Ética. Em teoria, define-se por algo que é aceitável culturalmente, legal ou compatível com as crenças ou costumes comuns. Mas é eternamente questionável, uma vez que o mundo é repleto de diferentes culturas, e muitas não aceitam costumes estrangeiros.

Mas se for para debater o conceito, ou refletir sobre ele, um interessante começo não é uma mídia didática ou jornais. Se há uma literatura que cave ao cerne da questão ética, é definitivamente Dostoiévski. Em todos os seus contos e livros há questionamentos internos no âmago da alma que são feitos através de histórias aparentemente comuns e sem graça. São vidas medíocres contadas a partir da razão humana e a sua relação com o emocional.

Em O Idiota, o autor diz grandes verdades de forma implacável, porém veste-se de um personagem cauteloso, que considera a ética acima de tudo – e o que seria ética afinal? é a pergunta maior do livro. Questiona a pena de morte, casamento por interesse, traição e círculos amorosos...  Denuncia apontando dedos as trivialidades de uma sociedade comum.

“...faz uma contundente crítica à pena de morte, descrevendo o rosto de um condenado à morte no minuto que antecede a execução e sugerindo a uma jovem que o pinte.”

 Retirada de um artigo do jornal Estado de São Paulo sobre o mesmo livro, esse parágrafo lança uma hesitação em julgar ou afirmar certezas sobre assuntos polêmicos – será que realmente queremos dizer o que queremos dizer?

Na história, os julgamentos de ética muito mudaram e se alteraram de eras em eras, tempos em tempos. Na Idade Média, não somente algo poderia ser considerado não-ético, como poderia ser considerado pecado, e consequentemente, um crime gravíssimo. No final do século XIX as regras de etiqueta em certos países eram rígidas e determinantes para julgar caráter, e atualmente, tudo pode ser discutido e questionado.

Para reforçar e trabalhar isso, um professor de uma escola escandinava propôs jogar um jogo de videogame em sala para enfatizar o desafio de determinar o que é ou não ético.

Esse jogo de videogame, The Walking Dead, faz parte de um novo subgênero de jogos que dá ao jogador o poder da tomada de decisões. O jogo ocorre como uma história num ambiente explorável, porém há momentos em que é preciso determinar o rumo do jogo – e então sobra para o jogador decidir o que será feito. E são esses momentos de decisão que o professor de ética Tobias Staaby pausa o jogo jogado em sala e discute com a sala que caminho tomar, o que fazer, que botão clicar?

O advento e rápido crescimento de jogos como The Walking Dead, Until Dawn, Life is Strange, Heavy Rain, entre outros jogos de decisões com múltiplos finais de acordo com a escolha tomada pelo jogador, mostra como a questão de ética é volúvel e, ainda assim, tão ambiciosamente discutida por todos. Será que, no fundo, todos querem ser éticos? Será que se não houvessem certas leis, nós seguiríamos o caminho “correto” mesmo assim?

Em Until Dawn, um jogo cujos personagens são típicos adolescentes, há momentos em que uma decisão pode definir a vida ou a morte de um deles. Há momentos em que o jogador pode ou não agredir animais, abandonar os colegas para a morte, ser educado ou rude, entre outros. As decisões tomadas em hora de desespero representariam, talvez, a verdadeira personalidade do jogador?

Há uma discussão pedagógica que diz se não houvessem multas, será que todos nós pararíamos no farol vermelho?. A princípio responde-se que claro que sim! É para evitar perigos, etc.... Mas e numa pressa? E se alguém do carro estiver em trabalho de parto? E se for o aniversário do seu irmão? E se, e se, e se...

 É comum dizer que em estudos de história da humanidade não se especula; atém-se aos fatos. E, apesar de filosofia, sociologia e antropologia serem especulações e embates internos, não há certeza em declarar se alguém se comportaria de tal maneira ou outra. É aí que entra a ética. Algo como tentar encontrar o verdadeiro eu e se este se encaixa em sociedade – aquela mesma sociedade que sabe julgar o que é certo ou errado quando uma ação foi realizada, mas que jamais conseguiria saber se algo seria certo ou errado em hipótese.

Bianca Braga de Carvalho

 Referências:

Artigo O Príncipe Ético de Dostoievski, acesso em 07 de outubro de 2016, http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,o-principe-etico-de-dostoievski,20030103p121.

 Notícia G1 “Escola Norueguesa usa game The Walking Dead para estudar ética”, acesso em 07 de outubro de 2016, http://g1.globo.com/tecnologia/games/noticia/2014/01/escola-da-noruega-usa-game-walking-dead-para-estudar-etica.html.

 IGN, “Diretor de Life is Strange explica o final polêmico do game”, acesso em 29 de setembro de 2016, http://br.ign.com/life-is-strange/16551/feature/life-is-strange-diretor-explica-o-final-polemico-do-game.

 Pesquisa google sobre vários finais do jogo Until Dawn e como obter resultados diferentes, https://www.google.com.br/#q=until+dawn+finais.

 Fiódor Dostoiévsky, O Idiota(1868)

 Heavy Rain, Quantic Dream(2010)

 The Walking Dead: Season One, Telltales Games(2012)

 Until Dawn, Supermassive Games(2014)

 Life is Strange, Dontnod Entertainment/Square Enix(2015)