Um ano atrás tive um sonho.

 Acordava preso a uma cadeira a qual não existiam cordas, algemas e nenhum outro acessório que pudesse me prender, eu simplesmente me sentia imóvel, como um tetraplégico numa cadeira de rodas eu só podia mover a boca e os olhos, mas mesmo mexendo a boca eu tentava gritar e não conseguia, parecia estar mudo.

                No sonho eu me encontrava em meio a uma bancada redonda que me rodiava e nela havia varias pessoas em torno, ao observar melhor eu vi que essas pessoas era eu mesmo, e cada eu sentado naquela bancada se intitulava por uma emoção e outros 3 se intitulavam passado, presente e futuro.  Esses três eram diferentes dos demais, eles pareciam juízes e os outros pareciam testemunhas ou vitimas, não conseguia diferenciar, atrás de cada um havia um relógio, mas não era um relógio comum, eles iam do zero aos 89 e aquilo me intrigava. Eles também giravam de formas variadas, o relógio do passado ia bem devagar, o do presente era rápido e o do futuro mal rodava, ao observar melhor vi que o relógio do futuro não estava completo, tinha só alguns números.

                Minutos iam passando e nada acontecia, eles me observavam, mas não sabia qual era a intenção deles, passando mais alguns minutos a sala em que eu me encontrava deu um estalo e então tudo se apagou, a sala ficou completamente escura, eu não enxergaria  a minha própria mão, era como se eu fechasse os olhos, então um novo estalo se deu ao fundo da sala e uma luz se acendeu bem distante do ponto em que eu me encontrava logo em seguida a cadeira em que eu estava começou a deslizar rapidamente rumo a luz,  foi tudo muito rápido.

                Ao me aproximar da luz havia uma mesa e nela havia dois botões um verde que dizia certeza e um vermelho que dizia duvida, e do outro lado da mesa havia uma pessoa que não dava para ser reconhecida devido à escuridão em torno, logo em seguida essa mesma pessoa se debruçou sobre a mesma expondo sua face, então novamente vi a mim mesmo, era como se estivesse olhando no espelho, esse outro me disse que se chamava passado,  durante alguns minutos ele olhou firmimente em meus olhos, e eu não tinha escapatória já que ainda estava imóvel, eu podia sequer desviar o olhar, eu não tinha posse de mim mesmo, estava vidrado, paralisado por completo.

Então o passado se levantou lentamente da cadeira, e mirou aquela luz diretamente nos meus olhos, acho que ele tinha a intenção de ofuscar minha visão, mas dava para perceber sua presença a minha volta. Ele começou a caminhar calmamente ao meu redor, percebi isso ao ouvir os seus passos, sentia um olhar pesado sobre meus ombros como a sensação de ser perseguido era como se ele estivesse me analisando ou então pensando em algo pra perguntar, parecia aqueles interrogatórios policiais que passa na TV, só que agora era comigo mesmo, e eu não tinha cometido crime algum - pelo menos eu achava-. Após algumas voltas em torno de mim ele voltou a se sentar e retirou a luz de meu rosto, então ele começou a fazer perguntas, perguntas simples tipo qual era o meu nome, a minha idade, onde eu morava e a cada pergunta respondida ele apertava o botão da certeza.

Novamente ele se calou, olhou pra mim calmamente e perguntou o que eu achava do meu passado, achei a pergunta estranha, mas sem pensar muito eu respondi que ele era bom, então ele balançou a cabeça em um sentido negativo e logo em seguida apertou o botão vermelho de duvida, logo em seguida o chão tremeu e as paredes da sala que eu estava caíram e em frações de segundos eu me encontrava em outro local completamente diferente.

Nesse local eu tinha recuperado todo o comando de meu corpo, mas naquele momento eu não tinha mais a vontade de acordar logo ou fugir, eu me sentia curioso pra saber onde aquilo ia parar logo em seguida uma criança corre a minha frente brincando, e depois de olhar melhor para criança vi que essa criança também era eu mesmo.

O Passado me chamou pra acompanhar ele e começamos a conversar sobre o meu passado, e durante horas e horas viajamos pelo meu passado, revendo momentos indesejáveis, ações erradas, caminhos errados e tudo mais de ruim que havia dentro de mim, era como se ele passa-se uma peneira nas minhas lembranças expondo tudo de ruim que havia.  Ele me faz enxergar meu passado com outros olhos e não era uma boa visão, com algumas lembranças eu ficava amargurado, com outras envergonhado, e a cada lembrança um novo sentimento despertava dentro de mim, depois de rever todas as lembranças as paredes da sala se reergueram em torno de min.

A sala já não era mais a mesma, dessa vez eu estava em tribunal onde eu era o réu, e no banco das vitimas encontravam-se vários e vários eus sentados, e cada um se intitulava respectivamente uma emoção que eu havia sentido durante o passeio com o Passado, no banco do júri havia apenas o eu que se chamava razão, compaixão, paciência, perdão e piedade, não entendia o porquê deles, mas eles estavam lá. Sem eu perceber haviam começado o julgamento, o meu julgamento o julgamento sobre o meu passado, e era tudo muito complicado.

Não conseguia explicar nada daquilo, eu não entendia o porquê, até que então a porta do tribunal se abriu e três homens encapuzados entraram e vieram andando bem lentamente em minha direção e pelo que pude observar todos no tribunal se silenciaram na presença dos 3, então dois deles me pegaram pelo braço e o terceiro nos acompanhava, ao atravessar a porta entrarmos em um corredor que havia varias portas, eu perguntava pra que era aquelas portas todas, mas ninguém me dizia, conforme íamos andando ele ia escurecendo até que chegamos a um ponto que não dava pra ver mais nada mas mesmo assim continuávamos a andar, depois de não muito tempo paramos e eles me colocaram em outra cadeira me amarraram e me vendaram.

  Não muito tempo depois comecei a escutar vozes e em seguida um silencio total, de novo eu escutava passos mas dessa vez não conseguia saber onde eram então os passos se cessaram e um homem tirou a venda que tinham me colocado foi ai que vi que me encontrava na mesma sala do inicio do sonho só que existia algumas diferenças, o Passado, por exemplo, já não estava mais se encontrava na sala, nem ele nem qualquer outra emoção que estava no tribunal.

Dessa vez o Presente se levantou da mesa dele calmamente andou até mim, se apoiou nos braços da cadeira, olhou nos meus olhos disse “prepare-se”, então o chão se abriu e cai em um rio, ainda me encontrava preso a cadeira e a correnteza era forte, não demorou muito para que eu começasse a me afogar, desesperado tentava me soltar da cadeira até que cheguei a um ponto que tinha desistido de me soltar, me acalmei aceitando que não podia lutar contra aquilo, foi ai que eu consegui me soltar da cadeira e comecei a boiar sobre a água.

Novamente foi estranho, eu não entendia o como tinha me soltado da cadeira ou como boiava, só sabia que eu estava calmo e fluía assim como a água, mesmo calmo e boiando eu tinha começado a procurar a margem do rio e ao olhar pro lados vi diferença, de um lado a mata era morta, escura, sem vida, do outro a  mata tinha vida, era mais verde, comecei então a nadar a margem do rio que tinha mais vida. Eu nadava, mas parecia que não adiantava era como seu eu não saísse do lugar, nadei tanto que cheguei a ficar cansado e quando mais cansado eu me sentia mais desesperado eu ficava e conforme meu desespero eu novamente começava a me afogar e com isso as águas ficavam violentas novamente e o desespero era maior a cada segundo que se passava.

Novamente a vontade de desisti veio à tona, novamente me acalmava aceitando que ali era meu fim e novamente eu voltava a boiar sem fazer o mínimo esforço, então dessa vez eu simplesmente me acalmei, fechei os olhos e segui junto à correnteza.

O tempo ia se passando e a correnteza ia ficando mais forte, mas ainda me mantia calmo como se estivesse dormindo dentro de um sonho, por um breve momento resolvi abrir meus olhos apenas pra ver onde eu estava.

Ao abrir os olhos me deparei com uma visão completamente diferente, no rio que eu estava havia varias bifurcações e cada bifurcação tinha em sua volta um tipo de mata, umas tinham a mata mais exótica, outras uma mata mais simples e algumas não havia mata nenhuma e água era mais violenta, foi nesse ponto que resolvi nadar de novo, não queria me deixar levar por águas violentas, dessa vez eu nadava, mas tinha resultados, dentre todas as bifurcações eu tinha escolhido uma onde a mata era mais simples, porém era mais verde que qualquer outra.

Durante o percurso fui observando varias arvores e todas com frutos, tudo estava calmo era uma perfeita sensação de bem estar, tentei nada pra margem do rio até que eu consegui, ao sair da água comecei a explorar tudo aquilo que havia em minha volta, parecia que eu nunca tinha visto nada daquilo, pra mim tudo aquilo era algo inédito.

Escutei um barulho no meio da mata, comecei a procurar o que era mais não achava nada, fiquei com medo, e o barulho ficava mais forte, alguém além de mim também estava ali  comecei a correr em busca da margem do rio e a cada barulho eu olhava pra traz e em um desses barulhos eu olhei para traz e desmaiei.

Não sei quanto tempo depois acordo de novo na mesma sala do inicio do sonho, mas dessa vez não havia absolutamente ninguém na sala além de mim, dessa vez eu não estava amordaçado nem preso a uma cadeira qualquer, eu estava solto, mas mesmo solto não havia pra onde fugir porque aquela sala era toda fechada, minha única opção foi sentar na cadeira que estava no meio da sala e esperar acordar, mas antes mesmo que eu pudesse acordar como eu esperava, um outro Eu veio em minha direção, me estendeu a mão e me disse “venha, me acompanhe”, cedi ao pedido, me levantei da cadeira e segui o homem e sem entender o porque fomos andando em direção a uma parede e quando ele chegou perto uma porta se abriu e ao atravessar a porta estávamos em um jardim.

O jardim em uma parte era bem cultivado, mas tinha algumas plantas mortas, outra parte estava recém plantada nada havia nascido ainda e outra a terra ainda estava sendo preparada pra plantio, então o outro Eu começou a conversar comigo, falava sobre minha vida, eu então perguntei o porque estávamos naquele jardim, ele parou, olhou em meus olhos mas nada disse, apenas sorriu olhou para o chão e continuou a andar. Andava como uma criança, ele ria sem motivo, chutava as pedras pelo caminho só pra ver onde  ia parar, mas apesar de andar como uma criança ele tinha um ar de seriedade, o ar de um homem com quem não se deve brincar.

Eu apenas o acompanhei pelo jardim, não havia mais conversa e sempre que eu tentava falar alguma coisa ele pedia meu silêncio, ele apenas dizia, “aproveite o momento”.

Depois de um tempo ele disse, “pronto, é hora de voltarmos”, e assim foi feito, voltamos pra sala pela mesma porta.

A sala estava diferente de novo, dessa vez só tinha quatro lugares, em toda a sala, um lugar era meu, em outros dois o Passado e o Presente se encontrava sentados a minha espera e o terceiro lugar era do Eu que me acompanhava, ele era o futuro.

Todos se sentaram e um quinto homem surgiu, ele não era nenhum um pouco parecido comigo, e durante todo o sonho foi a única pessoa alem de mim mesmo que eu tinha visto, ele se aproximou de mim e disse “pronto agora é a hora das perguntas”.

Fiquei desconfiado, sinceramente achei que poderia ficar trancado em uma sala de novo ou então ser jogado em um rio novamente, quem sabe visitar outro jardim. E o homem disse novamente “vamos, o que está esperando, pergunte!”.

Eu me levantei da cadeira e comecei a pensar em perguntas de todo o tipo pra fazer. Primeiro eu perguntei o porquê daquele sonho e o quinto homem respondeu que isso eu deveria saber por conta própria, que os 3 só aceitariam perguntas diretas, então perguntei o que significava os relógios que cada um tinha, e cada um respondeu, o Passado disse que o dele significava nada mais nada menos que o próprio passado e que ele rodava devagar por causa do tempo, que a vida e longa e o passado se faz a cada dia, o Presente disse que o relógio dele representava o agora e que girava rápido porque o presente se da a cada segundo de vida, e o Futuro disse que o relógio dele estava incompleto porque o futuro ainda está pra se fazer.

Perguntei então porque os relógios iam do 0 ao 89, e o futuro respondeu por todos eles, disse que aquele era meu tempo de vida.

Então fiz só mais seis perguntas, uma para cada um, a do Passado foi o porque daquele interrogatório e ele disse:

_ O passado pode não pode ser apagado muito menos reescrito, mas podemos decidir o que lembrar sua vida não foi perfeita e você ainda se condena pelos seus erros do passado, sua vida nunca seguirá adiante se você carregar dentro de si as magoa do passado, lembre-se de que para voar não precisa apenas ter asas, precisa querer, e as coisas ruins que você guarda dentro de si te prende ao chão. Por isso te fiz rever todo seu passado, porque pior que seja você não deve viver dentro dele, porque o passado é passado.

Perguntei então o porque de todas aquelas portas no corredor, ele disse:

_Aquilo são as portas do passado, cada uma abre uma lembrança, mas nem todas as portas devem ser abertas, porque você nunca sabe o que está de cada uma delas.

Então me aproximei do presente e perguntei o porquê ele me jogo no rio, ele olhou pra mim sorriu e disse:

_Meu caro, o presente é como um rio, ele corre rápido.

Perguntei então se ele podia me explicar melhor, ele disse que sim e começou a explicar:

_ Como eu disse, o presente é como um rio, e nesse rio não podemos nos desesperar, devemos seguir como segue a corrente, quando você nadava se afogava porque o presente é assim, se tomarmos decisões erradas na hora errada ele nos afunda, e só podemos subermergir quando nos acalmamos. Por isso na hora das bifurcações você não se afogou, pois aquele era o momento certo da decisão certa, cada bifurcação daquela era um caminho, e o caminho da nossa vida é agente que escolhe.

Era então a vez de perguntar ao futuro. Perguntei o porquê daquele jardim, ele respondeu:

_ Assim como o presente pode ser representado por um rio o futuro pode ser representado por um jardim, e nesse jardim você colhe o que planta, tudo é fruto das suas escolhes, se a colheita foi ruim, foi porque você não plantou de forma certa ou não cultivo como deveria.

Perguntei então aonde meu futuro iria me levar, ele riu e respondeu:

_ Ele vai te levar aonde você quiser que ele te leve, como eu disse o futuro é fruto das escolhas que fazemos no nosso presente

Antes que eu pudesse fazer a sétima pergunta eu finalmente acordei, acordei  no meio da madrugada e não consegui mais dormi, e levei aquele sonho como um aviso, e comecei a seguir os conselhos do futuro passado e presente.

Parei de me martirizar pelas escolhas erradas do passado, comecei a viver o presente sempre plantando pra cultivar no futuro.

E hoje? Hoje sou mais feliz, sou mais eu, hoje vivo o presente, penso no agora e semeio o futuro e ainda sonho, sonho pra que um dia eu sonhe com aquilo tudo novamente. Pra que? Acho que ainda devo agradecimento, agradecimentos a mim mesmo, já que só tinha eu mesmo no sonho. Tenho certeza que já sabia de tudo aquilo, eu só não enxergava.

È como dizem, os sonhos são um espelho da realidade