Escola Multisseriada

Sabe qual o principal serviço duma criança? Brincar!

Estudar vem em segundo lugar... ou terceiro ou quarto... pra dizer a verdade não sei se criança gosta de estudar.

Os pais, sim!

Eles gostariam que o filho gostasse de estudar; mas a criança...?

Por incrível que possa parecer, sinto saudade do meu tempo de escola. Vários anos atrás, lá no interior do Paraná. Meus primeiros anos na escola foram inesquecíveis. Não porque a escola fosse maravilhosa, nem porque ali houvesse um ambiente requintado.

Nada disso!

Era uma escolinha de uma sala só, com vários quadros negros nas paredes onde a professora passava as tarefas. Nas laterais, dois quadros, separados por uma janelona. Nos fundos um quadro grandão.

Cada turma, de cada série, ficava de frente para seu quadro respectivo. Essa era uma estratégia de ensino que dava certo, pois aqueles das séries mais adiantadas não ficavam olhando o que faziam os demais e não tinha como ficar fazendo gozação com os colegas.

E assim era a escola: Cada quadro para uma série. Todas as séries na mesma e única sala – escola multisseriada. E a professora tinha que se virar. Por isso era tão enérgica.

As certeiras eram enormes, para dois ou três alunos juntos. Os alunos maiores ficavam em dois, naquelas enorme carteiras de madeira. Os mais miudinhos sentavam em três. E não dava briga por lugar.

E se alguém brigasse ficava de castigo.

Alunos de hoje e os bichos da cidade não conseguem imaginar esse universo maravilhoso! Lá a gente estudava e aprendia.

Do lado de fora, dos dois lados, havia um bosquezinho e à sombra dessas árvores a gente brincar no recreio.

No pátio, cercado de balaustra, um pinheiro, fornecendo pinhão, no meio do ano. Pensa que não tinha alguns mais endiabrados que, enquanto professora preparava a merenda numa cozinha com fogão a lenha, acendia um fogo de grimpa para assar pinhão?

Na frente a estrada por onde passavam pessoas a pé ou a cavalo, indo e voltando da roça. Aos, fundos a invernada do meu tio. É, a escola fora construída num canto da fazenda do meu avô.

Minha saudade é justamente em relação a esse ambiente bucólico, onde passei muitas manhãs escolares, brincado!

Digo isso para reafirmar que a principal atividade de uma criança é brincar. Agora imagina como é a alegria de quem pode brincar na escola! E eu brinquei muito nos meus primeiros tempos de escola.

E não estou me referindo às brincadeiras que ocorrem antes do início da aula, no recreio e quando terminam as aulas – quando a gente brinca nos grupinhos que voltam pra casa, caminhando nas mesmas estradas.

Repito! Estou falando em brincar na escola, durante as aulas, dentro da sala de aula. E isso não se refere ao método de ensino. É brincar mesmo, enquanto a professora passava as tarefas.

Brincar, na escola, no meu caso, foi brincar durante as aulas... para minha alegria e do meu primo, que era meu parceiro de estrepolia; e para tristeza da minha tia.

Nossa professora era a mãe do meu primo... e irmã de minha mãe... Mas não era por isso que a gente brincava o tempo todo. A gente brincava porque brincar e uma atividade muito gratificante. É o principal serviço da criança.

Não foram poucas as vezes que nós virávamos uma carteirona daquelas, aproveitando que a professora estava ocupada com outra série, passando tarefa ou corrigindo algum caderno. A gente – eu e meu primo – transformávamos aquela carteirona numa “boleia” de caminhão e viajávamos em nossa diversão.

Você deve estar imaginando que as aulas viravam bagunça. Tipo a algazarra que ocorre nos dias atuais. Nada disso. Minha tia, a professora, mantinha a ordem com uma vara na mão.

Era só a gente começar a brincar e a tia/professora, giz numa mão e a vara de galho de marmeleiro na outra, vinha em nossa direção para cortar o barato.

Pra não apanhar a gente pulava a janela.

 

Neri de Paula Carneiro

Rolim de Moura - RO