ECONOMIA DA ALDEIA COMUNAL KENNETH KAUNDA NO DISTRITO DE MASSINGA, PROVÍNCIA DE INHAMBANE. UMA EXPERIÊNCIA ORIENTADA AOS DITAMES MARXISTA-LENINISMO, 1975 – 1987

Por: Elcído Francisco[1]&
 Iceu Carlos[2]

 

Abstract

This current study is based on the economics of the communal Village Kenneth Kaunda in Massinga district, 1975-1987. The study is structured in three chapters, where in the first chapter, it depicts the natural picture of the Massinga district, making reference to the geographical aspects, economic structure, population density and historical cultural aspects. The second chapter then discusses the evolution of the economy of Massinga district before and after the proclamation of national independence in 1975. However, such an evolution of the economy in the colonial period was based on agriculture, cotton cultivation and migratory activity. Where in agriculture it can be observed that there was a differentiation, to those who developed indigenous agriculture and non-indigenous agriculture. The cotton crop is an income activity that provided the improvement of the living conditions of the population and later that population lost in favor of the Portuguese who had greater power in relation to the native populations, where they were relegated to less productive lands and were forced to sell their labor force to the local cotton company.therefore, migratory activity was an option found by the population of Massinga to some extent to improve the living conditions of their families by emigrating to the Republic of South Africa. Finally, the third chapter deals with the emergence of the Kenneth Kaunda communal village in Massinga, the socialization and cooperativism of small-scale peasantry, income cultures, major sectors of activity (trade, agriculture, livestock and artisanal industry), trade balance and gross domestic product, which contributed to the development of populations, and finally, the monograph presents a conclusion of the research.
 

Key words: Massinga, communal village, Kenneth Kaunda, economy, agriculture.

 

 

 

Introdução

Com o alcance da Independência Nacional em Junho de 1975, Moçambique, introduziu reformas significativas no aparelho do Estado que consistiram na nacionalização dos principais serviços e bens (terra, saúde, educação, fábricas e habitação). A planificação Socialista da economia em Moçambique, foi uma das bases essenciais para o sucesso que se pretendia naquele período. Porém, tal sucesso, não se reflectia na dinâmica do crescimento populacional, mas também, da distribuição territorial e das relações de produção existentes. Assim sendo, a socialização da economia em Moçambique, teve o seu auge no seminário nacional de Agricultura, realizado na província de Niassa, distrito de Marrupa, o qual procedeu as ideologias da criação de aldeias comunais. Tais aldeias eram tidas como fonte de acumulação para o desenvolvimento económico das comunidades locais. Em Massinga, o marco inicial foi dado quando se iniciou o processo da integração das famílias naquela aldeia comunal, onde foram registadas cerca de vinte (20) famílias[3]. Assim, aqueles registos, destinavam-se por um lado, a socialização do campo que figurava como uma das prioridades envolvendo o Estado e a população que vivia naquela aldeia comunal, assim como para controlar a população das migrações; e por outro, serviu para proteger a população do conflito civil que se fazia sentir no distrito de Massinga. Como resultado, surgiu a aldeia comunal Kenneth Kaunda no distrito de Massinga 1975 – 1987.

Procedimentos metodológicos

No presente trabalho recorreu-se ao método dedutivo, com a intenção de perceber o conteúdo das premissas por intermédio de uma cadeia de raciocínios em ordem descendente, da análise do geral, (a economia Socialista em Moçambique, 1975 – 1987), para o particular (a economia da aldeia comunal Kenneth Kaunda no distrito de Massinga, 1975 – 1987). A pesquisa desenvolveu-se em três fases: na primeira, fez-se a revisão bibliográfica dos autores que abordam o assunto, leituras de obras publicadas, teses, dissertações, monografias e alguns artigos publicados. Esta literatura serviu de base para a compreensão da evolução da economia Socialista em Moçambique. No segundo momento, foi o de trabalho de campo onde se procedeu as entrevistas semi-estruturadas. O tipo de amostra foi por acessibilidade, que “consiste em determinar um número que o autor teve acesso, o mesmo que garanta uma representação do universo. Esta amostra é destituída de qualquer rigor estatístico” (Gil, 1989, p. 97). A escolha desta metodologia deveu-se ao facto de maior parte dos indivíduos vividos na época em estudo principalmente naquela circunscrição de Massinga, já encontram-se espalhados, alguns desaparecidos ou na pior da hipótese falecidos. Por esses pressupostos que a pesquisa teve acesso a seis (6) indivíduos, dos quais dois (2) antigos combatentes da Luta Armada de Libertação Nacional, residentes em Massinga. A escolha destes, justifica-se pelo facto de terem vivido em vários aldeamentos, desde os promovidos pelos portugueses nos últimos anos da sua presença em Moçambique e mais tarde em aldeamentos criados pela Frelimo; ainda recorreu-se a um (1) professor da disciplina de História em exercício na Escola Secundária de Massinga, por aquele ter contribuído com ideias concretas com base em experiência da cooperativa de Guizugo e; finalmente, foram contactados três (3) cidadãos que viveram o período em estudo, por entender-se que estavam directamente associadas em aldeias comunais, e que deixaram ficar suas reflexões sobre aquele modelo Socialista em Massinga. Na terceira fase, foi a compilação das informações obtidas nas fases anteriores, culminando com a redacção do trabalho final.

A pesquisa pretende abordar a economia Socialista em Moçambique. Contudo, as aldeias comunais da província de Inhambane, representam uma temática pouco desenvolvida, por isso, pode contribuir no campo da história económica do distrito de Massinga. Para isso, funcionária como um documento complementar de conhecimento relacionado à economia Socialista em Moçambique, valorizando a relação existente entre os menos e mais sucedidos economicamente, contrariando a situação herdada no período colonial que se traduzia em descriminação racial, geográfica, cultural e até económica.

 

 

 

 

 

EVOLUÇÃO ECONÓMICA DO DISTRITO DE MASSINGA

A economia do distrito de Massinga, apresentava uma organização económica constituída basicamente pela agricultura e a força do trabalho migratório. Ademais, a agricultura dos nativos era tradicional baseada na dependência pedológica e climática. Entretanto, tal cenário reverteu-se com a chegada dos portugueses em Massinga, estes que obrigaram os nativos a fixarem-se nas terras menos férteis, e consequentemente começou a dependência, (Almeida, 1959, p. 73).

Para além disso, a força do trabalho migratório, era determinante na medida em que o recrutamento de cidadãos locais estava a cargo da WNLA[4], esta que regulamentava o recrutamento dos cidadãos, tal acção constituía uma fonte de rendimento importante em divisas para o colonialismo português, facto que levou a maioria dos cidadãos com idade activa (jovem) a passarem grande parte da sua vida activa naquele País vizinho, (CEA[5], 1998, p. 51). Por outro lado, com a conquista da independência nacional em 1975, evento que marcou uma roptura na forma de ser e de estar da economia do distrito, devido as novas políticas económicas adoptadas pelo novo governo da Frelimo, onde alguns sectores foram inovados enquanto outros foram reestruturados conforme as políticas centralizadas. Assim sendo, a tendência da evolução económica do período colonial para o pós-colonial foi invertida. Por exemplo, a agricultura foi nacionalizada nos moldes do Socialismo, aglomerando as pessoas em aldeias comunais, como forma de desenvolvimento e da socialização do meio rural.

Assim, na sequência daquela transformação, houve mudança dos “modus operandii” daquelas actividades (agricultura e o trabalho migratório). Todavia, com a conquista da independência nacional, maior parte dos bens e serviços foram nacionalizados, onde, por conseguinte, decidiu-se a escolha da economia planificada desenvolvida em aldeias comunais e cooperativas agrícolas. Ademais, no mesmo diapasão Araújo (1997, p. 27), aludiu que aqueles povoamentos rurais, eram compostos por 3 a 4 casas familiares, as quais aparecem disseminados pelos campos próximo das machambas familiares. Desse modo, era necessária a socialização do campo, através dela, romper-se a dispersão populacional e que posteriormente, surgiu uma outra forma de organização da população, que tornou-se em unidades de produção colectiva[6].

Enquanto, a força do trabalho migratório foi proibido para intensificar a produção agrícola e enfraquecer a economia da África do Sul. Sobre tal facto, (CEA, 1998, p. 115), explicou que os imigrantes sentiam-se completamente dependentes do seu rendimento na África do Sul, porque a actividade agrícola não rendia o suficiente capaz de minimizar os estragos da guerra e ainda com as calamidades naturais que se fizeram sentir em 1983 e 1984, que afectaram de forma cíclica algumas culturas e em desespero os camponeses alimentavam-se das suas sementes como recurso, o que de certa forma contribuiu para o baixo rendimento das famílias. Aquele baixo rendimento, obrigou maioritariamente a população jovem a imigrar para a Vila de Massinga e África do Sul, consequentemente resultou no comércio informal, bandidismo e mendicidade.

Assim, o sector agrário esteve no epicentro da evolução económica do distrito, onde, as populações priorizaram o mercado interno, não obstante, a diferenciação existente no período colonial. Aquela actividade agrícola, contribuiu na produção de alimentos que possibilitaram na sua sustentabilidade até o inicio de outras épocas agrícolas. Todavia, as culturas eram alternadas em cada época agrícola, principalmente as culturas de rendimento, como algodão, copra e a castanha de caju.

 

O DESEMPENHO DOS PRINCIPAIS SECTORES DA ECONOMIA NA ALDEIA COMUNAL KENNETH KAUNDA NO DISTRITO DE MASSINGA (1975-1987)

Factores do Surgimento da Aldeia Comunal Kenneth Kaunda

A aldeia comunal Kenneth Kaunda, surgiu do corolário de muitas outras aldeias como foi o caso da aldeia comunal Agostinho Neto, na cidade da Maxixe; aldeia comunal de Funhalouro, na circunscrição do mesmo nome; aldeia comunal Josina Machel e a aldeia comunal 25 de Junho. Estas duas últimas, localizavam-se no distrito de Vilanculos, implantadas depois da independência nacional em 1975. O objectivo principal da criação daquela aldeia comunal, era o da socialização da economia no meio rural em que, o poder deveria estar centralizado nas mãos dos operários e camponeses. Entretanto, convicto a socializar a economia, devia-se aglomerar a população local em aldeia comunal, com autonomia administrativa e uma economia de subsistência. A socialização a que se referia, prendia-se em várias teorias de organização económica, que defendia a propriedade pública ou colectiva dos meios de produção e distribuição de bens de uma sociedade caracterizada pela igualdade de oportunidades. Sobre as géneses do surgimento da aldeia comunal Kenneth Kaunda, são referidos por Sabão Mutota (2017), ao explicar que:

O primeiro factor que levou ao surgimento daquela aldeia comunal Kenneth Kaunda, foi pelo facto de muitas famílias dependerem dos salários dos imigrantes e ficavam muito tempo sem voltarem para as suas casas, por vezes, por ano voltavam uma vez. Daí que, a Frelimo optou por concentrar aquelas famílias camponesas em aldeias, ensinando lhes as técnicas de cultivo modernas. E o segundo factor, prende-se com a guerra civil, quando a Renamo entrou no interior do distrito vindo de Muri[7] em direção a Vila do distrito de Massinga. Os homens armados matavam e saqueavam os bens das pessoas e como forma de se livrar, as pessoas fugiram a procura de esconderijo, onde foram aglomeradas naquela aldeia comunal e outras imigraram para África do Sul. (Cp. Massinga, 25/09/2017).

O surgimento da aldeia comunal Kenneth Kaunda, estave associado numa fase inicial da colectivização da agricultura como base para superar a fome e também como um factor decisivo do governo da Frelimo. Mais tarde, aquela aldeia serviu como um centro para acomodar a população que sofria os efeitos da guerra civil. Tal conflito, causou dificuldades de sobrevivência aos habitantes da circunscrição de Massinga. Assim, uns imigravam para África do Sul com o intuito de serem contratados para trabalhar nas minas e outros refugiavam-se naquela aldeia como o único local de abrigo. Da conjugação dos factores (socialização da agricultura e a guerra civil), conclui-se que o governo da Frelimo conseguiu concentrar as pessoas, primeiro para impulsionar a produção colectiva como forma de socialização do campo, e segundo para criar maior controlo em uma aldeia comunal. Deste modo, os produtos seriam colectivizados em produção estatal.