CRÔNICA – SOBRAL A CIDADE PRINCESA

CAUSO NÚMERO II

O MAIOR MENTIROSO

Toda Cidade tem suas particularidades, seus costumes, suas história. Assim é a nossa querida cidade Princesa. Quanto menor o lugarejo que você mora, mais engraçadas são as peripécias de seu povo. É assim que a Dramaturgia vira arte. Contada e imitada por nossos autores e diretores de cinema. Érico Veríssimo, Ariano Suassuna, Nelson Rodrigues, Darcy Ribeiro, Dênis Carvalho e tantos outros que me perdoem por não citar aqui.  Todos são fantásticos.  O Brasil é rico e têm um povo muito inteligente e criativo.   

Então, escolhi um nordestino, só não digam que estou puxando a farinha para o meu lado. Quem se lembra de Chicó e João Grilo com a interpretação do “Auto da Compadecida” do dramaturgo, escritor, poeta nordestino Ariano Suassuna. A história já conta tudo. É engraçada e divertida. Um mentiroso que dribla todas com suas anedotas e contos hilariantes.

Na minha cidade querida, no Ceará; existe um Chicó com as mesmas características, trajes, peculiaridades. Bem mais esperto que o ator da TV brasileira. Digo, pois, esperto na arte de trabalhar, que ao contrário do cinema ele é bem mais malaca (traquino) e preguiçoso.

Chamarei de Zé da bodega. Contarei o pecado e não o pecador. Ademais, sabem que em cidade pequena todo mundo conhece todo mundo, basta dizer um tiquim assim, já sabem quem é ou tentam adivinhar, como cartomante lendo sua mão e adivinhando tudo da sua vida. 

O Zé da Bodega é tão mentiroso que uma de suas anedotas conta que seu time do coração, o Rubro-Negro estava disputando a Taça, o Título de Campeão do Campeonato Cearense. O jogo estava marcado para um domingo no Estádio do Castelão na Capital cearense.  Todos os ingressos foram vendidos pelos cambistas, e ele esperto já estava com o dele comprado. Esgotaram todos. Chegou o grande dia.

Na manhã do clássico, a Rodoviária da cidade não tinha mais passagem. Os ônibus fretados defronte a Igreja e Praça do Patrocínio já se mandaram de madrugada para a capital.  Os amigos também foram todos de carro particular. Zé da bodega, atarefado com suas vendas em sua quitanda, não se atentou desse episódio. Perdeu o horário com os fregueses de sua venda. Por azar ou sorte nos finais de semana as vendas aumentavam em seu comércio. Vendia fumo, carne de porco abatida, carne de sol caseira, lingüiça caseira feita por sua patroa na semana, frango, farinha, pinga...

Disse o Zé da Bodega:

- Valha-me Deus! Perdi o horário. Estou lascado. Arruinado.

Andou de um lado a outro, feito pião no chão. Pegou a Camisa. Colocou a carteira no bolso e soltou o grito para dentro de casa.

- Vem cá muié, me acode pelo amor que tens a tua mãzinha e Nossa Senhora da Conceição.

A mulher, sem entender direito o que acontecia veio correndo, atropelando os móveis do corredor e derrubando tudo o que encontrava pela frente.

- Diz home de Deus o que houve dessa vez. O que te fiz e aprontei para tu ta aperreado desse jeito.

 Respondeu o grande mentiroso.

- Nada não muié. Vou deixar de assistir meu time do coração. Anda logo, fecha as portas da bodeca, coloca as trancas e guarda as chaves no armador da sala que vou viajar.

Partiu ele, abraçado com uma caixa de Sabão Jangada, produto aqui da região e seguiu rumo a Ponte Grande (Ponte Othon de Alencar) no Bairro das Pedrinhas.  Chegou aos trilhos, subiu, abriu a caixa de sabão Jangada e aprumou o pé uma barra de sabão em cada um. Chamou um dos meninos que estava por lá e mandou que lhe empurrassem com toda a força que tinha rumo à direção do Bairro Sinhá Sabóia. Foi feito bala de canhão se equilibrando como um alpinista descendo o Monte Everest. Quando estava prestes a se acabar a barra de sabão ele trocava fazendo alternância entre os dois. Avistou o povoamento Barro Vermelho, a Estação de Caucaia, ao lado da estrada do gado, antigo Soure e acelerou.

Passou pelo Km 08, no Bairro Antonio Bezerra em Fortaleza feito bala. Cruzou a linha de trens metropolitanos, avistou uma área de veraneios para os ricos de Fortaleza seguiu e chegou a tempo para assistir seu time do coração. 

- Cheguei! Disse ele. Graças a meu bom Padim Padre Cícero. Arrumou o cabelo, passou a mão no rosto, bebeu uns goles d’água, puxou a camisa e foi ao encontro da torcida rubro-negra.

Uma semana depois, o Zé da Bodega estava contando a história para seus ouvintes e fregueses. Os que caçoavam dele sorrindo ele botavam pra fora de seu estabelecimento e falava mal chamando nome com a mãe.