ENSINO REMOTO: UM CAMINHO ÁRDUO PARA ENSINAR E APRENDER A LÍNGUA ESPANHOLA EM TEMPOS DE PANDEMIA
Por Cosme Edvaldo Santos Medeiros | 14/03/2023 | EducaçãoUCAM – UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
COSME EDVALDO SANTOS MEDEIROS
ENSINO REMOTO: UM CAMINHO ÁRDUO PARA ENSINAR E APRENDER A LÍNGUA ESPANHOLA EM TEMPOS DE PANDEMIA
PICUÍ – PB
2019
UCAM – UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
COSME EDVALDO SANTOS MEDEIROS
ENSINO REMOTO: UM CAMINHO ÁRDUO PARA ENSINAR E APRENDER A LÍNGUA ESPANHOLA EM TEMPOS DE PANDEMIA
Artigo Científico apresentado à Universidade Candido Mendes – UCAM, como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Metodologia do Ensino das Línguas Portuguesa e Espanhola.
RESUMO
O ensino remoto, especificamente na atual conjuntura em que se enfrenta uma crise sanitária, com a pandemia da Covid -19, tem sido a modalidade de ensino viável para que as atividades escolares sigam realizando-se. No que se refere ao processo de ensino e aprendizagem de uma língua estrangeira (LE), é importante que sejam elaboradas metodologias a partir das quais as quatro habilidades comunicativas (escrever/ler/falar/ouvir) possam ser desenvolvidas, oportunizando ao estudante o aperfeiçoamento de sua competência discursiva. Com a mudança de regime de ensino (agora virtual), as aulas de LE, em muitos casos, tornaram-se verdadeiro desafio para professores e alunos, já que todos precisam adequar-se a essa nova realidade, utilizando-se de diversos recursos tecnológicos com o objetivo de propiciar o ensino e a aprendizagem da língua. A presente pesquisa tem como objetivo central analisar os impactos do ensino remoto de língua espanhola no planejamento das atividades docentes, assim como verificar a percepção do discente no que diz respeito a seu rendimento escolar nesse contexto. Quanto aos procedimentos metodológicos, a pesquisa se baseou em um estudo de caso e, inicialmente, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, seguida de uma pesquisa documental. A abordagem utilizada foi a qualitativa. Em relação aos resultados, foi possível verificar que, no que tange ao trabalho docente, a maior dificuldade consiste em motivar a turma a desenvolver a habilidade de compreensão auditiva, assim como a oral. No que concerne à percepção do discente, na dificuldade em estabelecer comunicação com seus colegas durante as aulas. Como aporte teórico, recorremos a autores, como Sedycias (2005), Silva Júnior (2017), Leffa (2016), Junger (2005), Rojo e Moura (2012, 2019), assim como a documentos oficiais, a exemplo da LDB (BRASIL, 1996), BNCC (BRASIL, 2017), OCN (BRASIL, 2006).
Palavras-chave: Ensino de língua estrangeira. Ensino remoto. Rendimento escolar.
INTRODUÇÃO
O processo de ensino e de aprendizagem de uma língua estrangeira (LE) requer que o planejamento docente seja pautado em atividades que possam garantir o aperfeiçoamento das habilidades comunicativas do estudante, propiciando sua competência comunicativa. Para isso, faz-se necessário que haja uma organização das práticas pedagógicas com o objetivo primaz de garantir que o aluno seja proficiente do idioma estrangeiro que estuda.
Nesse sentido, é importante que o docente promova condições para essa proficiência a partir de propostas de atividades as quais possam garantir que haja a efetiva interação entre os componentes da turma. Assim, tarefas que possam ser realizadas individualmente, como em grupos pequenos, por exemplo, são muito interessantes para o acompanhamento do professor no que diz respeito às dificuldades e os progressos dos discentes.
Com os adventos da pandemia da Covid-19, as escolas precisaram se adaptar ao regime de aula remoto e muitas foram as dificuldades no que diz respeito ao ensino e à aprendizagem de uma LE nesse contexto. Dificuldades estes referentes a vários fatores, como à exclusão digital, à falta de letramento digital, à inviabilidade de atividades em grupos em plataformas digitais entre outras.
É notória a necessidade de ampliar os espaços para as discussões relativas ao tema ensino de língua estrangeira em regime remoto e, assim, contribuir para que debates nesse sentido sejam suscitados entre comunidade escolar/acadêmica. Desse modo, a presente pesquisa apresenta-se como relevante para a promoção da reflexão acerca de possíveis propostas de ações efetivas para a superação de dificuldades relacionadas ao trabalho com as competências comunicativas em atividades desenvolvidas em plataformas digitais.
Como principal objetivo, apresentamos em analisar os impactos do ensino remoto de língua espanhola no planejamento da atividade docente, assim como verificar a percepção do discente no que diz respeito a seu rendimento escolar nesse contexto. Isso foi possível a partir de um breve relato de uma experiência vivenciada com uma turma de um Curso de Formação Inicial e Continuada ofertado pelo campus Picuí do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB).
No que se refere aos procedimentos metodológicos, a presente pesquisa se baseou em uma pesquisa bibliográfica, seguida de uma pesquisa documental. O aporte teórico foi composto por autores, como Sedycias (2005), Silva Júnior (2017), Leffa (2016), Junger (2005), e documentos oficiais, entre eles a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) (BRASIL, 2017) e a Lei de Diretrizes e Base da educação nacional (LDB) (BRASIL, 1996).
Assim, na primeira seção, apresentaremos algumas reflexões a respeito de práticas docentes referentes ao ensino de língua estrangeira em condições de ensino remoto e os obstáculos para a realização de um trabalho mais exitoso. Na seção seguinte, abordaremos considerações acerca das dificuldades encontradas pelos discentes envolvidos na experiência de aprender um idioma estrangeiro nesse contexto de aulas.
DESENVOLVIMENTO
Ensinar e aprender uma língua estrangeira (LE) envolve metodologias que precisam garantir o desenvolvimento efetivo das competências comunicativas do estudante. Nesse sentido, práticas pedagógicas que busquem a promoção de atividades interativas são fundamentais para que haja um trabalho exitoso com o ensino de um idioma estrangeiro.
Os desafios podem ser ainda maiores quando se trata do regime de aulas remoto, pois diversas são as dificuldades no que diz respeito ao ensino e à aprendizagem de uma LE nesse contexto, adversidades referentes à exclusão digital, à falta de letramento digital, à limitação do uso de ferramentas das plataformas digitais, dificuldades para trabalhar habilidades comunicativas, em especial a oralidade, para citar alguns exemplos. Esse regime de aula foi necessário em um contexto em que a sociedade brasileira – assim como a mundial – viu-se diante de um momento de crise sanitária que tornou imperativo o distanciamento social.
Tal contexto diz respeito à pandemia ocasionada pela Covid -19, que acometeu a população mundial e obrigou os sistemas educacionais de todo o mundo a adaptarem suas atividades pedagógicas. O distanciamento social imposto pelas autoridades políticas, a partir das orientações de cientistas, fez com que as escolas suspendessem as aulas presenciais e isso obrigou docentes e discentes a se adequarem a uma nova maneira de compartilhamento de conhecimentos, (o ensino remoto), o qual necessita da utilização de plataformas digitais para viabilizar a retomada das atividades escolares.
Nesse contexto, muitos são os desafios para que as aulas de LE, nesse regime remoto, possam garantir um trabalho efetivo das habilidades comunicativas. Tendo como base as teorias sociointeracionistas, reconhece-se que o aluno passou a ser visto como um sujeito que interage, assim escrever e falar não são atos unicamente de expressão individual, mas atos interativos e discursivos (CASTRO; ARAÚJO, 2020, no prelo).
No que se refere ao conceito de competência comunicativa, Hymes (1972, citado por CASTRO; ALYNE, 2020, no prelo) defende que a competência de um falante vai além de questões linguísticas, envolvendo, também, a dimensão sociocultural. Dessa maneira, forma, saber as regras e estruturas da língua não é o suficiente, é preciso saber usar esse conhecimento de forma apropriada em diversos contextos comunicativos.
Entre os obstáculos para o trabalho remoto com uma LE, está, justamente, a necessidade de oportunizar, em ambientes virtuais, atividades interativas que possam colaborar para o desenvolvimento da competência comunicativa do estudante, ou seja, propiciar que esse estudante seja usuário competente/proficiente da LE estudada e, assim, garantir a possibilidade de desenvolver as quatro habilidades, a saber: escrever/ ler, falar/ouvir. É evidente que conhecimentos linguísticos são importantes para que haja a possibilidade de elaboração de textos em gêneros textuais/discursivos diversos e, desse modo, promover a comunicação – já que o texto é a unidade básica de significado -, mas não basta apenas a produção, como assevera Bernabé (2017, p. 5), quando afirma que a “capacidade linguística do falante compreende não só a habilidade de produzir e interpretar expressões linguísticas, mas também a habilidade de interagir socialmente com a língua”.
Ainda com a autora, os alunos assumem o papel de sujeito do discurso e:
(...) as relações de ensino devem acontecer nos processos interativos de sala de aula entre professor/alunos e alunos/alunos, envolvendo dificuldades e sucessos na compreensão, resolução de tarefas de construção de significado e conhecimento partilhado
Nesse sentido, há, também, a “negociação de diferentes pontos de vista dos participantes” (BERNABÉ, 2017, p. 3). O que a autora aponta é que, “na visão sociointeracionista, o papel do professor é organizar as interações na sala de aula, permitindo situações de produção em que o aluno possa contribuir de forma mais atuante com os outros alunos, facilitando, assim, a aprendizagem e não simplesmente controlando-a” (BERNABÉ, 2017, p. 4), o que, em muitos casos, com as aulas remotas, tem sido difícil de promover.
Nesse contexto, é importante refletir acerca do que possa garantir essa interação entre os alunos durante as aulas remotas e uma das questões mais evidentes é que, para que esse novo formato de aula tenha êxito, um dos pontos cruciais é que os professores e alunos precisam ter habilidade no uso produtivo das Tecnologias Digitais de Informação e de Comunicação (TDIC), além da garantia da inclusão digital, com acesso ao serviço de internet e aos dispositivos eletrônicos necessários. Sem essas condições básicas, acredita-se que qualquer trabalho com qualquer que seja a área do saber pode ficar comprometido ou, até mesmo, ser inviabilizado.
No que se refere aos usos produtivos das tecnologias, documentos oficiais que orientam as atividades do sistema educacional brasileiro apresentam considerações com o objetivo de orientar o trabalho docente. Nesse sentido, a Base Nacional Curricular Comum (BRASIL, 2017, p. 9), em sua competência geral 5, considera que seja necessário
(...) compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
Dessa forma, é fundamental que os envolvidos no processo educativo sejam letrados digitalmente para que haja um trabalho efetivo com o ensino de LE, com o objetivo de propiciar acesso aos conhecimentos desse idioma estrangeiro. Então, fato é que, para que nossos alunos tenham condições de aprender uma LE – especialmente, no contexto de aulas remotas -, é importante refletir acerca das condições para que haja um eficaz trabalho com o desenvolvimento das habilidades comunicativas desses aprendizes.
Muitas são as experiências que os docentes poderão relatar sobre a forma como têm conduzido suas aulas de LE a partir de plataformas digitais. Estas podem contribuir para o acesso a textos multimodais ou multissemióticos, os quais exigem do usuário multiletramentos, “ou seja, textos compostos de muitas linguagens (ou modos, ou semioses) e que exigem capacidades e práticas de compreensão e produção de cada uma delas (multiletramentos) para fazer significar” (ROJO; MOURA, 2012, p. 19).
O letramento digital do docente pode possibilitar o uso de um amplo aparato de ferramentas digitais didáticas que podem enriquecer suas aulas de LE. Lemke (1998 [2010], p. 456 citado por ROJO; MOURA, 2019, p. 40) assevera que:
(...) nossas tecnologias estão nos movendo da era da “escrita” para a da autoria “multimidiática”, em que documentos e imagens de notações verbais e textos escritos propriamente ditos são meros componentes de objetos mais amplos de construção de significados.
Baseando-se em tudo que aqui foi posto, faremos um breve relato docente relativo a uma experiência com aulas de língua espanhola em regime de ensino remoto. Tal experiência ocorreu com uma turma de um curso de Formação Inicial e Continuada (FIC) de língua espanhola nível básico oferecido pelo campus Picuí do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB).
O referido curso iniciou-se, presencialmente, em setembro de 2019 e tinha a previsão de ser concluído em setembro de 2020. Sua carga horária foi de 80 (oitenta) horas totais, sendo 2 (duas) semanais e, devido à pandemia da Covid -19, houve uma parada em suas atividades, em março de 2020, sendo retomadas, remotamente, em setembro de 2020.
Muitos foram os obstáculos surgidos com essa retomada, o que comprometeu, de certo modo, o êxito de algumas atividades planejadas, sobretudo as relacionadas às habilidades orais e de escuta. Entre esses obstáculos, pode-se considerar o fato de que as plataformas digitais apresentam certa limitação em suas extensões, não sendo possível, por exemplo, no caso da plataforma digital de comunicação Google meet, promover atividades comunicativas em pequenos grupos e acompanhar o progresso deles - como se faz viável em aulas presenciais -, assim como atividades de compreensão auditiva também não puderam ser realizadas de forma exitosa.
Outro grande problema diz respeito à ausência do letramento digital, que, no caso do curso em tela, foi notório tanto por parte de alguns discentes quanto da docente, que ainda estava se familiarizando com as possibilidades de trabalho com plataformas digitais. Isso pode ser considerado como um entrave importante, já que, em alguns momentos, as atividades foram inviabilizadas.
A exclusão digital de alguns alunos também apareceu como um fator relevante. Alguns editais no campus Picuí do IFPB foram elaborados para tentar dirimir o problema de falta de acesso às aulas remotas, apesar desse movimento com o objetivo de auxiliar estudantes carentes, a turma do curso FIC não foi contemplada, o que fez com que tenha havido desistência de alguns discentes, já que não havia a possibilidade de seguir com o curso, o que compromete a garantia do “princípio de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, presente na Lei de Diretrizes e Base da educação brasileira (LDB) (BRASIL, 1996, p. 1), em seu Artigo 3°.
Além disso, um problema recorrente foi a nova dinâmica de aulas, através de smartphones ou notebook, que contribuiu para uma maior dispersão da turma. Em muitas ocasiões, quando requisitada a participação mais ativa do grupo, alguns discentes demoravam a responder o solicitado e algumas justificativas para isso era porque havia se ocupado de alguma demanda fora do contexto da aula.
Além desses fatores, compreendemos ser importante pontuar também que, em alguns casos, determinados alunos não apresentaram uma boa adaptação às orientações docentes quanto ao estudo autônomo em tempos de ensino remoto, como atividades dirigidas antes e após as aulas. É evidente que o professor precisa estar sempre atento ao progresso da turma, às dificuldades e à necessidade de flexibilização de seu planejamento, mas, segundo Leffa (2016, p. 292):
Ainda que o desempenho do aluno tenha que ser assistido durante um certo período, há pelo menos a previsão de que no futuro o aluno será capaz de executar a tarefa por conta própria; autonomia é um estágio a que se chega.
Assim, o curso de Formação Inicial e Continuada de língua espanhola nível básico, a partir da necessidade de realização de aulas de modo remoto, teve suas atividades prejudicadas. Ao final, dos 25 (vinte e cinco) alunos matriculados, 6 (seis) nunca assistiram às aulas, 9 (nove) haviam desistido antes da pandemia, totalizando, assim, 10 (dez) alunos presentes após a retomada com as aulas na plataforma digital e, desses dez, apenas 6 (seis) concluíram o curso com êxito.
Segundo Junger (2005 p. 31), “as línguas assumem um papel vital na interação entre os indivíduos e na aquisição e transmissão de conhecimentos e informações”. Porém, para que nossos alunos tenham acesso a esses conhecimentos e a essas informações, a escola, assim como todo o sistema educacional, precisa garantir que todos tenham condições de estudar, seja em regime de aulas presenciais, seja remotamente.
É importante ressaltar, no que tange ao estudo de uma LE, que não se pode perder de vista que “o aprendizado de uma língua estrangeira pode ter consequências muito positivas no desenvolvimento profissional e pessoal de um indivíduo” (SEDYCIAS, 2005, p. 38). Isso é ponto notório e pacífico, já que a ideia do aprendizado de uma LE amplia as possibilidades de acesso a várias situações, como oportunidade de viajar a trabalho a países nativos da língua estudada e a de realizar intercâmbio em instituições de ensino fora do Brasil, por isso a importância de garantir condições para o aprendizado dessa LE.
Importante também compreender, com clareza, o papel do trabalho com a LE na escola para que, a partir disso, as abordagens metodológicas sejam adequadamente utilizadas. Dessa maneira, as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (BRASIL, 2006, p. 133) consideram que:
a língua estrangeira não é simplesmente matéria escolar a ser aprendida, mas tem função educacional, e um dos seus papéis mais importantes, o de expor os alunos a outra língua a partir de uma óptica menos instrumental, poderá ajudar, entre outras coisas, a interferir positivamente na relação que os estudantes brasileiros guardam com a própria língua, em especial com a escrita
A escola e todo o sistema de educação do país precisam sempre viabilizar o acesso à aprendizagem de uma LE de modo eficaz, oportunizando ao aluno a possibilidade de adaptação às mudanças, quando necessárias. Tal empenho deve ser pautado na concepção de que a “diversidade de contato com línguas estrangeiras/adicionais na escola permite ao aprendiz o intercâmbio e a troca cultural sem mesmo sair do seu país de origem (SILVA JÚNIOR, 2017, p. 12). Asseguradas as condições básicas de ensino e de aprendizagem, podemos considerar que a escola cumpre seu papel social ao colaborar para a formação de um indivíduo multicultural e plurilíngue, adaptado às novas demandas da sociedade em que se encontra inserido.
O contexto de ensino remoto no qual a sociedade brasileira se encontra, como já discutido neste artigo, apresenta diversos obstáculos para que o processo de ensino e aprendizagem seja satisfatório. Além das limitações e desafios enfrentados pelo docente na intenção de apresentar abordagens metodológicas atrativas, interativas e instigadoras, aprender, em plataformas digitais, também pode ser uma experiência árdua para o estudante.
É possível que muitos sejam os relatos através dos quais a experiência de aprender um outro idioma a partir da tela de um dispositivo eletrônico seja, em alguns casos, desmotivante. Isso porque, como regra geral, aprender a se comunicar, sobretudo em um idioma que não seja o materno, requer metodologias em que haja condições para que o aluno participe de atividades interativas com pequenos e grandes grupos e, assim, tenha a possibilidade de desenvolver sua competência comunicativa, estando hábil a falar, a escutar, a escrever e a ler, de modo proficiente, no idioma que estuda e, muitas vezes, através de aulas remotas, essa interação pode ser prejudicada.
Com o mundo cada vez mais globalizado, ampliando as possibilidades de comunicação com pessoas de outros lugares, com outros idiomas e, assim, com outras culturas, muitos percebem a importância de aprender uma segunda língua e, nesse contexto, ressalta-se a necessidade de refletir acerca de alguns fatores que apresentam implicações diversas no resultado da experiência do estudante de uma língua estrangeira (LE). Entre eles, podem-se citar: a concepção de ensino de uma LE adotada pelo professor, a compreensão das contribuições das teorias de aprendizagens, as especificidades do ambiente em que se realiza a aula, a postura do aluno em relação à sua aprendizagem, assim como a qualidade do material que será utilizado em sala de aula, a abordagem metodológica utilizada pelo docente para alcançar os objetivos pretendidos em seu trabalho, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento da competência comunicativa do aluno.
Objetivando desenvolver as habilidades comunicativas do educando, a saber escrever/ler/falar/ouvir, o professor precisa ter condições para que possa acompanhar o processo de aprendizagem de seus alunos, percebendo-os de modo particular, ou seja, estando atento às dificuldades pessoais, assim como as relativas à interação do grupo como um todo. A interação, para o ensino de uma LE, é essencial para instrumentalizar o aluno a ser um usuário competente dessa língua e esse aluno, além de compreender seu papel como também responsável por seu êxito, precisa ser motivado a desenvolver atividades com as quais possa se tornar comunicativamente competente no uso da LE estudada.
Assim, o sucesso no aprendizado de uma língua estrangeira, como posto acima, resulta de vários fatores e talvez o mais relevante seja a forma como o docente oportuniza o desenvolvimento das habilidades comunicativas, como promove atividades interativas em sua aula, como faz uso desses momentos de interação para contribuir com o sucesso na aprendizagem do aluno. Estas atividades podem possibilitar certa autonomia linguística ao estudante, podem fazer com que esse estudante tenha proficiência para comunicar-se em situações reais de comunicação.
Nesse sentido, de acordo com Rego (2009, p. 93),
O homem constitui-se como tal através de suas interações sociais, portanto, é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações produzidas em uma determinada cultura. Sendo assim, O homem não desenvolve a linguagem de forma, somente, por aspectos hereditários e maturacionais, tampouco exclusivamente pelas pressões do meio. O que ocorre é “uma interação dialética que se dá, desde o nascimento, entre o ser humano e o meio social e cultural que se insere.
A autora afirma ainda que é, portanto, “na relação dialética com o mundo que o sujeito se constitui e se liberta” (REGO, 1997, p. 94). Desse modo, é, através das diversas formas de interação, que o indivíduo apresenta seu posicionamento diante das variadas situações comunicativas, assim como compartilha uma infinidade de conhecimentos com seus pares.
Quanto ao aprendizado de uma LE - assim como de qualquer outra área de conhecimento -, o aluno precisa apresentar, antes de tudo, real interesse em aprender o idioma estrangeiro, compreender quais objetivos o levam a fazer isso e persistir em busca do sucesso de sua aprendizagem.
Nessa direção, Leffa (2016, p. 123) defende que “a aprendizagem só ocorre se o aluno demonstrar o empenho suficiente para vencer todos os obstáculos que podem ocorrer durante a execução das tarefas. Sem o esforço do aprendiz, a língua meta a qual deseja será dificilmente aprendida”. Assim, a motivação desse aluno, sobretudo em aula de regime remoto, pode ser trabalhada a partir das possibilidades de interação durante as atividades propostas pelo professor. Para que haja esse momento de trocas, o professor precisa conceber o trabalho com a LE como uma experiência sociointeracionista.
De acordo com a abordagem sociointeracionista, Cruz (2015, p. 8) explica que, “(...) o desenvolvimento humano se dá em relação nas trocas entre parceiros sociais, por meios da interação e mediação, meios esses com os quais o indivíduo interage, também, com a sua cultura”. O autor argumenta ainda que, além disso, “a aprendizagem é concebida como um fenômeno, pois para que se tenha êxito, é preciso que haja comunicação e interação de um indivíduo com o outro, apresentando troca de informações coletivas”.
Dessa maneira, é possível compreender que, sem a interação entre os sujeitos, não haveria possibilidades – ou estas seriam ínfimas – para essa troca de informações coletivas (informações adquiridas entre um grupo de pessoas). Isso repercute, de modo muito sensível, no processo de ensino e aprendizagem de um novo idioma, já que aprender uma LE é aprender a usá-la de modo proficiente, em relações com o outro, em situações comunicativas várias.
Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1998 p. 57), nessa abordagem de ensino:
Aprender é uma forma de estar no mundo com alguém, em um contexto histórico, cultural e institucional. Assim, os processos cognitivos são gerados por meio da interação entre um aluno e um participante de uma prática social, que é um parceiro mais competente, para resolver tarefas de construção de significado/conhecimento com as quais esses participantes se deparem. O participante mais competente pode ser entendido como um parceiro adulto em relação a uma criança ou um professor em relação a um aluno ou um aluno em relação a um colega de turma.
Assim, a aprendizagem de uma língua estrangeira, dentro do espaço escolar, pressupõe a interação dos indivíduos envolvidos no processo, professor e alunos, destacando a importância de um parceiro mais competente nessa aprendizagem. Pressupõe, também, a compreensão de que as relações sociais são construídas com pessoas que, diante do outro, são agentes de desenvolvimento mútuo.
Esse entendimento está concernente à teoria da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), considerada, segundo Vygotsky (1996, p. 97), como:
(...) a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado pela capacidade de solucionar os problemas de modo independente, e o nível de desenvolvimento proximal, demarcado pela habilidade de resolver problemas com a ajuda de um parceiro mais experiente ou de um mediador.
Tal consideração leva à compreensão de que, no contexto de aprendizagem de uma LE, as atividades propostas precisam propiciar uma relação de cooperação entre os estudantes, colaborando para que eles trabalhem mutuamente com a finalidade de desenvolver suas habilidades comunicativas. Isso porque, ainda com Vygotsky (1996, p.102), “(...) as características individuais e até mesmo as atitudes pessoais estão impregnadas de trocas com o coletivo (...)”, isto é, o que entendemos ser o mais individual em um ser humano é fruto da relação do homem com o seu próximo, de sua interação com o outro.
Em se tratando de aprender uma LE de modo remoto, as dificuldades para que o grupo tenha condições de cooperar com a construção do conhecimento, a partir de uma efetiva interação, parece ser algo desafiador. Isso porque, com o uso das plataformas digitais em substituição às salas de aulas, muitas são as limitações para um trabalho efetivo no desenvolvimento da competência comunicativa do estudante a partir da colaboração do outro, este sendo fundamental para mediar a aprendizagem.
Com a necessidade do isolamento social devido à pandemia da Covid-19, a dinâmica das aulas de LE teve uma mudança significativa e isso não só atingiu a prática docente, como abordado na seção anterior, como trouxe alguns desafios para quem aprende. A falta de oportunidade de interação mais efetiva, durante as aulas, e, assim, a inviabilidade de participar de atividades mais dinâmicas pode ser elencada com uma das principais dificuldades para o aluno de LE.
Além disso, a dispersão durante a aula é algo muito comum em experiências remotas de aulas já que o aluno fica exposto ao acesso a vários ambientes virtuais, tendo acesso às diversas redes sociais, assim como pode se dispersar por não se encontrar em um ambiente físico favorável, por estar, muitas vezes, em sua residência, dividindo espaço com outras pessoas que não façam parte do momento de aprendizagem. Também se considera entrave para a aprendizagem em plataformas digitais o fato de alguns alunos apresentarem um comportamento mais retraído, com uma maior resistência para falar durante a aula, sobretudo no idioma estrangeiro que está estudando. O fato de não participar de atividades em que a oralidade é trabalhada traz um prejuízo muito grande para o processo de desenvolvimento da habilidade oral.
Tal dificuldade também pode ter como causa a falta de condições favoráveis para realizar essas atividades, uma vez que parte dos alunos não possui notebook e, desse modo, precisa usar smartphones e/ou outros dispositivos eletrônicos de dimensões espaciais menores, o que pode dificultar a qualidade de leitura, por exemplo. Relacionado a isso, ainda há o fato de que, para alguns, a falta de acesso ao serviço de internet já impossibilitou, inclusive, o prosseguimento do curso em regime remoto, ocasionando a evasão escolar na transição da aula presencial para a realizada a partir de plataformas digitais.
Não se pode perder de vista que, em alguns casos, como o da plataforma digital Google meet, não há a possibilidade de realizar trabalhos com pequenos grupos, o que poderia contribuir para que o professor tenha melhores condições para atender às demandas apresentadas pelas dificuldades dos estudantes desses grupos. A possibilidade de realizar as atividades em grupos pequenos é importante para que o aluno, sobretudo o mais tímido, sinta-se mais à vontade para participar desses momentos de interação.
Como visto, de fato, muitas são as dificuldades enfrentadas pelo aluno de língua estrangeira em condições de aulas em regime remoto. É sabido que aprender um novo idioma requer, tanto do aluno, quanto do professor, o comprometimento com seus respectivos papéis no processo pedagógico, além da garantia para que haja condições para a realização das diversas atividades propostas com o objetivo de contribuir com o desenvolvimento da competência comunicativa do estudante.
Compreendemos que, a partir do contexto da crise sanitária provocada pela pandemia da Covid-19, muitas questões foram levantadas, como a exclusão digital, a falta de um letramento digital por parte de professores e de alunos, a ausência de uma prática escolar com o objetivo de tornar o aluno um indivíduo autônomo e, assim, também responsável por seu aprendizado. Dessa maneira, compreendemos, também, que essas dificuldades podem ser sanadas a partir de esforços, sobretudo advindos de órgãos públicos, com a finalidade de tornar o ensino remoto uma modalidade viável, significativa e produtiva.
CONCLUSÃO
Seguramente, muitos são os desafios encontrados pelo professor e pelos alunos de uma língua estrangeira (LE) no que se refere ao trabalho com o desenvolvimento das competências comunicativas. Em espaços virtuais, como os usados na experiência de aulas remotas, com a utilização de plataformas digitais e sendo fundamental o engajamento e a autonomia do aluno diante do novo desafio, as dificuldades são mais proeminentes.
Diante disso, faz-se necessário e urgente que a sociedade possibilite espaços de debates para refletir acerca das condições básicas para um eficaz trabalho com o desenvolvimento das habilidades comunicativas do aprendiz de uma LE. Isso implica, entre outros fatores, a garantia de acesso aos recursos metodológicos, tanto para o docente quando para os discentes.
Assim, percebe-se ser necessário que haja um esforço para a elaboração e devida aplicação de políticas públicas no sentido de colaborar com a formação inicial e continuada do professor com o objetivo de promover seu letramento digital. Além disso entendemos, também, que seja imperioso ações do Estado brasileiro para garantir a efetiva inclusão digital dos estudantes, sobretudo os das camadas menos privilegiadas, os que mais foram prejudicados pela ausência dessa inclusão durante o regime de ensino remoto.
REFERÊNCIAS
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* Graduado em Letras com habilitação plena em Língua Espanhola pela Universidade Estadual da Paraíba. Graduado em Gastronomia pela Faculdade Maurício de Nassau.