Educação: o desafio dos pais

Quando falei sobre educação, dizendo que o sistema atropela o processo, e que os professores precisam ser apaixonados pelo que fazem, teve gente dizendo que eu estava esquecendo o papel da família, nesse processo formativo.

Mas não esqueci não. Pelo contrário. Já tenho afirmado, em outras oportunidades, a centralidade da família no processo educacional.

Em outras oportunidades tenho falado da negligência de algumas famílias em estabelecer regras e definir limites aos filhos. Já tenho dito que se existem estudantes gerando problemas na escola é porque a família nem sempre tem cumprido com seu papel educativo. Isso porque, se a escola tem um papel educativo, temos que esclarecer dizendo que esse papel é complementar. A escola vem para ajudar no acabamento da lapidação começada pela família. A escola vem como complemento àquilo que a família começou.

Sendo assim, se a família não lançou a semente, não há possibilidade da escola fazer o cultivo para que o fruto da cidadania seja produzido.

É evidente que em algumas situações o sistema vem atropelando também a família. O “Estatuto da Criança e do Adolescente”, em muitas oportunidades, em vez de ser usado como processo formativo e educacional, foi e continua sendo usado para supervalorizar os direitos das crianças e adolescentes, sem destacar suas responsabilidades.

A chamada “lei da palmada”, divulgada como sendo um impeditivo para as palmadas salutares também virou argumento da impotência da família para estabelecer limites.

Hoje se discute a redução da idade penal, mas isso está chegando como remédio para curar uma doença que poderia ter sido menos grave se, ao invés de gritar direitos, fossem afirmados deveres e obrigações. Se tivesse sido afirmado que para cada direito existe um dever correspondente; Se fosse esclarecido que para ter direito ao direito tem que se cumprir o dever. Por exemplo, se a criança tem direito à escola, tem que lhe ser afirmado o dever de estudar; para o direito de ser respeitada em seus comportamentos, tem que respeitar aos pais e professores...

Com isso estou querendo dizer que se na escola existem problemas de indisciplina e de falta de vontade de estudar, grande parte dessa situação deve ser creditada às famílias e ao sistema. O problemas começa quando a família perde a rédea e permite que legisladores se infiltrem no processo educacional. Leis que protegem os menores são importantes e necessárias, sim, mas quem deve conduzir o processo não deveriam ser os estatutos e legisladores, mas as famílias.

Por isso é que a música do Tião Carreiro e Pardinho, embora antiga, continua atual. “Se os filhos de hoje em dia já não obedecem aos pais” é porque as famílias perderam o comando. Analise o que diz a letra da música, que está disponível na internet:

Mundo velho está perdido, já não endireita mais/ Os filhos de hoje em dia já não obedece os pais/ É o começo do fim, já estou vendo sinais/ Metade da mocidade está virando marginais / É um bando de serpente / Os mocinhos vão na frente, as mocinhas vão atrás...

Pobre pai e pobre mãe, morrendo de trabalhar / Deixa o coro no serviço pra fazer filho estudar / Compra carro a prestação, para o filho passear / Os filhos vivem rodando fazendo pneu cantar / Ouvi um filho dizer: O meu pai tem que gemer, não mandei ninguém casar...

O filho parece rei, filha parece rainha/ Eles que mandam na casa e ninguém tira farinha/ Manda a mãe calar a boca, coitada fica quietinha/ O pai é um zero à esquerda, é um trem fora da linha/ Cantando agora eu falo: Terreiro que não tem galo/ Quem canta é frango e franguinha...

Pra ver a filha formada, um grande amigo meu/O pão que o diabo amassou o pobre homem comeu/ Quando a filha se formou, foi só desgosto que deu/ Ela disse assim pro pai: "quem vai embora sou eu"/ Pobre pai banhado em pranto/ O seu desgosto foi tanto que o pobre velho morreu...

Meu mestre é Deus nas alturas, o mundo é meu colégio/ Eu sei criticar cantando: Deus me deu o privilégio/ Mato a cobra e mostro o pau; eu mato e não apedrejo/ Dragão de sete cabeças também mato e não alejo/ Estamos no fim do respeito/ Mundo velho não tem jeito, a vaca já foi pro brejo.

Apesar de a vaca já ter ido pro brejo, ainda tem um toquinho do rabo dela pra fora. Ainda há tempo de segurá-la pelo rabo e arrastá-la de volta. Muitas escolas, muitas famílias, muitas autoridades estão tentando fazer isso. Mas para serem eficientes, essas ações precisam ser desenvolvidas em conjunto. As famílias, as escolas e as autoridades precisam saber que a vaca está atolada, mas não é verdade que “Mundo velho está perdido, já não endireita mais”.

A vaca é que está atolada, mas com esforço concentrado e vontade conjunta, sem uns tentando tirar o corpo fora ou colocar a culpa no outro. Afinal, Raul Seixas já dizia, ao cantar “Tente outra vez: “Veja! Não diga que a canção está perdida/ Tenha fé em Deu, tenha fé na vida/ Tente outra vez! [...] Queira! Basta ser sincero e desejar profundo/ Você será capaz de sacudir o mundo, vai! Tente outra vez!/ Tente! E não diga que a vitória está perdida / Se é de batalhas que se vive a vida/ Tente outra vez!”

Neri de Paula Carneiro

mestre em educação, filosofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - Ro