Bianca Braga de Carvalho

São Paulo, 2019

1 Contextualização

Sobre o Direito Eleitoral, Lins (2014) diz:

A disciplina compreende temas como direitos políticos, nos quais se inserem, por exemplo, os institutos indispensáveis ao exercício da democracia, a capacidade eleitoral ativa e passiva, os partidos e as coligações; a organização e competência da Justiça Eleitoral e do Ministério Público Eleitoral, com todas as peculiaridades que lhe são inerentes; os sistemas eleitorais, inclusive os que estão em debate na chamada "reforma política"; as eleições, em todos os seus termos, desde as convenções partidárias até o ato de diplomação dos candidatos eleitos, além dos crimes eleitorais passíveis de ocorrência e seu respectivo processo.

Com a criação do Código Eleitoral instituído pelo governo Vargas no ano de 1932, algumas mudanças surgiram de forma a ampliar aos cidadãos o direito de voto e garantias legais que o suportavam. Pela primeira vez na história do Brasil, uma Justiça Eleitoral unificada foi criada, com divisão de órgãos dentro dessa.  O artigo 5º do Código Eleitoral de 1932 instituiu a criação do Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal Regional Eleitoral e de juízes eleitorais.

 Assim, no artigo 2º do Código Eleitoral de 1932, determina-se eleitor aquele indivíduo que for maior de 21 anos independente de gênero desde que seja alistado. Esse alistamento é uma inscrição federal que possui um processo a ser seguido, segundo o artigo 38 do mesmo Código. Nele, inclui-se declarar a naturalidade, estado civil, filiação, idade, profissão, residência e assinar de próprio punho tal registro. Além de, naturalmente, estar quite com os serviços militares se homem. Em tal época, a votação passou a ser em sigilo.

Getúlio Vargas, o mesmo que promulgou o primeiro Código Eleitoral em 1932, suspendeu as eleições livres para a população e extinguiu a Justiça Eleitoral no ano de 1937 numa ruptura histórica que ficou conhecida como o início do Estado Novo. A Justiça Eleitoral se tornou definitivamente um órgão do Poder Judiciário em 1946, logo após a deposição de Vargas em 1945 e também após a criação de um novo Código Eleitoral naquele mesmo ano, que resgatava, porém, conceitos fundamentais do Código de 32. Este, por sua vez, ficou em vigor até 1965, quando novas leis formularam o Código Eleitoral de 1965.

No Brasil, o código que está em vigor é o mesmo que foi sancionado em 9 de abril de 1964. Apesar do período de ditadura com diversos direitos civis e até mesmo políticos (Ato Institucional II determinava o bipartidarismo) suprimidos pelos Atos Institucionais, havia eleições no país para o poder Legislativo. Não haviam, porém, eleições para o Executivo.

Algumas mudanças presentes somente no código vigente são o alistamento facultativo aos menores de 18 e maiores de 16 anos, aos idosos maiores de 70 anos, aos analfabetos e aos indígenas; a idade mínima para alistamento obrigatório é de 18 anos, e não mais 21 como previsto em 1932; O pluripartidarismo é reinstaurado, em oposição ao bipartidarismo de 1965; somente em 1996 as urnas eletrônicas, a máquina de votar prevista no código de 32, foram implementadas; e após o movimento Diretas Já reivindicando eleições presidenciais diretas no início da década de 80 e, em seguida, da criação da Constituição Cidadã - a Constituição Federal de 1988 - o brasileiro vota para representantes do Executivo e do Legislativo.

2 Conceito de princípio

Os princípios são conceitos morais implícitos e explícitos que norteiam a tomada de decisões dentro do Direito como um todo. A palavra princípios traduz, de maneira mais ampla, a noção de proposições ideais que se gestam na consciência de pessoas e grupos sociais a partir de certa realidade e que, após gestadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade (DELGADO, 2009).

No conjunto de normas, códigos e leis complementares de todos os ramos do Direito (Administrativo, Penal, Eleitoral, entre outros) há princípios constitucionais gerais e setoriais. Segundo Barroso (2001), os gerais são princípios que se irradiam por toda a ordem jurídica, como desdobramentos dos princípios fundamentais. Já os setoriais são aqueles que presidem um específico conjunto de normas afetas a um determinado tema, capítulo ou título da Constituição.

Dessa forma, para a composição do Direito Eleitoral é evidente o empréstimo de princípios da Constituição Federal determinados pelo Poder Constituinte Originário que são aplicados e utilizados nos outros segmentos. O Direito Eleitoral pode ser encontrado expresso e previsto em suas fontes. No Código Eleitoral, na Constituição Federal, nas Leis Complementares, na Lei das Eleições, na Lei das Inelegibilidades, na Lei Orgânica dos Partidos Políticos e nas diversas jurisprudências e resoluções do TSE – Tribunal Superior Eleitoral.  Além disso, existem no Direito em sua totalidade - e dessa forma aplica-se também ao Direito Eleitoral - as fontes subsidiárias, que não são exclusivas ou originais do texto Eleitoral, porém também se aplicam às suas jurisprudências. Cabe também dizer que doutrinadores diferentes aplicam suas próprias nomenclaturas a princípios que, por sua vez, podem ser idênticos a outros com nomes diversos.

Pode-se citar, no caso do direito eleitoral, alguns dos princípios que lhe são atribuídos tais quais o Princípio das Lisuras Eleitorais ou Lisura das Eleições, Princípio do Aproveitamento do Voto, Princípio da Celeridade, Princípio da Devolutividade dos Recursos, Princípio da Anualidade ou Anterioridade Eleitoral, Princípio da Responsabilidade Solidária ou da Solidariedade, Princípio da Proporcionalidade e Razoablidade e Princípio da Isonomia. Vale enfatizar que existem diversos outros princípios que se sustentam em diversos códigos existentes nas normas jurídicas do país, e aqui são citados somente oito da totalidade.

Descriminando os princípios citados acima, tem-se:

2.1 Princípio das Lisuras Eleitorais ou Lisura das Eleições

Previsto no artigo 23 da Lei Complementar 64 de 1990, prevê garantir que o processo eleitoral seja limpo, sem vícios ou fraude.

2.2 Princípio do Aproveitamento do Voto

Previsto no artigo 219 do Código Eleitoral, prevê garantir o voto sob o “in dubio, pro voto[1]”. Assim, garante-se a soberania popular, de modo que prevaleça a vontade do povo através de seu voto, dando-lhe validade em caso de dúvida.

2.3 Princípio da Celeridade

Previsto no artigo 257 do Código Eleitoral, prevê garantir a máxima rapidez no processamento de todos os recursos, etapas e decisões da Justiça Eleitoral.

2.4 Princípio da Devolutividade dos Recursos

Previsto no artigo 216 do Código Eleitoral, garante que os recursos de âmbito eleitoral tenham apenas o efeito devolutivo, ou seja, enquanto não houver resposta ao recurso eleitoral ao candidato político, este não poderá ser suspenso de suas atribuições garantidas mesmo se já for diplomado.

2.5 Princípio da Anualidade ou Anterioridade Eleitoral

Previsto no artigo 16 da Constituição Federal, foi considerada uma cláusula pétrea pelo Superior Tribunal Federal, e é relacionada à segurança jurídica com o propósito de não permitir mudanças no processo eleitoral de forma que prejudique ou altere a eleição que ocorrerá dentro de um ano. Portanto, a eficácia da lei só acontece após um ano e um dia após entrar em vigor. Utiliza-se como exemplo a situação do Brasil na época do Império, e leis eram criadas às vésperas das eleições para se garantir maioria no governo, num modelo que contemplava o Imperador, os presidentes provinciais e a oligarquia da época. É também aí que ficou evidente a necessidade da Lisura Eleitoral para garantir um processo limpo e idôneo.

2.6 Princípio da Responsabilidade Solidária ou da Solidariedade

Previsto no artigo 241 do Código Eleitoral, prevê que numa coligação partidária, somente os indivíduos e partidos relacionados à um ato ilícito que ocorrera serão responsabilizados por tal, eximindo os não relacionados a este mesmo que no mesmo partido. Porém, esse é um princípio relativo que cabe diferentes interpretações e jurisprudências.

2.7 Princípio da Proporcionalidade e Razoabilidade

Previsto no parágrafo 3º do artigo 37 da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei 9096/95 – LOP). Prevê garantir a medida proporcional de sanção dentro dos limites considerados razoáveis aos casos ilícitos que poderão se passar.

2.8 Princípio da Isonomia

Apesar de ser um princípio previsto no artigo 5º da Constituição Federal, ele é também aplicado de forma adaptada no Direito Eleitoral, garantindo a igualdade entre os candidatos políticos quando em se tratando a corrida eleitoral, vedando então o uso de outdoors, showmícios e a participação de artistas em atos de promoção política.

 

3 Conclusão

O ordenamento jurídico brasileiro é um organismo vivo altamente dinâmico e relacionado a todos os seus códigos, leis, decretos, atos normativos, entre outros que trabalham entre si de forma complementar a fim de maximizar a eficiência e idoneidade dos processos legais servindo ao princípio democrático para a maior justiça para a população brasileira. O Código Eleitoral é revisto e complementado desde 2010 pela Comissão Especial da Reforma do Código Eleitoral atendendo a demandas públicas através de audiências nacionais e constantes análises pelos respectivos juízes membros dos Tribunais Eleitorais.

 

 

Referências

 

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 4ª edição, São Paulo: Saraiva, 2001.Disponível em:  http://www.angelfire.com/dc2/direito2004/constitucional/principios.pdf. Acesso em 02/04/2019.

CÂMARA LEGISLATIVA. Decreto 21076/32 – Decreta o Código Eleitoral. Disponível em:  https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-21076-24-fevereiro-1932-507583-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 02/04/2019.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Título I – Dos Princípios Fundamentais. Disponível em:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 02/04/2019.

JUS BRASIL. Análise Dogmática dos Princípios Constitucionais do Direito Eleitoral. Disponível em:  https://jus.com.br/artigos/40607/analise-dogmatica-dos-principios-constitucionais-do-direito-eleitoral. Acesso em 02/04/2019.

LINS, Rodrigo Martiniano Ayres. Direito Eleitoral Descomplicado. 2ª edição. Editora Ferreira. 2014.

NETO, Aluisio.Validade, Vigência e Eficácia da Lei Tributária. Disponível em:  https://www.estrategiaconcursos.com.br/blog/prosa-rapida-diferencas-entre-validade-vigencia-e-eficacia-da-lei-tributaria/. Acesso em 02/04/2019.

TRE SC – TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL. SC. Princípios Constitucionais e Atividade-Jurídico Administrativa. Disponível em:  http://www.tre-sc.jus.br/site/resenha-eleitoral/revista-tecnica/edicoes-impressas/integra/2012/06/principios-constitucionais-e-atividade-juridico-administrativa-anotacoes-em-torno-de-questoes-contemporaneas/indexc8ca.html?no_cache=1&cHash=a2a68efd3ca6514c09845b50cb394079. Acesso em 02/04/2019.

TRE PI – TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL. PI. Evolução da Justiça Eleitoral no Brasil. Disponível em: http://www.tre-pi.jus.br/o-tre/o-tre-pi/memoria-e-cultura/evolucao-da-justica-eleitoral-no-brasil. Acesso em 02/04/2019.

TSE – TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Código Eleitoral. Disponível em:  http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/codigo-eleitoral-1/codigo-eleitoral-lei-nb0-4.737-de-15-de-julho-de-1965. Acesso em 02/04/2019.

TSE -  TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Primeiro Código Eleitoral do Brasil Completa 81 anos. Disponível em:  http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2013/Fevereiro/primeiro-codigo-eleitoral-do-brasil-completa-81-anos. Acesso em 02/04/2019.

 

[1] Do latim, “na dúvida, pró-voto”.