DA LIBERTAÇÃO ANIMAL PROPOSTA POR PETER SINGER

 

 

Filipe Vieira Lima[1]

 

 

Resumo: O presente artigo científico destina-se à análise dos argumentos levantados por Peter Singer em sua obra “Libertação Animal” em defesa da elevação dos animais não humanos ao status de iguais perante os animais humanos, da mesma forma as implicações que tal tratamento acarretaria. Explorando os fundamentos morais aos quais se prende o autor, relacionando-os a posições de outros que advogam pela libertação dos animais, bem como os críticos às teses e evidências levantadas pela obra quanto ao status dos não humanos.

Palavras-chave: libertação; animal; seres humanos; direitos; moral; igualdade; Singer; sofrimento; senciência; especismo.

Summary: This scientific paper is intended for the analysis of the arguments raised by Peter Singer in his book "Animal Liberation" in defense of the rise in non-human animals to the status of equal before human animals, as the implications that such treatment would entail . Exploring the moral foundations which relates the author, relating them to other positions that advocate for the liberation of animals, as well as critics of the arguments and evidence raised by the work on the status of non-humans.

Keywords: release; animal; human beings; rights; moral; equality; Singer; suffering; sentience; speciesism.

 

 

1 – Introdução

 

 

O livro Libertação Animal teve sua primeira edição e publicação no ano de 1975. Escrita por Peter Singer, filósofo australiano de posturas utilitaristas, a obra foi resultado de um ensaio que escreveu para The New York Review of Books acerca do livro Animals, Men and Morals[2], ocasião em que cunhou pela primeira vez na imprensa a expressão libertação animal[3].

Considerada a “bíblia” do movimento de luta pelos direitos dos animais[4], a obra Libertação Animal é responsável, segundo David DeGrazia, por elevar a discussão acerca da emancipação animal a um nível intelectualmente respeitável.[5]

Para DeGrazia a importância do livro é demonstrável em diversos pontos, como na recorrência a informações fatuais, utilizando dados de pesquisas com animais e pecuária industrial, demonstrando a relevância dos problemas morais enfrentados, e somado à isso, aponta o filosofo especializado em bioética e ética animal, Singer foi bem sucedido na tarefa de escrever um livro simultaneamente acessível àqueles que não dominam conceitos puramente filosóficos, mas se interessam pela situação dos animais, e sério o suficiente para que filósofos se prestem a discutir o movimento de libertação animal.[6]

Catalisadora do movimento supracitado, Libertação Animal é, de acordo com Peter Singer, uma obra sobre a “tirania dos animais humanos sobre os não humanos”[7], na qual procura propor bases éticas sólidas sob as quais se possa fundamentar o movimento de libertação dos animais, mediante o apelo a princípios morais e exposição de dados acerca do sofrimento que a mencionada tirania tem causado aos animais não humanos, assim como os benefícios que o fim desta situação traria consigo.

Debruça-se, destarte, o presente estudo científico à análise dos argumentos levantados por Peter Singer em defesa da elevação dos animais não humanos ao status de iguais perante os animais humanos, da mesma forma as implicações que tal tratamento acarretaria. Explorando os fundamentos morais aos quais se prende o autor, relacionando-os a posições de outros que advogam pela libertação dos animais, bem como os críticos às teses e evidências levantadas pela obra quanto ao status dos não humanos.

2 - Os fundamentos da Libertação Animal

O movimento libertação animal, conforme Singer,  tem como principal objetivo pôr fim ao preconceito perante a ideia de se considerar seriamente os interesses de animais não humanos[8], através de teorias que defendem a igualdade entre seres humanos e animais, buscando afirmar que embora se possa assumir que os humanos sejam superiores em certas capacidades, tais como as intelectuais, isto não é por si só suficiente para justificar a vigente diferença moral e jurídica que se configura entre os animais humanos e animais não humanos.

O primeiro capítulo da obra presta-se a apresentar os fundamentos filosóficos sob os quais se baseia a principal ideia proposta por Singer, qual seria:

[...] tornar bem claro que a defesa da igualdade não depende da inteligência, da capacidade moral, da força física ou características semelhantes. A igualdade é uma idéia moral, e não a afirmação de um fato.[9]

O princípio da igualdade dos seres humanos não significa, de acordo com o escritor, uma igualdade fatual entre os humanos, mas uma prescrição de como os seres devem ser tratados, independentemente de serem estes humanos ou não humanos, pois características tais quais as supracitadas não estão, verdadeiramente e igualmente, presente em todos os seres da espécie homo sapiens[10].

Singer esclarece seu ponto de vista apoiando-se, em grande parte, em teses utilitaristas inicialmente cunhadas por Jeremy Bentham, para o qual seria possível, até certo ponto, calcular a quantidade de dor ou prazer que determinada postura ou atitude traria ao universo, que segundo acreditava, seria regido por dois elementos máximos: dor e prazer.[11]

Portanto uma postura poderia ser moralmente defensável se dela resultasse mais benefícios, entendidos aqui como prazer, do que prejuízos, entendidos aqui como dor, para o ser que possuísse interesses afetados por tal postura.[12]

Para Bentham a capacidade de sofrer seria a característica essencial que concederia ao indivíduo a possibilidade de possuir interesses, destarte, o direito de igual consideração de seus interesses. A senciência[13] deve ser, consoante pensa o autor, o fundamento do princípio da igualdade.

Dessa maneira se o ser é capaz de sofrer, a ele também deve se estender o princípio da igualdade afim de que se tenha em consideração seus interesses em evitar determinada dor ou buscar determinado prazer. Da mesma forma pensa Singer:

Se um ser sofre, não pode haver justificação moral para recusar ter em conta esse sofrimento. Independentemente da natureza do ser, o princípio da igualdade exige que ao seu sofrimento seja dada tanta consideração como ao sofrimento semelhante - na medida em que é possível estabelecer uma comparação aproximada - de um outro ser qualquer.[14]

Para o autor, só com o embasamento supracitado, poder-se-ia livrar da contradição inata contida na frase “todos os seres humanos são iguais”, posto que se a igualdade baseasse-se na real similaridade entre os humanos, não haveria como defende-la, afinal o número de diferenças entre os seres humanos, como cor da pele, gênero, diversas disposições genéticas, capacidades intelectuais, etc., é gritante, ademais posturas como o racismo e sexismo não poderiam ser condenáveis mediante a afirmação aludida, por simplesmente não ser verdade que todos os seres humanos são iguais.[15][16]

A partir da senciência e o princípio da igual consideração de interesses[17], portanto, é que seria moralmente válido condenar atitudes tais como as racistas e sexistas, que atribuem maior peso a interesses de membros do seu grupo em situações onde seus interesses entram em conflito com interesses de membros de outras raças e sexos, justificando sua postura com a ideia de que por possuírem certa cor de pele ou gênero suas vontades devem prevalecer.

De acordo com Singer, racistas e sexistas estão moralmente errados porque o fazem sem levar em conta que na consideração do sofrimento causado por suas atitudes, o que de fato interessa é se o ser afetado tem ou não capacidade de sofrer, por consequência, de ter o direito de que seus interesses sejam igualmente sopesados, devendo-se, portanto, evitar condutas racistas ou sexistas em prol daqueles a que está causando sofrimento desnecessário.[18]

A consequência imediata desta constatação, segundo o australiano, é que:

[...] O elemento básico - tomar em consideração os interesses do ser, sejam estes quais forem - deve, segundo o princípio da igualdade, ser ampliado a todos os seres, negros ou brancos, masculinos ou femininos, humanos ou não humanos.[19]

Ou seja, possuindo senciência, o ser tem direito a ter seus interesses igualmente considerados, o que por sua vez nos forçaria a estender o princípio da igualdade afim de abarcar os animais não humanos, pelo menos até onde seja possível comprovar que possuam o pré-requisito básico para sequer possuir interesses, e assim tê-los tomados em conta: a capacidade de sofrer.[20]

Singer passa, destarte, a enfrentar as indagações acerca da possibilidade ou não de animais não humanos possuírem senciência, dedicando-se a responder aquilo que Bentham há muito havia questionado quando debruçou-se a analisar a linha que dividia aqueles dignos de ter seus interesses igualmente considerados, daqueles que não possuíam tal direito:

What else is it that should trace the insuperable line? Is it the faculty of reason, or, perhaps, the faculty of discourse? But a full-grown horse or dog is beyond comparison a more rational, as well as a more conversable animal, than an infant of a day, or a week, or even a month, old. But suppose the case were otherwise, what would it avail? The question is not, Can they reason? nor, Can they talk? but, Can they suffer?[21]

O filósofo australiano responde positivamente a indagação acima, expondo que os animais seriam seres sencientes, pelo menos em grande parte, elencando diversas razões para refutar o argumento de que animais não humanos não possuiriam interesses, pois não seriam capazes de sofrer.

            Uma dessas razões provém das constatações feitas acerca dos sinais exteriores que nas relações entre seres humanos os levam a concluir que sentem dor. Tais sinais, baseados em observações de comportamento, seriam atitudes como “contorções, esgares, gemidos, latidos ou outras formas de chamamento, tentativas para evitar a fonte da dor, demonstração de medo perante a possibilidade da sua repetição, etc.”[22], que fundamentam a ideia de que assim como é razoável, através de sua observação em animais humanos inferir que estes sentem dor, é também razoável a mesma conclusão em relação aos animais não humanos, posto que é possível identificar os mesmos sinais entre eles.

            Ademais, conforme conheceu-se a história evolucional dos seres humanos e outros animais, identificou-se que os animais não humanos possuem sistemas nervosos extremamente semelhantes aos humanos, especialmente em espécies como os mamíferos e aves, que possuem, similar aos os seres humanos, a região cerebral responsável por impulsos, emoções e sensações bem desenvolvida.[23]

Ao lado de Singer parecem caminhar estudos que emergem atualmente na superfície acadêmica. A veterinária Carla Forte Maiolino Molento[24] aponta algumas conclusões aceitas quanto a senciência presente entre os animais. Antes de mais nada, ressalta a veterinária, é interessante notar que a palavra senciência não é, sequer, uma palavra que conste normalmente em dicionários ou em certos segmentos científicos, sendo um neologismo criado para definir a capacidade de ter sentimentos associados à consciência.[25]

            Essa capacidade é de vital importância para que seja definido até onde no reino animal é possível defender a ideia de que os animais devam receber proteção do sofrimento que a eles se esteja sendo infligido. Essa linha, responsável por traçar até onde se é possível afirmar que determinados seres possuem interesses, tem-se revelado extremamente tênue e ainda obscura, haja visto que no meio científico, afirma Carla Molento, existem posturas que defendem a senciência como característica exclusiva dos humanos e outros que defendem sua extensão até em artrópodes e moluscos.[26]

            Isto é motivado pelo fato de a senciência ser um estado de mente, analisado através da consciência do indivíduo, o que implica no impedimento de se saber “em que ponto na escala evolutiva reside a linha limítrofe entre a presença e a ausência de senciência”[27], haja visto que mesmo existindo inúmeras teses que identificam semelhanças nas estruturas cerebrais de humanos e animais não humanos, entre elas as que são responsáveis pela existência de sentimentos[28], ainda não é possível concluir, com certeza, que nem em espécies animais em que são ausentes as estruturas associadas à senciência, não exista a capacidade de sentir.

Ademais nos ramos da taxonomia a evolução já não é mais aceita como uma linha uniforme ascendente, mas como uma ramificação característica de uma árvore, em que certos aspectos podem ter se desenvolvido paralelamente. [29] De acordo com Molento:

[...] a questão da senciência animal é mais bem entendida por uma abordagem quantitativa que qualitativa.  Assim, a melhor pergunta parece ser “Qual o grau de senciência de um animal?”  e não “Este animal é senciente ou não?”[30]

            Conforme a veterinária, a despeito de os estudos neurológicos e etológicos ainda não serem capazes de fornecer fontes definitivas acerca da senciência presente nos animais não humanos, uma postura quanto a isso deve ser tomada, haja vista a possibilidade de se estar causando sofrimento a uma quantidade incalculável de seres.

            Diante da obscuridade presente nos estudos científicos, clama a veterinária para que aos animais seja concedido o benefício da dúvida, tal como o propõe Singer[31], tratando-os como se seres sencientes fossem. Segundo Carla Molento, o Princípio da Homologia, isto é, a similaridade entre as estruturas anatômicas, genéticas, comportamentais e evolutivas com o ser humano, que tornam provável a senciência nos animais não humanos, significa, conforme o Princípio da Precaução, que “Se existe uma possibilidade de senciência nos animais, temos a obrigação de considerar esta senciência em nossas decisões”.[32]

            Conjunto a isso outros fatores reforçam a imperatividade de consideração dos interesses dos animais, vide o crescente número de legislações preocupadas com o bem-estar dos animais só no Brasil[33], que apesar de se constituírem em grande parte apenas numa perspectiva de uso humano, sinalizam a necessidade de uma regulamentação quanto ao sofrimento que se é possível causar aos animais não humanos, principalmente quando a estes se atribui um grau de complexidade próximo ao presente nos seres humanos, ou seja, seres com graus de senciência elevados.[34]

            A neurocientista Eleanor Boyle acredita que a ciência já mostra diversas evidências que suportam o argumento de senciência nos animais[35], e aponta a necessidade de se ter em mente que:

The methods of science ensure procedural objectivity but science cannot escape subjectivity in interpretation of data and in the research questions it chooses to ask. Science is also influenced by prevailing norms and views.[36]

Tornando-se, portanto, necessário superar visões que exerceram e exercem grande influência na postura que se tem perante os interesses dos animais, qual identificava-os como seres autômatos, comparando-os a maquinários e objetos[37] e que se passe, especialmente no meio científico, a ter mais tolerância e assenso quanto as novas evidências positivas para senciência de uma enorme quantidade de animais não humanos.

            À vista disso Peter Singer conclui que os animais podem sentir dor, o que, conforme o exposto, implica em não haver nenhuma justificação moral plausível para que se considere tal dor, ou prazer, menos ou mais importante do que a que experimentam os seres humanos. Todavia, não está o autor a dizer que uma dor infligida a um ser humano possa ser equiparada de prontidão a que se é causada aos animais não humanos, pois existem certas diferenças entre tais seres que trazem algumas complicações práticas.

            Assim é que Singer expõe: “Os seres humanos adultos normais têm capacidades mentais que, em determinadas circunstâncias, poderão levá-los a sofrer mais do que os animais sofreriam nas mesmas circunstâncias”[38], como, por exemplo, a capacidade mental de antecipação, que em certas ocasiões onde é possível prever que alguma violência lhes seja infligida afim de se realizar um experimento científico, levaria os seres humanos a uma situação de terror psicológico que já seria por si só uma forma adicional de sofrimento, o que não aconteceria em animais, por exemplo, pela falta de tal capacidade antecipatória.

            Este raciocínio, contudo, não torna correto que se realize estas experiências em animais, mas apenas demonstra uma razão moralmente defensável e não especista, segundo a igual consideração de interesses, para que se prefira animais a seres humanos adultos normais para se realizar a experiência, desde que, é claro, comprove-se a necessidade e os benefícios provindos desta atividade, tornando claro que é esta a forma pela qual se produziria menos sofrimento.

            O autor se vale do exemplo acima para demonstrar a difícil tarefa que é uma quantificação e comparação de sofrimentos em diferentes espécies, revelando que as características de cada ser podem levar a uma quantidade maior ou menor de sofrimento, tal como exposto anteriormente, mas também em outros exemplos, como em casos onde aos seres humanos seria possível explicar que qualquer quantidade de violência a eles infligida, como limitação de movimento, seria, por exemplo, em prol de salvar suas vidas posteriormente, caso em que um animal selvagem sentiria tanto terror quanto fosse tal limitação para na verdade tirar sua vida, pois “[...] não consegue distinguir uma tentativa de dominação e limitação de movimentos de uma tentativa de matar: tanto terror lhe causa uma como outra”.[39]

Peter Singer acredita haver alguma maneira de mensurar, a partir da intensidade das dores causadas aos indivíduos, um certo ponto de equivalência entre os sofrimentos causados. É assim que, com enfoque na senciência, tenta expor que o sofrimento é um mal em si mesmo, devendo ser evitado, independentemente de quem sofre, pois que assim como achar-se-ia errado infligir gratuitamente determinada dor a um bebê, o mesmo deveria se pensar sobre causar-se uma dor de proporcional intensidade a um cavalo.

Dessa maneira é que Singer busca proteger sua teoria das principais críticas que normalmente sofrem as teses utilitaristas, como Richard Ryder, fundador da tese que batizou painism[40], aponta:

One of the important tenets of painism (the name I give to my moral approach) is that we should concentrate upon the individual because it is the individual - not the race, the nation or the species - who does the actual suffering. For this reason, the pains and pleasures of several individuals cannot meaningfully be aggregated, as occurs in utilitarianism and most moral theories. One of the problems with the utilitarian view is that, for example, the sufferings of a gang-rape victim can be justified if the rape gives a greater sum total of pleasure to the rapists. But consciousness, surely, is bounded by the boundaries of the individual. My pain and the pain of others are thus in separate categories; you cannot add or subtract them from each other. They are worlds apart.[41]

Reconhecido como o primeiro a cunhar o termo especismo, postura de favorecimento dos interesses de um membro de determinada espécie em detrimento dos interesses de membros de outra espécie, simplesmente por pertencerem a determinada espécie, Ryder acredita que não é possível abstrair a quantidade de sofrimento que se está sendo causada, pois assim se estaria desconsiderando o indivíduo que de fato está sofrendo.

Deste modo o autor exemplifica que embora numa soma total um milhão de unidades de dor seja um número superior a cem unidades de dor, quando infligimos essas cem unidades de dor a um indivíduo apenas e as outras um milhão de unidades de dor em um milhão de indivíduos, certamente concluir-se-ia que causar cem unidades de dor em um só indivíduo é bem pior que uma única unidade de dor em cada um dos um milhão de sujeitos, mesmo que neste caso o total de sofrimento seja maior na conta final.[42]

Assim Richard Ryder aponta que mesmo sendo claro que cada espécie é diferente e reage a fontes de sofrimento de distintas maneiras, implicando que se deve trata-los de formas distintas, “we should always treat equal suffering equally”[43], o que, esclarece, não ocorre hodiernamente em relação aos animais, posto que é permitido que a tais seres seja infligido quantidades de dor definitivamente não aceitáveis se causadas a seres humanos, como exemplo:

A whale may take 20 minutes to die after being harpooned. A lynx may suffer for a week with her broken leg held in a steel-toothed trap. A battery hen lives all her life unable to even stretch her wings. An animal in a toxicity test, poisoned with a household product, may linger in agony for hours or days before dying.[44]

Para Singer o problema se complica ainda mais quando se passa a analisar a questão da morte e vida, que acredita ser tão complexa de se tratar no contexto atual de tirania entre humanos e animais, que apesar de não atrelar a sua teoria como a ideal para solucionar o dilema de identificar em que situações tirar a vida de um animal pode ser defensável ou condenável moralmente, afirma constituir “base suficiente para identificar e protestar contra todos os principais abusos dos animais perpetrados por seres humanos”.[45] Todavia não foge à discussão, analisando aspectos que tornaram tal questão tão delicada.

Singer identifica a atitude dos seres humanos segundo as condutas mais aceitas e estabelecidas como especista, termo que repete ao longo da obra, pois para o filósofo esta postura está encravada entre os seres humanos, identificando diversas ideias acerca do valor da vida que seriam formas de especismo. Dentre tais convicções aponta a opinião bastante aceita pela maioria das pessoas: “é sempre errado pôr fim a uma vida humana inocente”[46], denominando esta postura como o ponto de vista da “santidade da vida”[47].

Os indivíduos que sustentam o ponto de vista supracitado condenam tanto o aborto quanto a eutanásia, contudo não se opõem, normalmente, à morte de animais não humanos, mostrando que apenas quando a vida em questão é uma vida humana é que ela se tornará sacrossanta, por consequência, inviolável, e isto meramente por ser essa a espécie a qual pertencem.

De acordo com Singer aqueles que defendem que a vida humana é sagrada não admitiriam que mesmo diante da situação em que uma criança nasça com profundas e irreversíveis lesões cerebrais, a ponto de comprometer por completo a sua vida, sem chances de falar, reconhecer outras pessoas e ser um ser autônomo, lhe fosse tirada a vida, o que se reflete na própria legislação de vários países, inclusive a brasileira, posto a eutanásia ser considerada ilegal[48].

Contudo os mesmos indivíduos que seguem este ponto de vista não colocam objeções em relação ao abate de animais não humanos, apesar de entre estes existir seres que ultrapassem a criança aludida acima “nas suas capacidades de relacionamento social, de agir independentemente, de ter autoconsciência e de todas as outras capacidades que poderiam razoavelmente considerar-se como conferindo valor à vida”[49], e o fazem baseados essencialmente no fato de pertencerem a espécies distintas, ou seja, no especismo.

Aqueles que militam, portanto, contra o especismo afirmam que o direito à vida não deve depender meramente à pertença ou não à determinada espécie, deve, na verdade, ser concedido com base na ideia de que os seres que possuam semelhanças em todos os aspectos relevantes ao valor da vida, devem possuir também um semelhante direito à vida.

Neste ponto Peter Singer chama atenção:

Este argumento tem dois gumes. Pode ser tomado como significando que os chimpanzés, os cães e os porcos, juntamente com algumas outras espécies, têm direito à vida e que cometemos uma grave ofensa moral ao matá-los, mesmo que sejam velhos e estejam a sofrer e a nossa intenção seja pôr fim à sua dor. Alternativamente, pode-se pensar que o argumento mostra que os deficientes profundos e os senis sem hipótese de recuperação não têm direito à vida e podem ser mortos por razões bastante triviais, como agora fazemos com os animais.[50]

Constituem-se as duas posturas acima, infelizmente, formas de se evitar o especismo, e, embora seja claro que o autor defenda a elevação do status dos animais não humanos, Singer não as considera satisfatórias, dado que crê ser possível encontrar um meio-termo que “não considere as vidas dos deficientes e senis de forma tão leviana como agora são consideradas as vidas dos porcos e dos cães, nem tome como sacrossanta a vida dos porcos e dos cães de forma a pensarmos ser incorreto libertá-los de uma dor inelutável”[51], concluindo que rejeitar o especismo não significa afirmar que todas as vidas possuam igual valor.

Contudo o autor não se compromete a solucionar o dilema acerca de em que situações é correto ou não matar, pelo menos de forma indolor, um animal ou ser humano, pois esclarece haver certas características como ter esperança, aspirações, estabelecer relações com outros indivíduos, ser capaz de realizar pensamentos abstratos, possuir expectativas, entre outras, que se atrelam ao valor da vida que o ser carrega, fazendo com que tal valor seja variável conforme possua ou não tais atributos.

Segundo Peter Singer, em termos práticos, o aludido acima poderia significar que seria preferível talvez tirar a vida de um animal em vez de um ser humano, uma vez que o animal não humano não possui atributos como esperança, planejamentos, objetivos, que de certa forma tornam pior o ato de se tirar a vida de um ser humano, posto que normalmente carregam tais características. A dor, contudo, acredita Singer, é um mal em si mesmo, não sendo afetado pelas outras características daquele que a sofre, devendo, por isso, ser evitada.

Singer deixa claro que as ilações levantadas em sua obra “derivam apenas do princípio de minimização do sofrimento”[52], parecendo reconhecer a insuficiência de sua teoria como alicerce definitivo para a concessão de direitos aos animais, afirmando que argumenta a favor da igualdade entre animais e humanos, mas não necessariamente a favor de “direitos” aos animais, no sentido de uma linguagem que “faz parte do código político que se utiliza por conveniência”[53].

Assim se posiciona afim de refutar algumas críticas e pensamentos opostos a suas teses. Destaca-se, entre tais pensamentos, o raciocínio empregado por Michael Fox que em sua crítica ao movimento de Libertação Animal, aponta certas fraquezas na argumentação de Singer e outros filósofos porta-vozes do movimento aludido.

Fox defende que o fato de existirem certos animais com capacidade similares aos seres humanos, como senciência, inteligência e emotividade, sendo até mesmo capazes de sofrer tanto psicologicamente quanto fisicamente, que tornam suas vidas mais valiosas conforme o padrão reconhecido pelos seres humanos, não significa, como corolário lógico, que sejam sujeitos de direitos morais. [54]

Segundo o autor, aos animais ainda faltam certas características essenciais como a autoconsciência, vontade própria, a capacidade de praticar ações deliberadas, manipular conceitos e usar linguagens sofisticadas, que os impossibilitam de serem considerados seres autônomos, portanto, incapazes de participar de uma comunidade e possuir direitos.

Nas palavras de Michael Fox:

[...] only autonomous beings, as just described, can and do belong to a moral community, which is the sort of social group within which (and only within which) such concepts as those of rights and duties have any meaning and application. For it is only in a community of interacting autonomous beings of this sort that there can be the kind of mutual recognition require for these concepts to evolve and be understood.[55]

A partir de tal pensamento, considera Fox que deve haver alguma característica exclusiva à espécie homo sapiens, já que é a única espécie, crê, capaz de conceber conceitos como direitos e obrigações, que faz com que sejam os únicos capazes de pertencer a uma comunidade tal qual a descrita acima.

            Embora Fox reconheça que nem todos os membros da espécie homo sapiens possuam as características relevantes para que participem de tal comunidade moral, dado que nem todos são seres autônomos, da mesma forma, aponta, tampouco estará universalmente presente a capacidade de sofrer entre todos os humanos, afirmando que fazer o princípio da igualdade depender de tal característica nada mais é que basear a igualdade em uma outra característica fatual, qual com certeza é mais ampla que uma característica como a cor da pele ou sexo, mas definitivamente não universal, haja vista “a rare but thouroughly documented condition called ‘congenital universal indifference (or insensitivity) to pain’, which is characteriized by complete absence, throughout life, of any pain-sensing capability”[56], além de indivíduos que estejam completamente anestesiados, hipnotizados ou em profundo coma, aos quais é inadmissível que se negue direitos.

            O pensador conclui portanto:

[…] (1) that basic moral rights arise from other criteria than the capacity to enjoy and suffer (this capacity being a necessary but not a sufficient condition for the granting of the rights in question); and (2) that what counts in establishing rights are the characteristics that a certain class of beings share in general, even if not universally.[57]

Ou seja, mesmo que certos seres humanos não sejam considerados autônomos, esta característica deve ser verificada como o que normalmente ocorre entre tais seres, o que, crê Fox, não seria o caso dos animais não humanos.

            Segundo o autor supracitado, um dos problemas centrais da argumentação de Singer é que o filosofo não consegue provar porque, mesmo admitindo as diferenças entre humanos e animais, o prazer e a dor dos animais tanto quantitativamente quanto qualitativamente devam ser considerados como iguais às experimentadas pelos seres humanos ou de qualquer forma sejam igualmente considerados.[58]

            O mesmo problema é encontrado por David Degrazia que identifica a falha de Singer ao não assumir uma postura severa com sua própria teoria, ao mesmo tempo que não estabelece o que equivaleria de fato sua tese de igualdade ou igual consideração de interesses, visto não determinar qual seria o critério a ser tomado para se considerar certo interesse de um ser como idêntico ao de um ser distinto.

            Acredita Degrazia que em determinados casos uma resposta será necessária para que se saiba qual critério é válido afim de identificar se interesses de seres diferentes devem ou não ser igualmente considerados, questionando:

[…] what determines whether two interests, or sets of interests, are identical, or sufficiently similar that equal consideration applies to them?  This issue is important also in considering the interest of not being confined.  Is a normal human's interest in not being confined such that it should be given equal consideration to, say, a goldfish's interest is not being confined?[59]

Haja visto, portanto, a imprecisão em se comparar o sofrimento de membros de espécies distintas, Singer a tal indagação poderia responder:

[…] the calculations required for applying the principle of equal consideration of interests can only be rough approximations, if they can be done at all. Perhaps, though, that is just the nature of our ethical situation, and rights­based views avoid such calculations at the cost of leaving out something relevant to what we ought to do.[60]

Por outro lado existem precursores do movimento de libertação animal que, ao contrário de Peter Singer, advogam a libertação animal sob a ótica de se conceber direitos aos animais. Entre estes defensores encontra-se Tom Regan, que elenca entre os objetivos principais do movimento de libertação animal: a) a abolição total do uso de animais na ciência; b) a absoluta dissolução da agricultura comercial de animais; e c) a eliminação completa da caça comercial e esportiva, assim como uso de armadilhas.[61]

Afim de refutar posições que advogam a favor dos direitos dos animais, mas permitem, desde que em condições “humanitárias”, o contínuo uso de animais como objeto na ciência, matéria-prima da agricultura comercial e objeto de diversão na caça comercial, Regan aponta, posto crer na necessidade de uma mudança drástica no sistema como um todo, onde os animais são vistos como recursos a disposição dos humanos,  que posturas como essas nada mais seriam que garantir o bom uso dos animais pelos humanos. De acordo com o autor, mesmo que o objetivo seja causar menos sofrimento, o que se tem em conta são os interesses dos humanos afetados por tal sofrimento, não dos animais em si.

Em busca, portanto, de uma teoria moral segundo a qual seja possível provar as falhas do atual sistema de tratamento aos animais, assim como elevá-los a sujeitos dignos de direitos, Regan cria, a partir de uma visão influenciada pelo utilitarismo e em contrapartida a outras teorias como o contratarianismo[62], a teoria que denomina the right view, que por sua vez é baseada no que denomina inherent value.

Segundo sua tese todos os seres que sejam um “experiencing subject of a life”, isto é, um ser que experimente a vida, possuem valor inerente, o que significa por sua vez que esse ser é mais que um mero receptáculo de prazer e sofrimento, devendo ser considerado como um indivíduo com fim em si mesmo.

Regan defende que:

The genius and the retarded child, the prince and the pauper, the brain surgeon and the fruit vendor, Mother Teresa and the most unscrupulous used-car salesman — all have inherent value, all possess it equally, and all have an equal right to be treated with respect, to be treated in ways that do not reduce them to the status of things, as if they existed as resources for others. […] For either of us to treat the other in ways that fail to show respect for the other's independent value is to act immorally, to violate the individual's rights. [63]

Afirmando que não apenas os humanos, mas também os animais possuiriam tal valor inerente, enquanto indivíduos que são objetos de uma vida.

Qualquer tentativa, ressalta Regan, de limitar o escopo desta teoria apenas aos humanos, afirmando que os animais não possuam tal valor ou possuam em menor grau, está fadada ao fracasso, haja visto que outras habilidades e características, exceto a de ser um ser com vida, não estão presentes em todos os seres humanos, e mesmo aqueles que não as possuam ou possuam em menor valor devem ter seus direitos respeitados.

De acordo com o autor, todos que carregarem um valor inerente devem ter suas vidas protegidas e o direito a ser tratado com dignidade, justificando moralmente, através disso, os deveres que se teria diante dos animais não humanos ou seres humanos, mesmo que não possuíssem as qualidades são normalmente elencadas como critérios relevantes à decisão de se dispender ou não consideração aos direitos do indivíduo, como razão, linguagem ou cor da pele.

Tom Regan reconhece que no atual estágio de conhecimento não se sabe se existem outros seres, tais como plantas ou pedras, que carreguem semelhante valor inerente, entretanto, afirma:

[…] we do not need to know how many individuals have inherent value before we can know that some do. When it comes to the case for animal rights, then, what we need to know is whether the animals that, in our culture, are routinely eaten, hunted and used in our laboratories, for example, are like us in being subjects of a life. And we do know this.[64]

A partir disso o autor defende a abolição total do uso de animais na ciência, assim como da agricultura animal comercial e toda e qualquer postura que veja-os como meios para que se alcance fins.

            Os objetivos de Regan e Singer, apesar dos distintos pontos de vista, parecem convergir para minimização tanto quanto possível do sofrimento causado aos animais. Inclusive Michael Fox, que se posiciona como crítico destes autores, reconhece o dever moral de se minimizar o sofrimento dos animais, ainda que numa perspectiva de uso destes seres.[65]

Para Singer mesmo que se buscasse infligir menos sofrimento aos animais apenas em situações onde os interesses dos humanos não fossem afetados nem perto do que os interesses dos animais seriam, seria impreterível proceder a mudanças radicais no tratamento que se dispende aos animais, implicando em mudanças drásticas nos hábitos alimentares (como abandonar preferências por tipos de carne pelo simples palato), em métodos agrícolas (que sobrecarregam a produtividade em prol do mero lucro), caça esportiva, utilização de armadilhas, peles, circos, rodeios, jardins zoológicos, enfim tudo aquilo que causaria sofrimento desnecessário aos animais.[66]

Destarte, e no mínimo a pretexto de se concretizar o princípio de minimização do sofrimento[67], caso o leitor não se convença das implicações da igual consideração de interesses que propõe, é que Singer traz em seu livro a análise de diversas atitudes, posturas e métodos especistas, segundo acredita, que causam uma quantidade incalculável de sofrimento aos animais, que em grande parte, precisamente por crer ser um sofrimento desnecessário, poderia ser evitado.

3 – O uso científico de animais não humanos

Entre as principais posturas humanas que geram imenso sofrimento aos animais não humanos encontra-se a investigação científica. Singer dispende um capítulo inteiro de sua obra com intuito de descrever várias técnicas de uso de animais em pesquisas científicas, atividade que lhes causa uma enorme quantidade de dor, agonia, extremo estresse, acometimento de doenças, enfim, uma existência em miséria.

Através de uma análise acerca da aplicabilidade dos impostos pagos pelos contribuintes norte-americanos, os quais são identificados pelo autor como os maiores financiadores das pesquisas científicas que utilizam animais em seu país[68], dado que estas se valem de verbas públicas[69], o autor procura demonstrar que a despeito do discurso de que existe um enorme benefício proveniente de tais pesquisas, a maioria dos estudos utilizando animais não chegam a qualquer conclusão satisfatória e poucos realmente se provam de fato benéficos.

Para tanto Singer traz uma série de exemplos e descrições redigidas pelos próprios investigadores, publicados nos meios midiáticos que compartilham e que comunicam entre si. Segundo o autor esses relatórios tendem a favorecer os investigadores por duas razões: a) normalmente os redigem sem dar atenção ao sofrimento que está sendo infligido, exceto se for necessário para transmitir a ideia do resultado obtido; b) e apenas as experiências que os próprios investigadores e os editores de revistas científicas consideram relevantes chegam ao conhecimento público.

 O objetivo do filosofo é mostrar que através até mesmo de fontes favoráveis aos experimentadores é possível constatar o sofrimento que as investigações científicas provocam aos animais que são utilizados como objetos. De acordo com Singer, os relatórios demonstram como o especismo imbuído na metodologia destes experimentos permite aos pesquisadores realizarem as mais diversas atrocidades.[70]

Entre as amostras trazidas pelo autor estão experimentos que eram realizados mediante choques elétricos aplicados a animais. A primeira edição de “Libertação Animal” já trazia diversos exemplos de pesquisas feitas durante a década de 60 e 70, trazendo relatos de investigações científicas que administravam choques elétricos nas patas de 1.042 ratos, provocando convulsões, choques nos olhos dos animais ou utilizando chips em suas orelhas, registrando diversas mortes e casos de doenças.[71]

Consoante Singer, décadas a frente e a situação se repete:

W. A. Hillex e M. R. Denny da Universidade da Califómia, San Diego, colocaram ratos num labirinto e administravam-lhes choques elétricos se, após uma escolha incorreta, na tentativa seguinte eles não conseguissem escolher a direcção certa em três segundos. Concluíram que os "resultados são claramente semelhantes aos dos estudos anteriores sobre fixação e regressão no rato, nos quais os animais eram geralmente submetidos a choques no tronco do labirinto em forma de T, imediatamente antes do ponto de opção... (Por outras palavras, a administração de choques elétricos aos ratos no ponto do labirinto em que eles tinham de efetuar a escolha, em vez de o fazer imediatamente antes desse ponto - a novidade introduzida por esta experiência específica - não produziu qualquer diferença significativa.) Os experimentadores prosseguiam, então, citando o trabalho realizado em 1933, 1935 e noutros anos até 1985.[72]

De acordo com o autor geralmente as investigações científicas, além de causar profundo sofrimento aos animais, obtêm resultados “triviais, óbvios ou sem significado”.[73]

            Com base em relatos de pesquisadores como Steven Maier, que estudava em conjunto a outros cientistas uma condição de depressão supostamente encontrada nos seres humanos denominada de “impotência adquirida”[74], através da submissão de cães a choques elétricos em procedimentos que levavam os animais a revelarem sintomas como “defecação, micção, emissão de uivos e gritos, tremuras, ataques aos dispositivos, etc.”[75], Singer aponta que inclusive os próprios pesquisadores admitem que décadas gastas com o mesmo objeto científico resultaram apenas em um excessivo gasto da verba concedida pelos contribuintes, assim como fonte de um sofrimento imensurável aos animais utilizados.

Outra área, identifica o autor, da experimentação científica que constitui causa de grande sofrimento é a que envolve o envenenamento de milhares de animais por ano com intuito de se mensurar as toxicidades de certas substâncias.

A partir de testes acerca da toxicologia de produtos comerciais (ou não comerciais), centenas de não humanos são expostos a produtos como corantes alimentares, cosméticos, vários produtos de possível consumo humano, bem como “são obrigados a ingerir ou são colocados nos seus olhos agentes de guerra química, pesticidas e todo o tipo de bens industriais e domésticos”.[76]

            Os testes supracitados, de acordo com Singer, são criticados por diversos especialistas e médicos, identificados como fontes pouco confiáveis no que tange a aplicabilidade de suas conclusões perante seres humanos. Chama ainda a atenção para o fato de que realizar testes em animais pode produzir o inconveniente de não se ter certeza se aqueles produtos que a estes seres são prejudiciais, também serão em relação aos seres humanos, posto as reações adversas que animais e humanos podem assumir em relação a determinados elementos, levando a ciência a ignorar produtos que poderiam ser valiosos aos humanos, porém ofensivos aos animais não humanos.

            Um dos testes trazidos pela obra chama-se “LD50”, também conhecido como “Dose Letal mediana” ou “Dose Letal a 50 por cento”, qual seria um teste capaz de identificar a dose adequada de determinada substância para pôr fim a vida de 50% da população de seres que estejam sendo submetidos aos testes.[77] Segundo Singer, antes de se atingir o objetivo do estudo vários animais apresentam quadros de doenças graves, estresse e angústia evidentes.

            O autor crê que o próprio meio científico justifica e torna natural a crueldade empregada no tratamento aos animais, pois os estudos são sempre transmitidos em terminologias que de certa forma camuflam o sofrimento causado. Assim é que, por exemplo, no campo da psicologia:

[...] são utilizadas técnicas de "extinção" para aquilo que, de fato, é tortura pela sede ou quase morte à fome ou administração de choques elétricos; "reforço parcial" é a expressão utilizada para designar a frustração de um animal através da satisfação apenas ocasional das expectativas que o experimentador despertou no animal, em treino anterior; "estímulo negativo" é a designação usada para a sujeição de um animal a um estímulo que ele evita, se possível. O termo "evitamento" pode ser utilizado porque refere uma atividade observável. As qualificações "doloroso" ou "assustador" aplicadas a um estímulo não são tão bem aceitas porque são antropomórficas e implicam que o animal tem sensações podendo estas ser semelhantes às sensações humanas.[78]

            Interessante notar, conforme ressalta Singer, o dilema que se põe diante do investigador da área psicológica, tal como noutras áreas, que precisa admitir que: ou o animal é como os seres humanos, portanto sofre, o que ao mesmo tempo justifica, mas torna condenável moralmente, a realização de tais experimentos, ou que o animal não é como os seres humanos, portanto sem a capacidade de sentir, o que embasaria moralmente os experimentos, mas os deixaria sem objetivo concreto e justificativa, haja vista a inaplicabilidade aos seres humanos.

            A libertação animal prega que a inflição de sofrimento aos animais durante os procedimentos investigativos é fundamentada pelo discurso dos benefícios que estes experimentos trazem e trouxeram aos seres humanos. Essa é, para Singer, uma postura claramente especista, pois os experimentos são baseados precisamente na senciência dos não humanos e em suas similaridades perante os humanos, mas desconsideram os interesses dos animais utilizados, agredindo o princípio da igual consideração dos interesses.

Tais semelhanças físicas parecem atender apenas os objetivos humanos em, através dos experimentos, reduzir o número de mazelas presentes em sua espécie ou perpetua-la, pois quando se passa a discutir o tratamento moral que se dispende aos animais, raramente são reconhecidas o suficiente para que se leve a sério suas vontades.

Devido aos absurdos que Peter Singer encontra em diversos relatórios de experimentos com animais que, acredita, demonstram a crueldade e descaso com que os pesquisadores os tratam[79], o autor, apesar de admitir certos benefícios advindos da pesquisa com animais, emprega pouca ou quase nenhuma atenção aos avanços científicos obtidos em estudos realizados em animais não humanos, precisamente por crer serem raros os casos em que os benefícios sejam de fato comprovados e aproveitados pelos humanos de modo satisfatório.

Para a professora Aureluce Demonte, todavia, os avanços e a importância da experimentação animal são inegáveis. Segundo Demonte:

Desde os primeiros testemunhos históricos, que remontam a mais de 2 mil anos, com o relato de Hipócrates (450 a.C.) relacionando órgãos humanos doentes com os de animais para fins didáticos, até a atual e vasta utilização, entre outros exemplos, no controle de vacinas, nas pesquisas sobre células tronco no campo da cardiologia, da neurologia e de moléstias pulmonares e renais, além das pesquisas atuais da neurociência que envolvem a comunicação entre o cérebro de primatas e próteses robóticas, a experimentação animal tem contribuído significativamente para a melhoria da qualidade de vida.[80]

Esta vasta utilização se dá devido os animais constituírem perfeitos exemplares que são considerados, nas palavras de Demonte “mapas de territórios não explorados que servem de base para encontrar o caminho de um destino”[81], demonstrando o tratamento de certa forma objetificado que é destinado aos animais não humanos, encarados como objetos de pesquisa.

            Alguns avanços apontados por Demonte demonstram benefícios de se assumir uma postura segundo a qual os animais possam ser encarados, em certos casos, como meios para que os humanos alcancem fins. O exemplo mais característico encontra-se na área de animais transgênicos[82], isto é, animais geneticamente modificados com intuito de auxiliar em descobertas científicas e outros benefícios diretos na agricultura, medicina e indústria.

            O método da transgenia, segundo Demonte, “permite a criação de animais de grande porte com características comercialmente interessantes”[83], evitando as outrora clássicas técnicas de cruzamento e seleção. Tornou ainda possível o xenotransplante, que seria o transplante de órgãos de animais para seres humanos, apontando o seu uso “para a criação de porcos imunocompatíveis com o ser humano”[84], embora ressalte os riscos que esta interação entre humanos e animais provoca no que tange à transmissão de agentes patógenos.

            Da manipulação científica com animais surgiu, de acordo com Demonte, produtos como a insulina, hormônio de crescimento e fatores de coagulação, ferramentas importantíssimas na redução de deficiências encontradas nos humanos. Segundo a pesquisadora a evolução da ciência transformou a relação entre seres humanos e animais, tornando imprescindível a discussão acerca do sofrimento e bem-estar dos animais usados em laboratório, apontando que:

A ciência de animais de laboratório considera o bem­estar animal como um dos principais fatores que podem influenciar o resultado de um experimento e valoriza o uso ético de animais retomando o princípio dos três Rs desenvolvido por Russell e Burch: refinamento, redução e substituição (do inglês replacement), no qual, embora a utilização seja permitida, deve ser reduzida ao mínimo e substituída sempre que possível por outras técnicas.[85]

            Este último “R” que em português equivale a substituição se atrela à parte dos argumentos levantados por ativistas do movimento de libertação animal, pois, tal como Singer[86], creem ser possível  encontrar-se métodos alternativos ao uso de animais em pesquisas científicas, na tentativa de propor uma medida que minimize tanto quanto possível o sofrimento dos animais, e concomitantemente não se desfaça dos progressos provenientes de tais estudos.

            De acordo com Maurício Morales ainda são parcos os casos em que seja possível, através de simulações computacionais, experimentos in vitro ou outros métodos, a completa substituição do uso de animais. Segundo pensa “O conceito de ‘métodos alternativos’ deveria ser compreendido em um contexto mais amplo” [87], abarcando praticamente qualquer tentativa realizada pela comunidade científica com intuito de diminuir o sofrimento dos animais.

            Os estudos de moléculas e células, apesar de substituírem o uso de animais, afirma Morales, não são suficientes para análise de estruturas que sejam tão complexas quanto as de mamíferos, por exemplo. É justamente pela semelhança entre seres humanos e o restante dos mamíferos que estes se tornam modelos ideais para o estudo científico, como demonstra o autor:

Em 2007, o Prêmio Nobel de medicina e fisiologia foi entregue a três cientistas (Mario R. Capecchi, Martin J. Evans e Oliver Smithies) que revolucionaram as pesquisas com doenças genéticas ao contribuírem para o desenvolvimento de animais com modificações em genes específicos que são capazes de apresentar as mesmas doenças genéticas encontradas em seres humanos (animais nocaute). Essa metodologia possibilitou o desenvolvimento de animais que são utilizados para o estudo de diversas patologias, incluindo arteriosclerose, fibrose cística, doenças cardiovasculares e câncer.[88]

O animal objeto dos estudos eram ratos, portanto, mamíferos modificados geneticamente pelo uso de células estaminais embrionárias.[89]

            Existem alguns meios de pesquisa alternativos apenas em relação ao uso de mamíferos, como, por exemplo, os estudos quanto a transmissões químicas em células nervosas, onde foram utilizados sapos.[90] Doenças como a miastenia grave[91], destaca Morales, devem sua compreensão por parte dos humanos a estudos que se desenvolveram a partir da análise de estruturas como “músculos de sapos, sinapses de roedores, toxina de serpente, receptor de peixe elétrico e anticorpos de coelhos”[92].

Da mesma forma é possível citar, como alternativas para redução do sofrimento causado aos animais, os testes de irritabilidade, que antes eram feitos aplicando-se a substância diretamente à córnea de coelhos[93], e agora podem ser feitos através da utilização de “ovos de galinha fertilizados para avaliar a irritabilidade da membrana corion alantóide, que possui uma grande quantidade de vasos sanguíneos”, método conhecido como “Teste da membrana corio alantoide”[94], ou outros métodos, tais como o “Teste de opacidade de córnea bovina: onde são testadas a opacidade e permeablidade de córnea provinda de olhos de bovinos (que seriam descartados), após a exposição à substância a ser testada”[95].

            Cabe notar aqui a importante consideração que Marco Aurelio Guimarães[96] faz quanto a países que possuam baixos padrões socioeconômicos no que tange à saúde, questionando se nesses lugares, onde não há sequer o mínimo padrão de acesso a saúde para seus cidadãos, restrições à pesquisa em animais seriam de fato conveniente.

            Segundo Guimarães tanto aqueles que procuram acabar com a investigação científica em animais quanto os que a defendem possuem um certo grau de razão, esclarecendo que “A ciência progride sim com o uso de animais. Mas o direito ao uso não pode ser confundido com o direito ao abuso”[97]. Para o autor o simples veto de pesquisas em animais não pode ser a solução do problema, haja visto que a imensa maioria não estaria disposta a abrir mão dos benefícios até então adquiridos graças ao uso de animais na ciência. Da mesma forma, Afirma Guimarães, caso tais pesquisas passassem a usar primariamente humanos, países como o Brasil poderiam se encontrar em situações de extrema delicadeza, pois:

[...] países onde o padrão sócio-econômico é baixo e o acesso à saúde é limitado, a restrição à pesquisa em animais pode ter efeitos sérios. Um aumento não corretamente estruturado da pesquisa em seres humanos pode levar populações economicamente vulneráveis a participarem de pesquisas para garantir alguma forma de tratamento de saúde, reduzindo sua autonomia, seu direito de escolha, violando seus direitos humanos.[98]

            Peter Singer é cônscio dos avanços obtidos por tais experiências, assim como dos inconvenientes de simplesmente proibir o uso de animais para fins científicos, contudo afirma que esses esporádicos avanços, assim como os inconvenientes de uma proibição absoluta, não são suficientes para justificar a desconsideração que se tem perante o sofrimento que está sendo causado aos animais em experiências que não são de fato necessárias aos seres humanos.

            Diariamente, crê o autor, a inúmeros animais são infligidas imensuráveis quantidades de sofrimento a pretexto de se testar produtos com fins meramente comerciais, como novos cosméticos, xampus, corantes alimentares, e outros produtos supérfluos[99], e é desta maneira que explica sua oposição ao uso dos animais em pesquisas, afirmando:

[...] que as experiências que não servem um objetivo direto e urgente deverão ser suspensas imediatamente e, nas restantes áreas de investigação, se deverá, sempre que possível, procurar substituir as experiências que exijam a presença de animais por métodos altemativos que não o façam.[100]

            Para o movimento de libertação animal o especismo, assim como outrora o racismo, justifica a tolerância que se tem em relação a experimentos científicos apenas quando o ser objeto daquela pesquisa é um sujeito exterior ao grupo daqueles que realizam ou fazem uso de tais experimentos[101]. Segundo Singer, assim como o racismo permitiu experiências dolorosas a membros de outras raças, embasados no suposto conhecimento que tal postura atribuía aos membros de seu grupo, o especismo permite, e até mesmo encoraja, que membros de outra espécie tenham seus interesses sacrificados a favor dos supostos benefícios que aos seres humanos acarretaria.

            É desse modo, aponta Singer, que o experimentador afirma a importância de sua pesquisa, apontando as vantagens que trará a milhares de pessoas, procurando justificar, destarte, o sofrimento que causa, entretanto, não admite que em vez de animais se utilize seres humanos com nível mental semelhante ou inferior, por exemplo, pois membros do seu grupo não podem servir de meio através do qual se salve os sempre hipotéticos milhares de indivíduos que dependem de tal experimento, ainda que se comprovem objetos de pesquisa mais adequados. Enquanto aos animais se permite, desde que em nome do conhecimento, indiscriminadamente a inflicção de sofrimento.

            Como exemplo do supracitado tem-se os milhões de dólares gastos pelo governo norte-americano na investigação do cancro do pulmão, qual tem grande parte destinada a pesquisas com uso de animais, entretanto até então sem qualquer resultado que trouxesse alguma diminuição considerável nos casos de cancro do pulmão ou suas consequenciais fatais.

A conscientização em acabar com o hábito de fumar tem-se provado, na verdade, mais eficaz na luta contra o câncer de pulmão, posto que “o fumo provoca entre 80 e 85 por cento do número total de cancros do pulmão”[102] nos Estados Unidos. Diante de tal dado, Singer indaga:

Poderemos obrigar milhares de animais a inalar fumo de cigarros para lhes provocar cancro do pulmão, quando sabemos que poderíamos praticamente erradicar a doença se eliminássemos o uso do tabaco? Se as pessoas decidem continuar a fumar, sabendo que, ao fazê-lo, se arriscam a contrair cancro do pulmão, será justo fazer os animais pagar o preço desta decisão?[103]

Dessa maneira, aponta o autor, a conduta especista desloca o peso de suas decisões para membros de outras espécies, usando-os como artifícios na busca de seus objetivos, sendo a experiência com animais reflexo desta postura, justificada pelos ocasionais benefícios que traz, mas inquestionada pelo interminável sofrimento que religiosamente produz.

            É por tais motivos que o surgimento de comitês de ética, assim como avanços nas legislações de alguns países[104], embora positivos, não são verdadeiramente encarados como avanços para a libertação animal, pois seus defensores veem nessas mudanças meras institucionalizações daquilo que já é lugar-comum e tolerado entre os cientistas, isto é, a crueldade com os animais não humanos.

            Segundo Singer, a experimentação com animais deve sofrer uma série de reformas até que se possa falar na sua abolição. Para o autor os legisladores possuem um papel de enorme influência em relação às restrições impostas a esse tipo de experimentação. Contudo é preciso que as regulamentações reflexionem todos os interesses envolvidos, não apenas os grupos, sejam eles científicos, médicos, veterinários ou meramente políticos, que exerçam, através de organizações, relevante pressão política. Ressaltando que:         

Os legisladores devem aprender que, quando analisam a questão da experimentação com animais, têm de ouvir estas organizações e também as associações médicas, veterinárias, psicológicas e biológicas, como ouviriam General Motors e a Ford se analisassem o problema da poluição aérea.[105]

            É através do que chama de “objetivos parciais” que, conforme Singer, os militantes da libertação animal poderão agir, enquanto pequenos grupos, a favor do fim do uso dos animais em investigações científicas. Assim o farão através de divulgação em suas comunidades do que acontece nas universidades e em laboratórios comerciais de sua região. Da mesma forma os consumidores poderão recusar-se a usar produtos que sejam testados em animais, tal como os estudantes poderão declinar-se a realizar estudos que não considerem éticos.

            Enfim crê o autor que a exploração de animais em laboratórios é somente uma parte do sofrimento extraordinário que o especismo causa aos animais, e provavelmente apenas a revogação dessa postura perante os não humanos poderia pôr fim a práticas análogas às aludidas nos parágrafos anteriores.

4 – Produção animal em série

Singer passa, a partir da terceira parte de sua obra, a análise de uma forma de exploração animal que produz parte considerável, senão a maior, do sofrimento causado aos animais. Essa exploração é denominada pelo autor como produção animal em série, ou factory farming, que está por sua vez atrelada aos hábitos alimentares da maior parte das pessoas: o consumo de animais.

Consoante o autor a maior parte das pessoas, especialmente habitantes dos grandes centros urbanos, tem como maior ponto de contato com os animais a hora da refeição, momento em que os consomem. Esse contato vem, na regra das vezes, maquiado com eufemismos verbais como o uso de palavras adequadas, bifes em vez de bois, assim como em embalagens devidamente higienizadas que carregam os resultados de um processo de produção geralmente desconhecido pelos consumidores.

Justamente por desconhecerem os métodos atuais de produtividade envolvidos no manejo daquilo que diariamente consomem, os indivíduos, mergulhados no especismo, tendem a idealizar os locais de produção animal como outrora eram retratados: fazendas, afastadas dos núcleos urbanos, comandadas por pessoas simples, pacatas, sem aspectos industriais, distante da perspectiva lucrativa presente nos centros urbanos e com amplo espaço para os animais viverem.

É o que apontam Carla Molento e Guilherme Bond em relação à percepção da sociedade brasileira, em estados como Curitiba e Paraná, perante o bem-estar dos animais envolvidos na indústria pecuária. Segundo os autores, os entrevistados demonstraram uma noção incoerente com os diagnósticos técnicos, pois “consideram que os ciclos produtivos de bovinos de leite e galinhas poedeiras caracterizam-se por sofrimento animal ausente ou pequeno”[106], enquanto considerados os mais críticos no que tange ao bem-estar dos animais explorados.

Singer aponta que a idealização cultivada pela maioria das pessoas está bem distante do que de fato vem ocorrendo nos últimos cinquenta anos. Conforme o escritor a agricultura animal sofreu alterações que a aproximou muito mais das grandes produções industriais em série, comandadas por grandes conglomerados de empresas.

Para as empresas integrantes da indústria pecuária, assim como seus possíveis concorrentes, pouco importa qualquer grau de harmonia que naturalmente deva existir entre plantas, animais e o ambiente como um todo. O seu objetivo é aumentar a produtividade, é vencer a concorrência através dos métodos que melhor se adaptem às vicissitudes do mercado. A regra, segundo Singer, é produzir o máximo, gastando o mínimo, e quem normalmente acaba arcando com os ônus dessa produtividade são os animais.

A partir da descrição dos principais métodos utilizados na modernização da agricultura animal, Peter Singer procura expor a situação degradante que os animais constituintes dos principais pratos alimentares consumidos pelos humanos vivenciam em prol do aumento desenfreado da produtividade.

Um dos animais, consoante relatórios produzidos pelo PETA, que mais sofrem abusos no mundo são os frangos, onde só nos Estados Unidos aproximadamente 9 bilhões são abatidos anualmente com a finalidade de extrair sua carne, somado à 305 milhões de galinhas utilizadas na obtenção de ovos, mantidos, em grande maioria, desde o momento de nascimento ao abate em completo confinamento.[107]

Segundo Singer a galinha foi o primeiro animal a ser transferido para as fazendas tradicionais, as quais ainda emulavam certas condições naturais com intuito de explorar os recursos provenientes desses animais. As técnicas atuais revolucionaram, contudo, as fazendas tradicionais, conforme apontado anteriormente, e esses animais passaram a ser “criados em instalações semelhantes a fábricas, altamente automatizadas”[108].

Assim é que as aves de granja passaram a ser confinada em espaços fechados, gaiolas minúsculas situadas em edifícios desenhados para que todos os aspectos do ambiente sejam controlados, com intuito de forçar cada vez mais o crescimento dos animais, usando-se menos tempo e menos alimentos tanto quanto possível. Nestes locais, conforme o filósofo, aspectos como a luminosidade do ambiente, quantidade de água e comida, espaço de locomoção, assim como a interação entre os animais são minuciosamente manipulados com fito de incremento na produtividade.

Devido a super lotação, as condições extremamente artificiais em que são inseridas e a impossibilidade de dispenderem qualquer energia em atividades naturais de sua espécie, as galinhas chegam a quadros de extremo estresse, culminando em lutas entre si, situações em que acabam mutilando umas às outras. De acordo com Peter Singer:

Extracção de penas e canibalismo, na linguagem do produtor de frangos constituem "vícios". No entanto, não se trata de vícios naturais: são resultado da tensão e da exiguidade de espaço a que os produtores modernos submetem as suas aves.[109]

Nos espaços de confinamento em que são forçadas a viver nada, ou muito pouco, do que naturalmente ocorre entre a espécie é reproduzido. Por esse motivo fatores naturais como a formação de uma hierarquia entre as aves não ocorre, o que é ponto chave na eclosão ininterrupta de lutas entre as aves, amontoadas em edifícios exíguos.

Os “vícios” identificados pelos produtores são encarados como algo negativo, pois, segundo sua ótica, custam caro à produção, ao passo que levam a morte ou inutilização de vários animais. Estão cientes, conforme aponta Singer, que esses problemas decorrem da ocupação excessiva do espaço em que são alocadas as galinhas, mas a dinâmica do mercado não os permite aumentar os custos da produção a fim de melhorar a qualidade de vida dos animais que criam, “uma vez que, atendendo ao estado de concorrência existente nesta indústria, a eliminação desta ocupação excessiva poderia significar a eliminação simultânea da margem de lucro”[110].

            Diante do quadro relatado acima é que os produtores, cônscios de que os “vícios” presentes nos animais provêm das condições extremas e artificiais em que se encontram, desenvolvem métodos ainda mais artificiais no controle destes problemas. Dessa maneira florescem técnicas como a “debicagem”, que tem na criação de aves de granja, segundo Levino J. Bassi e Jacir J. Albino, por “objetivo melhorar seu desempenho produtivo, reduzir o canibalismo, diminuir a bicagem de ovos e melhorar a conversão alimentar”.[111] O procedimento é descrito por Peter Singer:

Introduzida pela primeira vez em San Diego, nos anos 40, o corte do bico costumava ser feito com recurso a um maçarico. O agricultor queimava a parte superior dos bicos das galinhas, de forma que estas deixavam de conseguir bicar-se mutuamente. Esta técnica rude foi rapidamente substituída pela aplicação de um ferro de soldar adaptado à função, e, hoje em dia, preferem-se os instrumentos especialmente concebidos para o efeito, com forma de guilhotina, equipados com lâminas quentes. Introduz-se o bico do pinto no instrumento e a lâmina quente corta-lhe a extremidade. A operação efetua-se com muita rapidez - faz-se em cerca de quinze aves por minuto. Esta velocidade significa que a temperatura e a capacidade de corte da lâmina podem variar, resultando em cortes descuidados e ferimentos graves.[112]

            Entre as recomendações trazidas por Bassi e Albino, existe grande preocupação com o tempo que se despende para cada uma das aves que passa pelo procedimento supracitado. Segundo os técnicos é sempre necessário o uso de equipes profissionais, o controle a temperatura da lâmina em torno de 700ºC, assim como o procedimento deve ser realizada lentamente, permitindo que haja a cauterização do bico, destacando que existem recomendações tanto pré quanto pós-debicagem, momento em que, por exemplo, deve ser fornecido vitaminas específicas na ração das aves.[113]

Peter Singer relata vários casos de erros que resultam em mutilações graves, haja visto que a pressa é uma das características essenciais da indústria animal, defendendo o ponto de vista segundo o qual, mesmo nos casos em que se procede corretamente, é inegável que os animais sintam dor intensa.[114] A debicagem, consoante o autor, definitivamente diminuiu os danos que as aves podiam causar entre si, mas não contribuiu de maneira alguma para situação de tensão e sobre ocupação a que são submetidos esses animais.

Aos frangos de granja, por exemplo, não é permitido contato com a luz do sol até o dia em que são retiradas dos aviários para o abate, tal como não inalam outra fonte de ar senão carregada de forte odor amoníaco proveniente dos seus excrementos. A própria ventilação, aponta o escritor, é mantida de forma precária e qualquer eventual falha mecânica significa o sufocamento de dezenas de animais, da mesma forma que qualquer alteração no ambiente deixa as aves extremamente agitadas, criando situações em que amontoam-se umas sobre as outras a ponto de sufocarem-se.

Em conformidade com o relatório produzido pela organização The Humane Socienty of the United States, a principal agressão ao bem-estar das aves usadas na indústria pecuária[115] é o crescimento rápido, isto é, técnicas de nutrição que selecionam as aves comercialmente mais interessantes, procurando os animais que ganham mais peso em menos tempo, ainda que as custas de sacrificar qualquer qualidade de vida que possuam.

Os estudos feitos pela organização relatam situações de grave sofrimento entre as aves que são alvos do mercado agropecuário norte-americano, descrevendo situações em que são obrigadas a ganhar peso de tal forma que chegam a perder o próprio equilíbrio e a habilidade de caminhar[116]. Apontam ainda que normalmente:

Market weight is reached after 6-7 weeks for broiler chickens, approximately 99 days for turkey hens, and 136 days for tom turkeys. The birds are hastily caught and can suffer dislocated and broken hips, legs, and wings, as well as internal hemorrhages during the process. The birds are put into crates stacked one atop another on trucks. During their journey to slaughter, they are not given any food or water and are afforded little if any protection from extreme temperatures.[117]

            Embora considerados animais altamente sociais e inteligentes[118], a situação dos porcos é da mesma forma degradante. Segundo o relatório trazido pela HSUS mais de 116 milhões de porcos são abatidos anualmente nos Estados Unidos. Submetidos a condições análogas às aves de granja, desenvolvem, conforme aponta Singer, a mesma propensão a vícios, que no caso dos suínos os levam a morderem mutuamente suas caudas, originando mais uma vez lutas entre os animais, extremo estresse, acometimento de doenças e morte.

            Nesta seara, assim como ocorre no procedimento de debicagem, os criadores optam pelo corte da cauda dos porcos. Este procedimento é descrito e proposto pelo próprio Ministério da Agricultura norte-americano que, segundo Singer, foca-se apenas nos aspectos técnicos necessários para que não haja qualquer perda de produtividade, indicando os locais certos de se efetuar o corte e métodos de estancamento do sangue, sem nenhuma sugestão quanto aplicação de anestesia ou analgésicos aos animais ou qualquer menção em relação a necessidade do corte das caudas advir justamente das condições de sobrelotações a que os suínos são submetidos diariamente.

As soluções encontradas pelos grandes criadores, acredita Singer, não consideram em momento algum os interesses dos animais, seja em evitar o sofrimento que tais mutilações provocam, seja em lhes proporcionar quaisquer condições naturais que necessitem para ter seu bem-estar mantido. A indústria pecuária está sempre voltada a encontrar a forma monetariamente mais conveniente de expandir o processo de exploração dos animais.

O resultado desta postura é o aparecimento de doenças características dos animais explorados na indústria pecuária, sujeitos a situações de extrema tensão. Entre tais doenças, Singer aponta a Síndrome do Estresse Suíno que, de acordo com o estudo realizado em conjunto por Dellalibera, Climeni, Monteiro e Lot, seria:

[...]uma miopatia não infecciosa dos suínos, relacionados com a intensificação do processo de melhoramento genético. Esses animais em situações de estresse ou ainda em decorrência da administração de anestésicos voláteis podem apresentar algumas manifestações clínicas, como tremores musculares, podendo seguir de taquipnéia, taquicardia e aumento da temperatura corporal.[119]

Situações como o confinamento exíguo das granjas, vacinações, lutas entre os animais, transportações para outros locais ou para o abate podem desencadear, conforme os pesquisadores, a síndrome supramencionada.

Ao lado das aves e suínos, os bovinos, domesticados há cerca de 6.000 anos[120], são fontes de vários recursos utilizados pelos seres humanos, em especial sua carne, componente necessário dos hábitos alimentares de muitas pessoas. Devido à popularidade do consumo de seus derivados esses animais acabam sofrendo de inúmeras formas.

Os números são expressivos, aponta The Humane Society of United States que “Every year in the United States, approximately 35 million cattle are raised for beef, 9 million cows for milk, and 450,000 calves for veal”[121]. Da mesma maneira que anteriormente aludido, os bovídeos são submetidos ao confinamento, chegando a situações extremas onde não podem sequer virar-se, assim como são obrigados a habitar ambientes superlotados, vivendo uma existência em miséria até finalmente serem transportados, em parcas condições, aos abatedouros.

Singer destaca que por meras preferências de paladar, os seres humanos impõem aos animais condições de vida extremamente degradantes. É o caso da carne de vitela, produto obtido a partir da exploração de bezerros, criados de forma a se tornarem anêmicos, reclusos durante toda sua existência e forçados a se alimentar mediante uma dieta específica, sem alguns nutrientes, como o ferro, essenciais à sua mínima subsistência, e isto com o único objetivo de que suas carnes tenham um aspecto pálido e macio.

Aos vitelos são negados quaisquer tipos de comportamentos naturais essenciais à sua espécie. Os produtores certificam-se continuamente que os bezerros não estão exercendo qualquer atividade física, assim como não podem ter contato com qualquer fonte de ferro ou nutrientes estranhos à sua dieta, tudo em prol da qualidade da carne almejada. São deixados quase sempre às escuras para que se diminua tanto quanto possível a agitação presente entre esses animais devido às condições em que vivem. Segundo o autor:

É comum um produtor descobrir que um em dez, num carregamento de bezerros, não sobrevive às quinze semanas de reclusão. Esta percentagem de mortalidade - entre lo e 15 - em tão curto espaço de tempo seria desastrosa para quem criasse bezerros destinados ao consumo geral. No entanto, os produtores de vitela de leite podem suportar estas perdas porque os restaurantes luxuosos estão prontos a pagar bem pelos seus produtos.[122]

 Procura o escritor, a partir do exemplo acima, demonstrar como o especismo permite que se cause grandes quantidades de sofrimento aos animais pelos motivos mais supérfluos possíveis, como, por exemplo, a maciez do alimento ou a cor que aparenta, expondo o atual tratamento moral direcionado aos animais, onde se admitem condutas que seriam inaceitáveis perante seres homo sapiens de níveis mentais semelhantes.

Se fosse possível a criação de animais em ambientes voltados a reproduzir o mínimo necessário de condições naturais para que vivessem adequadamente, da mesma forma fosse garantido que seus abates seriam mediante métodos indolores, Peter Singer admite que dessa maneira seria moralmente defensável, segundo sua teoria, o consumo de carne, haja visto que nessas condições os animais não experimentariam tanto sofrimento. Contudo o autor está convencido que criar animais nas referidas condições é atualmente inviável diante das dinâmicas lucrativas do mercado que explora os recursos animais em níveis astronômicos.

O mesmo parece pensar Hope Bohanec que identifica a produção animal descrita acima como “happy meat”, isto é, uma espécie de produção animal alternativa, comercialmente difundida através do discurso de que fornecem maior cuidado aos animais, tomando medidas como a proibição do uso de gaiolas ou a certificação de espaços amplos o suficiente para que os animais possam livremente circular.

De acordo com a escritora o surgimento de métodos alternativos pode ser encarado como um bom sinal, demonstrando que no mínimo as pessoas estão mais preocupadas com as origens dos produtos animais que consomem. Entretanto rótulos como “humane, free‐range, grass‐fed, sustainable, etc.”[123] não garantem de maneira alguma que os animais explorados não passaram por grande parte das mesmas atrocidades cometidas nos meios convencionais. Bohanec aponta:

Animals raised for meat with a feel‐good label have a similar story, frequently subjected to overcrowding and painful bodily mutilations: debeaking, tail cutting, ear notching, tooth filing or clipping, castration, and de‐horning, all without pain medications. And they are all sent to a sickening slaughter in the very beginning of their lives.[124]

            A ativista defende a ideia de que pouco importa o rótulo e a escala de produção, quando se cria comercialmente animais para se explorar sua carne, leite ou ovos, invariavelmente será indústria animal e invariavelmente haverá sofrimento “If an animal is hatched into this world in a sterile metal drawer without the comfort of her mother and a soft nest – that is factory farming”[125].

Singer afirma que mesmo nos países como a Suíça, onde as regulamentações e fiscalizações garantem matadouros mais higiênicos e procura-se melhores condições aos animais, com a criação de normas avançadíssimas em relação a países mais críticos como os Estados Unidos[126], a proteção que se dá aos animais é na perspectiva da sua exploração, portanto, insuficientes a ponto de se falar numa consideração séria de seus interesses.

O autor explica que matar animais é em si um ato errado, perturbante, e a maior parte das pessoas não consumiria os resultados desse processo se tivessem que, com as próprias mãos, mata-los ou submetê-los a tais condições, o que mostra, aponta Singer, que entendem o sofrimento que os atos justificados apenas pela conduta especista, como criações para abate, utilização em pesquisas científicas, inserção de doenças presentes incialmente apenas em humanos em nome do conhecimento, entre outros, causam aos animais utilizados.

5 – Principais medidas a se tomar pela causa dos animais

A partir dos dados, exemplos e relatos que expõe acerca de posturas humanas perante os interesses dos animais, Peter Singer afirma que é fato inegável que o tratamento dispendido aos animais passe por uma mudança drástica e urgente, para de alguma forma se pôr fim, pelo menos na sua maior parte, às práticas tais quais as citadas previamente e por conseguinte ao sofrimento desnecessário de milhares de seres.

Entre as medidas propostas pelo autor estão:

[...] escrever aos nossos representantes políticos acerca das questões abordadas neste livro; devemos alertar os nossos amigos para estes problemas; devemos educar os nossos filhos de modo a mostrarem preocupação pelo bem-estar de todos os seres sencientes; e devemos manifestarmo-nos publicamente em nome dos animais não humanos sempre que tivermos uma boa oportunidade para o fazer.[127]

Contudo a principal medida proposta pela obra é o abandono do hábito de comer os animais, considerado o primeiro passo para diminuição dos casos de crueldades cometidas.  Singer crê ser esse o único caminho coerente para se opor à inflicção de sofrimento aos animais.

            Segundo o autor a oposição ao sofrimento dos animais poderia conviver com o hábito de comê-los, desde que fosse garantido que “tenham vivido isentos de todo o sofrimento e sido mortos de forma indolor e instantânea”[128]. Entretanto, na prática e psicologicamente, não seria coerente opor-se ao sofrimento de seres, enquanto se admite, por exemplo, que sejam mortos com único fito de satisfazerem certas preferências de paladar.

Ademais essa conjectura de se criar animais em larga escala, mas sem lhes infligir sofrimento, isto é, sem uso dos métodos tradicionais como “[...]castração, separação de mãe e cria, ruptura de grupos sociais, marcação a ferro, transporte para o matadouro e, finalmente, o próprio abate”[129], afirma Singer, está bem distante da realidade, onde talvez pudesse ser feito em pequena escala, mas provavelmente a preços caríssimos, tornando-se bens inacessíveis às populações mais carentes.

Tornar-se vegetariano é, portanto, a providência mais prática e eficaz proposta pelo autor para que se evite simultaneamente a morte e sofrimentos de dezenas de animais não humanos. Encarado como uma espécie de boicote às principais condutas especistas aqui descritas, o vegetarianismo é, segundo Singer, a arma disponível a todos que queiram, pessoalmente, defender uma consideração séria quanto aos interesses dos animais.

            Conforme o autor especialistas em nutrição já possuem como certo a prescindibilidade de carne na dieta alimentar dos seres humanos. Relata várias fontes proteicas, assim como de todos os nutrientes necessários a uma dieta regular presentes na carne, advindas somente de vegetais, como tofu, frutos secos, cogumelos, derivados da soja, glúten de trigo, entre outros, que tornam desnecessário o consumo de carne.

            É o que reafirma o especialista em nutrologia Eric Slywitch, que identificou com baixíssima frequência casos de pacientes vegetarianos com insuficiências proteicas. Segundo afirma “Não há necessidade de ingerir proteínas de origem animal em qualquer fase da vida humana. Não existe nem um único aminoácido essencial que esteja ausente nas proteínas vegetais.”[130], argumentando que todos os estudos recentes apontam pro baixo risco de deficiência proteica entre os veganos.

            Singer acredita que o vegetarianismo é uma medida de combate ao sofrimento dos animais eficaz também numa perspectiva econômica, afirmando que “Quanto menor for a procura, menores serão o preço e o lucro. Quanto menor for o lucro, menos animais serão criados e abatidos”[131]. Segundo suas teses o abandono do consumo de carne traz, além de menos sofrimento, diversos benefícios à saúde dos seres humanos, como redução em taxas de colesterol e doenças relacionadas a hábitos carnívoros, maior produção alimentar e menos gastos de energia, assim como a eliminação de outros males produzidos pela indústria animal, em consonância com o que foi apontado recentemente no relatório produzido pela UNEP[132]:

Agricultural materials, especially animal products, are also a very important material flow in terms of their contribution to a large number of impact categories. Animal products are important because more than half of the world’s crops are used to feed animals, not people. Land and water use, pollution with nitrogen and phosphorus, and GHG emissions from land use and fossil fuel use cause substantial environmental impacts.[133]

            Através, Peter Singer afirma, de uma dieta vegetariana aqueles a favor da libertação animal terão em suas mãos formas de agir imediatamente em prol dos animais, assim como provar a coerência entre suas ideias e atitudes. Análogos aos melhores reformadores, tal como os primeiros a se opor ao tráfico de escravos, os vegetarianos poderão ser encarados como sujeitos excêntricos ou despossuídos de razão, mas isso não deve impedi-los de lutar pelo abandono de uma conduta que produz tanto sofrimento quanto o especismo.

6 – Conclusão

 

 

Pelo que até então se expôs é possível verificar como a conduta especista torna comum e moralmente inquestionadas as posturas humanas que provocam sofrimento aos animais na procura de atingir determinados objetivos, especialmente se existem fins comerciais envolvidos e os animais explorados não fazem parte do convívio familiar-social dos seres humanos.

O movimento de libertação animal nasceu, como anteriormente apontado, na tentativa de que tal preconceito em relação aos interesses dos animais tivesse fim. Peter Singer o fez propondo uma extensão do princípio da igualdade, ressaltando a capacidade de sofrer como a base deste princípio, por conseguinte abarcando todos aqueles que possuam senciência, como, por exemplo, os animais não humanos, que passariam a ter seus interesses em continuar vivendo, em evitar sofrimento e buscar prazer, igualmente considerados em relação aos que possuem os seres humanos.

Criticado por não ter sido capaz de satisfatoriamente definir os parâmetros necessários para que se quantifique e justifique se determinadas posturas são realmente defensáveis ou condenáveis conforme sua tese de igual consideração de interesses, posta a impreterível e árdua comparação de sofrimentos e prazeres entre espécies, pode-se dizer que o autor no mínimo cimentou a necessidade de se discutir o tratamento conferido aos animais, assim como o fim das práticas que expõe em sua obra e o sofrimento que produzem.

Desde o alvorecer do movimento de libertação animal alguns avanços já foram obtidos na busca de atingir seus propósitos. Conforme Singer, a datar de quando publicou a primeira edição de sua obra o número de afiliados e apoiantes do movimento cresceu significativamente, aponta:

The most obvious difference between the current debate over the moral status of animals and that of thirty years ago is that in the early 1970s, to an extent barely credible today, scarcely anyone thought that the treatment of individual animals raised an ethical issue worth taking seriously.[134]

De um maior número de pessoas levando de fato a sério as questões éticas envolvidas no tratamento que se dispende aos animais não humanos, diversos benefícios foram alcançados.

            Segundo o autor até 1970 existiam apenas 94 trabalhos científicos que tratavam da situação dos animais, enquanto entre 1970 e 1988 esse número subiu para 240. Um dos grupos defensores dos direitos dos animais chamado People for the Ethical Treatment of Animals já conta atualmente com mais de 750 mil membros.[135] Houve a proibição de compartimentos para vitelas na Grã-Bretanha, assim como a eliminação gradual do uso de gaiolas de aviários na Suíça e nos Países baixos, entre outros avanços como a proibição da criação de gado bovino que não dê condições que pastem em ar livre pelo menos durante seis meses.[136]

            Eclodiram diversas campanhas mundiais contra o comércio de itens como peles de animais, por exemplo, “Na Grã-Bretanha, a House of Fraser, uma importante cadeia de armazéns, foi alvo de protestos contra o comércio de peles”, anunciando posteriormente, devido a pressão, o encerramento da maioria de seus estabelecimentos que comercializavam peles.[137] Nos Estados Unidos embora a situação dos animais de criação ainda seja crítica, alguns avanços como a mobilização em prol do fim da realização de algumas experiências consideradas supérfluas já podem ser apontados.[138]

Em artigo publicado na revista Newsweek acerca da popularidade do movimento em prol da defesa dos animais Singer apontou que no ano de 2008, nos Estados Unidos:

Californians voted 63 percent to 37 percent for a measure that, beginning in 2015, gives all farm animals the right to stand up, lie down, turn around and fully extend their limbs. The state's 45 major egg producers will have to rip out the cages that now hold 19 million hens, and either put in new and larger cages with fewer birds or, more likely, keep the birds on the floor in large sheds. California's sole large-scale pig-factory farm will also have to give all its pigs room to turn around.[139]

Pelo que destaca o autor o movimento já supera a fase de ridicularização, também enfretada pelos que lutaram contra o racismo e sexismo, conseguindo milhões de adesões ao redor do mundo a ponto de persuadir “the European Union to require that all hens have room to stretch their wings, perch and lay their eggs in a nest box, and to phase out keeping pigs and veal calves in individual crates too narrow for them to walk or turn around”[140], comprovando que mais e mais pessoas identificam a noção de direitos dos animais como uma questão ética séria a se considerar.

            Como crê ser impossível uma defesa do especismo que esteja de acordo com os princípios morais que são normalmente aceitos entre os seres humanos[141], Peter Singer destaca a irremediável erradicação gradual dessas posturas, quais, apesar de grandes fontes de sofrimento aos animais, são atualmente toleradas. Somente assim, com o total abandono do especismo, superar-se-á a visão banal dos animais como simples meios destinados aos fins almejados pelos seres humanos que os exploram, desabrochando, destarte, uma realidade onde possa-se seriamente considerar seus interesses, levando-os a finalmente atingir o status de iguais.

7 – Referências bibliográficas

 

 

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[1] Acadêmico concludente do curso de Bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Piauí.

[2] SINGER, Peter. Animal Liberation. Disponível em: <http://issuu.com/fabiochaves0/docs/liberta__o_animal_-_peter_singer>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 12.

[3] SINGER, Peter. Animal Liberation at 30. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/2003/05/15/animal-liberation-at-30/>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[4] COLAVITTI, Fernanda. Igualdade entre espécies. Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Galileu/0,6993,ECT720950­1724,00.html>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[5] DEGRAZIA, David. Review of Singer: Animal Liberation (second edition). <http://digitalcommons.calpoly.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1798&context=bts>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 44.

[6] DEGRAZIA, op. cit., p. 44.

[7] SINGER, op. cit., p. 4.

[8] SINGER, Peter. The Animal Liberation Movement. Disponível em: <https://nwveg.org/files/Singer_The_Animal_Liberation_Movement.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 6.

[9] SINGER, Peter. Animal Liberation. Disponível em: <http://issuu.com/fabiochaves0/docs/liberta__o_animal_-_peter_singer>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 18.

[10] SINGER, op. cit., loc. cit.

[11] BENTHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Morals and Legislation. Disponível: <http://www.utilitarianism.com/jeremy-bentham/index.html#four>. Acesso em: 05 de fev. 2016;

[12] SINGER, op. cit., p. 18. BENTHAM, op. cit., Chapter IV: Value of a Lot of Pleasure or Pain, How to be Measured.

[13] Capacidade de ter sentimentos associados à consciência.

[14] SINGER, Peter. Animal Liberation. Disponível em: <http://issuu.com/fabiochaves0/docs/liberta__o_animal_-_peter_singer>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 20

[15] SINGER, op. cit., pp. 16-17.

[16] Id. The Animal Liberation Movement. p. 4.

[17] Se o ser possui senciência, então possui interesses, o que implica no dever de igual consideração a seus interesses, independente do ser que as possui.

[18] SINGER, op. cit., loc. cit.

[19] SINGER, op. cit., p. 18.

[20] SINGER, op. cit., pp. 20-21.

[21] BENTHAM, Jeremy. A Utilitarian View. Disponível: <http://www.animal-rights-library.com/texts-c/bentham01.pdf>. Acesso em: 05 de fev. 2016. Excerpted from The Principles of Morals and Legislation, 1789, Chapter XVII, Section 1.

[22] SINGER, op. cit., p. 22.

[23] SINGER, op. cit., p. 22.

[24]  Professora Dra. pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

[25] MOLENTO, Maiolino Forte Carla. Senciência Animal. Disponível em: < http://www.labea.ufpr.br/PUBLICACOES/Arquivos/Pginas%20Iniciais%202%20Senciencia.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[26] MOLENTO, op. cit.

[27] MOLENTO, op. cit.

[28] Segundo Molento: “Em primeiro lugar, o tronco cerebral parece necessário à senciência. Todas as espécies de vertebrados apresentam tronco cerebral.  O tronco cerebral, no ser humano, não é suficiente para a existência de sentimentos; as teorias atuais tendem a considerar que a consciência de sentimentos depende de circuitos neuronais recorrentes entre estruturas do tronco cerebral e do córtex somatossensorial e entre o córtex e o tálamo.  Foi proposto que o ponto evolutivo no qual aparece a conexão tálamo-cortical necessária à senciência situa-se na emergência das aves e dos mamíferos a partir dos répteis.  Um olhar mais detalhado mostra que o último ancestral comum de aves e mamíferos existiu no início da evolução dos répteis, cerca de 310 milhões de anos atrás; isso nos faz pensar que, a menos que a senciência tenha emergido de forma independente duas vezes, uma nos mamíferos e outra nas aves, esta característica é também compartilhada pelos mais precoces répteis.”

[29] BOYLE, Eleanor. Neuroscience and Animal Sentience. Disponível em: < https://www.ciwf.org.uk/includes/documents/cm_docs/2009/b/boyle_2009_neuroscience_and_animal_sentience.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 6

[30] MOLENTO, op. cit.

[31] SINGER, op. cit., p. 25.

[32] MOLENTO, op. cit.

[33] Nesse sentido: MINISTÉRIO DA AGRICULTURA. Legislação. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/animal/bem-estar-animal/auditorias>. Acesso em: 06 de fev. de 2016.

[34] MOLENTO, op. cit.

[35] BOYLE, op. cit., p. 9.

[36] Ibid., p. 8.

[37] Singer atribui à Descartes a visão difundida dos animais como objetos ou maquinários, incapazes de sentir dor, que crê está há muito ultrapassada, embora a força que ainda exerça (p. 21).

[38] SINGER, op. cit., p. 25.

[39] SINGER, op. cit., p. 26.

[40] Painism ou algo como “sofrimentismo” é a tese moral defendida por Ryder acerca do tratamento que se deve conceder aos seres em geral. Afasta-se do utilitarismo por não crer ser possível uma abstração de grandezas como sofrimento e prazer, focando-se separadamente indivíduos que estejam sofrendo.

[41] RYDER, Richard. All beings that feel pain deserve human rights: Equality of the species is the logical conclusion of post-Darwin morality. Disponível em: <http://www.theguardian.com/uk/2005/aug/06/animalwelfare>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[42] RYDER, op. cit.

[43] RYDER, op. cit.

[44] RUDER, op. cit.

[45] SINGER, op. cit., p. 26.

[46] SINGER, op. cit., p. 26.

[47] SINGER, op. cit., p. 26.

[48] Nesse sentido: GONÇALVES, Maria Denise Abeijon Pereira; ALMEIDA, Sarah Lopes de. Breves reflexões sobre a eutanásia e seu sancionamento. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 102, jul 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?artigo_id=11733&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 06 de fev de 2016.

[49] SINGER, op. cit., p. 27.

[50] SINGER, op. cit., p. 28.

[51] SINGER, op. cit., loc. cit.

[52] SINGER, op. cit., p. 29.

[53] SINGER, op. cit., p. 20.

[54] FOX, Michael. “Animal Libertaion”: A Critique. Ethics, Volume 88, Issue 2: Jan., 1978. p. 111.

[55] FOX, op. cit., p. 112.

[56] FOX, op. cit., p. 110.

[57] FOX, op. cit., p. 110

[58] FOX, op. cit., p. 113

[59] DEGRAZIA, op. cit., p. 49.

[60] SINGER, Peter. Animal Liberation at 30. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/2003/05/15/animal-liberation-at-30/>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[61] REGAN, Tom. The Case for Animal Rights. In PETER SINGER (ed), In Defense of Animals, New York: Basil Blackwell, 1985, pp. 13-26. Disponível em: < http://rintintin.colorado.edu/~vancecd/phil3140/Regan.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[62] Conforme Regan: “[...] morality consists of a set of rules that individuals voluntarily agree to abide by, as we do when we sign a contract (hence the name contractarianism). Those who understand and accept the terms of the contract are covered directly; they have rights created and recognized by, and protected in, the contract. And these contractors can also have protection spelled out for others who, though they lack the ability to understand moral­ity and so cannot sign the contract themselves, are loved or cherished by those who can. Thus young children, for example, are unable to sign contracts and lack rights. But they are protected by the contract none the less because of the sentimental interests of others, most notably their parents. So we have, then, duties involving these children, duties regarding them, but no duties to them. Our duties in their case are indirect duties to other human beings, usually their parents. As for animals, since they cannot understand contracts, they obviously cannot sign; and since they cannot sign, they have no rights.” Op. cit., pp. 338-339.

[63] REGAN, op. cit., p. 342.

[64] REGAN, op. cit., p. 343.

[65] FOX, op. cit., p. 113.

[66] SINGER, op. cit., p. 26.

[67] Atrelado aos postulados de Bentham significa agir de forma a produzir o mínimo possível de sofrimento.

[68] Estados Unidos é o país referência como objeto de pesquisa do autor, devido a relevância das estatísticas encontradas neste país.

[69] SINGER, op. cit., pp. 38 – 47.

[70] SINGER, op. cit., p. 41.

[71] SINGER, op. cit., pp. 41-42.

[72] SINGER, op. cit., p. 42.

[73] SINGER, op. cit., p. 46.

[74] Do inglês learned helplessness, a síndrome foi identificada por Martin Selligman a partir de experimentos que envolviam aplicação de choque elétrico em cães.

[75] SINGER, op. cit., p. 44.

[76] SINGER, op. cit., p. 49.

[77] SINGER, op. cit., p.  49.

[78] SINGER, op. cit., p. 47.

[79] Entre os exemplos, Singer aponta: “Os animais são também sujeitos a outros testes que visam determinar a toxicidade de muitas substâncias. Durante os estudos de inalação, os animais são colocados em câmaras seladas e obrigados a inalar pulverizações, gases e vapores. Nos estudos de toxicidade dérmica, é retirado o pêlo aos coelhos para que a substância a testar possa ser aplicada diretamente na pele. Os animais são presos de maneira a não poderem coçar os corpos irritados. A pele pode sangrar, empolar e cair. Os estudos de imersão, nos quais os animais são mergulhados em recipientes contendo soluções com as substâncias a testar, provocam por vezes o afogamento dos animais antes de se poder obter quaisquer resultados. Nos estudos que envolvem injeção, as substâncias são injetadas diretamente nos animais, quer por via subcutânea, quer por via intrarmuscular ou diretamente num órgão.” (p. 50).

[80] DEMONTE, Aureluce. Uso de animais em experimentos científicos. Disponível em: < http://www.unesp.br/aci/jornal/245/opiniao.php>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[81] DEMONTE, op. cit.

[82] Segundo Demonte: seriam animais “[...] com moléculas de DNA recombinante exógeno introduzidas em seu genoma por intervenção humana”.

[83] DEMONTE, op. cit.

[84] DEMONTE, op. cit.

[85] DEMONTE, op. cit.

[86] SINGER, op. cit., p. 40.

[87] MORALES, Maurício M. MÉTODOS ALTERNATIVOS À UTILIZAÇÃO DE ANIMAIS EM PESQUISA CIENTÍFICA: MITO OU REALIDADE? Disponível em: < http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=S0009-67252008000200015&script=sci_arttext>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[88] MORALES, op. cit.

[89] The Nobel Prize in Physiology or Medicine 2007. Nobelprize.org. Nobel Media AB 2014. Web. 5 Feb 2016. <http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/2007/>.

[90] MORALES, op. cit.

[91] Segundo Morales: “[...] uma doença neuromuscular que causa fraqueza, fadiga e paralisia dos músculos voluntários, podendo ameaçar a vida quando atinge, principalmente, os músculos da deglutição e da respiração.”

[93] Espécie de teste utilizado na detecção de índices tóxicos em cosméticos e produtos de limpeza, feitos geralmente a partir da aplicação direta aos olhos de animais como coelhos.

[94] MORALES, op. cit.

[95] MORALES, op. cit.

[96] Professor doutor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

[97] GUIMARÃES, Marco Aurelio. Até que ponto a utilização de animais em experimentos científicos é eticamente aceita? Disponível em: < http://www.ipebj.com.br/docdown/_ddf.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 3.

[98] GUIMARÃES, op. cit., p. 4.

[99] SINGER, op. cit., p. 40.

[100] SINGER, op. cit., loc. cit.

[101] SINGER, op. cit., p. 68.

[102] SINGER, op. cit., p. 71.

[103] SINGER, op. cit., p. 71.

[104] Singer destaca alguns países, dentre eles: “Na Grã-Bretanha, três comitês governamentais de especialistas em matérias relacionadas com animais aceitaram a conclusão, isoladamente, de que os animais sentem dor.” (p. 23). “Em 1966, quando estava sendo preparada a aprovação de legislação que se destinava a proteger os animais de laboratório, a American Veterinary Medical Association [Associação de Medicina Veterinária Norte-Americana] testemunhou perante comitês do Congresso que, embora aprovasse a introdução de legislação que impedisse o roubo de animais de estimação e sua subsequente venda a laboratórios, opunha-se à obrigação de licenciamento e regulamentação das instalações de investigação, uma vez que isto poderia interferir com a investigação.” (p. 60). “Na Austrália, o Código de Conduta implementado pelos principais organismos científicos oficiais (equivalentes aos Institutos Nacionais de Saúde nos Estados Unidos) exige que todas as experiências sejam aprovadas por um Comitê ético da Experimentação com Animais.” (p. 64). “Nesses países, o ‘equilíbrio’ entre benefícios potenciais e os danos provocados aos animais é ainda avaliado em termos de uma atitude especista para com os animais, tomando assim impossível uma igual consideração dos interesses dos animais e dos interesses humanos. Comparei a situação existente nos Estados Unidos com a de outros países apenas para mostrar que os padrões norte-americanos, nesta matéria, são terríveis, não apenas em relação aos padrões dos que pretendem a libertação animal como também aos padrões aceitos pelas comunidades científicas dos principais países desenvolvidos.” (p. 64).

[105] SINGER, op. cit., p. 74.

[106] MOLENTO, Carla Forte Maiolino. BOND, Guilherme Borges. PRODUÇÃO E BEM-ESTAR ANIMAL. Disponível em: <http://www.rcvt.org.br/suplemento11/36-42.pdf>. Acesso em: 05 de fev. 2016. p. 40.

[107] PETA. Chickens Used for Food. Disponível em: <http://www.peta.org/issues/animals-used-for-food/factory-farming/chickens/>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[108] SINGER, op. cit., p. 78.

[109] SINGER, op. cit., p. 79.

[110] SINGER, op. cit., loc. cit.

[111] BASSIM, J. LEVINO. ALBINO, J. JACIR. Debicagem em galinhas de postura. Disponível em: < http://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/46077/1/debicagem-em-galinhas0001.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016

[112] SINGER, op. cit., p. 79.

[113] BASSIM, ALBINO, op. cit.

[114] SINGER, op. cit., p. 79-80.

[115] Os relatórios são voltados para os Estados Unidos que possui normalmente as maiores estatísticas no cenário da agricultura animal.

[116] The Humane Society of The United States. An HSUS Report: The Welfare of Animals in the Meat, Egg, and Dairy Industries. Disponível em: <http://www.humanesociety.org/assets/pdfs/farm/welfare_overview.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 1.

[117] The Humane Society of The United States, op. cit., p. 1.

[118] Segundo Peter Singer: “A inteligência natural de um porco é comparável, e talvez seja mesmo superior, à de um cão; é possível ter porcos como animais de companhia e treiná-los para responder a ordens simples, tal como um cão.” p. 91.

[119] DELLALIBERA, Felipe Lopes. CLIMENI, Bruno Santi Orsi. MONTEIRO, Marcos Vilkas. LOT, Rômulo Francis Estangari. SÍNDROME DO ESTRESSE EM SUÍNOS – RELATO DE DOIS CASOS. Disponível em: <http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/8H8Azlsk9kiyUyc_2013-6-24-16-50-5.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[120] MOLENTO, BOND, op. cit., p. 37.

[121] The Humane Society of The United States, op. cit., p. 3.

[122] SINGER, op. cit., p. 101.

[123] BOHANEC, Hope. Factory Farming vs. Alternative Farming: The Humane Hoax. Disponível em: <http://freefromharm.org/animal-products-and-ethics/factory-farming-alternative-farming/>. Acesso em: 05 de fev. 2016.

[124] BOHANEC, op. cit.

[125] BOHANEC, op. cit.

[126] SINGER, op. cit., pp. 63-65.

[127] SINGER, op. cit., p. 115.

[128] SINGER, op. cit., loc. cit.

[129] SINGER, op. cit., loc. cit.

[130] SLYWITCH, Eric. Nutrientes: Proteínas. Disponível em: < http://www.alimentacaosemcarne.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13:proteinas&catid=49&Itemid=141>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[131] SINGER, op. cit., p. 117.

[132] United Nations Environment Programme (UNEP) ou Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente é uma agencia pertencente às Nações Unidas responsável por questões ambientais.

[133] UNEP (2010) Assessing the Environmental Impacts of Consumption and Production: Priority Products and Materials, A Report of the Working Group on the Environmental Impacts of Products and Materials to the International Panel for Sustainable Resource Management. Hertwich, E., van der Voet, E., Suh, S., Tukker, A., Huijbregts M., Kazmierczyk, P., Lenzen, M., McNeely, J., Moriguchi, Y. Disponível em: <http://www.unep.org/resourcepanel/Portals/24102/PDFs/PriorityProductsAndMaterials_Report.pdf>. Acesso em: 05 de fev. de 2016. p. 80.

[134] SINGER, Peter. Animal Liberation at 30. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/2003/05/15/animal-liberation-at-30/>. Acesso em: 05 de fev. de 2016.

[135] SINGER, op. cit.

[136] Id. Animal Liberation. p. 181.

[137] SINGER, op. cit., loc. cit.

[138] SINGER, op. cit., p. 182.

[139] SINGER, Peter. ANIMALS RIGHTS IS NOW A MAINSTREAM MOVEMENT. Disponível em: <http://www.newsweek.com/animals-rights-now-mainstream-movement-84917>. Acesso em: 08 de fev. de 2016.

[140] SINGER, op. cit.

[141] Id. Animal Liberation at 30.