A China deixou de lado o marxismo ortodoxo e adaptou o regime para um capitalismo liberal disfarçado de comunismo. O lucro foi liberado e lá se encontram hoje a maioria dos bilionários do planeta.

E o regime? Para todos os efeitos o Partido Comunista continua dando as cartas, mas na prática é o mercado que assumiu o protagonismo do sistema chinês. Num debate na USP no final dos anos 1990, questionei um palestrante sobre o caráter capitalista do regime chinês. Ele, um marxista ortodoxo, ficou furioso e me acusou de fazer uma crítica burguesa ao socialismo chinês (sem comentários).

A China optou pelo capitalismo ao perceber que é impossível ser socialista num mundo capitalista, precisando de divisas para adquirir insumos e alimentos no mercado global. Percebendo que a URSS estava indo a bancarrota com a ortodoxia stalinista, tratou de adaptar o marxismo às leis do mercado, adotando estratégias competitivas bem mais realistas. Hoje Michael Porter, guru do planejamento estratégico deve ser lido e relido pela cúpula do PC chinês.

Agora estamos assistindo a nossa retrógrada extrema direita fazendo campanha contra os chineses, querendo boicotar a vacina desenvolvida em parceria com o Instituto Butantan, por questões ideológicas (rs). O presidente pressionado pela horda de imbecís que o segue, fez o ministro da saúde desmentir uma decisão publicamente tomada em relação à vacina.

Já que estamos nesse nível, acho interessante boicotar todos os produtos chineses do mercado brasileiro, inclusive os da rede de lojas de um conhecido empresário apoiador do capitão. Para radicalizar, vamos deixar de exportar minério de ferro, soja, milho, carne etc para "esses comunistas", pois assim o nosso agronegócio, único setor da economia que ainda cresce, entra logo em colapso, aumentando a oposição contra esse pseudo-governol.

Essa história me faz lembrar de um panfleto que apareceu lá em casa quando eu era bem menino. Era do Partido Comunista Brasileiro, que reclamava que toda a nossa economia estava nas mãos do capitalismo ianque e seus sócios. O dia do brasileiro começava acendendo a luz que era da Light and Power, escovava os dentes com creme dental Kolynos da Whitehall americana. Tomava Nescafé, da Nestlê, comia pão da Pullman, presunto da Swift. Ia para o trabalho em ônibus da MBB, alemã e assim por diante.

Como a economia chinesa deve superar a americana até 2028, é melhor os nacionalistas extremados colocarem as barbas de molho, pois em breve os chineses dominarão o mundo. Aliás, meu avô já dizia isso enquanto jantávamos na Fazenda São Vicente, na Noroeste Paulista nos distantes anos cinquenta. Evoé vô João você sabia das coisas.