SINOPSE DO CASE:Execução por quantia certa fundada em título extrajudicial[1]

Lavínia Feitosa Silva Assunção[2]

Carlos Eduardo Cavalcanti[3]

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Calebe e Moabe decidem comprar 50% das quotas da empresa Betsaida. Em fevereiro, assinam um Protocolo de Intenções juntamente com duas testemunhas. Durante o acordo, Calebe repassou 200 mil à concedente. Porém, ao examinar a situação contábil-financeira, percebeu que a empresa estava à beira da falência. Constatando que seria inviável seu ingresso na empresa, desiste do negócio. Maabe, proprietário de 100% das quotas da empresa, entra com uma ação de execução fundada no Protocolo de Intenções. Depois de penhoras frustradas, e a entrada de um Embargo do Devedor por Calebe e Raabe, o juiz decide pela suspensão da execução, alegando que o Protocolo não tem natureza executiva, e que, Maabe e Calebe não tinham legitimidade para constarem no polo ativo e passivo da execução. Diante disso, indaga-se e este título é líquido, certo e exigível?

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

2.1 O título apontado na inicial é líquido, certo e exigível?

De acordo com o novo Código de Processo Civil, em seu artigo 784, são títulos executivos extrajudiciais: “[...] II- a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; III- o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas testemunhas); [...]”. Sendo assim, identifica-se que o instrumento utilizado para firmar o acordo entre Calebe e Moabe, o Protocolo de Intenções, mencionado na descrição do caso, é um título executivo extrajudicial.

Entende-se que, no título executivo extrajudicial, assim como no judicial, a obrigação precisa ser líquida, certa e exigível. Quanto à certeza, é relacionadaà formação da obrigação. Com a leitura do instrumento, identificam-se os sujeitos, sua forma e o objeto da prestação (MARINONI, p. 442). Sendo assim, constata-se a certeza do Protocolo de Intenção, pois nele estão contidos os contornos da obrigação assumida.

Quanto à liquidez:

Quanto à liquidez do título extrajudicial, é usual afirmar que estes títulos devem ser líquidos em sua origem, não admitindo procedimento ulterior de liquidação. Em rega, esses títulos devem expressar, imediata e diretamente, o valor da prestação devida ou ao menos indicar os critérios para a pronta definição desses elementos. Assim, em princípio, ou estes títulos apresentam de maneira clara a importância devida ou apontam instrumentos claros e objetivos para a obtenção deste montante. A necessidade de submeter o título a este procedimento – desde que simples e direto- para a apuração do quantum debeatur não lhe retira a liquidez ou, consequência, a sua exequibilidade. (MARINONI, p. 443)

Como explicita o doutrinador Marinoni, a liquidez se refere ao valor, ou caso não mencionado, é necessária a apuração dessa quantia ilíquida, para que se torne líquida, e então preencha o requisito do título. De acordo com o caso descrito, identifica-se a quantia acordada entre Calebe e Moabe, que se trata de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), sendo que R$ 200.000,00 já haviam sido pagos por Calebe, antes da desistência do acordo feito por eles.

E por fim, quanto à exigibilidade, “ela estará presente no momento em que for possível impor ao executado a prestação constante do título” (MARINONI, p. 442). Ou seja, o devedor deixa de cumprir sua obrigação em tempo hábil, e torna-se inadimplente, permitindo que, o credor entre com ação de execução para o cumprimento da obrigação.

No caso em questão, primordialmente, vale destacar o enunciado do artigo 206, do Código Civil:

Prescreve:

§5º- Em cinco anos: I- a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular; II- a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato; III- a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo. (BRASIL, 2002)

 

Sendo assim, constata-se que o prazo para a execução do título fundado no Protocolo de Intenções prescreveu. Pois a assinatura do instrumento ocorreu em Fevereiro de 2010, e a ação foi ajuizada em 18 de março de 2016. Passado 5 anos, o titulo prescreveu, de acordo com Código Civil. Sendo assim, o título extrajudicial não apresenta os requisitos necessários.

3. PERGUNTAS SECUNDÁRIAS

3.1 O princípio do devido processo legal foi observado no feito?

O princípio do devido processo legal não foi obedecido no caso em questão. Primeiramente, expõe a Constituição Federal, em seu artigo 5, inciso LIV: “ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Em conformidade, ordena o Código de Processo Civil, em seu artigo 332, §1: “o juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição”.

Observado esses dois pontos, e contextualizando com o caso em questão, observa-se que foi ferido o princípio do devido processo legal, uma vez que o título já estava prescrito. Sendo assim, o juiz poderia ter indeferido o pedido liminarmente, porém, realizou tanto a penhora on-line, quanto a tentativa de penhora dos bens do devedor.

3.2 Seria possível a penhora de direitos do devedor sobre bem financiado via contrato de alienação fiduciária? Caso positivo, qual a medida cabível em face da decisão de indeferimento da penhora?

De acordo com o artigo 835, do Código de Processo Civil, é possível a penhora de direitos do devedor sobre bem financiado via contrato de alienação fiduciária. Assim expõe:

A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: I- dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; [...] §2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento. (BRASIL, 2015)

Contra o indeferimento da penhora, cabe agravo de instrumento. Pois, conforme expressa o artigo 1015, do Código de Processo Civil, cabe agravo de instrumento em: “decisões interlocutórias proferidas nas fases de liquidação e de cumprimento de sentença e no processo de execução” (BRASIL, 2015).

3.3 Qual o(s) prazo(s) prescricional (ais) aplicáveis?

Quanto aos prazos, para a execução do título, aplica-se o artigo 204, do novo Código Civil, que legisla que:

Prescreve:

§5º- Em cinco anos: I- a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular; II- a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato; III- a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo. (BRASIL, 2002)

Por se tratar de um Protocolo de Intenções, que no caso, é um instrumento particular, o prazo para o credor ingressar em juízo, e exigir o cumprimento da obrigação, é de 5 (cinco) anos.

Quanto à realização da penhora, de acordo com o artigo 829, do Código de Processo Civil:

O executado será citado para pagar a dívida no prazo de 3 (três) dias, contado da citação.§ 1º Do mandado de citação constarão, também, a ordem de penhora e a avaliação a serem cumpridas pelo oficial de justiça tão logo verificado o não pagamento no prazo assinalado, de tudo lavrando-se auto, com intimação do executado.

§ 2º A penhora recairá sobre os bens indicados pelo exequente, salvo se outros forem indicados pelo executado e aceitos pelo juiz, mediante demonstração de que a constrição proposta lhe será menos onerosa e não trará prejuízo ao exequente. (BRASIL, 2015)

Ou seja, o executado será citado para o cumprimento da obrigação, caso descumpra, o prazo para a realização da penhora, é imediato.

3.4 Quais partes envolvidas possuem legitimidade ad causam para a execução e para os embargos?

Legitimidade ad causam consiste na condição de ação, ou seja, legitimidade para propor ação. Segundo decisão do juiz, Betsaida e Raabe não tem legitimidade para figurarem no polo ativo e passivo, respectivamente. De fato, Betsaida não possui legitimidade ad processum para figurar no polo ativo, porém possui legitimidade ad causam. Acerca disso, deverá ser representada, conforme expõe artigo 75, inciso VII do Código de Processo Civil: “Serão representados em juízo, ativa e passivamente: VIII- a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designaram ou, não havendo essa designação, por seus diretores.” (BRASIL, 2015). Sendo assim, identifica-se que, Moabe, representante de Betsaida, possui legitimidade ad causam e ad processum para figurar no polo ativo da ação.

Em relação a Raabe, por ser casada com o regime de comunhão de bens, mesmo sua assinatura tenha sido para mera outorga, possui legitimidade ad causam e ad processum. Conforme dispõe artigo 73, do Código de Processo Civil: “O cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito imobiliário, salvo quando casados em regime de separação de bens”. Por fim, constata-se, em razão da descrição do caso, que Calebe também possui legitimidade ad causam para figurar no polo passivo da ação, além de possuir também, legitimidade ad processum.

3.5 Quais medidas judiciais poderiam ser apresentadas na defesa dos interesses do(s) credor (es)? Com base em quais fundamentos de direito processual e material?

Diante do inadimplemento da obrigação de pagar, preceitua o artigo 774, do Código de Processo Civil: “considera-se atentatória à dignidade da justiça a conduta comissiva ou omissiva do executado que: IV – resiste injustificadamente às ordens judiciais”. Como se sabe, o executado precisa indicar os seus bens, que venham a ser penhorados.

A penhora poderá ser online, como informa o artigo 854 do Código de Processo Civil. E contra o indeferimento da penhora, cabe agravo de instrumento. Pois, conforme expressa o artigo 1015, do Código de Processo Civil, cabe agravo de instrumento em: “decisões interlocutórias proferidas nas fases de liquidação e de cumprimento de sentença e no processo de execução” (BRASIL, 2015).

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código Processo Civil. Disponível em: Acesso em: 10 de outubro de 2016.

BRASIL. Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: Acesso em: 10 de outubro de 2016.

MARINONI, Luis Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz. Curso de Processo Civil: Execução. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

 

[1] Sinopse do Case apresentada à disciplina de Processo de Execução do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 7º período de Direito da UNDB

[3] Professor Esp.