RESUMO

Este artigo objetiva analisar a conduta ética na prática docente através dos tempos e avaliar os paradigmas atuais, traçando uma análise sobre a moralidade de temas abordados na prática do ensino, bem como as implicações na conduta docente e na relação professor-aluno, de acordo com o PL 867/2015 que tramita no plano federal.

INTRODUÇÃO 

            A discussão sobre a prática docente e suas implicações, bem como sobre o papel do professor em sala e sua influência enquanto formador de opinião é questão antiga, sendo motivo de debates e questionamentos em todos os segmentos sociais.

            O presente artigo tem por finalidade tecer uma crítica sobre o delinear da ética docente em sala de aula, bem como substanciar a forma com que vem sendo estabelecidas normas de conduta e restrições para o pensar e a construção de aprendizagem relacionados com a tarefa do professor: fomentar a crítica, a problematização, suscitando o debate e o pensamento evolutivo, entre os alunos, demais professores e familiares, bem como entre todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem.

            Foram utilizadas fontes diversas, como sítios eletrônicos, revistas, entrevistas e livros regulares, no intuito de se extrair argumentos sólidos e consistentes para a crítica argumentativa sobre o que referenda o tema, bem como traçar um panorama sobre a influência e implicações no âmbito acadêmico e escolar.

Será objeto de análise a trajetória da regulação da prática docente, a influência do poder legislativo no que concerne à prática destes profissionais e a maneira como, periodicamente, interfere na forma de construir a aprendizagem, assim como os perigos da restrição imposta pela pretensa “lei da mordaça”, PL 867/2015, no intuito de restringir, delimitar, limitar, impor regras e criminalizar determinadas condutas de professores em sala de aula.

            O objetivo é expor, de maneira técnica, clara e concisa os pontos onde o referido projeto de lei intenta tocar, as implicações a curto, médio e longo prazo, a interferência na qualidade do ensino e na capacidade de raciocínio autônomo e crítico que tal imposição pode provocar.

            A escolha do presente tema deu-se pela experiência em sala de aula, afiançadana preocupação no tocante à pratica docente. Alia-se a isso o fato de que o meio acadêmico inicia um repúdio ferrenho nos bastidores, alicerçado na falta de discussão prévia e no perigo apresentado à grave ameaça de liberdade profissional, além da implicação direta nos resultados do processo ensino-aprendizagem.

            A clara afronta ao respeito para com os professores na mais ampla aplicação do termo e o descaso por parte do executivo em melhoria na qualidade do ambiente de trabalho, somados à baixíssima remuneração (mormente nas instituições públicas) são norte seguro para o objeto em análise.

A PRÁTICA DOCENTE NO BRASIL 

Iniciada provavelmente pelos jesuítas em sua chegada, o ensino no Brasil vem sofrendo modificações expressivas, desde a “alfabetização” indígena, passando pelos anseios das classes dominantes e a elitização do ensino até a criação das escolas públicas e as legislações que concretizam o ensino como “direito de todos e dever do estado”.

Inicialmente voltada para a educação das famílias mais abastadas, a conduta docente começa a receber influência do pensamento da igreja, que detinha o conhecimento “absoluto” e os meios e técnicas para a transmissão desse conhecimento. É importante frisar que, para exercer a profissão docente era “conditio sine qua non”, salvo raras exceções, que se exercesse função na igreja.

De algum modo, pode-se afirmar que a prática docente sofria influência direta dos ditames eclesiásticos, e sua conduta era regulada de acordo com os interesses locais, com a política da época, com a situação social que imperava, bem como a manutenção do “status quo” vigente.

A valorização excessiva da história europeia, a introdução eurocêntrica dos fatos, por longo período explanados de maneira separada e alheia a acontecimentos simultâneos, além das distorções sofridas pelas mais diferentes vertentes, as diversas linhas de pensamentos sobre o papel do professor na sociedade, sua influência na formação de opiniões e conceitos fizeram com que as discussões sobre o tema da ética docente e a participação dos professores no cenário político fosse no mínimo diminuídas, sempre à mercê de ordenanças advindas do plano legislativo.

Some-se a isso a pouca ou quase nenhuma participação no campo das decisões educacionais, tanto por parte da sociedade docente como geral. Esse assunto só tomou corpo a partir de meados do século XVII, quando as políticas voltadas para a área de educação entraram em voga, resultantes de um processo lento de preocupação com a formação de mão de obra.

As universidades públicas iniciaram suas tentativas de nascimento no Brasil nesse momento. A partir de 1909 surgiram em Manaus, São Paulo e Paraná universidades que não conseguiram prosperar, quando somente em 1920, por meio do Decreto n° 13.343, que a Universidade do Rio de Janeiro (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro e Universidade do Brasil) passou a existir como a primeira universidade do país. Essa data para o início das atividades universitárias sem interrupção no Brasil, ainda assim, é questionada por alguns autores.

Em 1971, a LDB 5.692/71 fixou a formação mínima para o exercício do magistério e introduziu no cenário educacional brasileiro as Licenciaturas de curta duração, as quais, segundo o Parecer n° 895/71, teriam uma duração entre 1200 e 1500 horas, contra as 2200 até 2500 horas da graduação plena ditando os parâmetros educacionais, mais uma vez, voltados aos interesses políticos ideológicos daquele momento. Como se vê, a educação se apresenta com obediência ao traçado ideológico oportunista de determinado período, sem uma previa consulta aos agentes da área.

No desenrolar da história, a profissionalização da docência no Brasil vem recebendo, desde o final do século passado, atenção especial no que diz respeito a educação, principalmente nas instituições públicas de ensino. Segundo os mestres Izauro Béltran Nunes e Betânia Leite Ramalho (UFRN), 

A profissionalização da docência, como processo de construção de identidades, é muito complexo e não pode acontecer por decreto ou exclusão; portanto se faz necessário incorporar os docentes na busca e na construção de uma nova representação – de um novo sentido – da docência como atividade profissional. Assim, faz-se também necessário que a profissionalização seja parte dos projetos pessoais e coletivos e de desenvolvimento profissional dos professores. 

Neste sentido, a busca incessante pelo aprimoramento de técnicas e, principalmente nos últimos anos, de conteúdos que visem provocar o espírito crítico construtivo no ensino brasileiro tem estado em voga. A preocupação com a formação de cidadãos críticos e conscientes permeou de maneira decisiva as várias correntes de pensamento no campo docente. Destacou-se o aluno como centro do processo de ensino-aprendizagem, e o professor passou de mero transmissor a construtor/partícipe do referido processo. As instituições de ensino de maneira geral, através de leis e decretos federais, colaborando com o que já foi mencionado, têm recebido instruções tácitas de ensino, ditados pelas diversas leis promulgadas no campo da educação, sempre ou quase sempre sem nenhuma consulta prévia sobre sua viabilidade e/ou eficácia, sempre norteadas pelas ideias de que a melhora da e na educação é algo conquistado numa bancada, sob o esquálido ar condicionado e permeada de achismos, objetivando os anseios da política vigente.

A prática política reflete a maneira indiscriminada que se tem tratado a educação no Brasil: sempre secundarizada, colocada à margem de preocupações tidas como “maiores” (como saúde e segurança pública, por exemplo), sem ater-se ao fato de que a base sólida para qualquer profissão é, sem dúvida a educação. Não teremos médicos, enfermeiros, policiais, engenheiros, políticos ou qualquer outro profissional, se não houverem professores. É determinante, no entanto, que a qualidade desses professores seja, obviamente, motivo de preocupação para a formação de todos os outros profissionais das mais diversas áreas.

Se a excelência na docência reside no saber e no aprimoramento, a excelência do saber reside no sempre aprender, e esse processo envolve todas as camadas e segmentos sociais. Logo, a importância da valorização e respeito aos docentes deve ser foco principal, sob pena de condenação estrutural de toda uma sociedade. Assim, de acordo com a Professora Maria do Céu Roldão,

O conceito de qualidade relaciona-se, por um lado, com uma preocupação de melhoria dos desempenhos profissionais, que é, nos dias de hoje, particularmente relevante no campo educacional, em parte por razões econômicas, é certo, mas também pela defesa do papel insubstituível de uma escola pública para todos nas sociedades atuais, sendo hoje determinante que essa escola se assuma e atue como de qualidade para todos (Caldwell, 2000). Por outro lado, implica reconhecer as ideias de qualidade, e também de excelência, no que se refere aos profissionais do ensino, qualquer que seja o nível ou domínio de sua ação, pode ser lida de maneiras muito diversas, que é importante esclarecer. (b)           

A presença do estado na educação é questão antiga, que exige, ao debate, conhecimento prévio sobre o assunto, discussões técnico científicas, principalmente no campo pedagógico. Não há como se discutir valores e ideias de educação sem a participação direta dos atores educacionais.

            A convocação de um referendo docente, a chamada para reuniões temáticas centralizadas, abertas à participação da sociedade acadêmica e da população geral seria um começo promissor para se iniciar uma resolução séria acerca da prática docente no Brasil.  

A REGULAMENTAÇÃO DOCENTE

 Ao referir-se sobre a prática docente, alicerçado no que foi exposto, é necessário refletir, num primeiro momento, sobre o papel do professor: até onde influencia na sociedade? De que maneira sua conduta interfere na formação dos cidadãos? A prática docente deve abster-se de pensamentos e ater-se tão somente na transmissão? É possível que o professor transmita seus conhecimentos e suscite a aprendizagem sem expressar suas impressões?

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