Entre gafes e bom dia: 

Data: 22.11.07, horário: 12:15h, havia encerrado o depoimento de Marilisa e pude observar que ela estava bastante preocupada em retornar rapidamente para o seu plantão na CPP/Joinville. Deixamos a “salinha” da Corregedoria na DRP/Joinville e Marilisa se despediu quase que formalmente, sem muita emoção, curtição... e foi direto para a Secretaria da DRP, pois queriam conversar com ela. Quando já estava prestes para descer a escada rumo ao andar térreo, lembrei que havia esquecido meu celular no interior da “salinha” e tive que retornar, entretanto, no momento que estava tentando abrir a porta pude perceber a aproximação de Marilisa com um papel nas mãos dizendo em tom emocional e quase de cobrança:

- “Felipe, eu não vou poder participar da audiência nessa data de vinte e seis de janeiro. Nessa data eu vou estar na operação veraneio, então não vou poder participar. Tu mudasses a data, não era para ser agora em dezembro as nossas audiências? Por que tu mudasses?”

Não estava entendendo muito bem o que ela queria me dizer e quando ouvi ela se aproximar chamando pelo meu nome imaginei que iria me convidar para almoçarmos ou, talvez, amanhã ou depois nos encontrarmos para conversar... Mas que nada, Marilisa parecia estar com pedras nas mãos, bom tinha saído do gabinete do Delegado Regional Dirceu Silveira que sabia como pegá-la no emocional, pelo pescoço... Apanhei o papel que ela tinha nas mãos e fui lendo o seu conteúdo para tentar entender o que estava acontecendo. Na medida em que passava os olhos lendo em voz alta percebi que Marilisa estava muito nervosa e que não tinha lido nada, e assim foi a minha leitura:

“...O processo disciplinar n. (...) instaurado por meio da portaria n. (...), instaurado na data de 26 de janeiro de 2007...(...) audiências nas datas de 07, 08 e 09 do mês de dezembro...(....)”.

Fixei meu olhar nos de Marilisa e fui dizendo:

- “Vem cá, tu lesses mesmo esse documento? Tu não estais lendo aqui que esse dia vinte e seis é a data da publicação da portaria, não tem nada a ver, e que consta aqui os dias...”.

Marilisa olhou para mim disfarçando a sua gafe e foi dizendo:

- “Ah, sim, não tinha entendido...”.

Interrompi:

- “Pois é, acho que vou desaparecer do mapa, meu Deus...”.

Na verdade era um desabafo pelo dia pesado, por ver Marilisa tão frágil, distante, indiferente, insensível... e assim nos despedimos quase com aquele “Bom Dia!” da Paulo Toller... com um gosto amargo, justamente eu que a queria tão bem, tão próxima, amiga...

A fenda prevalente: 

Por volta das dezoito horas estava dirigindo em direção a São Francisco do Sul, próximo ao trevo de Jaraguá do Sul, pela BR 101, resolvi telefonar para Marilisa na Central de Polícia. Ela me atendeu prontamente e de início pedi pelo tratamento meio distante no final da manhã. Marilisa foi desabafando que estava muito tensa na CPP e eu fui dizendo que fiquei muito preocupado com ela em razão da forma como a vi... Lembrei que ela veio me cobrar uma troca de datas e que eu jamais faria aquilo sem uma conversa prévia. Marilisa concordou que havia errado e assim procurei lhe passar uma mensagem de otimismo e ela agradeceu meu carinho. Perguntei o que ela havia achado das fotos e ela argumentou:

- “Que bom saber que estou dentro do teu computador, que bom saber que estou contigo...”.

Interrompi:

- “Ah, Marilisa, é mais que isso, você está bem dentro do meu coração, não esqueça disso...”.

Marilisa parece que não entendeu porque a ligação estava meio ruim e eu repeti... Marilisa deu a impressão que preferia ouvir de mim que confirmasse que ela realmente estava era dentro do meu computador, e só. Insisti, só para vê-la meio que perdida, pois nessas ocasiões, quando eu me manifestava no plano emocional ela parecia querer fugir por seus medos interiores..., como se estivesse se comprometendo, ou, ainda, que estivesse despreparada ou não quisesse assumir qualquer compromisso mais profundo no nosso plano desconexo, pois as aparências poderiam conduzir a erros de interpretações, as aparências muitas vezes poderiam nos induzir a erros de cálculos. Meu objetivo era diverso motivado por desígnios outros inconfessáveis... No nosso caso estava tratando apenas da nossa espiritualidade, amizade, de nossa ligação transcendental que eu mesmo não conseguia compreender muito bem, era algo forte que construímos juntos, porém seria incompreensível para uma cabecinha nas nuvens, dentro de um mundo formal... De qualquer maneira, mais uma vez senti de perto os temores de Marilisa com possíveis frustrações no plano amoroso, de se envolver num possível compromisso romântico..., e não era nada disso..., muito embora no seu “mundinho” poderia ela chegar essa conclusão por conta das minhas investidas e proximidade que num mundo formal tem as suas leituras, interpretações... e, obviamente, que tinha que me manter o “efeito polar” acima de tudo, ainda mais que nesse plano corre sangue quente por dentro que exige controles quânticos pessoais e contingências aplicadas a uma única “fenda prevalente”.

A grande investida: 

Por volta das dezessete horas já estava chegando em São Francisco do Sul e resolvi mandar um torpedo para Marilisa com a seguinte mensagem: “Má, invista no amor, no carinho, na atenção, na sensibilidade...q. tudo vai ficar bem. Ah, e não esqueça ser tolerante...”. 

A não tão invisível Escrivã Ivonete Bastos: 

No dia 22.11.07, por volta das dez horas, fui ouvir a Escrivã Ivonete Bastos da Delegacia da Mulher de Joinville, já sabendo de antemão que se tratava da grande amiga e confidente de Marilisa. Ivonete era incrivelmente parecida com Marilisa, dentro daquela perspectiva quântica e considerando a presença de “células-espelho”. Não só de corpo, roupas, óculos, mas, também, na forma de se expressar emocionalmente, sempre procurando ficar na defensiva, queixando-se das injustiças do “mundo policial” e se colocando meio que no centro das atenções, também, como forma de se preservar e defender suas verdades. Soube – para minha surpresa – que Ivonete era “manezinha” nascida na Capital (Florianópolis) e descendente de açorianos. O grande lance é que ela adora Joinville, daí mais uma batendo com o pensamento “Mariliziano”. Ivonete relatou que antes de ingressar na Polícia Civil já era amiga de Marilisa, isso desde o início da década de noventa e que essa ligação existia até aqueles dias. Em seguida, na medida em que conversávamos pude perceber que ela passava uma boa energia o que me fez pensar: “Bom, se ela se parece com Marilisa então...”. Na sequência, conversamos bastante e pude perceber a riqueza de uma pessoa muito especial, sensível, com luz própria... e, também, sincera e uma boa companhia para jogar conversa fora e dar algumas risadas.

Uma relação quente e proximal (o relato da Investigadora "Cida"): 

Por volta das onze horas chegou a vez de ouvir a Investigadora "Cida" (MAA). Durante o curso da audiência ela desabafou:

- “Imagina, eu estava ali fora e a Ivonete fez de conta que não me conhecia, eu fiquei de cara, como é que ela pode me tratar assim com tanta frieza? ...Que culpa eu tenho? Ela acha que eu sabia do rolo do ex-marido da doutora, eu não sabia...”.

Interrompi para provocar:

- “Ex-marido da doutora...? Que história é essa...?”

“Cida” me interrompeu:

- “Sim, já faz uns dez anos que eles se separaram. Eu tinha uma amiga lá na faculdade e eu não sabia que ela tinha se envolvido com o ex-marido da doutora..., imagina. Depois estourou o negócio e ele deixou dela para ficar com a minha amiga, mas eu não sabia que ele era o marido dela...”.

Interrompi:

- “Sim, mas ela estudava contigo?”

“Cida” continuou seu relato:

- “Sim, mas eu juro que eu não sabia de nada. Ele hoje é um ‘a.’ bem situado, está muito bem e vive melhor com a minha amiga, mas a Ivonete passou a me tratar com indiferença porque ela acha que eu sabia da relação dos dois e não contei nada. Ela acha que eu sabia que ele era o marido da doutora..., eu não sabia, só fui saber depois, então ela não pode ficar me tratando assim com essa indiferença, onde já se viu... Eu estava ali fora e ela fez de conta que não me conhecia só por causa da história do ex-marido da doutora..., fico muito chateada...”.

Procurei somente ouvir a conversa e não quis aprofundar até porque seria deselegante da minha parte, também não seria ético, ademais, ela era muito especial para mim, muito embora o meu caminho seria o distanciamento, até por respeito a sua relação com seu namorado ou convivente, portanto, era hora de passar para uma nova fase que já havia sido superada, ou seja, a casa dos 07.07.07.

Acreditava que havia chegado o término daquela jornada, porém, algumas coisas pareciam mal resolvidas, havia ainda algo que precisava ser transporto... Depois de ouvir o relato de “Cida” pensei seriamente que precisava evoluir e que não tinha mais o direito de invadir o  universo de Marilisa por meio de uma relação “tão quente e proximal” que encapsulavam nossos sentimentos e mentes. Se o interesse era registrar a história de uma instituição e documentar a trajetória de uma Delegada com o seu perfil, fui além das minhas expectativas, não imaginando a profundidade do contato que criei com ela e do tamanho da nossa dedicação por uma causa que de certa forma marcou nossas trajetórias existenciais para sempre. Acreditei que aquele momento contribui para que Marilisa pudesse alçar novos voos e se fortalecesse em todos os sentidos, que superasse suas frustrações, utilizasse  suas próprias asas, se desvencilhasse naturalmente de seus medos...  Se bem que no meu íntimo existia a convicção que ela talvez jamais conseguisse voar a lugar algum em razão de ser uma vítima de arranjos emocionais que ela próprio criou, por isso, precisaria de muita força para se libertar de seus dramas pessoais e existenciais e ao mesmo tempo buscar um ponto de fuga dos mesmos. E, nesse prisma, o espaço “Polícia”, “Delegacia”... seria a sua taboa da salvação, uma maneira de enfrentar os problemas dos outros, de se encobrir e não se olhar no espelho...  e, dessa forma, se furtar de buscar uma paz que acalmasse sua alma e serenasse seu interior.