CRÔNICAS DA SAUDADE - Encontros atemporais
Por Rosamares da Maia | 09/05/2016 | CrônicasEncontros atemporais
Um dia destes me peguei pensando após ouvir um DVD, “O doce Mistério da Vida”, nos encontros inusitados que esta vida nos proporciona e pensando especialmente no encontro de Fernando e Maria – Ela, Bethânia de arte, interpretação, talento, música e voz – Ele Pessoa, puro encanto, sutileza no encontro de arte talento sensibilidade e poesia.
Ambos, com a mais pura magia que me foram apresentados nos anos de 1970, em vinil e livraria e nunca mais me deixariam. Seduzida tornei-me cativa espontânea das suas bruxarias.
Como terá ocorrido o encontro desses dois? Já que aos olhos do mundo, ambos se apresentaram de formas tão distintas e distantes, tanto no tempo como nos caminhos que trilharam nesta vida e para além dela.
Um chegou quando o outro partia. Ele, no berço do Tejo, nasceu Fernando António Nogueira Pessoa, (António), assim mesmo, com acento agudo, pois estas coisas de encorpar o som das sílabas acentuadas é coisa nossa. Desaguou-se para os céus de Lisboa em 30 de novembro de 1935, aos quarenta e sete de idade, clamando por seus heterônimos que por certo estavam todos à sua cabeceira e segurando-lhe a mão para psicografar-lhe a última frase, escrita em Inglês, língua cultivada: “I know not what tomorrow will brig” ou em bom português: “Eu não sei o que o amanhã trará”
Ela, abençoada pelo chão do Recôncavo Baiano, nasceu Maria Bethânia Vianna Telles Velloso e, olhe que é muita letra dobrada, mesmo para o ano de 1946, em Santo Amaro da Purificação – BA, irmã de irmão famoso e de Poetisa internacional, juntou nas veias o que de melhor havia. Poderia sem sustos ser chamada de “cantriz”, se a palavra existisse, mas como não existe, tornou-se uma das melhores interpretes do Brasil e quiçá deste mundo. Fez sua incursão também no mundo da composição e poesia:
Eu sei que fidelidade /Não é seu forte afirna /E mesmo que eu quisesse / Ainda se eu pudesse
Não ia fazer igual / Porque só beijo quem amo / Só abraço quem gosto / Só me dou por paixão
Eu só sei amar direito / Nasci com esse defeito / No coração
E como o inusitado abraça o destino, a conexão improvável aconteceu. Onze anos depois que ele partiu ela surgiu, o cometa que ia cruzou com uma estrela nova que surgia, lançou seus fragmentos, na esperança de agarrar-se a sua alma. Ela o absorveu, mesmo sem partilhar de sua vida terrena, preenchendo os espaços com o que havia melhor na essência Dele - sua poesia.
Para sempre Maria amou Fernando buscando neste convívio traduzir-se e revelar-se em Pessoa.
Rosamares da Maia