O objectivo central do texto é analisar a dinâmica da dependência externa em Moçambique e impacto desta no desenvolvimento económico do País, por forma a contribuir para o debate que tem ganhado espaço nos últimos anos entre a ajuda externa e seu impacto no desenvolvimento económico dos países receptores.
De forma específica, a análise cinge-se na trajectória da dependência externa em Moçambique, com foco na Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD), sua origem e como esta tem contribuído para melhoria das condições de vida da sociedade, mudanças na estrutura produtiva, incremento da capacidade produtiva e distribuição da riqueza em Moçambique.
A literatura existente considera que existem três tipos de ajuda: (i) Ajuda Humanitária ou de Emergência, que é mobilizada em resposta a catástrofes ou calamidades; (ii) Ajuda Baseada na Caridade, geralmente desembolsada por organizações de caridade para determinadas instituições no país receptor ou directamente as pessoas afectadas; e (iii) Ajuda Sistemática, que é aquela feita directamente aos governos, podendo ser de governo para governo (denominada ajuda bilateral) ou feita através de instituições como Banco Mundial e Banco Africano de Desenvolvimento (denominada ajuda multilateral). É sobre esta ultima forma de ajuda externa, ajuda sistemática, que se pretende analisar neste trabalho.
Ajuda externa sistemática, também conhecida como Ajuda Oficial ao Desenvolvimento ou ainda Ajuda Pública ao Desenvolvimento é descrita por Moyo (2009), como sendo aquela em que é direccionada para os países em desenvolvimento em forma de crédito concessional (que apresentam taxas de juro mais baixas do mercado e períodos de pagamento mais longos em relação ao período concedido pelos bancos comerciais) e outra parte em donativos (sem necessidade de retorno por parte do país receptor).
O conceito de APD tem evoluído ao longo do tempo, conservando no entanto, os aspectos gerais sobre a sua motivação principal ao desenvolvimento, o carácter oficial e a natureza concessional.
Assim, para Hynes e Scott (2013), APD corresponde as transacções oficiais destinadas a promover o desenvolvimento económico e social dos países em desenvolvimento em termos financeiros. Este conceito foi muito mais detalhado por outros autores ao incluir que a APD é providenciada por instituições do sector público tendo como objectivo a promoção do desenvolvimento económico e bemestar, sendo estes fundos concessionais acrescido de uma percentagem de doação.
De uma forma resumida, alguns autores apontam que a teoria da dependência externa pressupõem que (i) o subdesenvolvimento esta ligado de forma estreita com a expansão dos países industrializados, o que concorre para que se perpetue o subdesenvolvimento; (ii) o desenvolvimento e subdesenvolvimento são aspectos diferentes do mesmo processo universal; (iii) o subdesenvolvimento não pode ser considerado como a condição primeira para um processo evolucionista; e (iv) a dependência, contudo, não é só um fenómeno externo, mas manifesta-se também sob diferentes formas da estrutura interna (social, ideológica e politica), gerando dinâmicas internas que acentuam o subdesenvolvimento.
A questão sobre o contributo da ajuda externa no desenvolvimento da economia receptora tem sido vista em diversas vertentes pelos estudiosos da matéria. Tomando como base o modelo keynesiano de crescimento económico de Harrod Domar, que sugere os seguintes elementos de crescimento: rendimento (crescimento), investimento (poupança) e o rácio capital-produto, Chenery e Strout (1965), realçaram que a ajuda externa contribuiu positivamente para o rápido crescimento económico citando como exemplo países como Filipinas, Israel e Taiwan. Em cada um dos casos os autores mostraram que um aumento
1 Estudante do Curso de Mestrado em Economia do Desenvolvimento - Faculdade de Economia, Universidade Eduardo Mondlane - 2016.
2 substancial nos investimentos financiados em grande parte com recurso a ajuda externa contribuiu para o rápido crescimento das economias destes países acompanhado de declínio constante da dependência do financiamento externo.
Ekanayake e Chatrna (2014), no seu estudo sobre os efeitos da ajuda externa no crescimento económico dos países em desenvolvimento (1980 a 2007), usando dados de painel, concluíram que a ajuda externa teve efeitos diferentes no crescimento económico dos diferentes países em desenvolvimento seleccionados, e tem contribuído de forma positiva particularmente para países africanos.
No entanto, alguns autores questionam a eficácia da ajuda externa no crescimento económico. Castel Branco (2008), na sua análise sobre a dependência da ajuda ao desenvolvimento em Moçambique, concluí que a análise da eficácia da ajuda externa no desenvolvimento depende do conceito de desenvolvimento ou crescimento que se pretende alcançar, criticando claramente o conceito de desenvolvimento baseado no aumento do número de firmas privatizadas, escolas e centros de saúde construídos, que no seu entender a ajuda externa permitiu alcançar.
Outros autores vão mais longe e argumentam que a ajuda externa não contribui para o desenvolvimento económico dos países em desenvolvimento, tal é o caso de Moyo (2009), que chega a conclusão de que a ajuda externa faz com que os países pobres se tornem cada vez mais pobres e com crescimento do produto mais lento, baseando-se no facto de que, no período entre 1970 a 1998, o fluxo da ajuda externa em
África esteve no pico e neste mesmo período a taxa de pobreza aumentou de 11% para 66%. A autora compara ainda a existência de empréstimos concessionais e donativos em África, com mesmo a existência de recursos naturais, concluindo que ambos encorajam a corrupção e conflitos que em simultâneo inibem o crescimento e desenvolvimento de empresas privadas.
Após a independência do país em 1975, e dada a situação em que a economia se encontrava, caracterizada dentre outros aspectos, por uma estrutura económica subdesenvolvida e desequilibrada, agricultura atrasada e indústria rudimentar, transportes e infra-estruturas deterioradas, cobertura sanitária muito pobre, baixos níveis de produção que são explicados tanto devido a sabotagem dos portugueses às empresas e a economia no geral aquando do seu abandono do País, quanto devido a falta de gestores nacionais qualificados para conduzir a economia rumo ao desenvolvimento, Moçambique optou como estratégia, a ajuda de outros países para retoma da economia, numa primeira fase (1975 a 1986) por uma economia centralmente planificada e mais tarde (a partir de 1987) pela economia de Mercado com apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM) através da assistência e ajuda que estas e outras instituições prestavam por forma a estabilizar e desenvolver o País dentro do modelo de ajustamento estrutural por estes propostos.
Em Moçambique a evolução do volume da ajuda externa apresenta uma tendência crescente entre 1994 a 2015, com uma taxa de crescimento média de 5,2% ao ano, chegando o valor total da APD a atingir USD 2.287,9 milhões em 2002, ano em que a contribuição das instituições bilaterais aumentou para mais do dobro em relação a 1996 e coincide também com ano em que os lideres mundiais firmaram acordos para financiar o desenvolvimento, incentivando, dentre outros aspectos, os países doadores a envidarem maior esforço no sentido de honrarem com o compromisso de alocar 0,7% do Produto Nacional Bruto em forma de APD para os países em desenvolvimento.
De 1994 a 1996, a ajuda externa para questões alimentares baixou, no entanto a balança de pagamentos e as importações continuaram a ter o apoio da ajuda externa. Houve nesta fase uma maior intervenção dos doadores multilaterais nos projectos de reabilitação de infra-estruturas destruídas pela guerra.
O período compreendido entre 1997 a 2002, foi marcado por uma crescente participação dos doadores no financiamento das despesas correntes e uma maior atenção as províncias, mudando o foco de ajuda aos projectos para ajuda sectorial, destacando-se aqui os fundos comuns para apoiar os sectores. E, 3 precisamente em 2000, foi introduzido o apoio orçamental num acordo formal assinado entre o Governo e seis doadores no âmbito de um "Programa Conjunto dos Doadores para o Apoio Macro-Financeiro".
Estas foram as principais razoes para que neste período se registasse o pico do volume da ajuda externa em 2002, com cerca de USD 2.287,9 milhões.
Em 2004, foi assinado o primeiro memorando de entendimento para concessão do apoio ao orçamento do Estado e precisamente em 2010, o Governo de Moçambique adoptou a Política de Cooperação Internacional e sua Estratégia de Implementação, com objectivo de estabelecer os princípios que regem a cooperação internacional incluindo a coordenação da ajuda externa, por forma a garantir a prossecução das prioridades do Governo. O grupo de doadores do "programa conjunto de doadores para apoio macro financeiro" subiu de 7 em 2002 para 15 em 2004.
Entre 2010 a 2013 houve um ligeiro decréscimo da APD, explicado em parte pela crise económica e financeira verificada nesse período, mudanças de governos na Europa e consequente alteração nas concepções de cooperação, eventual "cansaço da cooperação" motivado pelo período longo dos elevados fluxos, possíveis contenciosos e, perspectivas de melhoria de receitas fiscais e das exportações que os grandes investimento poderão produzir (Mosca, 2012).
No que diz respeito a origem de financiamento, ao longo do período em estudo, Moçambique tem colaborado com um grupo de países denominados G192 bem como os Unidos de América, Nações Unidas, Japão e Austrália.
Gráfico 1: Evolução do Volume de Cooperação por Origem de Fundos.

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