Dores compartilhadas:

No dia 31.10.07, horário: oito horas, estava na Corregedoria da Polícia Civil e com  aquela dor de cabeça que resistia, dando a impressão que  meus nervos junto a “nuca”  eram os responsáveis... Lembrei primeiro das dores de Marilisa e seus remédios (“tarja-preta”), os reflexos que isso trazia a sua saúde física e mental, depois voltei meus pensamentos ao  Delegado Nilton Andrade que havia me dito no dia anterior  que sua dor de cabeça tinha essa mesma causa: os tais “nervos” e sua esposa também...  Pensei: “Será que a minha também teria essa mesma causa...? No caso de Marilisa ela se socorria a remédios fortes e no meu caso não poderia cair nessa armadilha cruel justamente eu...”.

O encontro com o Delegado Jaceguay: 

No horário das dezesseis horas, estava deixando a Corregedoria da Polícia Civil para tomar um café no Conjunto Comercial “Pórtico” (centro de Florianópolis) em cuja ocasião  avistei o Delegado aposentado Jaceguay Marques Trilha, sempre de branco, inclusive, os sapatos. Trilha estava prestes a deixar o prédio onde residia, localizado entre o Hotel Fayal e o “Pórtico” (início da subida da LogoRua Felipe Schmidt). Logo imaginei que Trilha estava indo para a “musculação” e, como não poderia deixar de ser,  ao me ver tomou a iniciativa da conversa:

- “Ôh, doutor Genovez, o senhor vai bem?”

Respondi ao cumprimento:

- “Sim, como é que vai Trilha, tudo bem?”

Trilha foi mais longe:

- “O senhor é um ‘nobre’, sim, o doutor Genovez sempre foi um nobre”.

Ouvi aquilo  e achei engraçado, mas Trilha parecia deixar escapar um quê de irônico, talvez não fosse resultado isso, seus pensamentos externados poderiam ser levados muito a sério... Mas, havia outros quês bizarros carreados de sobriedade na sua fala e nos seus gestos, além  de tantos outros quês que poderiam transitar entre um misto de  “tresloucamento” e sabedoria. Trilha mudou de assunto:

- “O senhor sabe que eu não posso mais nem ouvir falar em política, não  posso ouvir falar mais em PMDB, partidos políticos, nunca mais na minha vida. Bom, doutor Genovez, depois que Delfim Neto entrou no PMDB, o senhor imagina, doutor Genovez, logo o Delfim Neto, então, nunca mais! Eu agora voto em pessoas, por exemplo, continuo votando no Paulo Afonso (ex-Governador) porque ele é meu amigo. O Paulo Afonso é meu amigo, chega a ser meu parente, mas não voto em mais ninguém...”. 

Eu pensei em fazer um tratado, falar coisas do fim do mundo, cheguei a pensar nos contos de Hércules dose como matou Hidra de Leme,  dos povos minóicos..., mas achei melhor ficar na superfície e arrematar:

- “Realmente, Trilha, mas tu sabes que a Polícia Civil nunca retrocedeu tanto na sua história como neste governo do Luiz Henrique...”.

Trilha deu a impressão que concordava com a minha avaliação e citou como exemplo a gestão do ex-Delegado-Geral “R.L.T.”. Aproveitei para argumentar:

- “Sim, mas ele foi ‘n.’ para a instituição...”.

Trilha ouviu aquilo e me fitou por alguns segundos, como se quisesse ler meus pensamentos. Eu estava demonstrando que não era tão ‘nobre’ como ele tinha dito que eu era, ou seja, um sujeito soberbo, querendo ficar bem na foto como todos..., intocável... Na verdade quis mostrar para Trilha que também era um ser humano cheio de verdades, incertezas, tão humano quanto ele. Trilha argumentou:

- “É, doutor Genovez, o problema é que criaram essa pessoa que o senhor mencionou...”.

Interrompi:

- “Sim, criaram, o problema foi que a doutora Lúcia, o Dirceu Silveira e o Toigo criaram o ‘T.’ e olha o estrago que ele fez para a instituição...?”

Trilha pareceu estar com pressa e eu também. Do outro lado da rua vinham Nilton Andrade e Hilton Vieira, provavelmente estavam saindo de uma audiência na Delegacia-Geral e a caminho de retorno à Corregedoria.

O caso do aditamento do Delegado Douglas Marreiros:

No dia 05.11.07, por volta das oito horas da manhã, estava na  Corregedoria da Polícia Civil e eis que chegou o Delegado Douglas Marreiros para relatar um caso de aditamento em uma sindicância disciplinar sob sua presidência. Douglas foi me perguntando se era possível um aditamento à portaria inaugural em se tratando de procedimento disciplinar. Argumentei que sim e Douglas insistiu:

- “Mas, Felipe, o caso é o seguinte, mandaram eu instaurar uma sindicância contra dois policiais lá da 5ª DP. Só que no curso da apuração o Nilton mandou que eu fizesse um aditamento para colocar o Luciano também. Sinceramente, eu entendo que não existe esse hipótese do aditamento. Eu acho que isso é coisa lá da Lúcia, eu não sei, eu acho que ela fez esse rolo todo. O Luciano era um bom policial, tu precisavas ver, ele era magrinho, casado com uma advogada. O rapaz hoje dá três de ti, a mulher dele se separou e hoje chegou a pedir uma garantia contra ele. O rapaz está cheio de problemas e aí vem o Nilton me dizer que era para fazer um aditamento na portaria para colocar ele também, tu achas que dá para fazer aditamento nesse caso?”

Respondi:

- “Bom, nesse caso eu entendo que não é possível. O aditamento pode ocorrer naquelas hipóteses do art. 383 e 384 do Código de Processo Penal, quando se tratar de se agravar a pena... O nosso estatuto manda aplicar subsidiariamente o CPP. Agora, isso vale para o mesmo acusado na inicial. Quando se tratar de outros acusados que não constam da inicial, aí só anulando o feito ou se baixando uma nova portaria acusatória contra os mesmos. Também, pode-se continuar a apuração e no relatório final se pedir que se instaure um novo procedimento para apurar as acusações contra os outros policiais mencionados...”. 

A seguir conversamos sobre os trabalhos da Delegada Sonêa em Brasília  e que por isso estariam desviando o foco. Argumentei que Sonêa parecia preocupada com os acontecimentos distantes, priorizando Brasília, menos o Estado de Santa Catarina. Douglas fez uma incursão perguntando se eu estava me fazendo de louco? Argumentei, já em ritmo de brincadeira, que naquela altura do campeonato, considerando que a ordem que permeava nosso universo policial era sermos tratados como ‘retardados’, ficava no ar a impressão que estavam querendo subestimar nossas inteligências. Douglas acabou dando algumas risadas e eu também. Douglas confidenciou que não via a hora de se aposentar para cuidar do seu sítio para os lados da Colônia Santana, próximo do hospício tradicional da grande Florianópolis, em cujo local desfrutava o seu melhor: seus equinos e eu pensei no meu sítio em São Francisco do Sul.