Cuidado com as alcatéias: 

Data: 06.10.08. Horário: 11:45h. Tinha encerrado mais uma audiência de ouvida de testemunhas numa sindicância na Delegacia Regional de Balneário Camboriú e resolvi ir até o gabinete do Delegado Ademir Serafim para saber das novidades. Logo que entrei percebi as presencas da Delegada Magali e mais um Comissário antigo que deveria ser um dos braços direito do DRP. Após me inteirar da conversa percebi que Magali fazia uma relato  do que havia ocorrido durante as eleições municipais em Balneário Camboriú ocorrida no último final de semana. Magali comentava que o pessoal do comando da Polícia Militar daquela cidade no dia das eleições se aproximou bastante dos Delegados e procurou estreitar as ligações como se estivessem meio deslocados no meio dos políticos, a começar, por não terem acesso ao Vice-Governador Pavan e ao prefeito eleito (Deputado Piriquito). O engraçado era que Magali e Ademir procuravam dar um "tom-mix" de ufanismo e soberba com seus relatos a respeito do comportamento dos Oficiais, dando uma pura demonstração que levaram a melhor em termos de prestígio e acesso aos políticos e autoridades presentes. Segundo os relatos carreados de certa dose de euforismo os militares se sentiam deslocados na medida em que aportavam no evento, razão porque procuraram uma aproximação com os Delegados. Ademir Serafim chegou a afirmar que o relacionamento deles com o Vice-Governador Pavan era excelente e que os Oficiais davam a nítida impressão que não gozavam daquele privilégio (excelente trânsito político). Na sequência  Ademir Serafim argumentou que os Oficiais estavam estrategicamente situados em todos os pontos chaves do poder dentro dos Poderes do Estado..., e, juntamente com Magali teceram comentários dando a impressão que pretendiam estabelecer uma relação de forças com os militares superiores quanto a prestígio politico, o que me fez meditar: “Meu Deus, como esse pessoal pensa pequeno. Quanta coisa importante para nos preocupar, quanta coisa para resolvermos e eles querendo contar vantagens sobre coisas tão ridículas, como essa preocupação com os Oficiais da PM que deveriam ser tratados como nossos principais aliados, amigos de verdade...”. Interrompi meus pensamentos e procurei colocar uma azeitona na empada dos dois interlocutores (Ademir e Magali), com o seguinte comentário:

- “É, mas vocês viram a lei complementar quatrocentos e quatorze, viram?”

Magali passou ao largo, mas Ademir Setafim pareceu instigado e tentou adivinhar fazendo um movimento com os olhos, balançando a cabeça ao mesmo tempo que procurava externar segurança retórica e procuravs relativizar, apequenar minha guinada..., o que me fez completar:

- “Vocês viram para quanto foi o efetivo da Polícia Militar?”

Ademir Serafim pareceu se situar sobre meu comentário e quase acertou na mosca:

- “Ah, sim, foi para vinte mil, não é isso?”

Respondi:

- “Foi mais que isso. Foi para mais de vinte mil”.

Ademir Serafim me surpreendeu com um percentual:

- “Eles aumentaram o efetivo em cinqüenta e três por cento”.

Arrematei:

- “É, de treze mil e pouco foram para mais de vinte mil...”.

O Comissário “olheiro” (Saulo) que estava no gabinete chegou a se levantar e sair da sala. Aproveitei então para completar:

- “Pois é, enquanto isso nós ficamos à míngua, sem projetos...”.

Era incrível a capacidade de Ademir Serafim que diante dos ventos contrários, aproveitando-se dos "ares de poder", conseguia - ao seu talante e com desenvoltura - mudar o curso da conversa, sair pela tangente, reverter uma situação desfavorável de cobranças, invocar novos argumentos... o que não foi diferente naquele momento, pois matou meu assunto com outro de impacto maior, colocando uma pá  de cal na cobrança da cúpula quanto a bater de frente no governo para aumentar tambem o efetivo policial civil, ainda mais sendo eles os "amigos" do "Pavan":

- “O Esperidião cometeu um erro muito grande. Quando ele foi governador em dois mil e dois ele tinha prometido que restauraria a nossa isonomia novamente com o Ministério Público. Eu me lembro muito bem, ele deu um soco na mesa dizendo que era uma questão de honra e tão-logo ele chegasse ao governo e equilibrasse as finanças do Estado nos daria de volta a isonomia. Eu não posso perdoar o Esperidião porque ele não cumpriu a palavra, hoje eu sou contra o Esperidião...”.

Fiquei impressionado outra vez porque Ademir Serafim passou os quatro anos no governo Esperidião ocupando cargo comissionado e sendo prestigiado, em especial, na direção do Detran quando  houve aquele escândalo envolvendo a sua filha (denunciada por viajar com a viatura do Detran todo dia para assistir aulas na Faculdade de Direito em Blumenau, já que também ocupava cargo comissionado naquele órgão). Ademir Serafim foi mais além:

- “Eu também não posso perdoar a Ângela, ela mandou uma correspondência para o Tribunal de Contas sobre aquela denúncia contra a minha filha. Olha Genovez, eu me incomodei um monte com o Tribunal de Contas por causa da Ângela, e isso foi até pouco tempo. Bom, teve um dia que eu tive uma discussão feia com ela, tu precisavas ver, ela quis vir por cima de mim, eu fui cobrar aquele documento que ela mandou para o Tribunal, olha tiveram que nos apartar porque foi muito feio... Tudo aquilo porque o Redondo baixou uma portaria na época dizendo que viatura do Detran não poderia ser abastecida num raio de... ”.

Novamente me veio a cabeça que Ademir Serafim durante aquele governo ficou muito bem, gozou, comeu, respirou o poder enquanto estava tudo muito bom, a mesa estava pronta e farta...  e me perguntei o que ele tinha deixado de legado com todo o poder que teve? Depois que Magali e o Comissário (braço direito) deixou a sala fiquei sozinho com Ademir Serafim e relembrei a ele que quando o Vice-Governador Pavan viesse a assumir o governo do Estado (2010) eles que estavam no poder na Segurança Pública e na Polícia Civil teriam oportunidade única para apresentar um projeto de impacto na defesa dos interesses institucionais e que não poderiam, nem deveriam, perder essa oportunidade, esse alinhamento dos astros. Ademir Serafim comentou que sempre tem lembrando do que eu já havia dito, ou seja, que eles teriam a oportunidade de dar uma cartada muito grande. Ademir Serafim deixou entender que realmente o momento a que me reportei seria muito profícuo e oportuno e que estava conversando com Maurício Eskudlark e que iria depender muito de quem estivesse no comando da Polícia Civil. Fiquei me perguntando: “Bom, se o Maurício deixar a Delegacia-Geral o Ademir deverá ser o candidato natural, e agora, será que só ele não sabe disso?”  Em seguida, Ademir Serafim argumentou que existia um projeto para aumentar o efetivo da Polícia Civil e que teria sido muito importante a PM ter aumentado o efetivo dela porque nos deu motivo de pedir o mesmo. Duvidei que eles tivessem isso em mente e para minha surpresa Ademir Serafim comentou que já existia um projeto que previa o aumento dos cargos de Delegado Especial, o que me fez indagar:

- “Sim, será que vão querer aumentar para sessenta cargos?”

Ademir  Serafim argumentou:

- “Imagina, Genovez, eu quero ser Delegado Especial e atualmente com esse número reduzido não vou chegar, tem que aumentar...”.

Perguntei:

- “Sim, Ademir, mas olha quantos Coronéis têm na PM, quantos? São só vinte três. Era dezesseis e agora foi para vinte e três e até a implementação do projeto deles vão ser trinta e quatro. Só que eles vão ser vinte poucos mil homens. Então esse negócio de nós termos sessenta Delegados Especiais não está certo...”.

Ademir  Serafim insistiu:

- “Mas, Genovez, na PM têm uma lei lá que obriga depois de tanto tempo eles irem embora na compulsória, é diferente de nós. Aqui o pessoal vai ficando, não vai embora...”.

Interrompi:

- “Ah, mas então vamos criar uma expulsória, não é?”

Ademir Serafim insistiu:

- “Ah, tu sabes que isso não vai ocorrer, não vê o Sérgio Maus, ele disse que iria requerer a aposentadoria dele, e até agora nada, não sai, não sai! Nós somos diferentes, temos que aproveitar a experiência do nosso pessoal mais antigo...”.

Interrompi:

- “Bom,  tu tens razão, na PM é diferente porque lá eles valorizam a hierarquia, lá existe respeito ao pessoal mais graduado, eles é que comandam a instituição. Mas na nossa isso não existe, então é melhor deixar assim...”.

Ademir Serafim deixou escapar um sorriso com um quê de ironia e argumentou:

- “Mas nós temos que mudar isso, Genovez, temos que mudar, está errado, temos que valorizar os nossos Delegados velhinhos...”.

Concordei pensando: “Sim, mas quem vai mudar? Quem vai começar a mudar isso? O Maurício? O Ademir Serafim? Na PM os Coronéis são respeitados, no Judiciário os Desembargadores são respeitados, no Ministério Público os Procuradores de Justiça são respeitados, entre nós Delegados funciona como a casa da mãe Joana, tudo ao sabor dos ventos da política...”. Ademir Serafim quebrou o silêncio:

- “Temos que mudar isso, está errado...”.

“Sim, parecia o óbvio ululante, mas afinal quem iria ser capaz de mudar? Quem teria vontade política e poder para alterar esse quadro?” pensei. Ademir Serafim relatou que morava no mesmo prédio onde o Vice-Governador Pavã tinha apartamento e residia quando estava na cidade (Balneário Camboriú). Depois de se dar conta do que revelou Ademir Serafim tentou consertar com aquele seu tradicional riso escarpado:

- “O meu apartamento é financiado pelo ‘BNH’, é diferente do Pavan, o dele é quitado, o meu é financiado...”.

Fiquei pensando: “Meus Deus, como esse Ademir parece tratar os outros como retardados. Primeiro, ‘BNH’ faz anos que não existe. Segundo, querer insinuar que é um ‘coitadinho’ porque teve que financiar um apartamento que devia ser de alta categoria exigiria cacife...”. Procurei não perder os detalhes da conversa, porém, continuei firme nos meus pensamentos: “Puxa, essa Ademir é incrível. Acho que Balneário Camboriú é o ‘Eldorado’ para se trabalhar. Talvez seja por isso que ele não arreda pé da cidade e é por isso que também o Maurício  nas sextas se faz presente na cidade...”. Nisso tocou o celular e Ademir Serafim me fez um sinal dizendo que era Maurício Eskudlark. Procurei silenciar  enquanto o DRP conversava com o DGPC. Era engraçada as respostas, pareciam em códigos entre eles e eu só podia  ouvir: “Ahã. Sim, ahã...! Eu sei! Certo! Sim, ahã!. Eu te disse. Eu te falei. Sim, ahã!. Eu entendo...”. Era impressionante, não entendia nada do que conversavam, por dentro achava aquilo uma conversa que parecia entre lobinhos...  E, como sobremesa, Ademir Serafim, enfim,  comunicou com um misto de ar ”triunfal, cadencial, modal, sonrisal...”:

- “Eu estou aqui com o doutor Felipe Genovez que veio me fazer uma visita. Realmente o doutor Felipe Genovez é uma pessoa que tem umas idéias muito boas,  a gente tem que conversar com ele...”.

A conversa se encerrou com uma despedida abrupta, como se a laranjada tivesse se azedado ou se transformado em limonada amarga. Ademir Serafim desligou o telefone e comentou  que o Delegado-Geral me mandou um abraço      o que me fez pensar como se fosse um lobinho escoteiro: “Puxa vida, ganhei um abraço do Delegado-Geral...”. Ademir Serafim ainda me instigou a participar de um grupo de estudos no Ministério da Justiça, do qual tem participado os Delegados Adriano Luz, Sonêa Neves, André Mendes da Silveira (Diretor da Academia de Polícia), dentre outros. Ademir Serafim me perguntou:

- “Eu não sei como é que não te chamaram para integrar esse grupo, Genovez. O pessoal tem se reunido lá em Brasília para discutir o futuro da Polícia e tu deverias integrar esse grupo, tens que participar”.

Imaginando que aquilo poderia ser uma “bofetada“ indireta Interrompi:

- “Bom, esse grupo que tu citasses aí, o Adriano, a Sonêa, o Neves, o Thomé... é o mesmo grupo que meses antes de se iniciar o governo Luiz Henrique se reuniu lá no antigo prédio da Delegacia-Geral e ficaram fazendo ‘planos’ para o futuro governo, para o Blasi... e olha no que deu? Perdemos a Corregedoria-Geral, até a Academia de Polícia foi para a SSP, perdermos a Polícia Científica, criaram o regime de horas extras para Delegados, e olha a nossa realidade salarial?”

Ademir se afundou na sua cadeira com a nítida impressão que ficou encurralado, sem argumentos, porém ainda tentou uma outra saída discursiva para defender o seu governo, procurando evitar choques ideológicos ao mesmo tempo que concordava comigo, tipo: acendendo uma vela prá Deus e outra para o Diabo.  Em seguida, Ademir Serafim começou a falar bem do Delegado André Mendes da Silveira, atribuindo ao mesmo ser uma pessoa com grandes idéias, muitos interesses em inovar. Em silêncio me passaram mil coisas na mente, mas resolvi guardar para mim: “Um Delegado novo, entrou ontem na instituição, está num cargo político estratégico, uma pessoa fácil de ser manipulada pelas raposas da Polícia e dizer que estávamos antes falando em hierarquia, princípios, valores... Era engraçado porque o Delegado André devia saber disso, ou seja, correria sérios riscos de poder estar  sendo usado..., e para tanto teria que pagar o seu preço,  servir de laboratório para novas experiências e como instrumento para jogos políticos internos, favorecer interesses escusos..., enquanto isso, as raposas poderiam agir  na penumbra, permaneceriam  blindadas no poder... enquanto ‘bobo-alegres’ se distraiam a si e aos outros (as presas fáceis) com suas idéias revolutas, seus ensaios futuristas... e a serviço de quem faz chover.

Já próximo do fim da conversa fiz alguns comentários  a respeito do meu interesse em editar meu Estatuto da Polícia Civil, edição 2009 e Ademir Serafim mostrou interesse  de me ajudar no sentido de fazer  contatos com o Delegado-Geral. Argumentei que no próximo ano pretendia me afastar do serviço e Ademir Serafim externou uma expressão que denotava desafio, como se eu estivesse enrolando e que não sairia tão cedo.   Argumentei que era só esperar para ver e quando  estava me preparando para deixar o recinto o tal Comissário retornou até o gabinete para perguntar sobre como seria o almoço. Ademir respondeu  que o Delegado-Geral Maurício Eskudlark não vinha e que eles almoçariam num restaurante bem “baratinho” e que servia prato tipo “PF”. Acabei lembrando o encontro com Ademir numa outro oportunidade onde o mesmo fez questão de comentar na presença daquele mesmo policial motorista que o almoço deles custaria só quatro reais e oitenta centavos. Agora Ademir Serafim novamente me fez passar o mesmo filme argumentando:

- “Genovez, queres almoçar com a gente? Vamos, vamos... o lugar é bom, é bem baratinho, a gente paga só nove reais e oitenta por pessoa, tu vais gostar, o dono é nosso amigo...”.

Agradeci convite e fiquei pensando: “Puxa, esse Ademir realmente é cria do ‘Pedrão (Delegado aposentado, velha raposa e da velha guarda), e faz questão de mostrar que é econômico até no almoço, que louvor, mas que coitadinho, deve até fazer milagres com o seu salário...”.

Depois que deixei o gabinete do DRP de Balneário Camboriú acabei lembrando com saudades de Marilisa, da sua doçura, da nossa última conversa por telefone quando estava ali naquele mesmo local, e pensei em ligar para ela para comentar os lances de Ademir Serafim e o casal Amin..., justamente para ela que também já tivera ligação bem próximo de Esperidião, não eu...