Da Célula até Gaia.

                A Natureza vive. Parece ser uma afirmativa óbvia, porém, quase sempre despercebida no dia-a-dia de uma grande maioria das pessoas, desde o caboclo que faz a sua roça, até o engenheiro que constrói uma enorme barragem. Embora tenham conhecimento sobre a vida de plantas e animais, sempre ou quase sempre, os consideram isolados do ambiente onde vivem. E mais ainda, elas próprias – as pessoas – se consideram fora da Natureza.

                Não pertencer à Natureza corresponde dizer que existem dois ambientes distintos, que não se misturam: o homem com suas edificações e a Natureza com o seu ar, solo, água, animais e plantas, sempre disponíveis para serem usados de acordo com a sua vontade. Os efeitos desta estreita visão, cujo centro das decisões é o homem e só ele, são mostrados diariamente.

                Uma abordagem diferente dos diversos materiais biológicos que compõem o universo, começando pelas células, indica que existe uma organização estrutural e funcional dentro deles. Se estabelecermos uma linha reta, o ponto inicial da mesma será ocupado pelas células (animal ou vegetal). Dentro deste nível de integração, a sua estrutura será formada pelas inúmeras partículas que lhes darão uma função especial (reprodução, crescimento, etc.). Neste primeiro nível, esta integração pode já funcionar como um indivíduo pronto, como nas algas e as bactérias unicelulares. Senão, as células se reunirão em tecidos, estes em órgãos até formarem um indivíduo multicelular animal ou vegetal, conforme o caso. As palavras função e estrutura vão estar presentes na definição deste nível. Os indivíduos apresentam uma série de componentes que formam o seu corpo e cada um, desempenha uma ou várias funções para que este ser viva plenamente. Por exemplo, no indivíduo vegetal a função desempenhada pelas raízes é a sustentação, além de servir de entrada para a água e nutrientes indispensáveis para ele. Este é o segundo nível de integração. O terceiro nível, corresponde ao que chamamos de população, ou seja, a reunião de inúmeros indivíduos de uma mesma espécie ocupando um lugar em um mesmo espaço de tempo. Aqui, mais uma vez, observamos a existência de uma estrutura, a populacional (a relação do número de machos e fêmeas, o efetivo e a densidade populacional, são alguns deles) e a função de cada um dos componentes da população é exercida através de seu crescimento, migração ou extinção. A pesca da baleia por exemplo, reduziu tanto o efetivo populacional desta espécie, que sua reprodução ficou comprometida e portanto, tendendo para a extinção.

                Na Natureza não encontramos apenas uma só população vivendo em um lugar. Vamos ter coexistindo em um mesmo ambiente, diversas populações de diferentes espécies. Esta reunião de populações interagindo entre si, recebe o nome de comunidade. É o quarto nível. Nas comunidades vamos perceber de novo a existência de uma estrutura e de funções relacionadas à ela. Exemplificando podemos indicar a comunidade humana de um bairro. Vamos ter entre seus componentes – as pessoas – diversas profissões que no seu conjunto, fazem com aquela comunidade funcione, isto é, viva. Até aqui, referimos apenas aos materiais essencialmente biológicos e às relações que se passam entre eles. O próximo nível de integração dos materiais além de englobar animais e plantas, inclui também as inúmeras interações que se passam entre eles e com a água, com o solo, com o ar e com o clima. É o nível de ecossistema.

                Importante notar a evolução da Ecologia no estabelecimento dos seus conceitos fundamentais. Inicialmente, quando Haeckel por volta de 1866 usou a palavra Ecologia, que se referia ao ambiente local, ao habitat. Naquela época, o horizonte de interesse era restrito até onde chegava a ciência e a tecnologia. Nos idos de 1935, Tansley sintetizava o conceito de ecossistema, como sendo a unidade básica para o estudo da Ecologia. A ideia da Natureza como um organismo vivo estava lançada. Com o extraordinário avanço da ciência e da tecnologia, especialmente da comunicação e da informática por um lado, e do poder de alteração ambiental que o homem adquiriu do outro, o alvo de interesse se expandiu de tal forma que o grande sistema ecológico a ser preservado passou a ser o Planeta Terra. Daí a elaboração por Lovelock, em 1988, Teoria Gaia. Assim, o sexto e maior nível de integração é chamado de Gaia. Resumidamente podemos dizer que a Terra é um hiperorganismo, que tem uma estrutura própria e seus componentes desempenham funções que a fizeram e a estão fazendo funcionar tal como a conhecemos hoje. Evidências que reforçam esta teoria estão cada vez mais sendo obtidas nos mais avançados centros de pesquisas ambientais.