O desenvolvimento tecnológico exerceu grande influência na música, tanto nos meios de produção e distribuição quanto em seus estilos e tendências, promovendo novas possibilidades para músicos e compositores, o que torna ainda mais exigente o papel do educador musical na contemporaneidade.

As escolas de música, conservatórios, academias ou os próprios departamentos de música em instituições de ensino superior, iniciam, ainda que de forma elementar, uma reflexão sobre a formação de profissionais nesta área, considerando as mudanças na sociedade atual.

O primeiro efeito da tecnologia na música foi o aperfeiçoamento dos instrumentos, através da melhoria técnica dos luthiers, profissionais responsáveis pela fabricação artesanal de instrumentos, já que instrumentos melhores e bem acabados resultam em novas experimentações acústicas e explorações tímbricas.

Ao realizar uma revisão histórica, nota-se que em tempos remotos a única forma de transmissão de uma composição musical entre músicos era a escrita, por meio de cópias manuais de partituras, porém, com o desenvolvimento tecnológico, esta realidade mudou significativamente.

As novas possibilidades de produção e reprodução de diversas cópias de modo quase instantâneo, proporcionaram um primeiro canal de transmissão de informação musical evoluindo até a era do rádio, da televisão, do vídeo e mais recentemente do computador e internet. Todos tiveram um importante significado em suas respectivas épocas de surgimento.

A facilidade da transmissão de informações, principalmente pela possibilidade de gravar o som e repassá-lo, marcou um novo período em que o acesso à música é extremamente simples. Pode-se aprender com os grandes mestres do passado, aprender com a música vinda de países distantes, aprender com metodologias feitas por professores de renome, ou até mesmo aprender com os próprios erros.

As TICs podem juntar elementos da educação formal com outros da não formal, trazendo benefícios tanto no aspecto prático para utilização destes meios quanto às teorias mais generalizadas presente no âmbito acadêmico, aproximando desta forma a prática real da performance instrumental com a academia, estimulando talvez um maior número de músicos a tornarem-se também pesquisadores.

Destaca-se que não raramente os músicos na contemporaneidade estão completamente envolvidos com as tecnologias, inserindo-as em sua rotina diária de trabalho, já que entender de equipamentos eletrônicos e digitais passa a ser um requisito básico no processo de produção, criação e divulgação de trabalhos musicais. De outro lado, esta também pode vir a ser a tendência no ensino da música, em que professores precisarão incluir tais recursos em suas metodologias e sistemáticas.

Contudo, a formação do professor de música também deve passar por uma reflexão profunda e ampla do seu currículo formal, proposto pelo sistema educacional vigente; considerando que a epistemologia da arte não se configura somente pelo fazer artístico, é preciso também refletir, exercitar o julgamento, comparar, analisar, interpretar, assim como entender o lugar da arte no tempo e na cultura.

Tais saberes talvez sejam imprescindíveis, posto que a experiência vivida pelos alunos, futuros professores, têm influência significativa e exerce grande importância na própria ação pedagógica.
    
Há uma preocupação com a formação intelectual através das disciplinas do curso, no que diz respeito às teorias, textos e conteúdos para o domínio de conhecimentos no processo de ensino/aprendizagem, indispensáveis para uma boa formação do professor. Mas, apenas o conhecimento teórico não é o suficiente. A necessidade da prática é indiscutível. Porém, a falta de articulação entre a prática e o conhecimento teórico ainda é sentida na preparação e formação do educador, deixando para um segundo momento a experiência e a vivência da arte (observar, experimentar, construir e viver).

Um novo tipo de sociedade condiciona um novo tipo de arte. Porque a função da arte varia de acordo com as exigências colocadas pela nova sociedade; porque uma nova sociedade é governada por um novo esquema de condições econômicas; e porque mudanças na organização social e, portanto, mudanças nas necessidades objetivas dessa sociedade, resultam em uma função diferente de arte. (KOELLREUTTER, 1997)


A arte, em geral, sempre foi muito importante no processo de desenvolvimento da humanidade.

De acordo com  Buoro (2003 p.21)
Para construir imagens o homem não só deve ter sensibilidade para o fenômeno, mas necessita de memória e capacidade de tomar decisões. Até mesmo no caso das imagens nas cavernas, estas já são imagens transformadas a partir de um olhar, com certo domínio do espaço e do tempo.
Elas estão ligadas não só ao próprio sustento do homem, mas a experiências coletivas e sociais, advindas de rituais, crenças, gestos e danças, materializadas por meio de sistemas de signos.

A arte enquanto linguagem, interpretação e representação do mundo é uma forma privilegiada no processo de representação humana, pois propicia ao homem contato consigo mesmo e com o universo. A arte é uma forma de o homem entender o contexto ao seu redor e relacionar-se com ele. O conhecimento do meio é básico para a sobrevivência, e representá-lo faz parte do próprio processo pelo qual o ser humano amplia seu saber.

Ao desenhar nas paredes ou fabricar cestarias e cerâmicas, o homem primitivo era impulsionado pelas mesmas questões de sobrevivência que motivaram o homem do Renascimento e o do século XX. A arte, então, aparece no mundo humano como forma de organização, como modo de transformar a experiência vivida em objeto de conhecimento que se desvela por meio de sentimentos, percepções e imaginação. Assim, ela abarca um tipo de conhecimento a partir de universos sensíveis e ideais da apreensão humana da realidade.

É preciso, entretanto, salientar que, embora a questão básica do conhecimento seja a mesma desde o homem primitivo, suas manifestações mudam ao longo do tempo. Toda obra de arte é filha de seu tempo.. Diz Kandinsky (1990, p.27 apud BUORO, 2003, p. 24), ... e muitas vezes, mãe de nossos sentimentos. Cada época de uma civilização cria uma arte que lhe é própria e que jamais se verá renascer ....

Essas mudanças na arte refletem as transformações que se processam na realidade social. A arte evidencia sempre o momento histórico do homem, cada época, com suas características, contando o seu momento de vida faz um percurso próprio na representação, como questão de sobrevivência.

Conforme Buoro (2003) entende-se arte como produto de uma relação homem/mundo, em que o homem ao interpretar a própria natureza, constrói formas, contudo, ao mesmo tempo ele se descobre, inventa figura e conhece.

Nessa perspectiva é preciso repensar a formação do professor de arte, no sentido de possibilitar um conhecimento capaz de promover a totalidade do ser, a fim de contribuir efetivamente na formação de pessoas mais críticas e criativas que, no futuro, atuarão positivamente na transformação da sociedade.

Nesta pesquisa elegeu-se como objeto de estudo, dentre as várias linguagens artísticas, a formação do professor de música, por entender que a música, em razão de sua especificidade como linguagem com características e conteúdos próprios, ressentiu-se das deficiências dos cursos de formação de professores, e a conseqüência foi o esvaziamento dos conteúdos dessa linguagem.

Para melhor tratar esta questão, talvez seja necessário resgatar o valor aqui atribuído a educação musical, aprofundando a temática a partir de algumas reflexões, cuja gênese está pautada no pensamento Platônico, que reconheceu haver na produção musical estreitas relações com o sistema social e político, pois ... não se poderia mudar a música se não mudasse primeiro a constituição do Estado. (D'OLIVET, 2002, p. 20).

Considera-se pertinente essa concepção porque de acordo com a postura platônica, ao invés de situar a perfeição da música em sua faculdade de afetar prazerosamente a mente, ressalta a primazia da razão e da verdade para compreender essa complexa trama de sons e significados, portanto, a beleza da música consiste, na verdadeira beleza da virtude. (D'OLIVET, 2002)

Na educação musical, busca-se conciliar a racionalidade com a emoção.  Esse é um dos aspectos importantes a serem considerados no processo de ensino aprendizagem, ou seja, buscar na música a essência da vida. E a música poderia proporcionar ainda, por meio de vivências claras e profundas, experiências expressivas e conhecimentos significativos sobre a sociedade, a cultura e política.

Para Platão (427-347 a.C) citado por D'Olivet (2002, p. 11) O homem bom ... é um músico por excelência, porque cria uma harmonia não com a lira ou qualquer outro instrumento, mas com o todo da sua vida.

O benefício que a música, assim como todas as artes de uma forma geral, poderia trazer ao homem não se encontra unicamente no prazer da exaltação dos sentidos ou no prestígio trazido pela habilidade em tocar qualquer instrumento, mas, no desejo de se tornar mais sábio e moralmente melhor através do desenvolvimento das faculdades racionais próprias do ser humano.

Entender a música como uma linguagem é entendê-la como um discurso que fala da alma, indo muito além do que se imagina (LOUREIRO, 2003, p. 153) de acordo com a autora, encontrar o caminho que leve à compreensão e ao esclarecimento da objetividade da educação musical é desvelar sua identidade no contexto em que se situa.

Assegurar um lugar para a música no contexto escolar, sobretudo público, não tem sido tarefa fácil. Se ela existe, é principalmente na escola de educação infantil, com caráter lúdico e recreativo perdendo sua força com a progressão dos anos, até desaparecer por completo.

Dessa forma, a educação musical vê-se diante de um desafio que, sem dúvida, apresenta-se como o alicerce para uma prática efetiva e consistente do ensino de música: promover, de modo amplo e democrático, uma educação musical séria e de qualidade em todos os níveis de ensino.

Com o processo de globalização surgem novas influências na produção do conhecimento, e a formação do professor de música, imerso nesse contexto, apresenta novos questionamentos que demandam outros redimensionamentos para os conteúdos curriculares.

A estrutura curricular em algumas instituições de ensino, pode cercar o cotidiano acadêmico, levando o futuro professor, ainda em processo de formação a se tornar mero executor de tarefas, distanciando-o da realidade exterior ao contexto institucional e silenciando-o em sua individualidade.

Segundo Loureiro (2003, p. 164)
A generalização e a uniformização vão desde hábitos, gostos, informações, preferências. Todos passam a fazer parte da massa globalizante e de uma homogeneização cultural, em decorrência da proximidade de certos produtos, até mesmo a música, sabiamente vinculada pelos meios de comunicação.

Diante da influência causada pelas transformações culturais e sociais, uma nova postura é exigida, um repensar o processo de ensino aprendizagem, o que significa, sobretudo, lançar um olhar mais reflexivo sobre a formação de professores de música.

Para Loureiro (2003), as práticas pedagógicas vêm oscilando entre dois extremos: de um lado, está o modelo tradicional que privilegia a transmissão de conteúdos de modo linear e seqüencial. Professores que o utilizam acreditam que o rigor metodológico seria a única maneira de transmitir o conhecimento, além de combater a falta de interesse, a baixa capacidade de concentração e a superficialidade nos alunos.

Do outro lado; adota-se um procedimento não linear, uma prática pedagógica apoiada em uma nova maneira de apreensão do mundo, propiciando experiências vivas e variadas, tão mutantes quanto curtas e diversas, em conformidade com o imediatismo da música.

A música vem desempenhando, ao longo da história um importante papel no desenvolvimento do ser humano, seja no aspecto religioso, moral ou social, contribuindo para aquisição de hábitos e valores indispensáveis ao exercício de cidadania.

Segundo Schön (1992), a sociedade contemporânea atravessa um processo cíclico de reforma educativa, o que significa uma nova consciência da inadequação da educação. O autor discute que é necessário buscar novas formas de considerar o processo de formação de professores, criando oportunidades em que sejam destacados os valores da prática como elemento de análise e reflexão do professor; a formação contínua baseada nas atividades de sala de aula, próxima de problemas reais enfrentados pelos professores; a formação que considera a dimensão participativa, flexível e investigadora do professor no processo de formação do aluno.

É importante resgatar no processo de formação do professor, sua identidade profissional, pois as inúmeras reflexões sobre a prática pedagógica docente em busca de um maior domínio das ações educativas. Se por um lado, tem-se exigido uma autonomia profissional do licenciado em música, que pressupõe clareza e responsabilidade nas decisões e escolhas de como e o que ensinar.  
Por outro lado, há que se cuidar da formação do formador do professor considerando as novas tecnologias da sociedade contemporânea.

Ressalta-se ainda, que um olhar mais atento sobre as Tecnologias da informação e comunicação na formação do professor de música especificamente, se justifica devido à estreita relação entre a produção artística de maneira geral e o uso das tecnologias.

Pontua-se que os programas de formação de professores ainda estão muito presos, em tecnologias educacionais que ensinam as técnicas de musicalização, indicando métodos e materiais didáticos para esse tipo de ensino, exigindo como avaliação de desempenho, apenas a repetição das técnicas e das informações teóricas.

O processo de formação do professor se reduz à capacitação do mesmo para ser um repetidor de ações pedagógicas dos diferentes educadores musicais com quem ele teve contato.

Os professores que desejam uma reforma no ensino precisam estar sensíveis aos múltiplos aspectos que afetam a qualidade da educação oferecida aos alunos.  Um desses aspectos diz respeito às necessidades de formação dos estudantes para que, no futuro, possam assumir profissionalmente o papel de cidadãos conscientes de seus papéis na sociedade.

Nessa perspectiva é importante, também considerar no processo de ensino aprendizagem questões significativas para a vida dos alunos, para que os mesmos possam desenvolver a percepção para elaborar conceitos e definições baseados em experiências próprias e saibam fundamentá-las em teorias já desenvolvidas, refazendo e revisando cada ação num movimento contínuo e dialético, com base nas tecnologias e informações da sociedade contemporânea.

De acordo com Barbosa (2003, p. 114)
Pode-se dizer, mesmo que, algumas vezes, foi a arte que impulsionou o aparecimento de tecnologias: não houvesse a preocupação estética com a imagem, com o design, não haveria a diversidade de programas para seu tratamento e aprimoramento.

Desta forma, os artistas oferecem situações sensíveis com as tecnologias, pois percebem que as relações do homem com o mundo não são mais as mesmas depois que revolução da informática e das comunicações nos coloca diante da robótica, da inteligência artificial, da realidade virtual e de outros inventos que vêm se destacando no limiar deste século. (DOMINGUES, 1997)

Hoje, tudo passa pelas tecnologias e a humanidade está marcada pelos desafios políticos, econômicos e sociais decorrentes de uma nova configuração da realidade, em que campos da atividade humana, estão utilizando intensamente as redes de comunicação e a informação computadorizada.

Convém destacar que em comparação com outros países, como Estados Unidos, França, Noruega, ainda são escassas as pesquisas brasileiras sobre a criação de tecnologias educacionais para música. Igualmente, não tem sido possível identificar um aumento expressivo de sua utilização na educação musical em geral. (KRÜGER; LOPES; FICHEMAN; DEL BEN, 2003)

Tal questão possivelmente poderá ser sanada, se os cursos superiores de licenciatura em música, promoverem a familiarização dos professores com as novas tecnologias, em termos de possibilidades e limites para a educação musical. Por outro lado, também se entende que é simplista pensar que o uso mais freqüente destes recursos na licenciatura pode contribuir significativamente durante o processo de ensino aprendizagem do acadêmico.

Corroborando com esta reflexão afirma Biasoli (2004, p. 8)
Pensar como acontece a formação do professor de arte na universidade é, de certa forma, ir ao centro do problema de como se dá esse ensino na escola, com concepções e posicionamentos acerca da arte e da educação.

A formação do professor de arte, de acordo com Biasoli (2004), continua sendo feita de modo precário, desarticulada, tanto em relação à teoria e a prática como em relação ao conhecimento da arte e ao conhecimento pedagógico.
Assim ao investigar a formação do professor de arte, especificamente o licenciado em música, foco deste trabalho, considerando o uso das TICs, durante o processo de ensino aprendizagem, busca-se resgatar algumas questões pertinentes às abordagens atuais do ensino universitário.

De acordo com Hentschke (2003, p 123)
Uma das condições primordiais para alguém dedicar-se à delicada tarefa de ensinar, de acordo com Gainza (1964), é sentir uma verdadeira paixão pelo objeto de ensino. Esse sentimento, diz, ela, quando verdadeiro, vem acompanhado de um grande desejo ou necessidade de multiplicar e difundir esse foco de interesse.

Contudo, a paixão se não estiver acompanhada pelo conhecimento profundo sobre a matéria que se ensina e uma sólida preparação pedagógica, pouco contribuirá para um ensino de qualidade.

De acordo com Hentschke (2004), quanto mais completa e abrangente for a cultura geral e musical do licenciado em música, maior amplitude e domínio ele demonstrará na prática de sala de aula, pois música e cultura são elos importantes no processo de ensino aprendizagem.

Para Loureiro (2003), o momento atual vem trazendo, no campo musical, inúmeras novidades, com produções nos mais variados estilos, exigindo dos professores e dos profissionais da música uma nova maneira de perceber, experienciar e ouvir.

Referências
BARBOSA, Ana Mae. (org.) Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002.

BIASOLI, Carmen Lúcia Abadie. A formação do professor de arte. Do ensaio à encenação. São Paulo: Papirus, 2004.

BUORO, Anamélia Bueno. O olhar em construção: uma experiência de ensino e aprendizagem da arte na escola. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2003.

D OLIVET Antoine. Fabre. Música: explicada como ciência e arte e considerada em suas relações analógicas com os mistérios religiosos, a mitologia antiga e a história do mundo. São Paulo: Ícone 2002.

DOMINGUES, Diana. (org.) A arte no século XXI: a humanização das tecnologias. São Paulo: UNESP, 1997.


HENTSCHKE, Liane; BEN, Luciana. Del. (org.) Ensino de Música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Paulo: Moderna, 2003.

KOELLREUTTER, Hans Joachin. O centro de pesquisa de música contemporânea da Escola de Música da UFMG: uma nova proposta de ensino musical. In: anais do II Encontro Nacional de Pesquisa em Música. São João Del Rei, Minas Gerais: 1985, pp. 189-197.

LOUREIRO, Alicicia Moreira Almeida. O ensino da música na escola fundamental. Campinas, São Paulo: Papirus, 2003.

SILVA, Mozart Linhares (org).  Novas tecnologias: educação e sociedade na era da informação. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.