Factores de infecção cirúrgicas em pacientes operadas no Hospital Materno Augusto Ngangula /Julho- Dezembro 2004. Luanda. Angola

 

 

Pascoal , Ana Maria José Garcia João

Lic. em Enfermagem pela Universidade Jean Piaget de Angola-UNIPIAGET. Angola

Especialista em Enfermagem em Infectologia pela Universidade Federal de são Paulo-UNIFESP.Brasil

Doutoranda em Saúde Pública pela Universidade de Ciências Empresariales e Sociales- UCES. Buenos Aires. Argentina

 

RESUMO

A infecção adquirida durante a hospitalização e que não estava presente ou em período de incubação por ocasião da admissão do paciente é chamada de infecção hospitalar. Geralmente, são aquelas que aparecem após 48 a 72 horas de internamento. As Infecções em Sítio Cirúrgico (ISC) são as maiores fontes de morbidade e mortalidade entre os pacientes submetidos a cirurgias. Estima-se que as ISC prolonguem o tempo de internamento em média mais de sete dias e conseqüentemente o custo do procedimento. O objectivo do estudo é identificar os factores que concorrem para o surgimento de infecções em feridas cirúrgicas de pacientes operadas no Hospital Materno Infantil Augusto Ngangula de Julho a Dezembro de 2004. Metodologia: Foi realizado um estudo descritivo, prospectivo, com a abordagem quantitativa. A população estudada abrangeu os profissionais que prestam assistência nas secções do Bloco Operatório e Cirurgia e 100 pacientes operadas neste hospital, que contraíram infecção da ferida cirúrgica no período em estudo. Foram avaliados o modelo arquitectónico do bloco operatório e área de internamento das pacientes assim como o comportamento dos profissionais relativo as normas de biossegurança. Resultados: estudo constatou que a estrutura arquitectónica do bloco operatório não era o mais aconselhado, observou-se acentuada violação das normas de biossegurança, nas técnicas utilizadas tanto no bloco operatório como na área de internamento em 100% dos profissionais. A taxa de infecção encontrada foi de 24,6% considerando a topografia da infecção maior predominância foi observada na incisional com 96% seguida da infecção de planos profundos com 4% do total de infecçõesidentificadas.

 

Descritores: Feridas cirúrgicas, Infecção hospitalar, paciente operada.

ABSTRAT

Introduction: infection acquired during hospitalization and who was not present or incubating period during the patient's admission is called nosocomial infection. Generally, they are those that appear after 48 to 72 hours of hospitalization. Infections in Surgical Site (ISC) are the major sources of morbidity and mortality among patients undergoing surgery. It is estimated that the ISC prolong the hospital stay on average more than seven days and therefore the cost of the procedure. Objective: To identify the factors that contribute to the emergence of infections in surgical wounds of patients operated on Maternal Hospital Infantil Augusto Ngangula July to December 2004. Methods: A descriptive study was conducted, prospective, with quantitative approach. The study population included professionals who assist in sections of Surgery and Surgery Block and 100 patients operated in this hospital, who contracted wound infection during the study period. We evaluated the architectural model of the operating room and inpatient area of patients as well as the behavior of professionals concerning the biosafety standards. Results: study found that the architectural structure of the operating room was not the most desirable, there was sharp violation of biosafety standards, the techniques used both in the operating room and in the hospital area in 100% of the professionals. The infection rate was found 24.6%, considering the topography of the most predominant infection was observed in 96% incisional followed by infection deep planes with 4% of infecçõesidentificadas.

Keywords: surgical wounds, hospital infection, operated patient.

 

INTRODUÇÃO 

Hoje em dia a Infecção Hospitalar tem sido um problema de saúde pública de primeira ordem em todos os hospitais do mundo. Ela tem suas origens históricas desde a Idade Média com a participação de religiosos na área de saúde.

Neste aspecto, a infecção hospitalar surgiu praticamente junto com os primeiros hospitais nos séculos XVIII e XIX, onde as condições de higiene eram precárias e os próprios médicos eram responsáveis pela transmissão de inúmeras doenças entre seus pacientes internados.( http://www.att-gestio.com\ asepsia e antisepsia.htm).

Estudos revelam que a infecção hospitalar teve seu apogeu no início do século XIX, na Áustria. Onde as mulheres morriam após o parto por terem contraído um mal desconhecido e não existia um diagnóstico completo. De acordo com Machado et. al., (2001): Na época pesquisas mostraram que os estudantes de medicina depois de fazerem autópsias examinavam as parturientes sem lavar as mãos ou usarem qualquer tipo de proteção, o que levava à infecção. Uma simples medida preconizada, a lavagem das mãos, reduziu significativamente o índice de infecção. (Machado et. al., 2001, p. 34)

Hoje, apesar dos progressos alcançados no que diz respeito ao controle da infecção hospitalar inclusive com o desenvolvimento de novos sistemas de prevenção, ainda assim a doença é um problema em todo o mundo.

Nos países desenvolvidos, a cada ano, 10% dos pacientes internados em hospitais contraem infecção hospitalar,( HOWARD, 1996), em nosso país, a taxa é desconhecida por carecer de estudos relacionados ao assunto.

Entre as infecções hospitalares, mais frequentes estão as infecções da ferida cirúrgica. As infecções das feridas cirúrgicas continuam a consumir um percentual considerável dos recursos destinados à assistência à saúde. Embora a eliminação completa da infecção no paciente cirúrgico seja impossível, uma redução na sua incidência para um nível mínimo pode produzir grandes benefícios tanto em conforto para os pacientes, quanto em recursos economizados.

Em cirurgia a infecção é uma entidade clínica de múltiplos factores envolvidos e a necessidade de reduzir e controlar a sua incidência determina a aplicação de medidas preventivas, educacionais e de controlo epidemiológico que visam, através de um processo de consciencialização colectiva, levar as taxas de infecção para limites aceitáveis para o tipo de clientela e de procedimentos realizados em cada hospital, (SMELTZER,1994: In In Bruner & Suddarth, 2002).

Os hospitais angolanos, iguais aos demais hospitais do mundo, não estão isentos deste grande inimigo que é a infecção hospitalar, apesar dos muitos esforços. A actualidade deste problema em Angola e a sua indiscutível gravidade, justificaram a necessidade, o interesse e a importância de se realizar um estudo, com o objectivo de identificar os factores que estão no surgimento de infecções em feridas cirúrgicas de pacientes operadas no Hospital Augusto Ngangula, avaliando-se através da técnica de observação directa, os meios e métodos de esterilização, às técnicas usadas no manuseamento do material esterilizado e pacientes, o comportamento dos profissionais face as medidas de biossegurança durante as cirurgias e curativos, assim como as condições da infra-estrutura do bloco cirúrgico, acomodação das pacientes no pós-operatório, entrevistas aos responsáveis da áreas estudadas e revisão dos prontuários.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

Foi realizado um estudo descritivo transversal, prospectivo, com abordagem qualitativa, no Hospital Materno Infantil Augusto Ngangula, nas áreas do bloco operatório e internamento dos serviços de cirurgia, locais onde as probabilidades de infecção hospitalares são maiores em pacientes cirúrgicos. Utilizou-se uma amostragem probabilística estratificada do universo de 784 pacientes submetidas a cirurgias no período em estudo foram investigadas 100 (13%) pacientes que contraíram infecção da ferida cirúrgica e todos profissionais de enfermagem (96) que prestavam assistência nos serviços de bloco operatório, sala de recobro e internamento de cirurgia. O desenho da amostra foi composto três extractos, o primeiro formado pelas infra-estruturas onde funcionam o bloco operatório e esterilização, assim como a área dos serviços de internamento, o segundo pelos profissionais de enfermagem que prestavam assistência tanto bloco operatório como nos serviços de internamento e o terceiro pelas pacientes que contraíram infecção.

Quanto a infra-estrutura foi observado o seu modelo arquitectónico, os materiais e equipamentos, sua funcionalidade, estado de conservação e higiénico e o processamento dos materiais na esterilização com respeito a biossegurança. Com relação aos profissionais, estes foram divididos em três grupos respectivamente anestesistas, instrumentistas e técnicos de enfermagem da área assistencial, aos quais foi observado o seu comportamento com respeito as normas de biossegurança no exercício de suas funções, assim como a aplicação de medidas para a prevenção da infecção da ferida cirúrgica.

Com relação aos pacientes foram monitorizados 68 pacientes desde a sua entrada no bloco operatório até a alta e feita uma revisão dos prontuários de 32 pacientes. Os elementos tidos em consideração para o estudo foram a classificação das cirurgias de acordo grau de contaminação, acomodação ou alojamento das pacientes no pré e pós-operatório. A taxa de infecção foi considerando o número total de cirurgias realizadas no período, excluindo as contaminadas e infectadas aplicando o cálculo somente sobre cirurgias limpas. Tanto a observação da infra-estrutura onde funcionam o bloco operatório, o serviço de internamento de cirurgia, como dos profissionais, foram feitas com conhecimento da direcção do hospital, dos profissionais e chefes dos serviços onde ocorreu o estudo, mas não tiveram acesso ao conteúdo dos instrumentos utilizados para a colheita de dados.

 

RESULTADOS 

  1. OBSERVAÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS

Nas observações feitas para avaliar o modelo arquitectónico do bloco operatório do Hospital Infantil Augusto Ngangula e área de internamento para pacientes cirúrgicos, constatou-se que: 1) O bloco operatório estava situado no rés-do-chão do edifício principal era do modelo americano constituído por onze compartimentos, entre eles, duas salas cirúrgicas geminadas para cirurgias limpas, separadas pela sala de esterilização uma outra sala para cirurgias sépticas, duas salas de recuperação anestésica com capacidade de seis camas cada e um corredor com formato de T que interligava as diversas áreas. Neste corredor também encontrava-se instalado o lavabo para higienização pré-operatória das equipas cirúrgicas e os armários para armazenagem do material esterilizado. É um modelo económico, mas do ponto de vista de segurança contra infecções é altamente desaconselhado pois favorece a contaminação cruzada, 2) A sala de esterilização sem barreiras para separar a área suja - área limpa - área estéril, 3) A secção de cirurgia onde eram internadas as pacientes era constituída por 7 enfermarias e tinha a capacidade de 32 camas. De acordo com estrutura arquitectónica preconizada, á área de internamento deve ter: sala de trabalho para os profissionais, sala de sujos, rouparia, casas de banho para pacientes e profissionais, arrecadação para materiais e equipamentos e área de conforto para profissionais. Todos estes itens não foram encontrados na Instituição.

 

  1. Materiais e EquipamentoS

Quanto ao processamento da roupa e do material cirúrgico, foi observado a ausência de protocolos relativo as normas universais de biossegurança, desde a sua preparação até a esterilização. As roupas algumas vezes eram dobradas ainda húmidas e colocadas nas latas para serem esterilizadas. Quanto aos instrumentais estes não eram escovados durante a lavagem para remoção de resíduos, nem desinfectadas nem enxugadas antes de serem empacotadas e colocadas no autoclave ou estufa. Com relação ao estado de conservação e higiénico dos materiais, roupas e equipamentos estão espelhados nas tabelas nºs.1, 1A e 2. Durante os actos cirúrgicos era habitual observar-se a circulação (entrada e saída) nas salas de pessoas mesmo com suas vestes normais, as portas constantemente abertas, expondo deste modo os pacientes ao risco de contraírem infecções hospitalares.

 

Tabela nº 1. Estado de conservação do material no Bloco Operatório do Hospital Augusto Ngangula. Julho a Dezembro de 2004

Itens observados
   Em bom estado de conservação       
 %
Em mau estado de%conservação
Caixas para material
4
100
0
0
Campos cirúrgicos
4
27
11
73
Pinças
  0
0
48
100
Batas cirúrgicas de tecido
5
28
13
72
Propés de tecido
2
33
4
67
 
 
 
 
 
               

 

Tabela nº 1A. Estado higiénico do material no Bloco Operatório do Hospital Augusto Ngangula Julho-Dezembro de 2004

Itens observados
   Em bom estado higiénico
 %
Em mau estado                 higiénico             %
Caixas param material
4
100
0
0
Campos cirúrgicos
4
27
11
73
Pinças*
  0
0
48
100
Batas cirúrgicas de tecido
5
28
13
72
Propés de tecido
2
33
4
67
 
 
 
 
 
               

*As pinças haviam perdido a sua coloração original apresentando uma coloração escura, com manchas de queimadura.

Tabela nº 2. Estado de funcionamento e de conservação dos equipamentos no bloco operatório e sala deesterilização do Hospital Augusto Ngangula Julho-Dezembro de 2004.

 

 
Em funcionamento
%
Avariado mas em uso
%
Inoperante 
%
Bem conservada 
%
Mal conservada
%
Mesas cirúrgicas*
0
0
3
100
0
0
0
0
3
100
Aspiradores 
2
100
0
0
0
0
2
100
0
0
Autoclaves 
1
50
0
0
1
1
2
100
0
0
Estufas 
2
67
 
 
1
33
3
100
0
0
Armários
2
100
0
0
0
 
2
100
0
0
Colchões
12
100
0
0
0
0
8
80
4**
20
Camas 
12
1000
0
0
0
0
12
100
0
0

 

*As mesas eram articuladas, e encontravam-se presas com sistemas de soro para manter o equilíbrio das mesmas, ademais completamente sujas com vestígios de sangue ressequido demonstrado a falta de higiene. ** Encontrava-se se resguardo e sujos com sangue.

As tabelas nºs 3, 4 e 5, mostram os resultados obtidos da observação dos profissionais de enfermagem que prestavam assistência no bloco operatório (instrumentistas e anestesistas) e salas de internamento (prestador de cuidados).

  1. COMPORTAMENTO DOS PROFISSIONAIS

Tabela nº 3. Observação directa dos anestesistas no Bloco Operatório.

Anestesistas 
Itens observados
Sim
%
Não
%
Usam paramentação específica nas zonas restritas
0
0
16
100
Calçam as luvas empregando a técnica correcta
0
0
16
100
Orientam ou fazem a desinfecção do material de aspiração após cada procedimento
1
6
15
94
Trocam de uniforme quando se ausentam do Bloco operatório.
0
0
16
100
Orientam a limpeza do ambiente
3
19
13
81

 

A tabela seguinte mostra os resultados obtidos da observação do comportamento dos instrumentistas no exercício de suas funções.

 

Tabela nº 4. Observação directa dos Instrumentistas no Bloco Operatório do Hospital Materno Infantil Augusto Ngangula de Julho a Dezembro de 2004.

 

Instrumentistas
Itens observados 
Sim
%
Não
%
Usam paramentação específica nas zonas restritas
0
0
41
100
Calçam as luvas empregando a técnica correcta
0
0
41
100
Lavam as mãos antes de realizar os procedimentos entre os pacientes na sala de recobro
0
0
41
100
Lavam as mãos depois de realizar os procedimentos entre os pacientes na sala de recobro
41
100
0
0
Fazem os cuidados da manha aos pacientes e limpeza terminal das camas?
15
37
26
63
Orientam ou fazem a limpeza do meio ambiente
15
37
26
63
Fazem a desinfecção do material cirúrgico
20
49
21
51
Trocam de luvas entre os procedimentos na sala de recobro
0
0
41
100
Trocam de luvas entre os pacientes na sala de recobro
28
68
13
32
Trocam de uniforme quando se ausenta do Bloco operatório.
0
0
41
100
Administram a medicação dentro dos horários prescritos.
10
24
31
76
Depositam a roupa usada durante a cirurgia em local apropriado
0
0
41
100

 

A tabela que se segue mostra os resultados obtidos na observação dos profissionais de enfermagem na secção de internamento do paciente cirúrgico.

 

Tabela nº 5. Observação directa dos profissionais de enfermagem na secção de cirurgia (internamento).

 

Itens observados
Sim
%
Não
%
Calçam as luvas empregando a técnica correcta
2
5
37
95
Lavam as mãos antes de realizar os procedimentos entre os pacientes na sala de recobro.
0
0
39
100
Lavam as mãos depois de realizar os procedimentos entre os pacientes na sala de recobro.
39
100
0
0
Fazem os cuidados da manha aos pacientes e limpeza terminal das camas?
0
0
39
100
Orientam ou fazem a limpeza do meio ambiente
14
36
25
64
Fazem a desinfecção e esterilização do material cirúrgico utilizado nos curativos.
0
0
39
100
Trocam de luvas entre os procedimentos no mesmo paciente.
6
15
33
85
Trocam de luvas entre os pacientes durante o curativo.
32
82
7
18
Esterilizam as compressas para o curativo.
18
46
21
54
Lavam, desinfectam e esterilizam o material após o curativo.
15
38
24
62

 

  1. Análise da Inspecção, Monitorização de Pacientes e Revisão dos Prontuários

     Durante o estudo observou-se que as pacientes admitidas no bloco operatório tinham como porta de entrada o banco de urgências e sala de partos. Dos serviços acima referidos, as pacientes eram encaminhadas para o bloco operatório com a tricotomia, algaliação e acesso venoso efectuadas. Na sala pré-operatória independentemente do estado higiénico e condição clinica de cada uma, eram alojadas duas pacientes na mesma cama e chegavam a permanecer mais de seis horas aguardando a cirurgia. Não eram submetidas a qualquer processo de higienização.

Após a cirurgia as pacientes permaneciam nas sala de recobro que também funcionava como sala de cuidados intensivos de 12 a 24 horas conforme a necessidade de cuidados especiais que o caso exigisse por falta de área de cuidados intensivos, sob responsabilidade dos instrumentistas. Enquanto permanecesse nesta sala elas estavam expostas a potencial infecção pois os cuidados com a higiene corporal nem sempre eram efectuados, acrescida a violação das normas de biossegurança por parte dos profissionais durante procedimentos principalmente durante os curativos, onde a mesma luva servia para retirar as compressas do pacote e efectuar o curativo em várias pacientes (tabela nº 4).

No internamento, as pacientes eram acomodadas duas a três na mesma cama junto os respectivos recém-nascidos. Apesar dos pacientes serem obrigadas a adquirirem luvas esterilizadas para a sua assistência, ainda observava-se, por parte dos profissionais, o manuseio de mais de uma paciente com o mesmo par de luvas, expondo-as a infecção cruzada (tabela nº 5), de forma que as pacientes começavam a apresentar sinais de infecção, como febre, supuração da ferida a partir do terceiro dia (72h) pós-operatório, dados que não eram registados na maioria dos prontuários pelos membros da equipa de saúde.

Quanto ao grau de contaminação das cirurgias efectuadas que foram classificadas como limpas, observou-se em 41% (tabelanº 6), por critério de exclusão as demais cirurgias foram desconsideradas. Destas 25% infectaram (tabela 6).Quanto a topografia da infecção os resultados estão apresentados na tabela 6A.

 

Tabela nº 6. Incidência das infecções cirurgicas segundo o potencial de contaminação

Classificação das cirurgias efectuadas*
Nº de cirurgias
Incidencia de infecções 
Limpas
321 (41%)
79 (25%)
Potencialmente contaminadas
269
11 (4%)
Contaminadas
186
8 (4%)
Infectadas
8
2 (25%)
Total
784
100

*Critérios de exclusão: cirurgias contaminadas, potencialmente contaminadas e infectadas

 

Tabela 6A.Frequencia segundo a topografia das infecções.

Topografia da infecção               Nº               %
Incisional ou superficial
75
95
Planos profundos e órgãos
4
5
Total 
79
100

 

 

DISCUSSÃO

 

Neste estudo constatou-se que a estrutura arquitectónica do bloco operatório era de um modelo americano e actualmente é desaconselhado devido a sua ligação directa entre as áreas consideradas estéreis com a área suja e dos expurgos. Outro inconveniente é ter um único acesso, já pouco usado pelo favorecimento da promoção de infecções conforme espelhado nos resultados apresentados. Em geral a planta deve ter um acesso para entrada e saída de macas, outra para circulação das equipas de profissionais e o terceiro para circulação dos resíduos e material para descarte. Se considera conveniente que a saída não se faça no mesmo sítio de entrada para evitar a contaminação.

Na área de internamento, as pacientes eram acomodadas duas a três na mesma cama o que pode ter favorecido o surgimento de infecções em feridas cirúrgicas naquela unidade além da carência dos insumos exigindo que o próprio paciente traga luvas entre outros insumos.

A tendencia actual é que cada paciente ocupe suaa unidade, é dizer seu quarto. (Gandsas,1984).

Geralmente em procedimento limpos a causa da infecção da ferida é por microorganismos exógenos.No presente estudo, o índice de cirurgia classificada limpas foi de 41%, o mesmo corrobora com o encontrado por Ferraz et al. (2001), que foi de 41,9%. Das pacientes que foram submetidos a este tipo de cirurgia 24,6% desenvolveram infecção da ferida cirúrgica, corroborado por Farber et. al. (1981); Leape et. al. (1991) & Wey et. al. (1989) ao afirmarem que infecção da ferida cirúrgica constitue a segunda infecção hospitalar mais frequente e responsável por 24% de sua totalidade.

As infecções de sítio cirúrgico (ISC) são as infecções hospitalares mais comumente encontradas em pacientes cirúrgicos e ocupam o terceiro lugar entre outros sítios de infecção. Elas contribuem em 14 a 16% de todas as IH nos EUA (Horam et. al., (1993, p. 75), & Mangram et al., (1999, p. 250).

 

Factores encontrados e analisados

O País não possui Legislações específicas para a arquitectura hospitalar, considerando as suas especificidades cada vez mais exigentes, o que permite as Instituições seguirem modelos arquitectónicos diversos e ultrapassados. A estrutura física deve contribuir, através de barreiras e fluxos adequados a contenção da transmissão de contaminação pois a arquitectura e a engenharia hospitalar muito tem a oferecer na luta contra a infecção hospitalar.

Observou-se também a ausência de normatizações para o funcionamento dos hospitais voltada para a segurança do paciente conforme orienta a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente da OMS pela Assembleia Mundial da Saúde em Outubro de 2004 (WHO, 2004).

A carência de insumos e a utilização inadequada dos mesmos põe-se como um factor de risco para a realização dos procedimentos assistenciais seguros para com os pacientes e o estudo mostrou evidências claras destes pontos que favorecem a ocorrência das infecções.

O comportamento dos profissionais revelou uma desinformação total sobre o uso correcto das medidas de protecção e prevenção da transmissão cruzada de microorganismos no ambiente hospitalar.

A primeira medida para reduzir as infecções hospitalares e a disseminação da micro-organismos multirresistentes é a lavagem das mãos. Para além desta medida prioritária, o uso das precauções padrão e específicas são a segunda medida prioritária (World Health Organization – WHO. Guidelines on Hand Hygiene in Health Care (Advanced Draft). Geneva. 2005). – WHO, (2005).

 

CONCLUSÕES 

 

Concluímos que o modelo arquitectónico do bloco operatório, da área de esterilização e de internamento do Hospital Materno Infantil Augusto N’Gangula está fora dos padrões recomendados actualmente, que a carência dos insumos, , o comportamento dos profissionais em relação a observância de normas de biossegurança no manuseio dos instrumentais e materiais ainda está muito aquém do preconizado o que tornou a assistência ao paciente um risco para a contaminação cruzada.

Atendendo à outros factores que estão na origem do surgimento de infecções de feridas cirúrgicas estão o mau estado higiénico e de conservação do dos materiais e equipamentos no bloco operatório e a forma de acomodação das pacientes na área de internamento são igualmente factores que contribuíram para o surgimento de infecções em feridas cirúrgicas de pacientes operadas.

 

RECOMENDAÇÕES

 

  1. A formação permanente para os profissionais deve ser considerada um investimento para uma melhor adesão às normas de biossegurança, para a melhoria nos procedimentos realizados no bloco operatório, área de esterilização e internamento.
  2. O amadurecimento do Comité Técnico de Biossegurança e Comissão de Controlo de Infecção deverá ser incentivado pela alta Direcção da Instituição para instituir e sustentar medidas de prevenção da ocorrência das infecções de sítio cirúrgico.
  3. A adequação da estrutura física e melhoria dos fluxos de trabalho dentro destas áreas é elementar para promover um ambiente de trabalho seguro para o paciente e para o trabalhador da Instituição.
  4. O País deverá criar Legislações e Normatizações para a Área Hospitalar de forma a construir estruturas de saúde com barreiras, protecções, meios e recursos - físicos, funcionais e operacionais que favoreçam o controlo da contaminação intra hospitalar principalmente no que se refere às áreas críticas como Bloco Operatório e Central de Esterilização e as áreas semi críticas como Internamento, Banco de Urgências, Recobro e UCI.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

 

  1. Farber, B.F: Kaiser, D.L, WenzeL, R.P., (1981). Relaciotion between surgical volume and incidence of postoperative wound infection. N. Engl. J. Med. V.305, p.200-204.

 

  1. Ferraz EM, Ferraz AAB, Bacelar TS, D.Albuquerque HST, Vasconcedlos MDMM, Leão CS, (2001). Controle de infecção em cirurgia geral . resultado de um estudo prospectivo de 23 anos e 42.274 cirurgias. Rev Col Bras Cir; 28: 17-26.

 

  1. Gandsas , Mário, (1982) Fundamentos de Enfermaria Quirúrgica e Instrumentacion, 3ª edição, Reimpression1984, Librera El Ateno Editora, Buenos Aires, Argentina. pp: 112-115.                    

 

  1. Horan TC, Culver,D.H.; Gaynes, R,P.; Jarvis W.R.; Edwards, J.R., Reid C.R., (1993). National nosocomial infections ; surveillance (NNIS) system. Nosocomial infectionvin surgical patients in de United States, January 1986-june 1992. Infect. Control Hosp. Epidemiol. v. 14, p. 73-80.

 

  1. HOWARD, P. J.(1996). Controle de Infecção Hospitalar: normas e procedimentos práticos. São Paulo: Santos.

 

  1. http://www.att-gestio.com\ asepsia e antisepsia.htm. 24.06.04, 9h.47m.

 

  1. Leape, L.L., Brennam,S.F., Jjeffrey, P.J.,(1990). The importance of surveillance aftaer discharge from hospital in diagnosis of postoperative wound infection.Ann Royal. Coll. Surg. Engl. V.,72. P. 207-209.

 

  1. Mangram AJ, Horan TC, Pearson ML, Silver LC, Jarvis WR.,(1999). Guideline for Prevention of Surgical Site Infection, 1999. Infect Control Hosp Epidemiol; 20(4): 250-78.

 

  1. MACHADO, Sidnei.(2001). O direito a proteção no ambiente de trabalho. São Paulo: Manole.

 

  1. World Health Organization (WHO, 2004). Practical Guidelines for Infection Control in Healthcare Facilities.. Disponível em: http://www.who.int/water_sanitation_health/emergencies/infcontrol/en/index.html [acesso em 04/11/2004]

 

  1. World Health Organization (WHO, 2005). Guidelines on Hand Hygiene in Health Care (Advanced Draft). A Summary. Geneva. 2005

 

  1. SMELTZER, Suzanne C., BARE, Brenda G.. Enfermagem Médico-Cirúrgica. Guanabara Koogan. 7ª ed.. volume 1. 1994.