Desalento...

Não ouve mais o canto do rouxinol no desaguar das manhãs.
A cumeeira da casa que o empoleirava está vazia...
As sementes cultivadas nos canteiros dos jardins não germinam mais, 
Não existem mais pétalas desabrochando,
Nem rosas exalando suaves fragrâncias. 
Os beija-flores e as borboletas arribaram, na ausência dela...
Sente o nariz cada dia mais perto do pó que adubava os jardins... 
O peso dos ombros o faz curvar-se na caminhada quase sexagenária.
Os anos dedicados à luta de classe tragaram a sua juventude, 
E os resultados se mostravam pífios...
Fragilizando a crença no ideário que o atiçava 
E o fazia acreditar em condutas retilíneas, 
Que o moviam rumo às mudanças em prol do bem estar de todos.
As utopias já não o embalam mais, 
Sonhos foram tragados pelas saliências dos caminhos... 
Cansara... 
Compelido a assistir o poder se concentrar e se agigantar nas mãos dos maus... 
Ceifando sonhos e louros do labor diário de homens e mulheres portadores de competências mil e de conduta reta.
Sentia seus passos trôpegos serem monitorados, despudoradamente.
Falavam-lhe meias verdades, sem olhá-lo nos olhos... E mentiam-lhe, fitando-os...
As boas novas prometidas esvaíam-se nos casuísmos adornados nas cores da propaganda e na pujança dos muitos slogans... 
A crença num novo porvir fê-lo não enxergar a pedra que havia no meio do caminho...
Contudo... Nada o atormentava mais do que a distância da mulher amada...