DA (IN) COMPATIBILIDADE DO DILEMA DO PRISIONEIRO COM A DELAÇÃO...

Por Felipe Marto Soeiro Carneiro | 18/08/2016 | Direito

DA (IN) COMPATIBILIDADE DO DILEMA DO PRISIONEIRO COM A DELAÇÃO PREMIADA E OS DEMAIS INSTITUTOS DESPENALIZADORES EM PARALELO COM A TEORIA DOS JOGOS

Ana Cecília Aguiar Ramos de Freitas

Felipe Marto Soeiro Carneiro 

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo analisar a aplicação da Teoria dos Jogos e seus subsídios metodológicos no Processo Penal, definindo a possibilidade de dialógo entre ambos. Após, será feito um estudo acerca da faceta específica do Dilema do Prisioneiro, corroborando para um entendimento salutar a fim de elucidar a problemática posteriormente apresentada. Finalizar-se-á com a análise quanto à possibilidade de compatibilidade entre o Dilema do Prisioneiro e a Delação Premiada.

1 INTRODUÇÃO

Desenvolver-se-á o presente trabalho versando sobre a temática da Teoria dos Jogos e seu caráter multifacetário, decorrendo em aplicabilidade em setores acadêmicos diversos. É imprescindível ressaltar a sua relevância a medida em que o Processo Penal é caracterizado como um embate em que as estratégias e táticas são inerentes ao seu decurso, possibilitando amplamente o dialógo com a Teoria dos Jogos e a metaforização das partes que o constituem como jogadores munidos de métodos aplicáveis a fim de sobressair seu prisma em face de um mediador imparcial e impessoal.    

É notório que o processo penal brasileiro é detentor de institutos despenalizadores, que, conforme a própria nomenclatura sugere, visam o abrandamento de penas específicas. A aplicação de determinandos institutos em detrimento de uma ação penal comporta decisões que são indossiciáveis da temática estratégica apresentada ao longo do trabalho.

Nesse sentido, será exposto de maneira fundamentada os elementos norteadores da Delação Premiada de forma delimitada, buscando sopesar e aprimorar o entendimento de sua relação e (in)compatibilidade com um faceta específica da Teoria dos Jogos, a saber, o Dilema do Prisioneiro.

O tema discorrido não possibilita o exaurimento do conteúdo, sendo insuficiente para a integral absorção temática. Os autores e referências utilizados no decorrer do trabalho, servirão para aprofundamento posterior e críticas que poderão ser feitas diante o exposto.

2 TEORIA DOS JOGOS APLICADA AO PROCESSO PENAL

Em análise acerca das interações sociais e o ímpeto quanto às decisões a serem tomadas frente às diversas possibilidades, é possível denotar a prática da estratégia e o esforço racional como basilar finalístico e decisório.

Ao adentrar na possibilidade da teoria dos jogos ser aplicada no âmbito jurídico, convém inicialmente expor seu conceito, o qual fora esclarecido por José Augusto Moreira de Carvalho (2007, p. 213):

(...) Constitui um meio para a adoção da melhor escolha nos casos de interação estratégica. A teoria dos jogos demonstra que, embora as decisões de determinados indivíduos se posicionem parar satisfazer seus próprios interesses, em certas ocasiões, em que há interação com outros indivíduos, tal comportamento não prevalece (ou não deveria prevalecer, sob pena de, inclusive, gerar prejuízos a todos que participam dessa relação). 

Nesse sentido, advindo de um contexto específico de interação estratégica em diversas áreas do conhecimento e empreendedorismo, a Teoria dos Jogos emerge e firma-se como sendo “um método utilizado para representar e compreender as decisões tomadas por agentes que interagem entre si”. (CARVALHO, José, 2007, p. 215).

O fato é que a instabilidade das relações, somada a possibilidade ou não de cooperatividade, faz com que diversas opções divergentes abrolhem, onde nem sempre a decisão mais racional é utilizada ou busca-se exclusivamente o equilíbrio (equilíbrio de Nash).

Quando a sua aplicabilidade ao Direito (importante ao presente trabalho na ótica do processo penal), ressalta-se que, ainda que oriunda de áreas exatas, a Teoria de Jogos demonstra sua existência pela faceta do processo penal em caráter analógico, uma vez que é composta por jogadores (partes que compõem o processo), conjunto de regras do jogo (trâmites processuais e delimitação em lei), a estratégia do jogo (defesas e acusações), o resultado do jogo (homologação de sentença) e a utilidade dos jogadores (estudo dos subsídios do processo no combate à criminalidade) (CALDEIRA, Rosane; OLIVEIRA, Sérgio Azevedo, 2007).

É basilar para o entendimento da aplicação da Teoria dos Jogos no processo penal o pressuposto de que o decurso processual pode ser, por similitude, comparado à um embate, um enfrentamento onde impera a primazia da obtenção da verdade e o ímpeto de aplicação da justiça (ROSA, Alexandre, 2013). Como fruto dessa relação, cada componente é detentor do um escopo específico, um desígnio que almeja alcançar alicerçado de estratégias com respaldo na norma legiferante.

Todavia, é necessário ressaltar que a supracitada aplicação ao processo penal brasileiro requer que seja salientado o seu caráter peculiar, uma vez que, diferente do que a noção de “jogo” pode causar, não se trata de um múltiplo cooperativismo, configurando o processo penal como um jogo assimétrico e complexo. Nesse sentido, “(...) o enfrentamento do processo penal brasileiro depende de posições antecedentes em relação a noções de Direito, tipo penal, Constituição, princípios, regras e etc, não se podendo falar em um processo penal idealizado” (ROSA, Alexandre, p. 26, 2013).

  A critério de exemplificação, elucida-se o Ministério Público atuando como custos legis, não confundindo-se com um acusador, mas proeminente fiscal da lei. Em sua atuação na demanda da verdade e cumprimento da lei, deverá exercer o papel de um jogador capaz de antecipar e ter elencado aquilo que pretende trazer ao jogo, configurando-se como à frente estrategicamente do jogador-defensor, representado por uma parte ou seu advogado constituido nos autos, que deverá elaborar o seu plano de jogo com base naquilo que é arguido em jogo, podendo manter-se em silêncio (com respaldo à princípio constitucional e na não auto-incriminação), contraditar os fatos alegados ou tangencia-los (ROSA, Alexandre, 2013).

Ainda na perspectiva da comparação do processo penal à um jogo de embates, ressalta-se a própria figura do mediador, representada pelo juiz dotado de impessionalidade e imparcialidade, caracterizando-se com dinâmismo no processo (CARVALHO, José, 2007).

Tendo como respaldo o príncipio da presunção de inocência, ao jogador que realiza defesa, alicerça-se no âmago da presunção, tendo o escopo de manter a sua posição, seja em silêncio ou contradizendo os fatos que são elencados pelo jogador-acusador, aquele que busca transpor a presunção de inocência e convalidar em penalidade. De forma concisa, pode-se afirma, conforme preleciona Alexandre Morais (p. 28, 2013) que:

O processo penal se estrutura como uma modalidade de jogo processual no qual há (a) conjunto de normas jurídicas; (b) que estabelecem expectativas de ganho/perda em momentos específicos (recebimento/rejeição da denúncia; absolvição sumária; produção probatória (informação), condenação/absolvição – em diversas instâncias), (c) mediante jogadas temporalmente indicadas (denúncia/queixa, defesa, preliminar, alegações finais, recurso, similares), (d) para os quais o Estado juiz emite comandos (despachos, interlocutórias, decisões, acórdãos, similares) de vitória/derrota (total ou parcial).

Nesse sentido, o decurso da relação processual penal na perspectiva de um jogo, ressalta que as decisões tomadas o são com o escopo de manter um equilíbrio, sendo mediadas e exercidas não em arbitrariedade, mas pautadas em um complexo sistema procedimental que possibilita que determinados princípios norteadores possam ser observados a fim de manter a integralidade da relação processual. Tal afirmação nos permite concluir que a incidência da Teoria dos Jogos no processo penal revela a complexidade do enfrentamento em busca da efetivação da justiça.

3 DILEMA DO PRISIONEIRO COMO CONSEQUÊNCIA DA TEORIA DOS JOGOS 

Como espécie que surge da Teoria dos jogos, o dilema do prisioneiro emerge como exemplo não-cooperativo em que os jogadores defendem seu próprio interesse e onde surgem opções específicas como estratégias de jogo com o escopo de beneficiar-se em detrimento da antecipação da estratégia do outro jogador e das condições inerentes aos elementos que compõem a lide, podendo ser benéficos ou prejudiciais para o fim que se busca alcançar. Dentre as possibilidades, os presos podem declarar-se culpados e acusar o co-réu, silenciar-se ou ser acusado (CARVALHO, José, 2007).

Tal jogo possui utilidade e relevância ao ramo processual penal, por ser proficiente e eficaz para a compreensão de situações presentes em alguns dispositivos de lei (posteriormente explicitadas no presente trabalho), bem como para o estabelecimento de métodos jurídicos seguros (busca de uma resolução da lide que coadune com os fatos levantados) (CARVALHO, 2007, p. 213).

Posteriormente, caberá análise quanto as estratégias provenientes deste dilema no ramo processual penal e a verificação se esta aplicação reside em compatibilidade com a efetivação da justiça, bem como em respeito aos princípios penais, adentrando-se no cerne da problemática apresentada.

Em termos conceituais, para além de elencar os subsídios que compõem o Dilema do Prisioneiro, resta que a elucidação é uma forma didática e relevante para a sua essência e finalidade estratégica. É nesse sentido que Carvalho (2007, p. 225) tenta descrever o referido através da seguinte situação:

[...]

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