1. INTRODUÇÃO

A presente abordagem trata de forma sucinta a embriaguez e o alcoolismo no trabalho, bem como suas conseqüências perante as relações trabalhistas, suas formas e características. Frisa-se que a embriaguez é um problema que atinge todas as classes sociais, tanto no âmbito familiar quanto no profissional.

O álcool além de muitas vezes servir como uma espécie de refúgio para esses dependentes, pois é subterfúgio pelo qual os usuários extravasam seus sentimentos de angústia, decepção, frustração, entre outros (fatores de ordem psicológica), tem também por fatores determinantes para o seu gozo fatores climáticos como o calor, frio, etc (GIGLIO, 2000).

Um dos principais problemas relacionados à ebriedade é quando a pessoa acaba perdendo o seu autocontrole, o discernimento de seus atos.E o que era para ser apenas um momento de descontração, torna-se facilmente em vício, que muitas vezes acaba por interferir e devastar famílias e, mais facilmente,relações de emprego.

Nesse sentido, quanto à embriaguez, um dos fatores de relevância na relação empregador e empregado é o fato da mesma ser ou não oriunda de ato inconsequente ou vicioso do empregado – ao menos no que tange ao inicio. Isso traz à tona a discussão acerca da culpa do empregado. 

  1. EMBRIAGUEZ HABITUAL OU NO SERVIÇO

Compete trazer à baila que a previsão da legislação trabalhista, no artigo 482, alínea "f", refere que a embriaguez habitual ou no serviço, ensejaria demissão por justa causa. Ocorre que o arcaico dispositivo advém de um entendimento igualmente antiquado e raso, de que a embriaguez ocorre sempre por culpa exclusiva da pessoa.

Com efeito, Giglio (2010) leciona a possibilidade de a embriaguez ser ocasional (raramente embriagar-se), habitual (frequentemente entrar em estado de ebriedade) e crônica (o indivíduo busca involuntariamente não deixar o estado de embriaguez). Ademais, leciona Giglio (2000, p. 156):

A embriaguez crônica é a forma patológica do vício. Ébrio contumaz é aquele que ingere novas doses de entorpecentes ao sentir que vão cessando os efeitos das libações anteriores; é o doente, que sofre de deliriustremensse lhe falta o tóxico; é o que bebe sozinho, por necessidade orgânica, desde o momento em que acorda de manhã.

Diante dessas possibilidades de embriaguez, interessa pontuar que a normativa trabalhista, consoante dito, arbitrou a demissão por justa casa quando presentes a habilidade da embriaguez, ou então sendo a mesma no serviço. No que tange à embriaguez de forma habitual, leciona Giglio (2000) que deve ela manifestar-se cronicamente, sendo desnecessária a publicidade e conhecimento geral da conduta do empregado.

Além disso, destaca-se que a embriaguez habitual é agravada pelo risco de quebra de confiança entre o empregado e o empregador, que acaba por pressupor condutas negativas do empregado ao associá-lo à contumaz ebriedade (DORVALO DE LACERDA apud GIGLIO, 2000).

De outro lado, quanto àquela embriaguez ocorrida em serviço, importa sublinhar que tem o condão de, além de garantir a boa imagem da empresa empregadora, também de resguardar o ambiente de trabalho contra acidentes, haja vista que o ébrio “não é senhor de seus atos” (GIGLIO, 2000, p. 160).

A justa causa embriaguez em serviço encontra fundamento, portanto, na necessidade das empresas de manter a disciplina interna, pois, sem um bom e são ambiente de trabalho, não há boa produção, e esse é o objetivo colimado por todas as empresas (GIGLIO, 2000, p. 160).

 

2.1 FASES DA EMBRIAGUEZ

Segundo Giglio (2000), a embriaguez possui ainda, de forma perene entre os autores, três principais estágios de perturbação da conduta, sendo eles: a excitação, a confusão e o sono. Nesse norte, Almeida Junior apud Giglio (2000, p. 157) caracteriza a fase de excitação:

[...] a fase de excitação se caracteriza pelo olhar animado, loquacidade, vivacidade motora e associação de idéias superficial; dilatam-se as pupilas; a respiração e o pulso se aceleram; a pele torna-se úmida; e o indivíduo revela-se eufórico.

Ainda nesse diapasão, o referido autor contata a existência da segunda fase, a de confusão, sendo a qual refere o início das perturbações dos sentidos, dificuldade de concentrar, impulsividade, falta de coordenação motora e linguística, etc. Na terceira fase, evidencia-se o estado de perda da consciência, pressão sanguínea, respiração e pulso baixos.

Cautelosamente, Giglio (2010), pontua que nas fases segunda e terceira inexiste situação patológica, tornando-se mais singela a aplicação da demissão motivada, uma vez que são aparentes e graves as consequências da ebriedade no emprego. Porém, alerta para os casos de embriaguez de primeira fase, notadamente em vista de ser essa mais sensível às variações de humor e clima, fazendo com que qualquer ser humano seja suscetível a, alguma vez na vida, cometê-las. Por isso, o Autor suplica pela aplicação de bom-senso às relações trabalhistas, a fim de que seja o empregado advertido antes mesmo que ser demitido por justa causa, que, ademais, trata-se de uma medida extremada de consequências terríveis para o trabalhador.

Dessa forma, diante da existência de causas variadas que levam a ebriedade, graus de embriaguez e, ainda, reiteração ou na da conduta, Giglio (2000, p. 165) apresentava, há aproximadamente 15 anos atrás, visão dissonante dos entendimentos jurisprudenciais das cortes trabalhistas à época:

Parece-nos, entretanto, que a lei deverá ser modificada, no futuro, para excluir a embriaguez patológica do rol das justas causas. O viciado é um doente e como tal deverá ser tratado. Essa conclusão é inelutável, e temos certeza de que vingará, no porvir, superando a resistência dos retrógrados, no campo do Direito do Trabalho, da mesma forma como superou a má vontade dos estudiosos da ciência médica, que relutaram, durante muito tempo, em considerar como moléstia a embriaguez crônica.

            Entrementes, o Autor, à época da obra, alertava acerca do excessivo rigor com que o tribunal estava aplicando o dispositivo legal:

Na prática, o rigorismo do legislador tem sido adotado pelos tribunais, sendo a justa causa em estudo a que é examinada mais superficialmente. Raramente se cogita da intenção do empregado, do grau de embriaguez, e de outros fatores que nos parecem importante e dignos de uma consideração mais demorada (GIGLIO, 2000, p. 161). 

  1. CONCLUSÃO

Portanto, importa recapitular a discussão acerca da culpa, pois se a embriaguez é eventual, há culpa, porém não apta a ensejar a grave punição de demissão por justa causa. De outra banda, havendo embriaguez reiterada e contumaz é, primeiramente, dever da empresa analisar se a mesma não se trata de patologia, sendo que para isso deve promover o adequado atendimento especializado, haja vista que se tratando de moléstia deve o empregado ser tratado e não demitido. Não sendo caso de patologia, aí sim, evidencia-se a culpa do empregado, que indiferente com as consequências de seus atos promove condutas incompatíveis com a relação de emprego e, por isso, deve ter seu contrato de trabalho rescindido motivadamente.

Por fim, carece destaque o fato de que os apontamos doutrinários tratam do início de uma discussão ferrenhamente travada durante as últimas duas décadas, período pelo qual inclusive a ótica interpretativa da lei teve (e ainda continua tendo) significativas alterações. Ou seja, nos anos de 2000 e seguintes o debate acerca interpretativos tinham grande restrições impostas pela escola do positivismo. Posteriormente, com o neopositivismo e derivados, interpretações extensivas, de cargas axiológicas, visando à integração entre a lei e o caso contrato (norma), fizeram com que os pretórios superassem a mera aplicação da lei para chegarem, calcados em princípios de expressiva relevância, a posicionamentos mais coerentes com um Estado Democrático de Direito.

 Numa última palavra, princípios como a dignidade da pessoa humana, ampla defesa, dentre outros específicos da relação de emprego, obrigaram que o jurista a cotejar circunstâncias concretas, e diferenciar a embriaguez contumaz, a eventual e a patológica no momento da análise da aplicação da demissão motivada, assegurando, assim, a manutenção do Estado Democrático de Direito e suas máximas principiológicas. 

REFERÊNCIAS:

Giglio, Wagner D. 1930 – Justa Causa – 7. ed. rev. e atual – São Paulo: Saraiva 2000