DIREITO AO ESQUECIMENTO NO ORDENAMENTO INTERNO
Por MARCIO R. LENCO | 06/05/2015 | DireitoMARCIO ROBERTO LENCO
DIREITO AO ESQUECIMENTO NO ORDENAMENTO INTERNO
DIREITO CIVIL
UNIVERSIDADE SANTA ÚRSULA
CURSO DE DIREITO
RIO DE JANEIRO
2014
EMENTA:
Relatório:
- Trata-se de análise de matéria pertinente ao ramo do direito constitucional, requerida neste parecer pelo Núcleo de Pratica Jurídica IV, requerendo breve análise acerca do instituto denominado Direito ao esquecimento.
- O direito ao esquecimento seria um direito inerente a pessoa para que um fato, seja verídico ou não, mas que não lhe agrada, seja lembrado por outros e posto ao público esses fatos decorrentes da esfera particular. Guardadas as ressalvas.
- Procura-se enfrentar o tema trazendo à baila as argumentações pelo qual o atual ordenamento jurídico tem se debruçado para solucionar as demandas trazidas a porta do judiciário.
- Ao tratar do tema se faz necessário lançar mão de uma citação do jurista e filósofo francês François Ost:
Uma vez que, personagem público ou não, fomos lançados diante da cena e colocados sob os projetores da atualidade – muitas vezes, é preciso dizer, uma atualidade penal –, temos o direito, depois de determinado tempo, de sermos deixados em paz e a recair no esquecimento e no anonimato, do qual jamais queríamos ter saído[1].
(OST, 2005).
- É o necessário a relatar. Em seguida, exara-se o opinativo.
Fundamentação:
- No Brasil, o direito ao esquecimento possui é discutido sobre a base constitucional, considerando que é uma consequência do direito à vida privada, intimidade e honra. Assegurados pela CF/88 (art. 5º, X) e pelo CC/02 (art. 21).
- Alguns autores também defendem a ideia de que o direito ao esquecimento é uma decorrência da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88).
- A discussão quanto ao direito ao esquecimento envolve conflitos aparentes entre a liberdade de expressão, o direito a informação, de serem informados, os interesses da coletividade, ou seja, os interesses da sociedade deverão prevalecer diante do interesse do particular na medida em que o agente em questão seja personagem público, desenvolva atividades ligadas aos poderes do Estado ou de qualquer outra maneira se relacione com atividades de interesse público de forma direita ou indireta.
- Continuando citando François Ost, quando faz referencia de um artigo de 1983 fundamentando o direito ao esquecimento:
(...) qualquer pessoa que se tenha envolvido em acontecimentos públicos pode, com o passar do tempo, reivindicar o direito ao esquecimento; a lembrança destes acontecimentos e do papel que ela possa ter desempenhado é ilegítima se não for fundada nas necessidades da história ou se for de natureza a ferir sua sensibilidade; visto que o direito ao esquecimento, que se impõe a todos, inclusive aos jornalistas, deve igualmente beneficiar a todos, inclusive aos condenados que pagaram sua dívida para com a sociedade e tentam reinserir-se nela. (OST -2005).[2]
- O tema tem ganhado força em razão da internet, pois todas as informações ali disponibilizadas tendem a se eternizar pela rede, trazendo por um lado a informação e por outro lado as vezes distorcidas, truncadas ou mal interpretadas, constrangedoras e também vexatórias e denunciantes, enfim existe informação para todos os tipos e gostos.
- No Brasil, o direito ao esquecimento voltou a ser palco de intensos debates em razão da aprovação de um enunciado nesse sentido VI Jornada de Direito Civil, além de o STJ ter julgado dois casos envolvendo esse direito há pouco tempo.
7. Em recente matéria da revista Veja, sob o título de “O direito de ser esquecido é um bem que pode fazer mal”, se discute os resultados desta medida e seus efeitos imediatos que podemos esperar se o Brasil adotar tal medida.
Para os europeus, o direito ao esquecimento prevalece. Diz a decisão do tribunal europeu: “As pessoas têm o direito — sob certas condições — de pedir a remoção de links”. As “condições”, porém, não são claras. A medida não se aplica a casos de interesse público e a dados científicos ou de valor histórico. Mas não é definido o que se encaixa nas exceções. “Europeus têm tradição de declarar direitos abstratos cuja aplicação é complexa e difícil”, disse Jeffrey Rosen, professor de direito da Universidade George Washington.
O problema ficou evidente no início deste mês, quando o Google divulgou que, dos 70 000 pedidos de remoção de links, 12% vieram de pedófilos, e outra grande parcela é de políticos acusados de corrupção. Com dificuldades técnicas para analisar caso a caso — e a multa pelo não cumprimento chega a 2% de seu lucro anual —, o Google resolveu aceitar a maioria dos pedidos. Larry Page, CEO do Google, declarou-se “preocupado com o efeito da nova lei sobre a democracia”. Jimmy Wales, fundador da Wikipedia, enciclopédia virtual, também alvo da norma, engrossou o coro: “É censura radical”. Há claros interesses comerciais em jogo. Sites de buscas ganham em cima dos dados que guardam, usando-os para atrair anunciante. Mas sem dúvida a norma da União Europeia atinge frontalmente dois direitos essenciais, o de liberdade de expressão e o da imprensa.
Renomados veículos de comunicação europeus, como a BBC e o The Guardian, foram alertados pelo Google de que algumas matérias não apareceriam mais em sua busca (veja ao lado). Jornalistas e acadêmicos manifestaram-se contra a medida. Disse Fred Cate, professor de direito da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos: “O direito de ser esquecido é para quem quer reeditar o passado, e isso empobrecerá nossa história”. Os defensores enxergam vantagens. “Manter uma memória digital pode nos aprisionar ao passado”, concluiu o advogado Viktor Mayer-Schönberger, autor do livro Delete — The Virtue of Forgetting in the Digital Age (Delete — A Virtude do Esquecimento na Era Digital)[3] .
- Em março de 2013, na VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, foi aprovado um enunciado defendendo a existência do direito ao esquecimento como uma expressão da dignidade da pessoa humana.
Enunciado 531: A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento.
Seguido pelo STJ:
A 4ª Turma do STJ, em dois julgados recentes, afirmou que o sistema jurídico brasileiro protege o direito ao esquecimento.
REsp 1.335.153-RJ e REsp 1.334.097-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 28/5/2013.
O Min. Luis Felipe Salomão também ressaltou que “ressalvam-se do direito ao esquecimento os fatos genuinamente históricos – historicidade essa que deve ser analisada em concreto – cujo interesse público e social deve sobreviver à passagem do tempo” (REsp 1.334.097).
- Nesse mesmo sentido também traz a baila as explanações do Min. Gilmar Mendes:
Se a pessoa deixou de atrair notoriedade, desaparecendo o interesse público em torno dela, merece ser deixada de lado, como desejar. Isso é tanto mais verdade com relação, por exemplo, a quem já cumpriu pena criminal e que precisa reajustar-se à sociedade. Ele há de ter o direito a não ver repassados ao público os fatos que o levaram à penitenciária. (MENDES, 2007)[4].
- CONCLUSÃO:
- Entende, portanto, este parecerista que:
- Como já exposto acima, que a internet sempre terá meios para eternizar as notícias e informações ali disponibilizadas, pois a sociedade deve acompanhar os passos da tecnologia. Sempre ponderando no caso concreto e não visualizamos outra forma para que se respeite o direito ao esquecimento, o direito a informação dentre outros tão caros ás sociedades que emergem na democracia.
- Diante disso, atualmente, é impossível garantir, na prática, o direito ao esquecimento na internet. Existe até mesmo um ditado que afirma que “uma vez on line, para sempre on line”. Em outros termos, depois que algo foi para a internet, é impossível retirá-lo.
- Justamente por isso é que embora o STJ tenha apontado para essa direção, não nos parece crível tornar esse um direito máximo, haja vista que a luz das sociedades democráticas vigora um princípio basilar da publicidade e informação para que se viabilize a vida em sociedade sem que pessoas com interesses escusos possam se utilizar deste expediente para que sejam esquecidos seus desvios.
- Voltamos mais uma vez a afirmar a necessidade de total ponderação na aplicação desse direito para que possa ser aplicado apenas ao caso concreto, cabendo poder judiciário a palavra final, sempre tendo o ministério público como entidade fiscalizadora e protetora da ordem pública e dos interesses difusos da sociedade.
[1] OST, François. O Tempo do direito. Trad. Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005, p. 160.
[2] ob. cit. p. 161.
[3] http://veja.abril.com.br/noticia/vida-digital/o-direito-de-ser-esquecido-e-um-bem-que-pode-fazer-mal - Revista Veja. Ed: 2382 – ano 47 – n. 29 – 16/ julho/2014. Reportagem: Filipe Vilicic e Fernanda Allegretti. – acesso em 26/07/14.
[4] Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 1ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 371.