De quem é a culpa?

Por Mariana Teixeira | 13/02/2013 | Política

O que aconteceu em Santa Maria, cidade do interior do Rio Grande do Sul, na madrugada do dia 27 de Janeiro de 2013 comoveu o mundo inteiro. Os jovens que sobreviveram ao incêndio na boate Kiss não serão mais os mesmos. Eles ficarão para sempre com a lembrança da impotência de nada poder fazer para salvar seus amigos e familiares.

            Em meio a esta tristeza, somos obrigados a nos perguntar: de quem é a culpa por esta tragédia? Sabemos que são muitos os culpados, mas: o que podemos e devemos fazer para que realmente essa história seja tomada como um ponto de partida para que haja uma verdadeira mudança?

            Tenho para mim que tudo começa no comprometimento que temos com a nossa própria vida e com a vida do próximo. Especialmente neste caso, quantos donos das casas noturnas levarem a sério o que fazem? Quantos não são apenas investidores sem conhecimento sobre o ramo que atuam e sem a noção das suas obrigações? Quando será dano início a uma mudança de atitude que vai contra a ideia de burlar a fiscalização a fim de diminuir custos? A pessoa preocupada com a sua dignidade vai mais além da simples ideia de lucrar com uma casa noturna. Vai atrás do conhecimento necessário para evitar um futuro problema, cria um senso de responsabilidade sobre o que faz e sobre as pessoas que estão envolvidas no seu projeto, gera uma intenção de ser correto sempre e não viver da sorte de ter uma festa bem sucedida todo o final de semana. Entendesse aqui, que uma festa é bem sucedida não por ter seus clientes satisfeitos, e sim, por lucrar além do suficiente, mesmo que para isso haja a superlotação.

            Se existe uma preocupação, não há entrada de pessoas além da capacidade, treinam-se adequadamente os funcionários para estarem preparados para contra tempos, não desmerecem as leis, e acima de tudo entendem a importância de uma lei. Assim, uma serie de erros podem ser apontados agora, passados quase um mês do acidente, tais como: extintores de incêndios vencidos, não disponibilidade de saídas de emergência e sinalização no interior da boate, uso ilegal de equipamentos que produzem faíscas, espuma altamente inflamável. Mas, de quem é a culpa?

            Casa noturna é um empreendimento, é uma empresa, e está submetida à falência se não for bem administrada. Como qualquer outra. As empresas possuem também leis de segurança do trabalho, pois preveem que fatalidades podem acontecer a qualquer hora em qualquer lugar. Por este motivo existe a possibilidade de se precaver com o auxilio dos responsáveis por coordenarem e fiscalizarem as empresas. E de uma tristeza infinita ver tantos jovens perderem a vida para que outras casas noturnas comecem a divulgar se estão ou não de acordo com as leis, ou pior, que a fiscalização seja rigorosa em relação a casas noturnas neste estado, neste país. Isso é absurdo. A má administração de uma casa noturna deve ser exposta aos clientes durante 365 dias por ano, através dos incríveis e infinitos meios de comunicação que hoje possuímos.

             Dificilmente entraremos em um ambiente pensando que não é seguro, ainda mais sendo ele bem conceituado através da divulgação à sociedade. Confiamos nas pessoas que dizem ter o conhecimento e a competência para “cuidar” de nós. E ai uma surpresa: uma pessoa qualquer abre uma casa noturna qualquer, coloca qualquer quantidade de pessoas lá dentro para então descobrir que poderia ter feito qualquer outra coisa da vida, menos ser dono de uma casa noturna. Este foi o exemplo que os deixa tristes hoje. Mas quantos lugares são tão perigosos quanto a Kiss foi naquele sábado? O bom senso não é privilegio de todos. Por isso, existem órgãos fiscalizadores para essas empresas.

              Poderíamos começar pensando que a culpa é nossa. De todas as pessoas que possuem democraticamente o poder de voto e que elegemos pessoas as quais não cuidam da sociedade e mantém um poder público incapaz de exercer suas obrigações.  Este é um país mal cuidado, nós sabemos. Sim, a culpa é parcialmente nossa. Parte por termos dado o poder a quem não merece, parte por não se quer termos instrução suficiente, educação suficiente, para discutirmos política. 

               A má educação e ignorância da sociedade brasileira aos olhos de países desenvolvidos podem ser vistos como um aspecto cultural. Uma vez que países vizinhos ao Brasil, com proporcional índices de pobreza e corrupção, veem a sociedade não se calar diante de escândalos que envolvem os governos. Se a corrupção neste país e os desvios de verba pública fossem diminuídos pela metade, o Brasil teria sim solução. Mas educar o povo pode sair caro, bem mais caro que o dinheiro que deverá ser disponibilizado para investimento. Nós, após recebermos educação, teremos "nas mãos" tudo que "eles" não precisam: teremos a capacidade de reivindicar os nossos direitos tendo em vista o certo e o errado.
               Em Santa Maria, tenho para mim que muitas pessoas do poder público possuem a culpa pela morte dos mais de 230 jovens na boate Kiss. Existem órgãos responsáveis pela fiscalização no trânsito, nos hospitais, em clínicas, auditorias, enfim, para as casas noturnas também existe pré-requisitos para o funcionamento. O maior responsável por esta tragédia é, sem dúvida, o poder público. Este, que reúne uma serie de setores, é o responsável por manter esta casa noturna dentro da lei e fora de funcionamento caso não estivesse apta.

             Infelizmente, no Brasil, o poder público cuida apenas do seu interesse. Experimentamos não pagar o importo de renda. O sistema funcionará perfeitamente confiscando nossas possibilidades de gerar renda ou fazer investimentos por exemplo. Por que para as empresas como a Kiss, não se aplica a regra? Sabemos que temos culpa em tudo que acontece de errado nesse país, mas teremos ainda mais culpa se ficarmos calados diante dessa tragédia onde tantos jovens pagaram com a vida a irresponsabilidade do poder público. Se nos acomodarmos por pensar que somos os culpados, o "jogo" continua: quando elegemos errado, erramos. E quando os que foram eleitos erram nada é feito. Vamos mudar isso! Vamos acabar com esta cultura de nada exigir de quem já está no poder. Afinal, o voto pode ter sido errado, mas quem disse que havia o certo? Em um país que permite que analfabetos se candidatem a eleições. Vamos exigir que os nossos responsáveis, mesmo que não sejam os mais competentes para tal cargo, reflitam sobre suas decisões. Afinal pagamos um dos impostos mais altos do mundo para isso.
              Esta é, ainda, uma chance de exigirmos muita mudança e muita punição. Imaginem quantas casas noturnas funcionam irregulares. Quem vai fiscalizar isso? Devemos e podemos exigir mais fiscalização daqui para frente. É sempre daqui para frente.  O contraste da riqueza e da pobreza no Brasil é estrema. Infelizmente o que acontece em uma favela pode ser facilmente calado. São pessoas muito humildes e que não possuem voz. Creio que se a boate Kiss fosse localizada em uma favela a repercussão nacional e mundial seria diferente, começando pelo acesso da mídia. A Kiss Esta era uma festa conceituada do Rio Grande do Sul. Não vamos esquecer-nos da comoção causada por este incêndio, que fez os principais jornais do mundo se perguntarem: de quem é a culpa? Boa ou má, pobre ou rica, isso é um total descaso com a sociedade brasileira.