Cuidado com a corrente do calote
Por Alexsandro Rebello Bonatto | 22/04/2009 | AdmO problema da economia é que tudo está relacionado.
Uma crise
bancária no mercado financeiro americano acaba influenciando num aperto
de crédito no Brasil, que por sua vez deixa as empresas sem acesso a
recursos.
Como o crédito pára de irrigar a economia,
investimentos deixam de ser feitos gerando desemprego. Pessoas sem
trabalho acabam atrasando o pagamento de seus compromissos e por aí vai.
É
exatamente o avanço da inadimplência do consumidor começa a provocar um
efeito cascata na economia nacional e já chega às grandes empresas. Se,
até o momento, eram as empresas pequenas e médias que vinham
apresentando maiores dificuldades para honrar seus pagamentos, agora as
grandes também começam a enfrentar esse problema e estão tendo de fazer
uma verdadeira "ginástica financeira". A alternativa adotada tem sido
negociar prazos, cortar funcionários e investimentos ou eleger contas
prioritárias para pagamento - o que tem elevado as estatísticas de
inadimplência entre empresas. Só em fevereiro, a alta foi de 20,6% em
relação ao mesmo mês do ano passado, de acordo com dados da empresa de
análise de crédito Serasa Experian.
Quando não há acordo, a
dívida entre as empresas acaba parando na Justiça. No primeiro
bimestre, o volume de títulos protestados (apenas de pessoas jurídicas)
subiu 40% em relação a 2008, segundo dados da empresa de solução para
gestão de risco Equifax. O volume de cheques devolvidos subiu 23%. Um
dos efeitos disso foi o aumento de 25,16% no número de falências no
Brasil.
No caso dos consumidores, os compromissos com cartões de
crédito concentravam 37,1% dos problemas com inadimplência no
trimestre, também maior do que os 31,4% de participação apurados um ano
antes. A dívida média no período foi de R$ 386,86 – valor 13,3% menor
do que o verificado no primeiro trimestre do ano passado.
Em
relação aos cheques sem fundo, a fatia caiu de 23,4% para 17,6% de
janeiro a março deste ano, com dívida média de R$ 828,70, uma alta de
31,2% em relação ao mesmo intervalo do ano passado.
O Jornal O Estado de São Paulo traz um exemplo muito interessante sobre como a inadimplência se propaga:
"No
setor têxtil, essa "corrente do calote" já é perceptível. Pequenos
varejistas ou sacoleiros com dificuldades em receber de seus clientes
pessoas físicas pedem mais prazo a fornecedores - como os fabricantes
de roupas -, que, por sua vez, têm de renegociar suas dívidas com seus
próprios fornecedores, as grandes tecelagens.
"Essa situação tem
sido muito ruim para a indústria", diz o empresário Eliezer Turco,
sócio da Bordados Sulamita, empresa instalada há 30 anos em Ibitinga,
no interior de São Paulo. Conhecida como a "capital nacional do
bordado", a cidade convive com representantes comerciais de redes de
varejo e também com os sacoleiros, que invadem as ruas do município em
busca de novidades no mercado de enxovais.
Na Bordados Sulamita,
a devolução de cheques - de pessoa jurídica ou dos sacoleiros - dobrou
em relação ao ano passado. Isso sem contar o aumento do número de
clientes que pedem a prorrogação dos prazos de pagamento, para até 120
dias. "Não tenho alternativa. Se não estender um pouco o prazo, não
recebo nada", diz Turco, destacando que tudo depende do cliente que faz
o pedido.
Com o caixa debilitado e sem crédito, a saída da
Sulamita foi adotar a mesma estratégia dos clientes: pedir a extensão
dos prazos das dívidas com as indústrias de tecelagem. "Não temos
margem para fazer milagres", destaca Turco, explicando que a empresa
foi obrigada a demitir 15% do quadro de funcionários por causa da crise.
Na
outra ponta da corrente, no caso da indústria têxtil, estão as grandes
tecelagens, que veem aumentar o pedido de renegociações de dívidas. Na
Teka, por exemplo, os pedidos de aumento de prazos não partem apenas
dos clientes nacionais, mas também dos estrangeiros. A empresa, porém,
tem sido resistente, diz o diretor de relações com investidores da
companhia, Marcelo Stewers. "Na compra, eles já pedem descontos entre
15% e 25%. Em alguns casos, a gente cede. Em outros, a gente não
vende.""
Os números negativos pegaram os empresários no
contrapé. Muitos tinham acabado de fazer investimentos pesados para
atender a uma demanda cada vez maior. De repente, passaram a conviver
com escassez de crédito, queda na receita e inadimplência. Tal situação
dificultou o planejamento das empresas, implicando no aumento dos
prazos de pagamento dos clientes para evitar a inadimplência. Contudo
essa gestão de curto prazo posterga investimentos e dificulta a criação
de estratégias para exatamente enfrentar a crise.
A escalada da
inadimplência em função de seu "efeito corrente" impactando no caixa
das empresas, dificultando sua tomada de decisão, gerando desemprego e
por consequência mais inadimplência.
Bibliografia:
Jornal O Estado de São Paulo de 13 de abril de 2009
Jornal do Brasil de 14 de abril de 2009