Segundo Leal (2013) o Sistema Financeiro Brasileiro é responsável pela exclusão financeira que se desenvolve no país. A pesquisa “Bancos: Exclusão e Serviços” feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (2011) demonstra que 39,5% da população brasileira está excluída do sistema financeiro e apesar de ter acontecido uma melhora se comparado à situação dos cinco anos anteriores, ainda sim, grande parte da população de baixa renda se encontra excluída desse sistema.  

Outro aspecto citado por Leal (2013, p.44) é a desigualdade e exclusão financeira devido ao seu carácter regional, “enquanto nas regiões mais desenvolvidas economicamente mais de 60% de sua população foi incluída no sistema bancário, as regiões menos desenvolvidas economicamente (Norte e Nordeste) representam cerca de 50%”.

Singer (2003) explica que muitas vezes a exclusão financeira é devido à exclusão de acesso, muitas vezes os próprios bancos criam restrições devido a processos de avaliação de risco ao oferecer seus serviços para a população mais pobre. Rigo (2014, p.48) explica que “a oferta de serviços bancários esta diretamente relacionada com a expectativa de desempenho da economia de um dado território e de seus clientes usuários”. Dessa forma, muitas vezes é difícil obter informações suficientes da população de baixa renda, fazendo com que os bancos restrinjam os recursos para esse público. Os serviços bancários podem também oferecer condicionantes atrelados aos produtos ofertados, não atendendo ás necessidades de quem já é excluído pelo sistema.

Leal (2013, p. 58) acrescenta a “incapacidade de determinados grupos de indivíduos terem acesso a serviços financeiros devido ao valor de comissões e/ou tarifas associadas a produtos e serviços”. Além disso, o autor acrescenta a exclusão por marketing, devido a forma como as vendas e publicidades são direcionadas para atrair determinado publico, alguns segmentos do mercado são excluídos dessa oferta. 

Para Rigo (2014) há também uma parcela da população que por desacreditarem no sistema financeiro, se recusam a procurar os bancos ou instituições bancarias e dessa forma são auto excluídos.

Leal (2013) observa que no desenvolvimento do sistema financeiro brasileiro houve uma concentração dos serviços e do acesso aos recursos, gerando uma grande desigualdade.

Segundo os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (2011), 39,5% dos brasileiros não possuem conta bancária e 40,6% deles desejariam ter. Apesar disso, 73,4% dos que não possuem acesso à conta bancaria acreditam não possuir as condições financeiras necessárias para os bancos.

Cabe apontar que a exclusão financeira não significa apenas a falta de acesso a contas bancárias, mas a todos os produtos e serviços financeiros. Este é o principal fator que caracteriza esse tipo de exclusão. Enquanto a inclusão financeira representa a possibilidade de acesso ao uso de produtos e serviços financeiros, a bancarização significa apenas ter uma conta bancária (simplificada, na maior parte das vezes), sem, contudo, estar incluído financeiramente. (LEAL, 2013, p.47)

Através do acesso ao crédito é possível fazer uma analise por região brasileira. O Grafico 02 apresenta as quantidades de contratos por pessoa física e por região brasileira. É possível observar que as regiões Norte e Nordeste possuem um déficit na oferta  e acesso ao credito, já a região Sudeste e Sul apresentam os melhores indicadores. Leal (2013) aponta que essa observação pode indicar uma preferencia por parte das instituições financeira em ofertar seus produtos nos centros economicamente mais ativos do país. A função social do crédito de inserção econômica fica ignorada nas regiões mais precárias do país.

A partir do gráfico 06 que demonstra o índice de inclusão financeira no Brasil, podemos perceber mais uma vez uma baixa participação da região Norte e Nordeste dentro do sistema financeiro nacional. 

As noções de exclusão financeira apresentadas acima estão associadas à condição de privação, insuficiência ou precariedade de acesso aos recursos financeiros, por dada parcela da sociedade. Segundo essa lógica, na economia de mercado, os recursos financeiros se concentram nos territórios economicamente ativos com a finalidade de favorecer a sua expansão e acumulação às unidades econômicas superavitárias, sejam elas indivíduos ou empresas. (LEAL, 2013, p. 56).

O governo tem papel importante na atuação de combate à exclusão financeira. Singer (2003) diz que o governo pode atuar como facilitador, através de medidas para induzir ações de combate à exclusão, regulamentação do sistema financeiro. Para Barros, Henriques e Mendonça (2001, p.22) o governo deve cumprir seu papel de legislador “criando uma legislação direta que impõem sobre os bancos e outras instituições financeiras, a obrigação de fornecer serviços bancários universais” que atenda todas as parcelas da população.

Leal (2013) ressalte que essa intervenção governamental também pode ser feita por meio de incentivos diretos como isenção fiscal e garantias de crédito, motivando o sistema financeiro a promover a inclusão financeira. Um exemplo disso e a iniciativa  do governo federal que impõe aos bancos que destinem parte de seus depósitos em operações de microfinanças.

Há uma diferenciação entre as respostas de mercado e da sociedade, “as respostas de mercado são caracterizadas pela rentabilidade do capital investido e as respostas da sociedade caracterizadas pela finalidade econômica, as quais buscam o desenvolvimento dos territórios em que as iniciativas são inseridas” (SINGER, 2009, p.44). As respostas da sociedade tem o intuito de democratizar o acesso ao sistema financeiro e dessa forma são criadas algumas instituições baseadas em relações de proximidade e colaboração. Vamos entender um pouco mais sobre essas instituições financeiras solidárias.

ECONOMIA SOLIDÁRIA

A economia solidária é contraria ao individualismo que se prega no mercado  economico.  Para Singer () ela surge como uma forma de reeorganizar o comportamento do mercado de uma forma mais justa e igualitária. França Filho e Laville descrevem como,

 

Uma diversidade de atividades econômicas organizadas segundo os princípios de cooperação, autonomia e gestão democrática, e realizada por cidadãos, produtores e consumidores, entre elas: coletivos de geração de renda, cantinas populares, cooperativas de produção e comercialização, desenvolvimento de software livre, empresas de trabalhadores, redes e clubes de troca, sistemas de comércio justo, organizações de finanças solidárias, grupos de produção ecológica, comunidades produtivas autóctones, associações de mulheres, serviços de proximidade e etc (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004).

Santos () explica que os princípios da economia solidária não impedem o normal funcionamento do mercado, dessa forma as organizações solidárias se inserem no movimento econômico presente, mas propõem uma diferença de valores intrínsecos. Na formação dessas redes solidárias os trabalhadores associados se juntam por criarem laços morais, dessa forma eles são capazes de se adaptarem ás condições de instabilidade que a economia proporciona.

Leal (2013) acredita que os movimentos de economia solidária transformam as relações econômicas, pois os meios de produção e rendas obtidas nas trocas e comercialização dos produtos e serviços gerados são distribuídos de forma democrática. A visão do lucro individual é submetida à ideia de geração de valor para o conjunto e dessa maneira há um crescimento “dos benefícios sociopolíticos, como o aumento da cidadania e da participação dos trabalhadores dessas iniciativas” (LEAL, 2013, p. 82).

Búrigo () explica que a economia solidária proporciona uma forma de gestão e participação coletiva para enfrentar os problemas causados pela exclusão. As pessoas se mobilizam para agirem em beneficio dos problemas sociais, visando superar as condições precárias e de acesso desigual aos recursos.

FINANÇAS SOLIDÁRIA

As finanças solidárias são movimentos da economia solidária que possuem o intuito de democratizar as práticas econômicas, dessa forma são criadas estruturas socioeconômicas que prestarem serviços financeiros para a população que é excluída do mercado.  Leal (2013, p. 81) acredita que “as finanças solidárias podem ser consideradas como uma ferramenta para apoiar a consolidação de práticas econômicas que não estariam identificadas com as praticas do mercado autorregulado, portanto, um tipo de finanças que pode contribuir para gerar novas estruturas econômicas”.

Há uma reconfiguração do sistema financeiro, onde as relações entre produtores, intermediários e consumidores são alteradas. Rigo () interpreta as finanças solidárias como sendo uma forma alternativa de democratização do sistema financeiro, onde os produtos financeiros oferecidos são adequados às necessidades básicas da população e ás suas realidades sociais. O intuito é de favorecer àqueles que são excluídos do sistema bancário tradicional, proporcionando um desenvolvimento mais integrado e sustentável.

 

Os envolvidos nas ações de finanças solidárias são, em geral, organizações de natureza comunitária, cuja participação democrática e a busca pela satisfação das necessidades dos seus usuários são aspectos fundamentais de sua prática. Nessas organizações, são os próprios usuários que, em geral, criam e assumem a gestão da organização, definindo suas regras de funcionamento e controle (LEAL, 2013, p. 86).

Para o funcionamento de um sistema solidário a lógica da rentabilidade e garantia de capital é transformada em utilidade social. Observa-se uma crescente proximidade entre os participantes o que fortalece os laços de cooperação entre eles. No entanto, Singer () observa que isso não despreza a necessidade de retorno dos recursos investidos, porém o mais importante é que o investimento possa gerar melhoras sociais e econômicas para o território local. Rigo define como,

Um tipo de finanças que busca recuperar o valor do trabalho, desenvolver as capacidades  das pessoas e do território, além de reconhecer e valorizar as já existentes, ao contrario das finanças dominantes, que se distanciam do trabalho, da produção, do consumo e chegam a criar “bolhas” separadas da economia. (RIGO, (), p.44)

Singer () explica que as organizações de finanças solidárias normalmente não agem sozinhas, elas podem ser apoiadas por parcerias com o governo e instituições públicas financeiras como também por instituições não governamentais. Dessa forma recebem não somente apoio como também suporte financeiro e legislativo.

O processo de arrecadação de recursos pode ser tanto por meio de incentivos do governo ou por meio de doações, como também pela venda de produtos e serviços no mercado. Dessas podemos encontrar diversos tipos de operações e serviços que fazem esse intermédio como uma forma de finança solidária. Leal (2013) cita alguns como os as cooperativas, os empreendimentos de microfinanças e microcréditos, fundos rotativos e os bancos comunitários de desenvolvimento. Cada um desses é separado pela sua forma organizacional.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Andressa Nunes. Economia solidária: princípios e contradições. 2010. 120f. Dissertação (Mestrado em Política Social) - Universidade Federal do Espírito Santo, Programa de Pós- Graduação em Política Social, Vitória. Disponível em: <http://base.socioeco.org/docs/andressa_nunes_amorim.pdf> Acesso em: 03 set. 2015.

ARAÚJO, Yara Mendes Cordeiro; RODRIGUES, Luciene. A economia solidária como estratégia de obtenção de recursos: uma análise a partir dos bancos comunitários. In: XI CONGRESSO LUSO AFRO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, 2011, Salvador. Universidade Federal da Bahia. 2011. 16 p. Disponível em: <http://csonline.ufjf.emnuvens.com.br/csonline/article/viewFile/385/358> Acesso em: 26 out. 2015.

BÚRIGO, Fábio Luiz. Moeda social e a circulação das riquezas na economia solidária. 2000. 18 F. Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina, Florianópolis. Texto apresentado como um dos requisitos para a conclusão da disciplina Análise Sociopolítica do Sistema Financeiro no Capitalismo Contemporâneo. Disponível em <http://lemate.paginas.ufsc.br/files/2015/03/MOEDA-SOCIAL-E-A-CIRCULACAO-DAS-RIQUEZAS-NA-ECONOMIA-SOLIDARIA.pdf> Acesso em 08 set. 2015.

CARVALHO, Carlos Eduardo; ABRAMOVAY, Ricardo. O difícil e custoso acesso ao sistema financeiro. In SANTOS, Carlos Alberto dos (Org). Sistema financeiro e as micro e pequenas empresas: diagnósticos e perspectivas. Brasília: SEBRAE, p. 17-45, 2004. Disponível em: <http://acesso.mte.gov.br/data/files/FF8080812B62D40E012B6EF426CD3DBF/sitema_financeiro_e_as_mpe.pdf > Acesso em: 14 abr. 2015.

FRANÇA FILHO, Genauto. Considerações sobre um marco teórico-analítico para a experiência dos Bancos Comunitários. ENCONTRO DA REDE BRASILEIRA DE BANCOS COMUNITÁRIOS, 2., 2007, Iparana / CE. 11 p. Disponível em: <http://www.anpad.org.br/admin/pdf/APS-C2557.pdf > Acesso em: 13 out. 2015.

FRANÇA FILHO, Genauto Carvalho de. Terceiro setor, economia social, economia solidária e economia popular: traçando fronteiras conceituais. 2002. Revista Bahia Análise e Dados, Salvador, v. 12, n. 1, p. 9-19.

FRANÇA FILHO, Genauto Carvalho de. A via Sustentável-Solidária no Desenvolvimento local. Salvador: Organizações & Sociedade/UFBA, v. 15, n. 45, p. 219-232, abr./jun., 2008.

FREIRE, Marusa Vasconcelos. Moedas sociais: Contributo em prol de um marco legal e regulatório para as moedas sociais circulantes locais no Brasil. 2011. 374 p. Tese apresentada ao curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília. Distrito federal. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/Nor/relincfin/Palestra_Marusa_Vasconcelos_Freire_._Moedas_Sociais.pdf. Acesso em: 14 abr. 2015.

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Bancos, exclusão e serviços. Governo Federal. 2011. 16 p. Disponível em: http://www.avozdocidadao.com.br/images/ipea_sips_bancos_exclusao.pdf. Acesso em: 18 abr. 2015.

KRUGMAN, Paul. Crises monetárias. São Paulo: Makron Books Ltda. Tradução técnica por Nelson Carvalheiro. Do original: Currency Crises. 2001.

LEAL, Leonardo Prates. Gestão dos bens comuns na experiência dos bancos comunitários de desenvolvimento. 2013. 180f. Monografia (Conclusão de curso) - Escola de Administração, Universidade Federal da Bahia. Salvador. Disponível em: <http://base.socioeco.org/docs/dissertacao_final_mestrado_npga_eaufba1-1.pdf>  Acesso em: 24 set. 2015

LEMOS, Maximiliano Engler; FALCOSKI, Luiz Antonio Nigro; CASTRO, Carolina Maria Pozzi. Implantação de bancos comunitários e o desenvolvimento social dos territórios. 2012. 48p. Disponível em: https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&ved=0CCgQFjABahUKEwj3jP_U-5nJAhXJEpAKHdf9AaA&url=http%3A%2F%2Fsedici.unlp.edu.ar%2Fbitstream%2Fhandle%2F10915%2F26713%2FDocumento_completo.pdf%3Fsequence%3D1&usg=AFQjCNGFlbk66_dmF_MElCgzXSKo4nEZ2Q&cad=rja  Acesso em: 13 ago. 2015.

LIETAER, Bernard; ULANOWICZ, Robert E.; GOERNER, Sally J.; McLAREN, Nadia(2010). Is Our Monetary Structure a Systemic Cause for Financial Instability? Evidence and Remedies from Nature. Journal of Futures Studies. Mar. 14:3. p. 89-108. Disponível em:<http://www.jfs.tku.edu.tw/14-3/E02.pdf>. Acesso em: 10 agosto 2015.

MELO NETO, João Joaquim M. Rede de Bancos Comunitários. Rio de Janeiro e São Paulo: Seminário de Bancos Comunitários – indicadores, tecnologia e inovações para a superação da pobreza, 27 e 28 de maio de 2008. 20 slides. Disponível em: http://www.seminariobancoscomunitarios.com/apresentaccedilotildees.html, Acesso em: 20 jun. 2015.

MOURA, Ruth. Finanças solidárias. In CATTANI, Antônio David et al. Dicionário internacional da outra economia. Porto Alegre: Edições Almedina, 2009, p. 208-213.

PINHEIRO, Marcos Antonio Henrique. Cooperativas de Crédito: Historia da evolução normativa no Brasil. Banco Central do Brasil, 2008, Brasília, Distrito Federal. 6 ed. p.98.

PINTO, João Roberto Lopes. Economia Solidária: De volta a arte da associação. UFRGS. Porto Alegre, 2006.

RIGO, Ariádne Scalfoni. Moedas sociais e bancos comunitários no Brasil: aplicações e implicações, teóricas e práticas. 2014. 344f. Monografia (Conclusão de curso) - Escola de Administração, Universidade Federal da Bahia. Salvador. Disponível em: http://www.adm.ufba.br/sites/default/files/publicacao/arquivo/tese_versaofinalcompleta_para_impressao_final.pdf Acesso em: 24 abr. 2015.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Produzir para viver. Os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 2005.

SINGER, Paul. A economia solidária no Brasil: a autogestão como resposta ao desemprego. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2003. p 25-28. (Coleção economia)

SINGER, Paul. Economia solidária, entrevista com Paul Singer. Entrevista concedida a Paulo de Salles Oliveira. Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 23 set. 2007, p. (289-314). Disponível em: http://www.revistas.usp.br/eav/article/viewFile/10335/12013. Acesso em: 14 ago. 2015.

SINGER, Paul. Finanças Solidárias e Moeda Social. 2006, 8 F. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C812D3ADC4216013AFAE0DA6514F7/FINAN%C3%87AS%20SOLID%C3%81RIAS%20E%20MOEDA%20SOCIAL.pdf. Acesso em 13 abr. 2015. .

SOARES, Cláudia Lúcia Bisaggio. Moeda social: uma análise interdisciplinar das suas potencialidades no Brasil contemporâneo. Florianópolis: Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC, 2006. Tese de Doutorado. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/89433/226267.pdf?sequence=1. Acesso em 30 maio 2015.

SWANN, Robert (1995). Foreword. In SOLOMON, Lewis D. (1996) Rethinking our Centralized Monetary System: The Case for a System of Local Currencies. Westport, Connecticut: Praeger.