ETNOMATEMÁTICA E A VALORIZAÇÃO DA CULTURA AFRO NAS AULAS DE MATEMÁTICA E HISTÓRIA ATRAVÉS DAS TRANÇAS AFRICANAS: UM PROJETO INTERDISCIPLINAR
Por Geovane dos Santos Damaceno | 05/06/2025 | EducaçãoRESUMO
Este artigo apresenta a experiência de aplicação de um projeto interdisciplinar desenvolvido na disciplina de Matemática em uma escola pública de Jerônimo Monteiro – ES, com foco na valorização da cultura afro-brasileira por meio da abordagem Etnomatemática. Intitulado Etnomatemática e a valorização da cultura afro nas aulas de Matemática e História através das tranças africanas, o projeto teve como objetivos específicos promover o diálogo entre as disciplinas, apresentar o conceito de Etnomatemática, explorar os diferentes tipos de tranças africanas e abordar a cultura afro como instrumento pedagógico de combate ao preconceito e ao bullying. Através da análise de padrões geométricos, simetrias e sequências presentes nas tranças, foi possível integrar saberes matemáticos e históricos de forma significativa e culturalmente contextualizada. Os resultados revelaram alto nível de engajamento e aprendizagem por parte dos estudantes e professor, evidenciando que a inserção de saberes tradicionais e identitários no currículo contribui para uma educação mais inclusiva, crítica e alinhada às diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e à Lei nº 10.639/2003. Conclui-se que a Etnomatemática, ao reconhecer e valorizar os conhecimentos de diferentes culturas, fortalece o papel da escola na promoção da equidade e do respeito à diversidade. Palavras-chave: Etnomatemática. Cultura afro-brasileira. Interdisciplinaridade. Educação antirracista. Tranças africanas.
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo apresentar a experiência do autor com a aplicação de um projeto interdisciplinar desenvolvido na disciplina de Matemática em uma escola pública de Jerônimo Monteiro - ES. Trata-se de um projeto na área de Etnomatemática, denominado Etnomatemática e a valorização da cultura afro nas aulas de Matemática e História através das tranças africanas. Como objetivos específicos do estudo destacam-se: a promoção do diálogo entre as disciplinas de Matemática e História; a apresentação do tema 3 Etnomatemática; o conhecimento sobre os diferentes tipos de tranças africanas; o desenvolvimento de um projeto que contemple a tratativa da cultura africana nas escolas como forma de enfrentamento do preconceito e do bullying. Estudar Etnomatemática significa, sobretudo, reconhecer que os saberes matemáticos não surgiram apenas a partir da formalização científica ocidental, mas se manifestam desde os primórdios da existência humana, nas interações com o ambiente e nas estratégias de sobrevivência desenvolvidas por diferentes grupos ao longo da história. D’Ambrosio (2001), um dos principais teóricos da Etnomatemática, destaca que esse conhecimento antecede a própria organização social humana. Ele aponta, por exemplo, que o Australopiteco — primata ancestral do ser humano — já apresentava sinais de raciocínio matemático ao utilizar pedras para extrair carne de ossos. Tal ação envolvia a avaliação de tamanho, peso e forma das pedras, o que exige capacidades cognitivas ligadas à comparação e à escolha de objetos adequados para uma finalidade específica. Essas habilidades, segundo D’Ambrosio, constituem manifestações iniciais de pensamento matemático. A trajetória do conhecimento matemático, desde essas expressões rudimentares até sua configuração atual, foi sendo construída de forma coletiva por diversas culturas. Conforme relatam Rosa e Orey (2005, p. 5), os registros mais antigos de práticas matemáticas sistematizadas podem ser encontrados nas civilizações egípcia e mesopotâmica. Com o tempo, esses saberes se expandiram para a Grécia Antiga, onde passaram a ser formalizados por filósofos e matemáticos como Pitágoras, Euclides e Arquimedes. Posteriormente, essas ideias foram traduzidas para o árabe, ganhando novos contornos com as contribuições de estudiosos islâmicos, ao mesmo tempo em que saberes desenvolvidos na Índia, como o sistema decimal e o conceito de zero, também eram absorvidos e reinterpretados nesse processo de intercâmbio cultural. A proposta da Etnomatemática na educação nasce no Brasil e representa uma alternativa pedagógica que valoriza a produção de conhecimento de forma intercultural, permitindo que o processo de aprendizagem ocorra em sintonia com as vivências e a realidade de cada estudante. A sala de aula é compreendida, nesse contexto, como um microcosmo de pluralidades, onde cada aluno contribui com sua bagagem cultural, social e histórica (François, 2009, p. 1518). A partir dessa perspectiva, a Matemática, embora essencial nas grades escolares, necessita ser 4 ressignificada, conforme já discutido anteriormente neste trabalho (p.18). As abordagens tradicionalmente utilizadas, criticadas por D’Ambrosio (1998) por sua obsolescência, carecem de uma renovação que considere não apenas os conteúdos, mas também os contextos históricos, sociais e culturais em que os estudantes estão inseridos. [...]