FINALIDADES DA EDUCAÇÃO: 

Uma perspectiva da avaliação neoliberal no caso moçambicano

 

Antoninho ALFREDO[1]

 

Resumo 

O objetivo deste ensaio é o de discutir a questão da finalidade da educação no sistema nacional de ensino moçambicano, a partir de uma crítica às imposições das políticas avaliativas promanadas das instituições de Bretton Woods (o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial). Cientes de que falar sobre o processo educativo enquanto acção – reacção exige uma ginástica intelectual elevada, dada a complexidade que o assunto sugere, entende-se que, de acordo com a teoria defendida por Libâneo, em concatenação com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, existem quatro finalidades educativas escolares fundamentais, designadamente: primeiro, uma educação que visa a satisfação de necessidades básicas; segundo, uma educação voltada para o desenvolvimento humano; terceiro, uma educação centrada no mercado de trabalho e quarto, uma educação para a sociabilidade e convivência. Essas finalidades têm sido sufocadas, em países do Terceiro Mundo, como Moçambique, pelas instituições que financiam a produção e implantação dos curricula, com especial enfoque para a questão avaliativa (através da difusão dos testes em escolha múltipla), daí urge contrariar a este modo de actuar, através de um processo de acção – reacção educativa que preconiza os valores locais, de modo que a geração vindoura não seja acrítica, receptiva, com deficit identitário e pouco produtiva.

 

Palavras – Chave: finalidade educativa, acção – reacção, educativa e avaliação

 

Abstract 

The purpose of this essay is to discuss the question of the purpose of education in the Mozambican national education system, based on a criticism of the impositions of evaluative policies emanating from the Bretton Woods institutions (the International Monetary Fund and the World Bank). Aware that talking about the educational process as an action - reaction requires high intellectual gymnastics, given the complexity that the subject suggests, it is understood that, according to the theory advocated by Libâneo, in concatenation with the World Declaration on Education for All , there are four fundamental school educational purposes, namely: first, an education aimed at meeting basic needs; second, an education focused on human development; third, education centered on the labor market; and fourth, education for sociability and coexistence. These purposes have been stifled, in Third World countries, such as Mozambique, by the institutions that finance the production and implementation of curricula, with a special focus on the evaluation question (through the dissemination of tests in multiple choice), so it is urgent to counter this way to act, through an action process - educational reaction that advocates local values, so that the coming generation is not uncritical, receptive, with identity deficit and not very productive.

 

Key - words: educational purpose, action - reaction, educational and evaluation

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  1. Introdução

Não se pode negar que quando se pretende falar sobre a Educação, se deve estar convicto das inúmeras dificuldades que podem surgir, dada a complexidade que este conceito encerra. Por isso que, através deste ensaio, se prende apenas falar sobre o fim último da Educação, no contexto moçambicano, tendo em conta que uma das questões que mais se levantam, quando o assunto tem haver com a Educação escolar, prende-se com a finalidade inerente a ela. Questiona-se, de entre outros aspectos: Para que serve a educação? Qual é, afinal, a finalidade de educar as nossas crianças? Qual é, essencialmente, a teleologia da acção educacional?

É, pois, nesta perspectiva que se encerra o tema do presente ensaio. Pretende-se, com o mesmo, falar das finalidades da educação, tendo em conta a perspectiva da avaliação neoliberal, no contexto moçambicano, ainda que não seja de modo cabal. Para o efeito, a tese que se pretende defender centra-se no facto de se considerar que o fim último da educação moçambicana é o de preparar os cidadãos para uma sociedade acrítica, receptiva, com deficit identitário e pouco produtiva.

Com este ensaio se pretende pensar a educação moçambicana (e mais especificamente, no aspecto relativo à avaliação influenciada pelo neoliberalismo) sob o ponto de vista dos fins a que ela persegue, de modo que, a partir daí, se indague sobre o sentido e o alcance do sistema educacional que se pretende transmitir às gerações vindouras.

Em termos de sua composição, para além do presente introito, ao longo do corpus do presente ensaio, ir-se-á debater ideias de vários autores que abordaram algo acerca do tema que se propôs aqui realçar. Tal debate estará circunscrito em três blocos, designadamente: o primeiro, no qual se explora uma abordagem teórica sobre as finalidades da educação (neste prisma, a visão de Libâneo irá nortear o debate) e o segundo, que tratará de analisar os agentes influenciadores do sistema educacional moçambicano (com especial enfoque para as instituições do Bretton Woods) e, finalmente, o terceiro, embora não menos importante, o qual se dedicará a tecer um olhar teleológico da educação que se está a transmitir e da sociedade que se espera ter como corolário desse processo.

  1. As finalidades da Acão - reação educativa 

Entendemos que a educação enquanto processo de relações intersubjectivas não é apenas uma acção. Ela também compreende uma componente reactiva. Por isso, se usa a expressão sinalagmática “acção – reacção”. É assim como deve (ria) ser entendida a educação. Um processo onde se verificam dois movimentos em sentidos opostos, por um lado, o da acção dos educadores sobre os educandos e, por outro, o da reacção dos educandos aos trâmites da acção que sobre si recaiu. Esta visão do processo educativo seria, com a necessária ousadia da nossa parte, uma educação newtoniana[2].

O processo educativo que ocorre em uma sala de aulas, seria entendido apenas como acção, se os alunos fossem realidades passivas, inanimadas e órfãs de subjectividade e/ou individualidade. Mas, como não o são, pois cada um dos alunos tem a sua própria perspectiva sobre determinado conteúdo transmitido, apesar de terem, todos eles o mesmo professor, resulta claro que estes, por sua vez, exerçam uma acção sobre o professor (a isso denominamos de momento reactivo do processo educativo, isto é, trata-se da própria reacção).

Assim sendo, não restam dúvidas de que a acção – reacção educativa que ocorre nas nossas escolas (desde os mais elementares níveis aos mais elevados), tem finalidades. Aliás, a partir da visão macro, quando se elaboram os curricula, colocam-se as metas que se pretendem alcançar, com determinado modo de educar. E, na visão micro, quando se elaboram os planos de aula, é fundamental contemplar um espaço para a descrição dos objectivos, cuja questão norteadora é: o que é que se pretende alcançar, no final da aula, uma vez transmitido determinado conteúdo?

Portanto, não se pode compreender uma aula sem objectivos, tal como é inconcebível a existência de um plano curricular sem objectivos. Desta feita, o processo educativo (tanto na dimensão activa quanto na reactiva) também tem objectivos a seguir.

Daí que, num cômputo geral, concluímos que o objectivo delineia a finalidade de um determinado processo, porque não se pode e nem se deve olvidar da ideia de que “as finalidades indicam uma orientação filosófica e valorativa, explicitam e dão fundamento à organização do sistema educativo” (Lenoir, 2016, p. 19).

O autor e estudioso de matérias de educação, José Carlos Libâneo, no capítulo segundo do livro Políticas Educacionais Neoliberais e Escola Pública: uma qualidade restrita da Educação Escolar, quando fala da questão inerente as políticas educacionais neoliberais e a escola, debatendo os conceitos de qualidade da educação restrita e restritiva, no contexto da hegemonia neoliberal, em referência; Declaração Mundial sobre Educação para Todos, de Jomtien (1990), realça quatro finalidades educativas escolares, designadamente: (i). Educação para satisfação de necessidades básicas; (ii). Educação para o desenvolvimento humano; (iii). Educação para o mercado de trabalho e (iv). Educação para a sociabilidade e convivência.

Assim sendo, a educação para satisfação de necessidades básicas de aprendizagem é a finalidade educativa mais importante, pois se trata de um direito fundamental de todos. Nesta finalidade, a aprendizagem se refere apenas à aquisição de conhecimentos úteis, habilidades de raciocínio, aptidões e valores básicos. Em razão disso, a educação básica deve estar centrada na aquisição e nos resultados efectivos da aprendizagem (Libâneo, 2018, p. 45).

Trata-se, por assim dizer, de uma educação que tem em vista ensinar os alunos a saber ler, saber escrever e saber contar. O alvo dessa finalidade de educação basilar, é erradicar o analfabetismo. Os alunos aprendem o alfabeto (abecedário) de modo a traduzir o seu próprio pensamento por escrito ou a entender o pensamento de outros, aprendem os números e as primeiras operações matemáticas. No contexto moçambicano da acção – reacção educativa, esta finalidade educativa encontra-se permeada no ensino primário do Sistema Nacional de Ensino, bem como no programa de Educação e Alfabetização de Adultos.

A segunda finalidade educativa é aquela que se define como educação para o desenvolvimento humano e inclui a busca do bem-estar para todos, para superar a marginalidade e a pobreza, tendo em vista potencializar a capacidade produtiva e, assim, contribuir para desenvolvimento económico e social. A ideia de desenvolvimento humano, assim, vincula-se à concepção individualista e competitiva de ser humano conforme os princípios do liberalismo, em que o indivíduo é visto “não só como objecto de exploração, mas como sujeito que demanda e consome e, portanto, susceptível de ingressar no mercado” (Bloom, 2004, p.220 apud Libâneo, 2018: 46).

Esta finalidade educativa insere-se convenientemente no nosso contexto moçambicano. Aliás, é apanágio do discurso político nacional, até porque o ministério que tutela a área da educação foi denominado em 2015 e continua até a presente data, como sendo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano.

Trata-se de uma tentativa de tornar prática a ideia de que o objectivo é emancipar o ser humano. O que implica tirar-lhe da sua situação de penúria, de degradação e de fraqueza, para uma situação melhor. O cidadão moçambicano passou pela humilhante experiência da escravatura seguida da colonização e de tudo quanto isso significou para a sua dignidade enquanto pessoa. Posto isto, teve de passar por uma situação de luta (armada) que levou cerca de uma década para poder alcançar a tão almejada independência (que se pretendia, total e completa).

Uma vez independente, viveu os duros momentos de imposição ideológica de um sistema marxista - leninista que era mais “Samorista”, do que propriamente obediente à visão de Marx e de Lenine; o que fez com que se desembocasse a guerra fratricida. Portanto, uma vez mais, o cidadão moçambicano perdeu a oportunidade de se demonstrar enquanto tal. Por esta razão, nos nossos dias, soa bem a ideia de uma educação voltada ao desenvolvimento humano. Uma educação em que através dela o cidadão moçambicano pretende sair da pobreza e se alcançar o bem-estar e o progresso, individual e social.

Por seu turno, segundo Libâneo (2018, p.48), existe ainda uma terceira finalidade do processo educativo, através da qual se pretende uma educação para o mercado de trabalho. É uma finalidade que justifica de modo mais visível os esforços dos sistemas de ensino para assegurar a aprendizagem para todos. Na Declaração de Jomtien (1990), um dos principais desafios é o de melhorar a capacidade do sistema de ensino para contribuir para o desenvolvimento da força de trabalho e garantir que alunos desfavorecidos e de baixo desempenho tenham acesso à qualidade e a oportunidades de aprendizagem relevantes.

Esta finalidade da acção – reacção educativa se viu espelhada no contexto moçambicano, com maior realce, nesse período em que se verifica um boom das descobertas pelos recursos minerais. Em várias instituições de ensino (principalmente as do ensino técnico e profissional) foram sendo concebidos e abertos, cursos de caris voltada a minas, a geologia, a petróleo, etc., como forma de se responder a demanda que o próprio país não estava habituado. Este é um sinal clarividente de uma educação voltada ao mercado.

Uma quarta finalidade educativa é a denominada Educação para a sociabilidade e integração social, a qual realça o papel da escola como espaço de convivência visando satisfazer as necessidades de sistemas educacionais afectados por situações de conflito e instabilidade e conduzir os programas educacionais de forma a promover compreensão mútua, paz e tolerância que ajudem a prevenir a violência e os conflitos (Ibidem, p. 49).

Hoje, mais do que nunca, Moçambique precisa de perseguir esta finalidade da acção – reacção educativa. Vivem-se conflitos (com tonalidades terroristas) no Norte do país, na província de Cabo Delgado. Vivem-se, igualmente, conflitos armados (embora episódicos) na zona centro do país, nas províncias de Manica e de Sofala. Há, também, focos de violência em vários sectores societários (com especial enfoque para as famílias, onde o índice de violência domestica tem estado a crescer sobremaneira).

Urge, pois, uma educação que dê relevo a formação de mentes desarmadas, mentes pacíficas (e não passivas), mentes que saibam tolerar as diferenças, mentes que compreendam o outro na sua mutualidade. A disciplina de Educação Moral e Cívica e também de Filosofia, devem, para todos os efeitos, ser expandidas e ser conferidas maior amplitude. Não basta que os alunos aprendam as letras e os números, é preciso que aprendam a saber estar com os outros, pois a diversidade é uma riqueza.

Feliz ou infelizmente, o mundo neoliberal em que nos situamos, as finalidades educativas e os critérios de qualidade do ensino e da aprendizagem são definidos com base no modelo da racionalidade económica, que incide de modo directo ou indirecto no planeamento das políticas educacionais, na legislação educacional, no currículo, nas formas de organização e gestão da escola, nos procedimentos pedagógico - didácticos. Essas políticas, para além dos alunos, atingem, também, os professores em suas condições de exercício profissional: pela precarização e intensificação do seu trabalho, pela pressão para acatarem conteúdos pré-definidos externamente, pela perda de autonomia e pela desvalorização do seu trabalho que fica reduzido ao treinamento dos alunos para os testes padronizados (os chamados testes de multi – choice) Considera Mabote (2013, p.48) que ao se escolher a categoria das avaliações mediante perguntas fechadas (multi – choice), o Sistema Nacional de Ensino, através dos doadores, quis eliminar o subjectivismo, reduzir o número de intervenientes no processo de correcção e classificação as respostas, reduzir o tempo de correcção e contribuir para a qualidade do ensino nas escolas. Mas, ao contrário, o que efectivamente se verificou, ou sem tem verificado, é que os alunos têm sido cada vez mais acríticos, receptivos, com elevando deficit identitário e pouco produtivos.

 

  1. A mão externa na educação moçambicana

A questão dos testes de escolha múltipla (multi – choice) por exemplo, e tantos outros aspectos que foram inseridos no processo da acção – reacção educativa nacional são o corolário de uma mão externa. Moçambique está inserido no teatro dos denominados países sub - desenvolvidos (ou, segundo uma nomenclatura mais separatista: do Terceiro Mundo).

Embora rico em potencialidades minerais e naturais, não reúne condições de explorar por si só, os recursos que tem, bem como não possui condições para arcar com o seu próprio orçamento geral do Estado. Por isso, recorre, nas mais das vezes, à financiadores, a parcerias e a endividamentos públicos, de modo a ver suprida as suas necessidades básicas como país.

O sector da educação não fica excluído deste esquema. A maioria do orçamento destinado à educação provém dos financiamentos das organizações internacionais. Ora,

Uma organização internacional, na verdade, só tem o poder que lhe confere os Estados que a sustentam. As vezes, acha-se que é a organização internacional que decide. Ela toma decisões, claro, mas na lógica e, muitas vezes, conforme os interesses dos países que a mantém, isto é, que a financiam. Atrás das organizações internacionais, é o poder do capital internacional que funciona (Charlot, 2007).

Portanto, o que se está a dizer é que as instituições e/ou organizações internacionais não agem por si só. Elas são a voz dos países que os financiam. O Ocidente, por assim dizer, vai tecendo a sua teia sobre os países do chamado Terceiro Mundo.

Assim, para os países mais pobres, as organizações importantes são o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM). São as chamadas organizações de Bretton Woods[3].

A missão do FMI é, entre as outras, a de evitar uma crise igual a de 1929. Para tanto, este organismo se dedica a emprestar dinheiro, a curto prazo, aos países com problemas financeiros. Ora, para saber se esses países têm condições de reembolsa-lo e para ajuda-los a criar essas condições, o FMI estabelece com eles “planos de ajustamento estrutural”. Nestes, muitas vezes são feitos cortes nos orçamentos da saúde e da educação, que são gastos sem rentabilidade de curto prazo.

O Banco Mundial, por sua vez, tem uma missão central de combater a pobreza a longo prazo. Na verdade, trata-se de um grupo constituído pelo Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) mais quatro organizações a ele associadas. É basicamente um banco, cuja função é emprestar dinheiro para amparar projectos de desenvolvimento, em particular na área da educação.

O Banco Mundial tem uma doutrina oficial: pensa que a qualidade da educação é fundamental para lutar contra a pobreza, mas que não tem e nunca terá dinheiro público suficiente para desenvolver uma educação de qualidade. Daí o Banco Mundial conclui que e preciso dinheiro privado.

Através destes mecanismos de financiamento, estas instituições vão inserindo os seus paradigmas nos curricula a serem implementados em Moçambique, um dos quais é o de financiar uma educação para que o produto da acção – reacção educativa seja uma sociedade acrítica, receptiva, com deficit identitário e pouco produtiva. A forma usada para a prossecução de tal intento, são os testes de múltipla escolha, com perguntas objectivas e respostas fechadas, inicialmente introduzidos no sistema nacional de ensino, por volta dos finais do ano 2000 (Oliveira, 2012, p.137).

 

Neste prisma, Jefete Mabote, constatou que:

O diagnóstico da situação que recomendou a introdução de testes de múltipla escolha no sistema educativo moçambicano, foi feito em 2001, mas a decisão para a introdução deste tipo de perguntas, só veio a ser tomada em 2006 e, na sua implementação efectiva foi em 2008, depois da publicação, em Boletim da republica do Diploma Ministerial no. 77/2008, de 3 de Setembro (Mabote, 2013, p.70).

A questão que reside, por conta disso, é que visa oferecer respostas ao facto desse tipo de avaliação inserido no processo de acção – reacção educativa proporciona alunos melhores, uma educação de qualidade e uma sociedade melhor, olhando para o contexto moçambicano, ao que, desde logo, se deplora.

Porque, os alunos apenas se definem como elementos passivos do processo avaliativo, não podendo ser capazes de, a partir deste ponto, desenvolver habilidades suficientes que o permitam alcançar, pelo menos, um dos quatros objectivos e/ou finalidades educacionais avançados por Libâneo.

 

  1. Da questão Ngoenhiana: que educação para que Moçambique?[4]

O filósofo moçambicano Severino NGONHA, publicou no ano 2000, a obra Estatutos e Axiologia da Educação, sob a chancela da Livraria Universitária da Universidade Eduardo Mondlane.

Naquela obra, o autor busca fazer uma demonstração de que o saber transmitido nas escolas através do processo de acção – reacção educativa pode servir de via de emancipação para as realizações humanas. Tal possibilidade se materializa na medida em que se vão transmitindo, às gerações, os valores inerentes a uma educação propriamente dita (Ngoenha, 2000).

Ngoenha critica o neoliberalismo e a forma avaliativa deste sistema. Derruba as organizações internacionais referidas na secção anterior (Banco Mundial e o FMI) e tudo quanto elas implicam na “travagem” de uma educação genuinamente moçambicana e propõe que a finalidade de Educação deve estar centrada na transmissão de valores (a questão axiológica), com especial enfoque para os tradicionais.

Para o caso do país, não basta dizer de modo politicamente correcto que a meta é a qualidade de ensino (através da consolidação da vertente dos testes de escolha múltipla), sem, contudo, analisar a questão da finalidade do processo de acção – reacção educativa.

A educação em Moçambique é um projecto que precisa de ser repensado na sua globalidade e no quadro das condições concretas, com vista a identificar os momentos disfuncionais do actual sistema, em relação à realidade e ao tecido social (Ngoenha, 2000, p.199).

Uma vez que, segundo Ngoenha (op. cit: 202), a educação teria sido o primeiro sector nacional a perder a própria autonomia em termos de elaboração de politicas, torna-se mister que, ao se aceitar os financiamentos dos organismos internacionais (BM e FMI), que são necessários, pois ajudam a suprir as basilares deficiências económicas que o país enfrenta, é preciso negociar os elementos inerentes aos ganhos e as perdas (check and balance), sem se limitar a receber os financiamentos e as imposições que tais organizações fazem no currículo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Conclusão

Em suma, podemos afirmar que a educação como um processo que ocorre em sala de aulas, deve ser visto numa versão newtoniana de ação – reação. Nisso, o processo em sala de aulas, é entendido apenas como ação, se os alunos fossem realidades passivas, inanimadas e órfãs de subjetividade e/ou individualidade. Mas, como não o são, pois cada um dos alunos tem a sua própria perspectiva sobre determinado conteúdo transmitido, apesar de terem, todos eles o mesmo professor, resulta claro que estes, por sua vez, exerçam uma ação sobre o professor (a isso denominamos de momento reativo do processo educativo, isto é, trata-se da própria reacção).

Assim sendo, não restam dúvidas de que a ação – reação educativa que ocorre nas nossas escolas (desde os mais elementares níveis aos mais elevados), tem finalidades. Mesmo porque a partir da visão macro, quando se elaboram os curricula, colocam-se as metas que se pretendem alcançar, com determinado modo de educar, observamos isto. E, na visão micro, quando se elaboram os planos de aula, é fundamental contemplar um espaço para a descrição dos objetivos, cuja questão norteadora é: o que é que se pretende alcançar, no final da aula, uma vez transmitido determinado conteúdo?

No entanto, não se pode compreender uma aula sem objetivos, tal como é inconcebível a existência de um plano curricular sem objetivos. Desta feita, o processo educativo (tanto na dimensão ativa quanto na reativa) também tem objetivos a seguir. Os objetivos educativos macros, nomeadamente através dos currículos, ao nível micro, através dos planos de aula, da dosificação e da sua aplicação em sala de aulas através do professor, enceram em si, a questão das finalidades educativas, que em síntese são quatro (4), designadamente: Educação para satisfação de necessidades básicas; educação para o desenvolvimento humano; educação para o mercado de trabalho e Educação para a sociabilidade e convivência.

Observa - se que a ligação entre as políticas educativas nacionais e as finalidades neoliberais da educação, impostas por organismos do Bretton Woods garantem um desmoronamento das competências do Estado em fazer valer o seu objetivo nacional maior de formar um cidadão moçambicano com enfoque na identidade e um valor ético nacional, assim como a ação do professor em sala de aulas. Dado isto, resulta que por detrás dos sistemas educacionais, existe u projeto maior de sociedade, que consiste em preservar, os valores, as técnicas e as instruções, vistas como positivas para a sua eternização.

A educação Moçambicana deve se basear na transmissão de valores, fundamentalmente os tradicionais. As possibilidades de superação dos limites da autonomia versus dependência; construção da identidade nacional versus cultura exterior, passa necessariamente, na nossa visão, na autonomia (não isolamento) do sistema nacional de educação.

Portanto, o aprofundamento de estudos ligados a áreas como a avaliação da implementação curricular dos professores, o domínio da avaliação dialogada em sala de aulas, a construção da identidade nacional através da educação, acabam sendo uteis na compressão maior do nosso estudo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia 

OLIVEIRA, et.al., A avaliação educacional em Moçambique, 2012, in www.inde.gov.mz Acesso em: 12 de Abril de 2020

MABOTE, Jafete Alberto, A implementação do Programa de reformas públicas na área dos exames nacionais em Moçambique: introdução de perguntas de múltipla escolha nos exames de 12 classe, Dissertação apresentada na Universidade federal de Juiz de Fora, Brasil, 2013.

 

[1] Docente do Curso de graduação em Filosofia da Universidade Rovuma/Moçambique. Mestrando em Educação e Ensino de Filosofia pela Universidade Licungo/Moçambique

[2] Em referência ao aludido na terceira lei de Isaac Newton, a qual “a toda a ação sempre há uma reação de mesma intensidade e direção, porém em sentidos opostos”.

[3] Esta designação surge em referência ao lugar onde foi pensada a reorganização da economia mundial, em 1944, nos Estados Unidos da América.

[4] Questão colocada como titulo do capitulo VIII, da obra de Severino Elias Ngoenha, intitulada Estatuto e Axiologia da Educação (2000) e que aqui se empresta.