- Ah se não fosse tão complicado compreender as vertentes pelas quais esse meu pobre e ingênuo coração caminha, talvez eu tivesse mais amigos, quem sabe sairia mais de casa, ouviria mais os soares da vida, cheiraria os odores da sociedade, largaria esses vícios metódicos e tocaria mais nas pessoas - desabafava, arfando de angústia, para um conhecido de mui estima.

     - E quando se pensa que você não é tão insignificante assim, chega mais uma dessas pra esquentar os ouvidos.

     De fato ele deveria estar incomodado, aliás, o chamava sempre que tinha problemas, passei a fazer isto desde quando minhas fugacidades tornaram-se alertas e naquele instante o considerava menos que os grãos de areia grudados sob a sola de meus chinelos.

     - Perdoe-me a incoerência.

     Eu precisava pedir desculpas. Nos encontros, o elevava a herói da calma que alentava minha alma e o que disse foi totalmente de encontro com isso.

     - Por mim já não faz diferença, ajudo as pessoas porque acho ser correto, é feio e estúpido esperar algo em troca, pois os seres humanos tendem à decadência. Mas um "obrigado" faz toda a diferença vezes em quando.

     - Certamente. Obrigado - falei em meio a risos contorcidos de vergonha.

     - Obrigado - repeti - é , talvez faça diferença mesmo, pois afirmando isto estou, quase que sem perceber, denunciando minha obrigação a te servir pelo que fizestes por mim.

     - Mais uma de tuas efemeridades! Já não era sem tempo! Venha! Vamos ao salão pensar, desabafar, chorar e rir mais uma vez.