Sentado vendo o tempo passar,
Seria que de fato veria? O tempo existirá?
Absorto em pensamentos ao léu,
Observando a chuva caindo levemente do céu.

Ócio tenebroso que me faz prostrar,
Morrendo aos poucos, a vida tende a passar.
Nos momentos de enfado parece mais lento o tempo,
Torno-me desconsolado, parece-me desalento.

As pessoas passam como sombras,
Sem tocá-las, apenas aprecio a forma como andam.
Neste dia nem o sol apareceu para brilhar,
Talvez tenha sentido o mesmo enfado e preferiu não se mostrar.

O ar começa a mudar por afetação umedecida,
O arco-íris é passado, agora a tonalidade é cinza.
Dualidade entre preto e branco, assim o céu está,
Conforme nós que o contemplamos, vivo num dia, morto no outro estará.

Existem os que afastam o ar sombrio em um bom trago de vodka,
Que ingenuidade, falamos de hábitos brasileiros, aqui, popular é cachaça.
Pode-se também render-se a queimar um tabaco,
Vendo a brasa consumir, iludo-me, pois sou eu quem me desfaço.

Chuva fina que não amedronta o pedestre sem proteção,
Mas que por insistência, desce encostas, causa até inundação.
Chuva cotidiana que se torna habitual,
Hoje ela me chateia, amanhã acho normal.

Acordar com seu som de pingos e carros cortando poças,
Sair de banho tomado, pensando, que tolo, molhar-me-ei denovo, parece-me mofa.
O dia todo eu me sinto molhado, não importa a ocasião, sei que a certeza é chover,
Ao final do dia, já seco, em casa, tranquilo... barulhos de pingos, isso que embala-me a adormecer.

A serenata das águas até auxilia em constipações,
Acalenta o romântico, inspira corações.
Escurece o dia e fomenta solidões,
Mas também excita a libido, desperta ardentes paixões.

O visual muda, desde o asfalto escurecido pela umidade,
Até o trânsito de guarda-chuvas que impera pela cidade.
Os caridosos pensam no infortúnio dos que se molham sem moradia,
Os chamados indigentes se compadecem com esses seres chuvosos, sem alegria.


A linha tênue de água escorre pelas fendas,
A chuva sem cessar, parece até como em outros tempos, pedir oferendas.
Não se sabe o motivo, talvez algum "índio" tenha mantido a tradição de fazer chover,
Talvez seja apenas efeito natural, dizem mesmo que as camadas polares estão a derreter.

A chuva também é portadora de Thanatos,
Sem cessar, faz desabar barrancos.
Parcela de culpa existem aos que constroem seus lares sem estrutura adequada,
Como julgá-los, pois já é de muita monta terem uma morada.

Há quem explique a chuva por uma série de fatores físicos e químicos,
Mas para muitos é beleza divina, inspiração para o romantismo.
Líquido da vida, a água nos inspira pelo mistério de ser,
Nós convivemos com ela até mesmo após perecer.

Também não se deve negar a virtuosidade da chuva,
Pois nem tudo prejudica, causa dano e inunda.
Faz-se também de Ceres e propicia boa colheita,
Não pensas que por acaso desde tempos remotos foi-lhe conferido status de deusa.

Chuva molhada, ensopada, aguada,
Aquosa, líquida, hidrológica, alagada.
Chuva fina, grossa, tempestuosa, seguindo o vento,
Às vezes forte, irada, formando serpes, arroja-se e conduz-se sem prumo, aos dissabores de Chronos, o Tempo.