ESTRANHAS MANIAS

Por Romão Miranda Vidal | 10/03/2010 | Contos

ESTRANHAS MANIAS.

Seu Crescêncio tinha muitas manias, uma delas era de mascar fumo de corda.De tanto mascar fumo, os dentes eram todos amarelados e tinha um beiço mais caído, de tanto guspir. Se gabava de ter ganho um campeonato de guspe. De quem guspia mais longe.
Outra mania que deixava todo mundo enojado era de enfiar o dedo no nariz e ficar olhando o resultado.Mas afora estas manias era uma santa alma. Um vivente que gostava de criar passarinhos soltos, de criar garnizé e galinha cruzada com galo índio. Mas o que lhe enchia de orgulho eram as galinhas de pescoço pelado. Essas então eram a sua paixão.

Não se casara e nem namorada tivera. Celibatário por opção? Outros diziam que era por causa da caxumba recolhida e ele ficara roncolho. Mas pouco se importava com o que às bocas alheias falavam. Tinha suas manias e suas economias.

Um dia resolveu comprar o caminhão. Foi para a cidade grande e lá comprou o dito caminhão. Chegou no meio da madrugada e para que ninguém soubesse do acontecido, guardou o dito cujo, no galpão de bananas. Assim ninguém iria saber da nova mania de Seu Crescêncio. Mas segredo é coisa que só dura para sempre se um dos dois morrer. Um que sabia do caminhão é o vendedor de caminhão e o outro era o Seu Crescêncio.


Homem de Deus! É verdade que comprou um caminhão. Como é você sabe? Ora sô! Toda a cidade sabe que você comprou um Jame Meche. Que Jame Meche? Não é Jame Meche? Então é Gesse Jame. Que Gesse Jame, nada. Você é tão burro e linguarudo que não sabe nem falar Gemece. Gemece? Ora você nunca viu aqueles caminhão marítimo, com um negócio em cima do vidro para defender os olhos do sol? Nunca viu aquelas letronas: GMC ? Pois é só ler: Gemesse.


Mas o que iria fazer o vivente com o tal Gemesse? A produção de banana não era tanta que exigisse um caminhão. Café? Bem que poderia. E se fosse trilhar milho, arroz e feijão com a trilhaderia SCL. Fabricada no Rio Grande do Sul?


Mas a cada dia Seu Crescêncio inventava uma nova mania. Em uma de suas viagens comprou 120 codornas poedeiras. Não falou pra ninguém. Criava as bicinhas na chácara, lá para bandas do rio Saltinho. Quando começar ão a botar era quase 100 ovos por dia. E o quer fazer com aquela ovarama toda? Nos primeiros dias levou para a cidade e mandou um piá vender os ovos. Dizia que era ovos das galinha granizé. Mas todo o santo dia, tinha ovo para vender. Até que um dia Dona Cremi veio perguntar: Mas que danada de galinha garnizé é esta que bota tanto do ovo? Ué! A senhora não sabe? É uma raça de galinha garnizé especial que veio dos estranja. Me amostra. Não dá. Mas pruque num dá? Por caso do mal olhado. E assim a venda de ovos de garnizé das estranja foi ganhando fama. Então aconteceu de chover por uma semana inteira e a ponte do rio Saltinho, foi embora com a enxurrada. Tinha ovo que não acabava mais. O que fazer agora? Sentou junto ao fogão e ficou a ler um Almanaque do Biotônico Fontoura. Receita de Licor de Ovos. Pronto estava resolvida a questão.

O problema era quebrar os ovos. Um por um. Pior seria perder. Quase 800 ovos. Estava com os dedos em carne viva de tanto descascar ovo. Mas valeu a pena. 18 litros de Licor de Ovos. A chuva passou e lá se foi Seu Crescêncio com os ovos, os 18 litros de Licor e mais algumas idéias na cabeça. Mal chegara na casa da cidade, encontrou uma comadre. Comadre daquelas antiga, que gostava de falar. Me diga uma coisa compadre. O que é que ta acontecendo? O danado do meu marido, depois que começou a comer estes tais ovos de garnizé das estranja que o compadre anda vendendo, deu de ficar assanhado igual recruta. Não tem uma noite que ... Ora comadre eu não sei destas coisas. Não sabe porque é roncholho. Ta me ofendendo. Quer experimentar? Nem morta. Morta não saberia o que é bom pra tosse.

Terminou ali conversa. Mas o buchicho já ganhara fama. Os ovos do Seu Crescêncio, fazia até velho sentir vontade de viver. Os ovos do Seu Crescêncio? Ora ele não é roncolho? Não entendeu nada. Os ovos que ele vende. E assim teve que fazer mais uma viagem às escondidas para comprar mais codornas poedeiras. Agora a viagem era de caminhão. Comprou mais 500. Na festa da padroeira vendeu todos os litros de Licor de Ovos, foi um sucesso. E nas cestinhas de bambu com três dúzias de ovos, então era a mais procurada.


E a vida ia sendo levada do jeito que dava. Uma hora vendia ovos, outra licor, depois banana. Na safra trilhava o que aparecia e assim foi fazendo o seu patrimônio.


Um belo dia, uma viúva veio lhe procurar para ver, se não interessava comprar um sitio, com uma plantação de banana que dava gosto de ver. Tinha nanica, nanicão e prata.Não tinha uma doencinha só. Tudo sadia. Quantos pé de banana tem? Mais de dois mil pé. Comprou. Agora sim. Tinha um caminhão, tinha produção de ovos, que ainda acreditavam que era de ganizé das estranja. Já podia vender na cidade grande. Mas para fazer uma carga de banana por semana, tinha que construir no mínimo quatro câmaras para amadurecer as bananas. Com carbureto. Carbureto isto mesmo.


O barracão abrigava o caminhão, as caixarias de banana, a trilhadeira e mais uma badulaqueira que dava gosto de ver. A única solução era aproveitar o desnível do terreno e construir as quatro câmaras debaixo do assoalho do galpão. Contratou pedreiro, mestre de obra e construí as câmaras. Mas era muito cuidadoso. Cada câmara tinha uma porta. E todas as quatro câmaras ficavam instaladas em um tipo de sala fechada. Aproveitava todo o espaço. Pois para compensar tinha que amadurecer as bananas de tal forma que desse uma carga. Quando tinha pouca banana, amadurecia em uma ou duas câmaras. Caso contrario eram as quatro e mais a sala. Tudo debaixo do assoalho do galpão.


O homem do correio parou a bicicleta e lhe entregou um telegrama. Preciso urgente.pt. Quatro carga banana.pt. . Preço ótimo.pt. Dinheiro a vista.pt. Prazo uma semana.pt.

Não teve dúvida. Encheu as câmaras e a sala, até onde podia de banana. Comprou cinco tambores de 200 litros. Mais 25 quilos de carbureto. Empilhou os cachos direitinho. Câmara por câmara. Distribui dos tambores, cada um em frente de cada câmara e mais no corredor para completar.

Chovia. E como chovia. De fato o local onde se encontravam as quatro câmaras, mais o corredor era vedado de tal forma que não passava uma formiga.

Ideal para amadurecer bananas com carbureto. Tinha luz. Bem iluminado. Comprara até uma máscara para não respirar o gás. Já era de noitinha. Estava mascando fumo e cuspindo. Começou pelos fundos e foi colocando 5 quilos de carbureto em cada tambor. Depois mais 1 litro de água e então teria inicio a reação, com a formação de gás.

E então o não era para acontecer. Aconteceu.

Quando estava no último tambor. Com a porta principal fechada, deu um raio e apagou a luz. A esta altura dos acontecimentos, quatro tambores já estavam formando gás e o ambiente estava praticamente cheio de gás. Não teve dúvida. Colocou a mão no bolso e tirou uma caixa de fósforos. Acendeu para poder enxergar a porta de saída. Foi uma explosão só.A cidade inteira correu para ver o que tinha acontecido. Tamanha explosão, nunca tinham visto. Encontraram Seu Crescêncio em um estado deplorável. Tinha a cara preta como um breu e todo cheio de casca de banana e banana amassada.

Com a explosão o teto cedeu. O caminhão GEMECE caiu em cima de uma das câmaras. A trilhaderia com a explosão praticamente se desmontou toda. Foi para o hospital. Nada grave. Só susto e alguns arranhões. Mas podia ter morrido. Fica em casa. Dieta rica em proteína. Canja de galinha. Ovos com vinho. Gemada. E muito descanso. Uma comadre desquitada se ofereceu para cuidar de Seu Crescêncio. Gosta de Licor de Ovos compadre? E o compadre porque não come dos ovinhos de garnizé das estranja? Então os dois comiam ovos e tomavam Licor de Ovos. Grávida? Tá louca?

Até hoje não se sabe. Se foi de tanto comer ovos de garnizé das estranja e tomar licor de ovos, ou se foi a explosão que fez com que Seu Crescêncio se tornasse pai, com a idade de 59 anos. As más línguas diziam que os ovos do Seu Crescêncio desceram