DIREITO POSITIVO OU DIREITO JUSTO?
Publicado em 01 de setembro de 2010 por Adriana Azevedo de Araujo Lima
DIREITO POSITIVO OU DIREITO JUSTO?
Um breve ensaio sobre as teorias desenvolvidas por Kelsen sobre moral e justiça
Adriana Azevedo de Araujo Lima
Na concepção da maior parte dos acadêmicos do Direito, Hans Kelsen é um ícone representativo do Direito Positivo, utilizado como exemplo por quem valoriza a "dura Lex", e acredita que valores como a moral, os costumes do local devem ser excluídos para redigir as peças e julgar as ações. Contudo, estudando a teoria Kelseniana através dos escritos do próprio Kelsen, descobre-se que este famoso autor foi além da Lei pela Lei. No livro "O problema da justiça", logo em sua introdução, discorre sobre a justiça como uma qualidade moral, e classifica-a (a justiça) como pertencente ao domínio da moral.
Faz um comparativo com a conduta social do indivíduo como forma de exteriorizar o seu sentimento de justiça, ou seja, se o indivíduo respeita as normas de conduta da sociedade a qual pertence, está sendo justo, ao contrário, se as transgride, está sendo injusto.
A maior parte dos doutrinadores contemporâneos considera que justiça se confunde com moral, quanto aos seus conceitos. Como exemplo, pode-se citar Dimitri Dimoulis, em sua apresentação do livro "O caso dos denunciantes invejosos", quando cita:
(...) A moral estabelece os comportamentos "justos", ou seja, os comportamentos adequados e aceitos em determinada sociedade. Nesse sentido, a moral impõe aos membros da sociedade determinados padrões de comportamento, seguindo o critério do justo. Por sua vez, a pessoa que é moralmente correta deve fazer o justo adotando regras de comportamento conforme o ideal da justiça social. Em palavras mais simples, a moral se identifica com a justiça porque nunca aquilo que é imoral pode ser considerado justo, nem aquilo que é visto como injusto pode ser moralmente correto (p. 12-13).
Kelsen faz, porém uma distinção entre moral e justiça, enfatizando que as noções dadas às normas de direito positivo e de justiça não podem caminhar juntas, vez que podem ser conflituosas entre si. Para justificar tal afirmação, utiliza-se do termo "validade", dizendo que:
(...) Em face de uma norma de justiça pressuposta como válida não pode ser considerada válida uma norma do direito positivo que a contradiga e, inversamente, em face de direito positivo pressuposta como válida não pode ser considerada válida uma norma da justiça que a contrarie (p. 06).
Noberto Bobbio, considerado um dos principais seguidores de Kelsen, afirma que:
(...) validade da norma jurídica indica a qualidade de tal norma, segundo a qual existe na esfera do direito ou, em outros termos, existe como norma jurídica. Dizer que uma norma jurídica é válida significa dizer que tal norma faz parte de um ordenamento jurídico real, efetivamente existente em uma dada sociedade (p. 136-137).
A partir dessa afirmação surge a dúvida entre qual seria o melhor sistema, o moralista, que deve harmonizar os preceitos morais com as normas jurídicas, ou o positivista, em que prevalece o que está escrito, positivado na Lei. Pode-se entender que o melhor caminho seria o moralismo da validade, que faz depender a validade de uma norma jurídica de seu acordo com as exigências básicas da moral.
Há de se fazer, portanto uma clara distinção entre moral e justiça, utilizando para tanto a regra de validade da norma jurídica, mas não em detrimento da norma de justiça, pois esta é a importância de estudar as normas de conduta social, saber que uma está fundada na outra, e se houver discordância entre elas, que prevaleça a norma jurídica, para evitar que haja divergência entre os muitos sistemas de regras morais e diversas opiniões sobre o justo e o correto. Todavia, de forma que o legislador seja sensibilizado e não utilize de caráter subjetivo ou, como afirma Lévy-Bruhl, as leis podem entrar em desuso, por constituírem "letra morta".
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995.
DIMOULIS, Dimitri. O caso dos denunciantes invejosos: introdução prática às relações entre direito, moral e justiça. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
KELSEN, Hans. O problema da justiça. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
LÉVY-BRUHL, Henri. Sociologia do direito. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
Um breve ensaio sobre as teorias desenvolvidas por Kelsen sobre moral e justiça
Adriana Azevedo de Araujo Lima
Na concepção da maior parte dos acadêmicos do Direito, Hans Kelsen é um ícone representativo do Direito Positivo, utilizado como exemplo por quem valoriza a "dura Lex", e acredita que valores como a moral, os costumes do local devem ser excluídos para redigir as peças e julgar as ações. Contudo, estudando a teoria Kelseniana através dos escritos do próprio Kelsen, descobre-se que este famoso autor foi além da Lei pela Lei. No livro "O problema da justiça", logo em sua introdução, discorre sobre a justiça como uma qualidade moral, e classifica-a (a justiça) como pertencente ao domínio da moral.
Faz um comparativo com a conduta social do indivíduo como forma de exteriorizar o seu sentimento de justiça, ou seja, se o indivíduo respeita as normas de conduta da sociedade a qual pertence, está sendo justo, ao contrário, se as transgride, está sendo injusto.
A maior parte dos doutrinadores contemporâneos considera que justiça se confunde com moral, quanto aos seus conceitos. Como exemplo, pode-se citar Dimitri Dimoulis, em sua apresentação do livro "O caso dos denunciantes invejosos", quando cita:
(...) A moral estabelece os comportamentos "justos", ou seja, os comportamentos adequados e aceitos em determinada sociedade. Nesse sentido, a moral impõe aos membros da sociedade determinados padrões de comportamento, seguindo o critério do justo. Por sua vez, a pessoa que é moralmente correta deve fazer o justo adotando regras de comportamento conforme o ideal da justiça social. Em palavras mais simples, a moral se identifica com a justiça porque nunca aquilo que é imoral pode ser considerado justo, nem aquilo que é visto como injusto pode ser moralmente correto (p. 12-13).
Kelsen faz, porém uma distinção entre moral e justiça, enfatizando que as noções dadas às normas de direito positivo e de justiça não podem caminhar juntas, vez que podem ser conflituosas entre si. Para justificar tal afirmação, utiliza-se do termo "validade", dizendo que:
(...) Em face de uma norma de justiça pressuposta como válida não pode ser considerada válida uma norma do direito positivo que a contradiga e, inversamente, em face de direito positivo pressuposta como válida não pode ser considerada válida uma norma da justiça que a contrarie (p. 06).
Noberto Bobbio, considerado um dos principais seguidores de Kelsen, afirma que:
(...) validade da norma jurídica indica a qualidade de tal norma, segundo a qual existe na esfera do direito ou, em outros termos, existe como norma jurídica. Dizer que uma norma jurídica é válida significa dizer que tal norma faz parte de um ordenamento jurídico real, efetivamente existente em uma dada sociedade (p. 136-137).
A partir dessa afirmação surge a dúvida entre qual seria o melhor sistema, o moralista, que deve harmonizar os preceitos morais com as normas jurídicas, ou o positivista, em que prevalece o que está escrito, positivado na Lei. Pode-se entender que o melhor caminho seria o moralismo da validade, que faz depender a validade de uma norma jurídica de seu acordo com as exigências básicas da moral.
Há de se fazer, portanto uma clara distinção entre moral e justiça, utilizando para tanto a regra de validade da norma jurídica, mas não em detrimento da norma de justiça, pois esta é a importância de estudar as normas de conduta social, saber que uma está fundada na outra, e se houver discordância entre elas, que prevaleça a norma jurídica, para evitar que haja divergência entre os muitos sistemas de regras morais e diversas opiniões sobre o justo e o correto. Todavia, de forma que o legislador seja sensibilizado e não utilize de caráter subjetivo ou, como afirma Lévy-Bruhl, as leis podem entrar em desuso, por constituírem "letra morta".
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995.
DIMOULIS, Dimitri. O caso dos denunciantes invejosos: introdução prática às relações entre direito, moral e justiça. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
KELSEN, Hans. O problema da justiça. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
LÉVY-BRUHL, Henri. Sociologia do direito. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.