EXISTE CETICISMO EM DESCARTES?

Francisco Eduardo Neto Filho[1]

 

RESUMO: Neste presente artigo está presente a discussão do ceticismo em Descartes, existe? Se existe como, por que, de que forma? Descartes através de seu método de dúvida consegue elucidar uma forma de se fazer pensamento, de se fazer história. É através do que este grande autor fez que poderemos chegar a uma verdade, verdade alcançável para Descartes diferentemente da verdade inalcançável dos céticos absolutos.

PALAVRAS – CHAVE: Ceticismo; Verdade; Racionalismo.

INTRODUÇÃO

            No ceticismo, podemos comprovar que não há uma verdade absoluta, não existe a possibilidade de verdade, Descartes em seus estudos colocou em questão, em dúvida, tudo o que tinha recebido como verdadeiro, grandes situações que podem condená-lo a ser um cético, mas pela a forma como ele duvidava, onde pretendia e acreditava chegar a uma verdade, descartamos a possibilidade de ser um cético.

Ele acreditava fielmente naquilo que confiava, até querer estabelecer um método onde se pudesse colocar esses conhecimentos que até então acreditava na dúvida para concluir serem verdadeiros realmente ou não, e tranquilamente sem se abalar Descartes o põe em dúvida, e assim estabelece o método Cartesiano para se chegar a uma verdade indubitável, onde pela regra geral de Descartes, devemos colocar nossos juízos limitados apenas a acreditar naquilo que for claro e distinto, onde em tudo que eu o provo ele passa por verdadeiro.

Ora não foi fácil para Descartes encontrar um método que se pudesse estabelecer uma regra para se chegar a verdade, simplesmente ele duvidou daquilo que o rodeava e assim pode encontrar respostas, não todas verdadeiras, mas que pudessem comprovar de que duvidando podia se comprovar a veracidade de tudo.

Através dessa regra geral estabelecida por Descartes se pode perceber como podemos fugir do erro, mas que ele ainda acontece, e ele explica isso através de conhecimento inseguros que tomamos como fundamentos, ideais, ou até mesmo ideias, e que nos indicam ao erro sem ao menos nos darmos conta que estamos errando, ou praticando o erro. Assim devemos nos cumular de conhecimentos seguros, em que eu possa comprová-los serem verdadeiros, para que tudo aquilo que possa usufruir desses conhecimentos se torne também como verdadeiros.

É bastante interessante incluir um filósofo como Descartes em investigações como as que estamos fazendo, pois nossa razão o entende como um grande racionalista que faz com que o nosso pensamento se acumule apenas do que é correto, e é claro sempre duvidando para se chegar a alguma verdade e não desacreditando em tudo e até mesmo na verdade.

1. CETICISMO

            Ceticismo vem do grego e significa exame, onde se examina e investiga e que demonstra ser impossível alcançar o total conhecimento de algo ou alguma coisa, impossível assim de chegar a uma verdade total. Existem vários tipos de ceticismo, por exemplo: Ceticismo absoluto, o qual é impossível apreendermos o objeto, não existindo assim nenhum conhecimento verdadeiro; Ceticismo mitigado: Não podemos dizer se este ou aquele juízo é ou não verdadeiro, podemos apenas dizer se é provável ou não; Ceticismo metódico: Um meio para alcançar a verdade, utilizando a dúvida; Ceticismo metafísico: destaca que é impossível conhecermos tudo o que ultrapassa a nossa experiência sensível.

2. CETICISMO EM DESCARTES

            Em Descartes podemos observar que existem grandes questionamentos que possibilitam a nossa compreensão questionamentos que ultrapassam o limite da razão e até não existir verdade para esses questionamentos. Existindo o ceticismo, grande corrente dentro da história da filosofia que trata de alguns pensadores que desacreditam existir uma verdade sobre algo ou alguma coisa, e que podemos relacionar essa corrente as investigações e questionamentos do Filósofo em questão: René Descartes.

            Em sua obra: Meditações, Descartes inicia um processo de procura a todos os lados para comprovar o que está em sua volta e o que realmente era a verdade. Em relação ao ceticismo uma primeira forma de ceticismo nas meditações seria:

“Tudo o que, até o presente, aceitei como mais verdadeiro e certo, fiquei sabendo pelos sentidos ou através deles. Mas posso provar que algumas vezes os sentidos me enganam, e que é sábio não confiar inteiramente em algo que já alguma vez nos enganou”.[2]

                Assim Descartes transmite uma forma cética de pensar de não podermos acreditar nos próprios sentidos que nos inserem informações. Mas como o próprio autor falou, não podemos confiar nos sentidos pois comprovamos que já nos enganaram e que podem muito bem nos enganar sempre e é claro nos confiarmos firmemente neles. O segundo argumento cético de Descartes seria:

“Devo lembrar que sou um homem, e, como tal, tenho o hábito de dormir. Durante meu sono, frequentemente sonho, e no sonho tenho impressões semelhantes às que pessoas insanas têm quanto estão acordadas, ou até mesmo mais prováveis. Quantas vezes já não me ocorreu, em sonhos, que eu estivesse em determinado lugar, vestido de tal maneira, sentado próximo à lareira, quando, na realidade, estava na cama, dormindo. No momento presente, realmente me parece que é com olhos despertos que vejo este papel, que a cabeça que movimento não está adormecida, que é deliberada e intencionalmente que estico meu braço e vejo minha mão. O que acontece durante o sono parece não ser tão claro e distinto como as impressões que estou tendo agora. Mas ao pensar sobre tudo isso eu me relembro de que, em muitas outras ocasiões, tive ilusões semelhantes, enquanto dormia. Examinando cuidadosamente essas lembranças, concluo que, manifestamente, não existem indicações certas pelas quais possa claramente distinguir as impressões que tenho, quando acordado, das que pareço ter, enquanto durmo, e fico confuso. E minha confusão é tal que sou quase capaz de me persuadir que no momento estou sonhando”.[3]

            Aqui Descartes entra cada vez mais m um beco sem saída, ora, os sentidos nos enganam e são os próprios sentidos que nos transmitem informações necessárias, então são os próprios sentidos que neste momento podem estar nos enganando; em relação ao sonho um argumento bastante radical podendo assim dizer que provoca em nós uma grande dificuldade: quem nos garante que neste momento possa eu estar sonhando, estando neste momento convencido do que disse? O próprio autor comenta estar mais distante de algo verdadeiro i indubitável, por conta de incertezas encontradas. O terceiro argumento cético seria quando Descartes enuncia que “dois mais três sempre serão cinco” ou que “um quadrado sempre terá quatro lados”, parece ser tão óbvio, independente dos sentidos, independente se estou acordado ou dormindo, mas Descartes quer encontrar testar a veracidade das coisas, dos argumentos, daí ele sabendo da existência de um ser maior e superior: Deus, que tudo pode e que pode me enganar, e sempre me mostrar que dois mais três sempre será cinco e de que um quadrado sempre terá quatro lados; temos aqui o auge da Dúvida de Descartes, o ponto extremo em que ele generaliza sua dúvida.

            Estamos tratando, portanto do ceticismo em Descartes; tudo o que foi relatado até agora, inclusive as citações do próprio autor, mostra-se como uma forma de ceticismo, mas Descartes jamais quis ser um cético ou fazer de suas investigações um ceticismo, Descartes em tudo o que colocava em dúvida, em questionamento, queria apenas validá-lo, acreditando, pois assim existir uma verdade, e é claro que podemos chegar a uma verdade. Comprovamos isso quando Descartes encontra sua primeira certeza, onde não pode duvidar de que é capaz de duvidar, e ninguém pode enganá-lo neste sentido, portanto se duvidamos, comprovamos que existimos. Por isso não há um ceticismo em Descartes, mas sim uma forma de se chegar a uma verdade existente colocando em dúvida tudo o que for incerto para ser validado e ter uma verdade certa e indubitável.

3. CETICISMO METÓDICO

            Estamos abordando o ceticismo sobre René Descartes, então se deduz que existe sim ceticismo em Descartes, mas tendo em mente que seja um ceticismo diferente do que se tem como ideia o Ceticismo em si. O ceticismo em Descartes demonstra ser uma das melhores formas de descobrir a verdade e/ou o erro. A dúvida é o melhor instrumento para isso, devemos pôr em dúvida tudo aquilo que até mesmo nos pareça real, masque não temos argumentos para sustenta-lo e pauta-lo em demonstrações. Como então chegar a verdade? É por isso então que o autor se desfaz de tudo o que aprendeu para examinar e decidir qual caminho percorrer.

            Os sentidos, a forma de apreendermos a tudo o que está a nossa volta foi o primeiro elemento que o autor duvidou, assim ele fez um longo caminho em busca do que é realmente necessário, essencial, verdadeiro. Aquilo que eu não posso duvidar se dá através de sua clareza e de sua distinção, onde não tem como eu duvidar daquilo que está claro, visível e perceptível não ser de outra forma. Descartes também destaca o porquê de durante nossa vida não questionarmos aquilo que acreditamos, com toda confiança acreditamos e pronto.

4. PORQUÊ ACREDITAR NAQUILO QUE ACREDITAMOS?

            Descartes observa que recebera muita coisa, muito conhecimento tido como correto e verdadeiro e sem mais delongas acreditado e confiando que não se podia questionar, pois era necessário adquirir estes conhecimentos. Acreditamos naquilo que acreditamos por necessidade, pois devemos confiar em algo, Descartes nos ensina a colocar aquilo que apreendemos como certo e indubitável em questão e assim avaliar como verdadeiro ou não, não como um cético, mas como alguém que deseja chegar a verdade correta, onde não podemos duvidar de forma nenhuma.

“Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto; de modo que me era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente desde os fundamentos, se quisesse estabelecer algo de firme e de constante nas ciências. Mas, parecendo-me ser muito grande essa empresa, aguardei atingir uma idade que fosse tão madura que não pudesse esperar outra após ela, na qual eu estivesse mais apto para executá-la; o que me fez diferi-la por tão longo tempo que doravante acreditaria cometer uma falta se empregasse ainda em deliberar o tempo que me resta para agir”.[4]

            Vemos que Descartes quis chegar primeiramente a uma idade mais madura e pronta a iniciar um novo processo de reconhecimento de princípios, opiniões, valores etc. Podemos então como Descartes nos apoiar na dúvida, para se chegar a uma verdade até mesmo daquilo que acreditamos e confiamos ser verdade, para confiar e acreditar naquilo que é indubitável.

5. RACIONALISMO EM DESCARTES

            Descartes é considerado um racionalista nato, pelo fato de duvidar e pensar acerca de tudo, a ideia de ceticismo é então perdida para dar espaço ao racionalismo fortemente presenciado na filosofia moderna. É entendido assim que para se chegar uma verdade não é necessário uma descrença, uma dúvida cruel e perseverante, mas uma desconfiança em que se descobre uma verdade através do pensamento do racional. Levando em conta também o dualismo cartesiano a substância pensante (res cogitans) em que está ligada ao pensamento a consciência; e a substância extensa (res extensa) que corresponde ao mundo material, corpóreo.

6. VERDADE E O ERRO NA IV MEDITAÇÃO METAFÍSICA DE DESCARTES

            Pela regra Geral dada por Descartes podemos concluir que o método para se chegar a uma verdade indubitável é: limitando os nossos juízos apenas as ideias claras e distintas, servindo como um meio para não errar; então como é possível o erro? Pode-se dizer que a investigação cartesiana acerca da natureza do erro na IV meditação desenvolve-se em três hipóteses: este é um efeito de um poder que Deus deu às criaturas; ou é fruto de uma negação; ou de uma privação.

            A que Descartes mais aceitaria como fundadora do erro seria a terceira hipótese, em que Descartes, através deste conceito de privação, defende que, por um lado, a substância pensante, enquanto tal, deveria pensar clara e distintamente todas as ideias que possui, mas, por outro lado, por ser criatura, é um ser finito e, portanto, não é isso o que ocorre e, portanto, há o erro. Assim, não é que nos negaram uma faculdade que pudesse evitar o erro, mas sim nos falta conhecer e muitas vezes conhecemos nos enganamos e erramos.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É possível perceber o grande potencial de Descartes, de suas discussões acerca do que está correto e do que está errado, é muito interessante destacar a preocupação dele com a tradição histórica do que ele aprendeu durante sua vida e que não desprezou de forma alguma para se firmar em outras coisas, mas utilizou o melhor método já descoberto e por ele: a dúvida; colocando tudo em dúvida pode-se comprovar ser verdadeiro ou não e desta forma se firmar naquilo que é verdadeiro naquilo de que não se pode duvidar.

REFERÊNCIAS

DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo, Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores).

DESCARTES, René. Discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes, 1996.



[1] Aluno da Universidade Estadual Vale do Acaraú do Curso de Filosofia Bacharelado, cursando o 5º Período.

[2] DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo, Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores). P. 93-94.

[3] DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo, Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores). P. 94.

[4] DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo, Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores). P. 93.