Ele foi importado da Paraíba, mais exatamente de Areia. Meu pai – Sempre ele! – em uma viagem épica à sua terra natal, um belo início de noite, chega em uma caminhonete fretada no sítio trazendo o Severino, o novo caseiro, sua esposa e na caçamba um jumento. Eu, como quase sempre, também no sítio gozando mais uma licença prêmio da FCAP/UFRA.
Rapaz novo, com uns vinte e poucos anos, mostrou-se decidido na nova missão. Acomodaram-se na casa e no outro dia, com eu sempre fazia, apresentei-o aos demais – Brás e Avelino – e fomos à luta, isto é, aos trabalhos rotineiros. Na época estávamos preparando o plantio de forrageiras nos piquetes destinados aos porcos. Por iniciativa própria o Severino levava sua mulher para ajudá-lo. Não disse nada, preferi pagar pra ver. Não tinham filhos, portanto...
Certo dia, ainda na primeira semana, ele foi comigo à Vigia comprar algumas coisas que estavam faltando no sítio. Só eu e ele. Ao chegar na entrada da cidade, percebi logo um comportamento original e até engraçado: Ao ver passar uma mulher na calçada, o Severino só faltava pular da boleia. Acompanhava o passar cadenciado das mulheres, especialmente as vestidas de short, colocava o braço direito apoiado na janela e se esticava todo pra fora, prestes a ser lançado. O olhar acompanhava a mulher até quase ela sumir da vista!…
– Ôxi, biu! – Ouvia ele dizer, espantado, surpreso! Isso se repetiu diversas vezes. Imaginei que na cidade dele essa cena era rara ou inexistente.
A rotina das atividades no sítio estavam indo bem. O desempenho do Severino tava bom.

Minha licença terminou e tive que voltar para Belém. Na véspera, então, chamei ele e passei todo o bê-á-bá. As planilhas das atividades semanais e ao final entreguei-lhes um revólver 22, que tinha comigo, recomendando-o guardá-lo no escritório e claro, usá-lo em uma eventual, porém, improvável tentativa de invasão à propriedade, porém, nunca sair com ele, seja pra onde fosse!
No final de semana seguinte, retornei ao sítio. Ao encontrar com os demais funcionários: o Brás e o Avelino, um deles me chamou prum canto e disse:
– Seu Carlos, o Severino aprontou! – Fitei-o aguardando que continuasse.
– Ele foi pro igarapé de Santa Maria! Lá encheu a cara e começou a atirar com um revólver!!! – Meus olhos ficaram esbugalhados de espanto! Chamei ele pra dentro de casa, para um ambiente mais sossegado e pedi que ele relatasse com mais detalhes o ocorrido. Blá, blá, blá!!!

O Severino e a mulher estavam na roça, um pouco distante da casa.

– Ele tava só ou levou a mulher? – Perguntei-lhes.

– Só, seu Carlos. Só!

– Mas qual o motivo? Por que ele levou o revólver? – Ele não soube responder.

No final da tarde resolvi conferir o caso lá mesmo em Santa Maria, uma comunidade relativamente próxima do sítio, onde inclusive moravam o Brás e o Avelino. Todos com quem conversei, confirmaram. Era um sábado, todos estavam se divertindo no igarapé quando de repente escutaram os tiros pro alto! E mais blá, blá, blá.

Retornei ao sítio. Decidi antes de tomar alguma providência, conversar com meu pai em Belém. Voltei domingo para Belém e no mesmo dia conversei com meu pai sobre o ocorrido. Ele, profundamente chateado, me fala que a decisão era minha. Ponderei que acataria a sua opinião e decisão, visto que foi ele quem trouxe o Severino da Paraíba para o sítio, etc. Ele não titubeou:

– Vamos cortar o mal pela raiz. Não podemos tolerar uma atitude dessa. Faz as contas dele, dá o dinheiro das passagens deles e dispensa o quanto antes. No final da outra semana, chamei o Severino e ele confirmou tudo. Apresentei minha posição a respeito do fato, anunciei a decisão de despedi-lo e entreguei-lhes o dinheiro do transporte de volta. Despedimo-nos e eles pegaram o primeiro ônibus pra Belém.