DELAÇÃO PREMIADA

A eficácia de sua aplicabilidade frente ao sistema penal brasileiro[1]

David Alves Costa e Ecio Fonseca Costa[2]

Cleopas Isaías Santos[3]

RESUMO

O presente trabalho tem como tema o instituto da delação premiada, analisando sua aplicação em alguns casos de alta relevância, como são os casos do “mensalão” e do “petrolão”. O objetivo do paper é demonstrar que, apesar dos problemas visivelmente ocorridos no instituto desde sua concepção por falta de uma legislação clara e objetiva, a delação premiada tem sido muito bem utilizada em benefício da justiça e, também, em benefício do colaborador. Assim, o trabalho mostra a relevância do instituto da delação premiada no combate aos crimes, apresentando a eficácia dessa delação na apuração de tais condutas criminosas, fundamentado através de embasamento teórico. Na primeira seção, é abordada a origem do instituto. Na segunda seção, é feita uma breve análise da delação premiada no sistema penal brasileiro, ao passo que na terceira seção é demonstrada a eficácia da delação premiada frente a certos casos que estão em voga no país.

Palavras-chave: Delação premiada. Cooperação. Eficácia.

1 INTRODUÇÃO                                                                           

 

                   O crime é uma praga que assola todas as sociedades organizadas estatalmente. Buscando fundamentar-se tal sociedade criminaliza algumas condutas típicas para que possa haver uma estrutura organizada de desenvolvimento político-social.

 

O Direito Penal é o segmento do ordenamento jurídico que detém a função de selecionar os comportamentos humanos mais graves e perniciosos à coletividade, capazes de colocar em risco valores fundamentais para a convivência social, e descrevê-los como infrações penais, cominando-lhes, em consequência, as respectivas sanções, além de estabelecer todas as regras complementares e gerais necessárias à sua correta e justa aplicação. (CAPEZ, 2012, p. 20).

 

                   Diante disso, o Estado se depara com tais crimes que afrontam diretamente a organização do Estado: dentre eles, o crime organizado. Parecendo até uma ironia a designação de tal conduta, contudo, o que poderia confrontar de maneira sólida a organização do Estado, se não, algo que, também, seguissem uma ordem delineada, como é o caso do crime organizado?

                   Assim, como ponto de partida observa-se o panorama histórico da delação premiada, a sua forma coma ela é entendida hoje. Destacando a influência que tal instituto sofreu de outros países e, como o aumento do crime organizado no território nacional contribuiu para sua elaboração.

                   Num segundo momento, é colocado como se expande a delação premiada, pelas leis extravagantes após entrar em vigor a lei dos crimes hediondos (lei 8.072/90), e quais os requisitos estabelecidos pelo ordenamento jurídico para que o acusado/criminoso venha se utilizar desse instrumento. Perpassando, ainda, pelo problema da nomeação utilizada para esse instrumento jurídico e as críticas de tal designação.

                   Por fim, comprova-se a eficiência da delação premiada observando a sua utilização em casos de grande expressão nacional, onde por meio de sua eficácia ocorreram a desarticulação de crimes e o desmembramento de organizações criminosas que corroíam o dinheiro público nacional.

 

2 PANORAMA HISTÓRICO DA DELAÇÃO PREMIADA

 

O instituto da delação premiada entrou em vigor no Brasil por volta do ano de 1930 com o Código Criminal. No entanto, segundo Rocha Nogueira (2014, p. 15) tinha como base o Código Filipino que destacava, dentre outros, o crime de Lesa Majestade, este praticado contra “[...] a família real, contra um de seus membros ou contra um soberano de Estado. O tema era detalhado e demonstrava a forma como seria concedido o perdão aos “malfeitores” caso delatassem coautores do crime cometido e até mesmo revelar delitos de outrem”.

É vital destacarmos, contudo, que a gênesis da delação premiada - como a entendemos hoje - está diretamente ligada a atuação dos grandes grupos criminosos mundialmente conhecidos; Endo (2006, p.05) coloca, por exemplo, a respeito da máfia ítalo-americana considerada como uma das maiores, atuando de forma bem articulada e agindo, dentre outras, da seguinte maneira: “[...] com um forte poder de persuasão; a estrutura e a hierarquia bem definida; a existência de normas a serem seguidas; a quantidade de agentes públicos corrompidos e os altos lucros obtidos”.

Diante dessas práticas danosas surge, primeiramente, na Itália, a delação premiada denominada pentitismo, com a Lei Misure per la Difesa dell Ordinamento Constituzionale, segundo Nascimento (2013, p.04) surge, em decorrência da Máfia, essa já supracitada era uma organização que, “apesar de surgir apenas como um movimento de resistência ao império do rei de Nápoles, a partir da segunda metade do século XX, passa a se dedicar à prática de várias atividades criminosas”.

Já nos Estados Unidos, de acordo com Nascimento (2013, p. 05), a delação premiada teria surgido sob a denominação leniency program (programa de leniência) buscando combater toda a organização de cartel, onde eram firmados acordos entre os delinquentes e as autoridades locais antes de iniciar qualquer processo de investigação.

No Brasil, ENDO (2006, p.05) descreve que, as organizações criminosas começaram a tomar destaque a nível nacional agindo de modo diversificado, principalmente, nos morros e favelas, praticando tráfico ilícito de entorpecentes, roubos e favorecimento à prostituição. Além disso, organizava o contrabando de produtos provenientes dos tigres asiáticos, estabelecia o tráfico de seres humanos e operavam o desvio de verbas públicas - os chamados crimes de colarinho branco - estes últimos controlados dentro dos grandes centros.

Origina-se, assim, “A Delação Premiada” no Brasil.

 

Um instituto que foi importado dos direitos italiano e norte-americano configurando-se em uma incentiva do legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios (redução de pena, perdão judicial, aplicação de regime penitenciário brando etc.) (JESUS, 2006, p.26-27).

 

Prosseguindo, com uma contribuição magistral de Nucci, podemos compreender melhor em um breve resumo do que possa ser a delação premiada, expressando-se ele da seguinte maneira:

 

(...) significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s) comparsa(s). É o ‘dedurismo’ oficializado, que, apesar de moralmente criticável, deve ser incentivado em face do aumento contínuo do crime organizado. É um mal necessário, pois trata-se da forma mais eficaz de se quebrar a espinha dorsal das quadrilhas, permitindo que um de seus membros possa se arrepender, entregando a atividade dos demais e proporcionando ao Estado resultados positivos no combate à criminalidade (NUCCI, 2011, p.54).

 

Na verdade, a delação premiada não pode ser considerado um mal, mas, sim, um bem para toda a sociedade e, também, para a investigação que poderá prender mais criminosos e desarticular mais organizações criminosas.

 

2.1 Um problema na denominação do instituto

 

Um dos problemas que surge com tal instituto diz respeito a sua designação, pois tal nomeação de “delação premiada” não soa muito bem, principalmente entre os criminosos. Sendo, comumente, utilizadas tais expressões como: entregar, delatar, dedurismo oficializado, boca mole, língua solta, dentre outras. Criando no criminoso uma repulsa e um medo, pois entre os delinquentes e até entre alguns juristas a delação não é aceitável. O delator é considerado um infame, onde os criminosos condenam a atitude daquele que entregou os demais e a punição deste, na maioria das vezes, será com a própria vida.

Um caso bastante conhecido e que serve para ilustrar a repulsa da delação em si - guardada as devidas proporções - foi a traição de Judas Iscariotes em relação a Jesus e os seus discípulos. De forma bem humorada, Lanna (2015) discorre:

 

O apóstolo Judas Iscariotes optou pelo benefício da delação premiada e decidiu entregar Jesus na operação Lava Mãos, coordenada pelo Procurador Pôncio Pilatos. A polícia federal romana prendeu Jesus após uma reunião com seus discípulos no jardim do Getsêmani e o conduziu para a carceragem. Especula-se que pela delação Judas tenha recebido 30 moedas. De dólar.  Jesus aguarda julgamento na prisão e poderá ser condenado à morte caso seja comprovado seu envolvimento no caso do Messialão.

 

O Direito Penal Brasileiro não foi feliz com essa denominação de delação premiada sugerindo, assim, uma troca, uma barganha por parte da justiça para com os criminosos, onde estes seriam premiados por meio de um “caguete”. Bezerra da Silva (2002) já se expressava sobre a figura do “cagueta” em sua canção “defunto caguete”:

 

Mas é que fui num velorio velar um malandro Que tremendo decepção Eu bati que o esperto era rico e legal Ele era do time da "entregação" O bicho esticado na mesa Era dedo nervoso e eu não sabia Enquanto a malandragem fazia a cabeça O indicador do defunto tremia Era caguete sim .. Era caguete sim .. Eu só sei que a Policia pintou no velório e o dedão do safado apontava pra mim Era caguete sim Era caguete sim Eu já vi que a Policia rochou no velório e o dedão do coruja apontava pra mim.

 

 Sendo, com isso, muito atacado por aqueles que condenam a delação premiada descrevendo que não só a denominação do instituto é inapropriada como, também, a prática da delação mostra a fragilidade do Estado em investigar e apurar a ocorrência de vários crimes. Nascimento (2013, p. 04) coloca que existe uma relação direta entre tal benefício/prêmio e a falência da atividade investigativa. Basicamente ocorre que quanto mais se utiliza a delação premiada, mais falida se mostra a estrutura investigativa estatal.

No entanto, diante de toda essa discussão a lei 12.850/13 veio amenizar os “ataques” que a delação premiada vinha sofrendo. Tal lei veio tratar sobre as organizações criminosas, dispor sobre a investigação criminal e sobre a obtenção de provas, trouxe, ainda, algumas mudanças, principalmente em relação à designação terminológica sendo denominada, não mais como delação premiada, mas por colaboração premiada, tal denominação defendida já há bastante tempo por vários juristas.

 

3 O SISTEMA PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO E A DELAÇÃO PREMIADA

 

Por meio da Lei 8.072/90, lei dos crimes hediondos, foi adotado no ordenamento jurídico brasileiro, novamente, o instituto da delação premiada, cujo objetivo era possibilitar a desarticulação de quadrilhas, bandos e organizações criminosas, que crescia a cada ano, facilitando as investigações e evitando a prática de novos crimes por tais grupos.

Diante desse “novo” paradigma, se espalhou pelas leis extravagantes o instituto da delação premiada; podemos destacar, segundo Nascimento (2013, p.09), algumas: a Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (nº 7.492/86) art. 25, §2º (inclusão com a Lei nº 9.080/1995); Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica (nº 8.137/90) art. 16, p.u (inclusão com a Lei nº 9.080/1995); Código Penal art. 159, §4º (delito de extorsão mediante sequestro - inclusão com a Lei nº 9.269/1996); Lei dos Crimes de Lavagem de Capitais (nº 9.613/98) art. 1º, §5º; Lei de Proteção a vítimas e testemunhas (nº 9.807/99) art. 14; Lei de Drogas (nº 11.343/06) art. 41; Lei que trata do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (nº 12.529/2011) art. 86. Havia, ainda, a Lei nº 9.034/95 que foi revogada pela lei nº 12.850 de 2013.

Podemos perceber, em relação a tal evolução legislativa acima exposta, é que, além de ser um reflexo da crescente preocupação com o avanço da criminalidade é, também, uma demonstração de que a delação premiada é um instituto que tem servido positivamente o sistema penal e processual penal brasileiro caracterizando-se como um meio muito eficaz para desmantelamento dos grupos criminosos do país. 

Segundo Zanotti (2015, p. 205), a delação premiada caracteriza-se substancialmente por uma contribuição voluntária por parte do réu com a finalidade de auxiliar a elucidação de um crime. Assim, o investigado poderá firmar o acordo da colaboração premiada na fase de inquérito policial ou até mesmo na fase processual, quando já está em curso a ação penal. O que ocorre comumente é que a colaboração se da mais na fase inquisitiva, pois é nessa fase que tal instituto é bem mais útil, sendo capaz de fornecer a investigação mais elementos para elucidação do crime. A importância da delação premiada está diretamente relacionada à produção de provas que dela podem surgir. De tal maneira que, por maior            que seja a participação do indivíduo nas ações criminosas, se suas informações forem verídicas - confirmadas, logicamente, pela investigação – mais benefícios o colaborador premiado vai receber. Diante disso, observar muito bem Bittar (2011, p.25) “[...] são os possíveis benefícios previstos para o delator: a não aplicação da pena; a diminuição de 1 (um) a 2/3 (dois terços) da pena; e, substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”.

É importante frisar, que a colaboração premiada deve ser utilizada com outros elementos de prova para que possa fundamentar bem a condenação dos acusados, pois é um caminho para o esclarecimento dos crimes e precisa ser confirmada como prova. Nesse diapasão, Zanotti (2015, p.206), relata:

 

[...] é importante ressaltar que a delação premiada possui valor probatório relativo, uma vez que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador, devendo ser acompanhada de outras provas que comprovem o fato criminoso.   

 

Contribuindo mais sobre o que está sendo colocado, o Ministro Menezes Direito relatou:

 

[...] não entendo a delação premiada como prova. Ela não é prova, é um caminho. Por isso é que, na verdade, ela não se caracterizaria nem figurativamente numa “deduragem” irresponsável, inconstitucional, porque não é uma prova, é um caminho de prova. Se ela fosse uma prova, na minha concepção, claro, estaria coberta pela disciplina da ampla defesa e do contraditório (MENEZES APUD MIRANDA; CHAVES JUNIOR, 2012, p. 04).

 

Com isso, a validade da colaboração premiada será averiguada para ver se o delator terá ou não as benesses da lei, tal análise se consubstanciará no artigo 4º e seus incisos, da Lei 12.850/13:

 

Art. 4o  O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:

I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;

II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

 

Seguindo esse ponto, Rocha Nogueira (2014, p. 54) descreve, ainda, que fora esses requisitos, que são requisitos objetivos, há, também, os aspectos subjetivos presentes no §1º do artigo 4º da respectiva lei já supracitada:

 

A personalidade do delator, que deverá se mostrar arrependido das condutas praticadas em detrimento da organização criminosa em que fazia parte; a natureza do crime, em relação à ofensa causada a sociedade; a circunstância, relacionado ao modo de execução de suas atividades criminais; a gravidade, embasada na tipificação penal do delito, podendo ser crimes mais graves ou mais leves; a repercussão social, necessidade de punição requerida pelos cidadãos pela sua reprovação ao tipo do crime. (ROCHA NOGUEIRA, 2014, p. 55).

 

                   Observados tais requisitos o Ministério Público ou o delegado, mediante a manifestação do Ministério Público, poderá representar ou requerer ao juiz os benefícios ao acusado pela sua colaboração.

 

4 A EFICÁCIA DA COLABORAÇÃO PREMIADA

                  

                   Para que haja uma eficácia de sua aplicação, a delação premiada tem que funcionar da forma já prevista na lei 12.850/13, ou seja, como uma colaboração premiada daqueles que estão inseridos nas organizações criminosas, Segundo Fernando Capez (2012, p. 416), “[...] não basta que o ato esteja na esfera de vontade do agente, exigindo-se também que dele tenha partido a iniciativa de colaborar, sem anterior sugestão ou conselho de terceiro [...]” Além disso, exigi-se um nexo causal entre a colaboração premiada e o efetivo esclarecimento dos delitos e, consequentemente, o desmantelamento da organização criminosa.

                   A colaboração premiada tem se mostrado bastante eficaz e tem ganhado, principalmente nos últimos anos, bastante destaque no cenário nacional por conta de várias organizações criminosas que agiam no ambiente político do país; crimes investigados pela Polícia Federal e Ministério Público Federal puderam ser desarticulados mediante a ajuda do instituto da colaboração premiada. Podemos citar, dentre muitos, os que foram mais conhecidos como é o caso do “mensalão do DEM”; “mensalão” e “petrolão”. Observando em cada um deles a utilização bem positiva da colaboração premiada.

                   O “mensalão do DEM” foi investigado e desmanchado pela operação da Polícia Federal que ficou conhecida como “Caixa de Pandora”:

 

No dia 27/11/2009, foi deflagrada a operação Caixa de Pandora pela Polícia Federal, para cumprimento dos mandados de busca e apreensão ordenados pelo Superior Tribunal de Justiça, com o apoio do informante Durval Barbosa, com o objetivo de investigar a suposta distribuição de recursos ilegais à base aliada do Governo do Distrito Federal, alcançando grande repercussão nacional devido ao fato de existirem acusações documentadas por vídeos e escutas, atingindo grande parte de políticos influentes no Distrito Federal. (LOPES JUNIOR, 2013, p.44).

 

            Essa organização criminosa que agia no Distrito Federal, só foi possível a sua desarticulação devido à participação decisiva do informante Durval Barbosa, pois ele trouxe as informações necessárias para incriminar os demais réus desses crimes cometidos contra a Administração Pública. Lopes Junior (2013, p.51), descreve, ainda, com mais precisão sobre o importantíssimo instituto da colaboração premiada para solucionar esse caso:

 

Com o advento da delação premiada, foi possível utilizar-se, especificamente na operação Caixa de Pandora, da colaboração de Durval Barbosa, como uma ferramenta com maior potencial no auxílio às investigações, tornando possível, dessa forma, condenações que seriam quase impossíveis ou pouquíssimos prováveis, no caso, a prisão do Governador José Roberto Arruda e na descoberta de outros integrantes da quadrilha, que faziam parte do alto escalão do Governo do Distrito Federal.

 

            A delação/colaboração premiada, no caso do mensalão do DEM, despertou na população a sensação de que o Código Penal, também, pode ser utilizado para os políticos corruptos e para as pessoas do alto escalão econômico-financeiro desse país que se envolvem ou lideram organizações criminosas.

 

Sendo assim, o cenário político e administrativo de Brasília foi modificado com a execução da operação Caixa de Pandora e, sobretudo, pela colaboração de Durval, que forneceu informações de suma importância em troca dos benefícios da delação premiada. (LOPES JUNIOR, 2013, p.45).

 

            Deixou claro, a Operação “Caixa de Pandora”, que a colaboração premiada foi eficaz para aquilo que foi estabelecida pelo ordenamento jurídico brasileiro mudando o cenário político-administrativo de Brasília e levando o principal nome da organização criminosa para a cadeia: o Governador do Distrito Federal José Roberto Arruda. 

                   No denominado “mensalão” uma das figuras principais foi o Ex-deputado federal Roberto Jefferson, ele foi o responsável por escancarar o esquema do Mensalão, em 2005. Contou como a prática funcionava, indicou comparsas e entregou o empresário Marcos Valério, acusado de orquestrar a arrecadação de dinheiro junto ao governo para compra de apoio no Congresso Nacional. Como benefício pela delação, teve a pena reduzida em 1/3; sendo sua pena de dez anos e meio reduzida para pouco mais de sete anos. A diminuição da pena acabou permitindo ainda que ele a cumprisse em regime semiaberto. Cooperando, Avila (2014, p.42), diz que:

 

Em linhas gerais, o esquema do “mensalão” é visto como um repasse de dinheiro do Partido dos Trabalhadores (PT) em forma de um pagamento mensal aos parlamentares da base aliada pertencentes à Câmara dos Deputados. Esta mensalidade (daí o nome popularmente conhecido como mensalão) era apresentada aos deputados como forma de incentivar aos mesmos a votarem junto com o governo em projetos legislativos na casa. Portanto, a organização com fim ilícito nada mais era que a compra de apoio parlamentar.

                  

                   A manipulação com o dinheiro público é tão gritante que chega a causar nojo naqueles que ouvem os relatos de tais práticas criminosas. O Mensalão caracterizado pela compra de apoio político foi, também, desfeito pela eficiência da colaboração premiada que mesmo atacada por alguns juristas revela que é bastante útil e proveitosa para desmascarar práticas eticamente e criminalmente condenáveis.

 

Convém lembrar que, no caso em tela, apenas dois réus formaram acordo junto ao parquet e por isso obtiveram como prêmio o perdão judicial. Tal acordo foi proposto a demais réus na ação não sendo aceito. Convém ressaltar que os beneficiados de acordo foram apenas os réus Lúcio Bolonha Funaro e José Carlos Batista. (AVILA, 2014, p.47-48).

 

                   Hoje em dia, a delação ou colaboração premiada, tem estado nas primeiras páginas dos jornais, debates em círculos de amigos, nas escolas e universidades, pois, segundo as denúncias, o chamado “petrolão” tem envolvido um grande número de parlamentares e até o alto escalão do Poder Executivo Federal; os nomes do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa são os nomes mais citados, pelo que os tais acordaram em cooperar com as investigações em troca de benefícios da justiça. As denúncias apareceram na operação denominada de Lava Jato pela Polícia Federal.

                   Segundo a Polícia Federal o esquema de lavagem de dinheiro pode ter movimentado cerca de R$ 10 bilhões de forma ilegal. E as delações dos acusados já supracitados têm contribuído de forma significativa para prisão de mais envolvidos em tais crimes.

 

Com início em um posto de gasolina –de onde surgiu seu nome–, a Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2014, investiga um grande esquema de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. (FOLHA DE S. PAULO, 2014).

 

            Diante de tal esquema de lavagem e desvio de dinheiro na maior estatal do país, vem à tona toda a organização criminosa envolvendo partidos políticos e as maiores empreiteiras em funcionamento no Brasil fazendo ruir esse belo castelo de areia construído por corruptos que dilapidaram o dinheiro público.

 

Em seu depoimento, o ex-diretor da Petrobras afirmou que havia um esquema de pagamento de propina em obras da estatal por parte de empreiteiras, e que o dinheiro abastecia o caixa de partidos como PT, PMDB e PP. Em novembro de 2014, a Polícia Federal deflagrou uma nova fase da Lava Jato, que envolveu buscas em grandes empreiteiras como a Camargo Corrêa, OAS, Odebrecht e outras sete companhias. (FOLHA DE S. PAULO, 2014).

 

            Diante desse cenário corrupto que se formou no país nos últimos anos, no que tange a pagamento de propina com o dinheiro oriundo da PETROBRAS, a colaboração premiada vendo sendo utilizada por muitos acusados que voluntariamente procuram ajudar as investigações para serem premiados com penas mais brandas. 

 

Tanto Costa quanto Youssef assinaram com o Ministério Público Federal acordos de delação premiada para explicar detalhes do esquema e receber, em contrapartida, alívio das penas. Um ano após o início da Lava Jato, já são 15 os delatores do esquema. (FOLHA DE S. PAULO, 2014).

 

                   Assim, a colaboração premiada tem sido um instrumento importantíssimo no combate às organizações criminosas evidenciando a sua eficácia, pois tanto a polícia quanto o Ministério Público têm utilizado sabiamente tal instituto e vem colocando fim em esquemas bilionários que sugavam os cofres públicos do Brasil.

 

 

5 CONCLUSÃO                                                                                 

 

A partir da pesquisa feita para o presente trabalho foi possível concluir que, diante das ameaças que vão surgindo para desestabilizar a organização estatal, como é o caso dos crimes organizados, ocorre uma contrapartida desse mesmo Estado que se utiliza de mecanismos que podem assegurar a sua estrutura e desmantelar na raiz tais grupos criminosos.

Com o aumento do crime organizado surge o instituto da delação premiada, que como já foi colocado não soa muito bem tal nomeação, o que acertadamente foi concertado com a lei que trata das organizações criminosas, investigação e obtenção de provas (lei 12.85/13) que designou tal meio de colaboração premiada e não mais delação premiada.      

A origem histórica dessa colaboração ocorre desde o império com as ordenações filipinas. No entanto, tal instrumento depois da queda do império ficou esquecido por esses longos anos sendo lembrado na década de noventa com a lei de crimes hediondos (lei 8.070/90).   

            O Sistema Penal Brasileiro abraçou a colaboração premiada e esta foi ramificada por um grande número de leis extravagantes. Contudo, só depois de vinte três anos é que surge uma lei que coloca de maneira bem mais clara e objetiva a colaboração premiada trazendo os requisitos necessários para obtenção das vantagens ao colaborador.

            Por fim, a utilização da colaboração premiada nos últimos casos de repercussão nacional: “mensalão do DEM”; “mensalão” e “petrolão” mostram, expressamente, a eficiência da colaboração premiada, pois por meio desta, esquemas foram desfeitos; crimes solucionados; criminosos, que desviavam e lavavam o dinheiro público, presos e vantagens foram recebidas por parte daqueles que, voluntariamente, se colocaram a cooperar com a justiça para prisão dos demais envolvidos e, para pôr fim a organizações criminosas que dilapidavam o país.  

 

REFERÊNCIAS

 

AVILA, Luiz Felipe Damião Serralvo. A delação premiada na AP 470/MG: um estudo de caso do instituto no Acórdão do mensalão. Brasília, 2014. UniCEUB. 2013. 60 p. Monografia. Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais – FAJS. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BRASÍLIA, Brasília: UniCEUB, 2013. Disponível em:< http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/5746/1/20948065.pdf>. Acesso em: 29 de Abril de 2015. 

 

BITTAR, Walter Barbosa. Delação premiada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

 

BRASIL. Lei Nº 12.850, de 2 de agosto de 2013. Define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal; altera o decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); revoga a lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995; e dá outras providências. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm> Acesso em 20 de abril de 2015.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 3, parte especial: dos crimes contra a dignidade sexual a dos crimes contra a administração pública (arts. 213 a 359-H) / 10. ed. – São Paulo : Saraiva, 2012.

 

ENDO, Igor Koiti. Origens das organizações criminosas: aspectos históricos e criminológicos. Presidente Prudente, 2006. Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo – Faculdade de Direito de Presidente Prudente. Disponível em:< http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/ETIC/article/viewFile/1242/1184> Acesso em: 05 de Abril de 2015.

 

GOMES, Luiz Flavio. Crime organizado: enfoques criminológico, jurídico (Lei n9034/95) e política criminal. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997.

 

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LANNA, L. Judas opta pela delação premiada e entrega Jesus na Operação Lava Mãos. Disponível em: http://sensacionalista.uol.com.br/2015/04/04/judas-opta-pela-delacao-premiada-e-entrega-jesus-na-operacao-lava-maos/. Acesso em: 01 de Maio de 2015.

 

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MIRANDA, Ana Paula Faria de; CHAVES JUNIOR, Airto. A delação premiada e a (des) vinculação do magistrado sentenciante ao acordo. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.1, p. 144-163, 1º Trimestre de 2013. Disponível em:< www.univali.br/ricc>. Acesso em 20 de Abril de 2015.

 

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NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 8. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

 

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ZANOTTI, Bruno Taufner; SANTOS, cleopas Isaías. Delegado de polícia em ação: teoria e prática no Estado Democrático de Direito. 3ª Ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2015.

 

 

[1] Artigo apresentado à disciplina de Processo Penal I, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

[2] Alunos do 6º período do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor Mestre, orientador.