Os estudos que estamos iniciando nesta série nos colocam diante de um dos maiores investimentos de Deus com vistas à melhoria de qualidade de vida do ser humano na face da Terra: a família. Isto nos leva à consideração de que a família é um projeto de Deus e não uma invenção humana. Temos aprendido ao longo de nossa jornada cristã que a família é uma instituição divina. Partimos deste pressuposto e não o questionamos. A comprovação que oferecemos é a iniciativa do próprio Deus em promover a união do primeiro casal (Gn 2.18-25). 

Neste estudo inicial gostaríamos de abordar a família como uma receita divina. Receita de que e para quê? Antes de iniciarmos a responder a esta pergunta, vale frisar que Deus está interessado no bem estar de sua criação máxima, o homem. É nesta busca que ele ocupa-se em criar o maior projeto de convivência e de subsistência humana que já se teve notícia: a família. Assim sendo, a família que Deus idealiza e estabelece é uma receita de realização pessoal; uma receita de boa convivência; uma receita de progresso e desenvolvimento. 

Não houvesse Deus criado a família, a história das sociedades teria inventado alguma coisa para o seu lugar. Com certeza, esta invenção não teria a qualidade da criação divina. Sem a família a existência humana perderia muito em significação e, conseqüentemente, a individualidade exacerbada traria desgastes vultosos aos relacionamentos. Portanto, a família também é receita de Deus para o homem criar raízes, fazer história, acalentar sonhos e trabalhar por ideais. 

A origem divina da família

Desde os primórdios da existência humana na face da Terra, vamos perceber a presença da família como instituição estabelecida e consolidada para dar a existência humana um vulto que os seres isoladamente, por certo, nunca alcançariam. O homem, no exercício de sua inteligência e ao longo de sua história, providenciou que muitas instituições fossem organizadas para lhe trazer benefícios vários em âmbitos como: educacional, social, religioso, cultural etc. Mas, a organização e a estruturação da família precedem qualquer iniciativa humana de prover algo para organizar e estimular os laços de ternura, afeto, sociabilidade, proteção e dar vazão a uma sexualidade latente em cada ser. 

Melhor assim. Deus já tinha um projeto e o pôs em prática desde o princípio. Seu interesse no bem estar do homem que emerge de sua imaginação criadora, o leva a instituir a família. É importante salientar tal fato, posto que, como nunca, vivemos numa sociedade que tem proclamado e estimulado a falência da família. Se for certo que o número de divórcios tem aumentado assustadoramente, também é certo que o contingente dos que estão investindo no casamento é grande. 

Deve-se debitar a conta demoníaca do desgaste da família nos tempos contemporâneos, na escancarada conta corrente da permissividade e da imoralidade que tem solapado com os valores bíblico-cristãos em nossos dias. Se a família é de Deus (como o é a sua Igreja) nada nem ninguém há de destruí-la. Os portais do inferno moral ou mesmo os dardos inflamados da maligna decadência espiritual de nossos dias não hão de prevalecer contra ela. 

Para os cristãos não deve existir qualquer dúvida sobre se a família é criação divina. Este deve ser um conceito arraigado em nossa concepção coletiva de qual seja o ideário de Deus para os aspectos relacionais da presença humana na terra no que diz respeito à afetividade. Desde a percepção divina sobre a situação em que se encontrava o ser criado, até as providências tomadas para suprir aquilo que Deus detectou acerca das carências humanas, tudo corrobora para credenciá-lo como Autor da família. 

A expressão divina "não é bom que o homem esteja só" (Gn 2.18), oferece o mais contundente testemunho acerca do diagnóstico de Deus sobre a condição solitária do homem e a decisão que toma - "far-lhe-ei uma ajudadora que lhe seja idônea" com a conseqüente formação da mulher de forma espetacular - depõem a favor de uma preocupação divina com o estabelecimento de algo especial. Desde os primórdios da Criação Deus estabeleceu algo do porte da família - que atravessa gerações, séculos e milênios e mantém-se sempre firme a robustecer os ideais de Deus para a humanidade - a fim de que a existência humana fosse mais feliz. 

Receita de realização pessoal

Segundo as definições mais elementares de família, podemos vê-la como o conjunto de ascendentes e descendentes, colaterais ou afins, de uma linhagem ou ainda como o núcleo básico social composto de pai, mãe e filhos. Se levarmos em consideração os aspectos sociológicos, a idéia de família fará alusão a um grupo de indivíduos, constituída por consangüinidade, ou adoção, ou por descendência dum tronco ancestral comum. 

Em todos os casos citados, percebe-se que família não é um conceito que se construa sem as amarrações tão benfazejas dos laços de consangüinidade ou de afetividade. O que é para ser valorizado, para muitos é motivo de desprezo. Reclamam que a família sufoca, manipula, persegue, vigia. Equivocam-se do valor protetor e de amparo que a família propicia. 

O fantasma da clonagem humana que persegue a humanidade do século XXI aponta para a geração de homens que não possuam qualquer laço filial. Alguns apologetas da desintegração da família acusam-na de ser um valor pequeno-burguês, já de todo superado pelas novas descobertas tecnológicas, pela entronização da Internet no dia-a-dia das pessoas e pela superficialidade dos relacionamentos contemporâneos. Preconiza um tempo em que os humanos serão auto-suficientes, despidos de qualquer sentimento relacional, simples máquinas de existir, de fazer sexo, de prosseguir para vida ou para a morte sem frustrações, sem saudades, sem esperanças e sem ressentimentos. 

Este não foi o projeto original de Deus. Deus não quer filhos sem pais, pois isto também significa filhos sem paz. Deus não quer homem sem mulher nem mulher sem homem, pois ele os fez um para o outro. Se há exceções - e estas também recebem a bênção do Pai - elas confirmam a regra, pois o celibato é dom, não foi feito para todos indiscriminadamente. 

Então a fórmula para se povoar o planeta de gente é a fórmula da família. Tudo o que fugir deste critério é uma contrafação ao propósito original de Deus. Desde que criou macho e fêmea (Gn 1.27), Deus, de forma abençoadora, os designou para "frutificar, multiplicar e encher a terra" (Gn 1.28). 

A verdade é que a família é uma receita divina para a realização pessoal de todos os que conseguem perceber o seu valor e investir na consecução de seus ideais. Esta realização pessoal se dá em vários campos. Vejamos alguns: 

1º) Realização do ponto de vista do companheirismo. O lar é o lugar do eterno retorno. Podemos sair para trabalhar, passear, negociar, descansar, viajar, cultuar e se divertir. Mas se temos uma família, um lar, sabemos que temos um lugar para onde voltar e pessoas que nos aguardam para receber-nos de volta depois dos compromissos de trabalho, do lazer e da descontração de umas férias merecidas. 

Os laços familiares promovem uma cumplicidade de sonhos e intenções, bem como investimento de energias, talentos e recursos em áreas de interesse comum que trarão benefício coletivo-familiar. Estar só não é condição de vida para o ser humano. "Não é bom que o homem esteja só", declarou Deus e partiu para tomar providências emergenciais. Criou, então, o ser mais belo de toda a Criação: a mulher. 

2º) Realização do ponto de vista da sexualidade. O casamento é o espaço reservado por Deus para a manifestação de uma sexualidade madura, sem culpas e abençoadora. Por um longo tempo na história das religiões viveu-se a máxima da "negação do prazer", como se  o gozo e a alegria fossem somente expressões de carnalidade e não de espiritualidade. Importante ressaltar isto, visto que ambas as situações são recorrentes. A questão não é se temos prazer, alcançamos alguma felicidade e nos sentimos recompensados por algo. A questão é se o objeto da nossa satisfação reproduz a vontade de Deus para as nossas vidas. 

Então, sexo não será algo apenas permissível porque possui uma função reprodutiva. Será algo também desejável por sua função prazerosa. Desde que dentro da estrutura divina que é o casamento e a família. O casamento que leva ao sexo, leva à felicidade do ser; que leva à formação da família; que leva à construção de um lar; que leva à preservação da espécie; que leva à harmonia da vida e à concretização dos ideais divinos para a sua criatura. 

Os seres humanos que Deus criou e que após formar os contemplou de forma satisfatória, a tal ponto de declarar que sua obra era "muito boa" (cf. Gn 1.31) eram seres sexuados: macho e fêmea. Logo, Deus não poderia condenar a atividade sexual, qualificando-a de desprezível ou menor.  

Receita de progresso e desenvolvimento

As palavras que associamos a casamento: matrimônio, consórcio, aliança, acordo, dentre outras, fazem referência a um dos significados mais importantes para casamentos que dão certo em nossos dias: parceria. 

Até bem pouco tempo, vivenciava-se uma realidade em que os casamentos eram verdadeiras competições intramuros, sobre quem é que mandava mais, quem falava mais alto, quem possuía o maior salário, quem era mais inteligente e, assim, marido e mulher disputavam entre si a hegemonia do lar. 

Obviamente que tal competição nunca foi saudável muito menos recomendável. Mas era factual. Hoje, ainda que ventos de machismo soprem de vez em quando em certos casamentos ou mesmo alguns ruídos de desentendimentos quanto aos caminhos do feminismo se façam sentir, os casais aprenderam que ou são parceiros de um grande negócio chamado casamento ou as brigas internas os levarão à ruína pessoal e do projeto de construir família. 

Assim sendo, o casamento é um espaço onde pode e dever haver progresso e desenvolvimento. A conquista que um casal vai acumulando ao longo de sua caminhada seja no âmbito das emoções, dos filhos, da aquisição de bens, da formação intelectual e cultural, na esfera dos relacionamentos e em outras áreas, tudo isso refletirá positivamente para a construção da vida a dois. 

Aplicações para a vida

É preciso que tenhamos em mente pelo menos quatro verdades acerca do que Deus tem como propósito para a família: 

1ª) A família é originária em Deus e só se realiza como apoio ao ser humano quando se baseia na vontade divina. 

2ª) Como receita divina para melhorar a qualidade de vida do ser humano, a família propicia um espaço democrático de apoio mútuo e companheirismo, em que cada indivíduo pode alcançar aceitação e proteção. 

3ª) Como receita divina, a família oferece o espaço necessário e suficiente para o início do processo de socialização dos indivíduos.  

4ª) Como receita divina, a família também oferece ao indivíduo oportunidade de crescer e conquistar maiores resultados na sua vida como cristão, cidadão e profissional.