Ética Cristã: A ética e a moral (4)

Em relação aos comportamentos humanos, não há dúvida: envolvem valores. Por esse motivo ao mencionarmos os comportamentos humanos também estamos falando sobre sua moralidade. E se estamos discutindo a moralidade dos atos, também se faz necessária uma discussão sobre sua eticidade.

Ética e moral: duas faces distintas de uma só realidade. Realidades distintas que podem e devem ser estudadas e entendidas em suas especificidades uma vez que se completam e explicam o homem e seus comportamentos em sua vida social. (Ressaltando que o comportamento humano passível de reflexão ética é aquele que diz respeito à vida social. O ato de um indivíduo isolado, que não tenha intenções nem repercussão sobre a sociedade não diz respeito à ética.)

Como não há consenso, podemos, como o fazem vários teóricos, assumir que: quando falamos em moral, estamos nos referindo aos comportamentos que produzem os atos. Os comportamentos podem ser morais ou imorais. O mesmo se pode dizer dos atos: podem ser analisados quanto à sua moralidade.

E a ética? É uma área da filosofia. Ela é, para a filosofia, a reflexão sobre os comportamentos e atitudes das pessoas e grupos. É claro que os comportamentos também podem ser objeto de análise da política, da sociologia, da psicologia... mas a indagação da filosofia em relação aos comportamentos humanos é bem específica. Trata de saber de sua moralidade e tem a ver com a discussão a respeito do bem ou do mal produzidos pelo ato humano.

Em seu livro “Ética”,(R. Janeiro: Civilização Brasileira, 1980, p. 7) A. S. VASZQUEZ, assim distingue ética e moral:

Os homens não só agem moralmente (isto é, enfrentam determinados problemas nas suas relações mútuas, tomam decisões e realizam certos atos para resolvê-los e, ao mesmo tempo, julgam ou avaliam de uma ou de outra maneira estas decisões e estes atos) mas também refletem sobre esse comportamento prático e o tomam como objeto da sua reflexão e do seu pensamento. Dá-se assim a passagem do plano da prática moral para o da teoria moral; ou, em outras palavras, da moral efetiva, vivida, para a moral reflexa. Quando se verifica esta passagem, que coincide com os inícios do pensamento filosófico, já estamos propriamente, na esfera dos problemas teórico-morais ou éticos.

Poderíamos sintetizar as palavras do pensador espanhol da seguinte forma: os homens agem moralmente e quando olham para sua ação, tratam de analisá-la com os critérios da filosofia moral, ou seja, da ética. Portanto a ética é a teorização dos comportamentos; é uma forma de analisar atos e posturas com a finalidade de classificá-los. Classificação essa feita a partir do quadro de valores morais que a sociedade desenvolveu a fim de saber da moralidade ou imoralidade desses atos.

É a filosofia moral, a ética, que procura a explicação sobre o fato de um determinado ato humano ser classificado como moral ou imoral. A reflexão que determina a qualidade do ato é o campo da ética. Além disso a reflexão sobre os atos humanos pode determinar não só a moralidade ou imoralidade dos atos, como também a amoralidade.

Um ato humano pode ser considerado um ato moral quando representa um bem para o indivíduo ou o grupo. Denunciar atos de corrupção é um ato moral; já a corrupção é imoral. Ao passo que contemplar a beleza de uma flor ou um céu estrelado são atos humanos, mas são atos amorais, pois não dizem respeito ao bem ou ao mal.

A reflexão a respeito dos atos e comportamentos se faz necessária não em uma atitude mexeriqueira, mas em virtude de sua complexidade. A maioria dos atos humanos não são simples como o contemplar uma flor ou um céu estrelado. Os atos humanos estão repletos de boas e más intenções. E são as intenções que demonstram a moralidade, imoralidade ou amoralidade do ato.

Contemplar a flor é um ato amoral se ele esgotar-se em si mesmo ou representar prazer de embevecer-se com a beleza. Mas podemos contemplar a flor, admirando sua beleza, com a intenção de roubá-la do jardim da vizinha a fim de presentar a namorada. Essa intenção transforma a contemplação em um ato imoral, em virtude da intenção que é roubar. Por outro lado, conduzir um veículo em alta velocidade, apesar de ser um ato criminoso, uma transgressão uma norma de trânsito e passível de punição, pode ser um ato moral, se a intenção for salvar vida de uma pessoa.

É a reflexão filosófica, o campo da ética, que conduz o juízo de valor a respeito dos atos e comportamentos humanos. Comportamentos que podem ser moralmente válidos ou inválidos em virtude de sua imoralidade. Um toque afetuoso no corpo de uma pessoa é moralmente válido. Já um toque não consentido com intenção obscena é imoral. Essa complexidade dos atos e comportamentos humanos foi o que exigiu do homem uma reflexão a fim não só de estabelecer os limites entre o permitido e não permitido; entre o certo e o errado; entre o positivo e o negativo... A reflexão diferencia a animalidade do ato humano que pode ser imoral ou criminoso, para buscar a pureza dos atos que caracterizam sua humanidade.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador.

Rolim de Moura - RO