

O ponto de partida para uma vida-boa poderá estabelecer-se numa filosofia geral de vida, através das diversas especializações filosóficas, e domínios das ciências sociais – axiologia, ética, estética, filosofias da: educação, saúde, trabalho; religião; antropologia, psicologia, sociologia, direito, história, política, economia, entre outras áreas disciplinares que tocam aspetos sociais.

Importa, neste Receituário Filosófico para uma vida-boa, considerar as reflexões que conduzam à idealização e implementação de projetos verdadeiramente humanistas, porque os beneficiários diretos são os indivíduos humanos, mas também, outros seres que coabitam com a pessoa humana.

A Filosofia poderá constituir, nos tempos modernos, conturbados, violentos e impregnados de injustiças, e de ódios, uma forte alternativa para a resolução de conflitos pessoais, comunitários e internacionais.

A Filosofia não tem pretensões a um estatuto científico e, possivelmente, nem haverá benefícios com a introdução de novos conceitos ou objetivos e, reciprocamente, a seu respeito, além de que, nem tudo o que é, alegadamente, científico e técnico, constitui o melhor processo para resolver determinadas situações.

O mundo humano vive um período conturbado, onde a força das armas, dos interesses materiais e das grandes concentrações, quaisquer que elas sejam, perturbam toda uma humanidade, que já não tem força para fazer prevalecer o diálogo racional, moderado, apaziguador, embora se continue a acreditar numa oportunidade que possibilite alterar o rumo que muitos dirigentes mundiais, suportados num poderio bélico, económico, estratégico, político ou religioso, têm vindo a imprimir, a partir das suas próprias comunidades.

Tudo funciona à volta de interesses: dos mais nobres e altruístas; aos mais inconfessáveis desígnios; poucos, dão importância ao diálogo, às soluções pacíficas, ao pensamento dos filósofos, e às propostas que apresentam para ajudar a solucionar os mais complexos problemas; muitos outros, rejeitam a sabedoria dos mais velhos, a prudência dos mais experientes, alegadamente, porque estarão desatualizados, porque são idosos e o seu tempo passou.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal

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